Margaery Tyrell: A Rosa Dourada de Highgarden 🌹 escrita por Pedroofthrones


Capítulo 32
Pelo bem do povo




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A jornada para Correrrio foi mais longa do que o esperado. O caminho estava tomado por montes de neve e lagos congelados que dificultaram a passagem por diversos momentos; quando passaram de Monte Cailin e desceram pelo Gargalo as coisas não ficaram mais fáceis: os pântanos estavam congelados — sendo possível vislumbrar lagarto-leões congelados em alguns momentos —, e a cobertura de neve impedia de ver com clareza onde era era terra e onde era água congelada. Os cranogmanos, liderados por Lorde Howland Reed, ajudaram a caravana a passar por cada pelos locais — o terreno era hostil, um passo em falso e o corpo de um homem poderia afundar na lama e sumir diante de todos. O solo era tão instável que nem mesmo as solas com espinhos dos nortenhos, feitas para quebrar o gelo duro do solo, eram úteis, pois elas só ajudavam os soldados que as usavam a afundar mais facilmente.

O enorme grupo não era apenas formado por soldados: Ladies, lordes, selvagens, imaculados, outros estrangeiros, plebeus e estranhas e pequenas criaturas místicas formavam a imensa caravana. Todo o Norte estava unido em uma linha, tendo um mesmo destino. Até mesmo gigantes e mamutes estavam com eles — estes últimos eram os que mais facilmente afundavam nos pântanos do Gargalo. Aqueles que paravam, provavelmente morreriam sozinhos no frio.

O inverno estava mesmo rigoroso, pois os dias de viagem pareciam demorar mais que o dobro do tempo necessário para a caminhada. Por sorte, Daenerys queimava uma parte da neve com seu enorme dragão; derretendo a neve em diversos lugares e auxiliando na passagem.

— Bom ver que o dragão serve para algo que não seja comer nortenhos — ralhou o Grande Jon Umber, o Lorde de Última Lareira, sem velho tom de pilhéria alegre de sempre.

— De fato — disse a Lady Waynwood, sogra de consideração Sansa, por cima do cavalo. A velha senhora estava com o cabelo castanho totalmente grisalho, e o frio tirava a sua energia restante (embora não tivesse muita após a morte de seu primogênito nas mãos de Daenerys e a prisão em Winterfell parecia tê-la esgotado).

Sansa suspeitava que nenhum daqueles golpes da vida havia machucado tanto a orgulhosa Lady como quando soube que seu protegido, Sor Harrold, outrora Rei do Vale, havia sido deposto de seu cargo e virado os reinos do Tridente e do Vale num caos — As Terras Fluviais perderam todo o terreno para exércitos inimigos, e o Vale estava tomado por selvagens, enquanto o povo se revoltava com qualquer lorde; o pai de sua antiga amante, chamada Açafrão, havia sido morto em uma dessas rebeliões.

Sansa torcia para que Myranda e as outras colegas estivessem bem; a última coisa que soube delas foi quando um corvo do Portão Sangrento veio avisar que os Portões da Lua estavam soterrados na neve e que Myranda estava iniciando a marcha para o Tridente. Só podia rezar que o caminho estivesse melhor para o grupo dela.

Quanto ao marido, ela não poderia desejar para que ele tivesse boa sorte; Harry sempre se mostrará um idiota, mas ele conseguiu superar até mesmo Joffrey em sua estupidez. Não sentia nada além de ódio ao marido… Bom, isso quando se lembrava dele. Harry sumiu de sua vida, pois não havia quase nenhum aliado do vale no Norte e sua semente não vingara no ventre de Sansa. Até os hematomas marcados na pele alva dela haviam sumido. Era como se Harry fosse uma lenda para ela.

A frente do exército de pessoas que marchavam, e mantendo o espírito de todo vivo, havia o rei do Norte, com sua fronte coroada de bronze e ferro, duros e frios, como o monarca que os usava. Seu cabelo castanho, quase todo grisalho, caia pelos seus ombros — um velho corvo também se empoleirava em seu ombro, grasnabdo aqui e ali e picando os fios de cabelo de Jon. Sempre ao seu lado, estava seu intendente, Cetim, um belo rapaz perfumado, que parecia ser a sombra do rei do Norte. Sansa se surpreendia que seu irmão mais velho preferia mais a companhia do patrulheiro do que da princesa selvagem com cabelos de mel.

Apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelos caminho, nenhuma aterrorizou mais o coração de Sansa quanto se aproximar e vislumbrar as gêmeas: o local onde sua mãe e o seu irmão mais velho foram injustamente mortos, junto da maior parte do exército nortenho e do tridente; aqueles que não morreram, foram presos.

A casa Frey não deixou de sofrer graves baixas após tudo isso, parecendo estar amaldiçoada pelos deuses: a irmandade sem bandeiras havia enforcado alguns membros da casa; após isso, em um casamento com a casa Lannister em Correrrio, a mesma irmandade matou milhares membros de ambas as casas e seus membros, e Lorde Walder Frey, um dos mandante do casamento Vermelho, foi colocado num esquife e colocado no rio, como os Tully falecidos eram, e uma flecha incendiou o seu barco, junto do próprio lorde da travessia; enquanto tudo isso acontecia, no Norte, Stannis e os Nortenhos matavam os membros da família que ajudavam os Bolton, e o insano Ramsay Snow matou a madrasta Frey, junto de seu feto em formação; no fim, após diversos Frey matarem uns ao outros pela herança das gêmeas, o herdeiro direto que sobrara era Sor Sandor Frey — filho do falecido Geremy Frey, quinto filho do Falecido Lorde Walder Frey com a sua terceira esposa, Amarei Crakehall, que havia lhe dado outros seis filhos, que tiveram outros filhos; todavia, todos acabaram por morrer de forma trágica.

Sandor tinha apenas uma irmã, chamada Cynthea, e a mãe deles era a falecida Carolei Waynwood. Sandor era um rapaz jovem que serviu há bom tempo como escudeiro de Sor Donnel Waynwood. Quando todas as mortes dos Frey deixaram a casa em crise, Sandor veio como o herdeiro de direito, saindo do Vale após ser condecorado cavaleiro.

Sansa havia visto pouco de Sandor no Vale, nunca conversando com ele diretamente — não necessariamente pela rivalidade com a casa do rapaz, mas também pela falta de oportunidade, afinal, ela nunca tivera motivos para se hospedar no Portão Sangrento e falar com ele.

Sandor tem sangue Waynwood, pensou, ele não me faria mal ou a Lady Waynwood. Ele não é como os outros.

Apesar de ainda temerosa, as torres gêmeas dos Frey não pareciam nem de longe ameaçadoras: o saque dos Homens de ferro havia sido devastador, pois era possível ver as cinzas do incêndio que eles fizeram ao atacar o local; uma das bases das ameias estava rachada e as janelas estavam quebradas e escancaradas; a ponte que conectava as duas torres também estava quebrada em várias partes — foi a conexão de pedra que serviu para os Dracares Greyjoy atracarem e invadirem.

— Creio que os Frey já viram dias melhores — disse Petyr, atrás da égua de Sansa. Não tinha o sarcasmo de sempre, parecendo um tanto amargo. — Os deuses são justos; Cat merecia coisa melhor do que morrer num dos salões daquelas torres de pedras.

Mesmo estando destruída, de alguma forma, a visão das enormes torres fez um arrepio percorrer a espinha de Sansa. Sentiu seu coração apertar e errar uma batida. Apertou com força as rédeas do cavalo, sentindo a respiração ficar presa.

Seu irmão mais velho parecia ter visto a perturbação em seu rosto.

— Fique Tranquila, irmã — disse ele. — Os Frey podem ser estúpidos, mas duvido que iriam contra um dragão.

O dragão de Daenerys voava em círculos por cima das duas torres dos Freys. Tal visão deveria ter acalmado Sansa, mas não o fez; nunca se sentiria calma com aquela horrível criatura alada.

A ponte levadiça abaixou e fez a conexão entre a torre que apontava para o Norte e a terra. Dois cavaleiros de armadura e erguendo os estandartes Frey saíram de dentro das muralhas, galopando pela porta.

A armadura de uma senhora é sua cortesia, disse a si mesma. Tinha que ser forte, não poderia deixar o seu medo transparecer.

Seu irmão Bran, que estava ao seu lado, disse:

— Os Frey não farão mal, acreditem — o rapaz disse. Era bem novo, com espinhas na cara e um enorme cabelo acobreado que nunca havia sido cortado. — Eles não são o problema aqui.

Seu irmão não era um selvagem como Rickon, mas nem por isso era menos esquisito: tinha um ar solene, e parecia ser mais velho do que seus dezessete dias de seu nome indicavam; era calma, de voz grave e solene. Sansa também achava que ele era magro demais. Imaginava que Bran devia ter comido bem pouco em seus anos de desaparecimento — dos quais ela não sabia praticamente nada, pois ele guardava bastante para si, tal como Arya e Jon.

Pelo visto, todos eles têm seus pecados. Sansa sentia um pouco de ressentimento por eles nunca terem falado nada para ela… Porém, algo dentro dela lhe dizia que deveria ficar feliz e aliviada com aquilo.

O velho corvo que vivia no ombro do irmão desde que ele voltou da muralha bateu as asas e pediu grão, mas Jon o ignorou. A ave voou até ficar em cima do cabelo de Bran e disse "grão!". O jovem princípe sorriu e olhou para cima, fitando a cabeça curvada do corvo. "Grão!".

Quando os dois homens que usavam armas Freys se aproximaram, Fantasma e Verão, os enormes lobos de seus irmãos, tomaram a dianteira e ficaram alertas. Atrás deles, três lobos normais fizeram o mesmo. Grande Jon bateu as esporas e fez a montaria dar alguns galopes a frente, e segurou o cabo da espada larga, tão grande, que precisava de duas mãos para empunhá-la.

Os dois cavaleiros pararam e fizeram uma vénia para a família real. Os dois soldados tinham uma cara de fuinha dos Frey, mas Sansa não saberia dizer qual o grau de parentesco, pois Walder Frey tivera oito esposas e diversas amantes ao longo dos anos; era simplesmente impossível lembrar-se de todos.

— Meu rei — um dos homens de cara chupada disse e depois olhou para Sansa e Bran, fazendo outro aceno. — Meus príncipes. — Voltou a olhar para Jon e continuou: — Tivemos pesadas baixas pelos invasores das ilhas de Ferro, mas nós estamos resolvendo a bagunça; e meu senhor ficará feliz em dar Pão e sal para vocês, e dar o direito ao hóspede.

— Não ficaremos muito tempo — disse Jon. — Devemos sair ainda hoje. Mas eu e meus irmãos ficaríamos felizes em agradecer ao seu suserano e mostrarmos nossa gratidão e confiança para com ele.

O cara de fuinha assentiu. Stannis grunhiu.

— Eu não ficarei — disse o rei. — O filho de Ned Stark pode ficar cegado pela honra, tal qual o pai e o irmão dele, que perdera a cabeça por isso, mas eu não sou tão cego a ponto de confiar em um Frey.

Os dois homens se encolheram diante do insulto seco do monarca. Os lordes da Tempestade e do Norte acenaram as cabeças concordando.

— Vossa Graça pode ir — disse Jon, mantendo a calma. — Avise minha rainha de que logo eu e meus irmão iremos vê-la.

— Certo, vou avisar Daenerys que talvez ela deva queimar o que restou deste castelo após a garganta do futuro marido dela ser cortada.

Jon ignorou a pilhéria seca de Stannis e apenas aquiesceu.

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

As Gêmeas, ou travessia, era uma imensa ponte de pedra protegida que conectava duas torres imensas e idênticas que ficavam de cada um dos lados da margem do ramo verde do tridente. Para auxiliar na defesa, havia uma imensa torre no meio da conexão de pedra, que podia atacar inimigos por qualquer que fosse a direção que viessem. A conexão de pedra era tão grande, que os Frey demoraram três gerações de sua família para completá-la.

 A Travessia era a única conexão que havia até o outro lado do Ramo Verde que se estendia por vários quilômetros. Não era uma surpresa que os Frey tivessem passado de uma simples ponte e fortes de madeira para imensas construções de pedra maciça e cheia de tapeçarias e ouro; vários nobres haviam dado tesouros e bons casamentos com suas filhas para ter a permissão dos Frey e passarem para o outro lado mais rápido. O próprio irmã de Sansa, o falecido Rei Robb, teve de prometer a mão de sua jovem irmã Arya e sua própria mão para os familiares do falecido Lorde Walder Frey.

O irmão mais velho de Sansa estava na mesma situação: se quisesse chegar a Correrrio a tempo com todo o seu exército, precisava atravessar as Gêmeas.

Sansa sentia o medo pesar em seu corpo conforme passava pelo arco formado pelas muralhas do castelo. Olhou para cima, vendo a enorme forma escura passar por cima dela, como uma sombra. Sentia-se uma garotinha novamente, assustada. Tentou fazer o que podia para esconder, mas sabia que estava tremendo.

— Está bem, princesa? — indagou Wylla Manderly, que galopava ao seu lado, enquanto os irmão de Sansa e o Rei Stannis galopavam à sua frente.

— É só o frio — mentiu.

— Devo acompanhar minha princesa até o salão? — indagou Petyr. — Não acho de bom tom que você vá para dentro de um lugar que lhe faz tão mal.

Será que ele imagina que Jon e Bran podem ser mortos e eu serei rainha no lugar deles?, se perguntou. Não sabia do que Petyr era capaz de imaginar. Tudo nele era imprevisível.

As carroças de comida passavam primeiro; depois delas, os lordes e os homens a cavalo; e, por fim, o povo simples e pobre, que não tinha dinheiro ou comida.

Stannis analisava duramente as pessoas e os carros de comida e pele que passavam por ele, com um intenso olhar azul e minucioso.

Sansa se perguntava desde o começo daquela aliança com Daenerys o motivo pelo qual um homem duro e severo como Stannis aceitou se aliar a rainha que proclamava ser a rainha do trono que ele lutou por anos. De fato, já se questionara o motivo pelo qual ele aceitou Jon e Harrold serem reis. Stannis sempre lhe pareceu ser um homem que jamais faria tal coisa, pois sempre se mostrara insensível a qualquer visão de mundo que barrasse a sua própria visão das coisas.

Talvez ele acredite que a ameaça maior seja mais importante do que o que ele pensa. Entretanto, Sansa não poderia ter certeza disso — pelo menos não ainda.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X X I X 

 

O castelo estava mesmo bem destruído. As paredes estavam nuas, e havia tapeçarias rasgadas e chamuscadas no chão, sem qualquer visgo para dar algum cheiro doce no local que cheirava a fumaça acre. Havia tochas faltando, com as arandelas quebradas e algumas das mesas do Salão estavam quebradas e reviradas. Era possível ver algumas manchas de sangue seco no chão. As vigas no topo do cômodo estavam enegrecidas e quebradiças.

Foi aqui que minha mãe e meu irmão morreram, pensou Sansa, sentindo um aperto na barriga e teve medo de desmaiar ao sentir-se tonta e com pernas bambas. Retirou o capuz de lã e forrado de arminho e olhou em volta. Apesar de destruído, tudo logo poderia ser arrumado e o local logo voltaria a ser um belo salão, imaginava. Apenas precisavam de novas cadeiras e trocar as vigas antes que estas quebrassem e desabassem. Por sorte, os frey ainda eram uma casa bem rica e logo conseguiria repor suas perdas, mesmo com parte do ouro saqueado.

Apesar do salão quebrado, o imenso caldeirão do Senhor da travessia, que estava rachado e chamuscado, ainda permanecia de pé, de forma imponente. O ébano negro tinha as duas bordas talhadas como duas torres conectadas. Na enorme cadeira, estava Lorde Sandor Frey, um rapaz feio, que puxou o nariz curvado dos Frey, assim como a cara chupada e olhos pequenos de fuinha; o cabelo dele era oleoso e o queixo pontudo, como Sansa viu que os Waynwood tinham ao conhecer os parentes de seu marido no vale. A jovem ao lado dele, que ela imaginou ser a irmã do lorde, era tão feia quanto, senão mais.

Acima de todos no salão das gêmeas, havia algumas pessoas, vários Frey com caras de fuinha, narizes torcidos e pontiagudos, e olhos pequenos, observando os convidados no salão destruído com nervosismo óbvio. Sansa sabia que se tivessem besteiros por ali, todos seriam facilmente abatidos como meros animais. Nem mesmo Jon Umber e Alysanne Mormont poderiam defendê-los ou a si mesmo.

Lorde Sandor poderia ter o nome de Clegane, mas ele não tinha o ódio no olhar, o corpo de guerreiro, ou a altura, sendo um rapaz minúsculo.

— É um prazer poder receber vossas graças — disse Lorde Sandor, sorrindo. — Eu lamento, porém, não ter condições para dar um bom tratamento, mas saibam que eu faço o possível dentro das minhas condições.

Jon assentiu.

— Sabemos que houve problemas com os Homens de ferro, Milorde — disse ele. — Entendemos as preocupações.

Lorde Frey confirmou, acenando com a cabeça.

— De fato, vossa graça. Por sorte, o marido da minha prima, Amerei, filha do falecido nono filho do meu falecido avô, é um Crackhall de grande destreza e ajudou a mandar setas contra os invasores, através da torre no centro da ponte de pedra. — Ele gesticulou para Sor Lyle, ao lado da esposa com cara de fuinha e peitos grandes, que deveria ser Lady Amerei. Ambos deram um sorriso jubiloso com os elogios. Sorrisos feios, como o rosto deles.

Sansa sabia bem quem era Sor Lyle Crackhall; filho do meio do lorde de Crackhall, ele claramente iria buscar alguma forma de poder para si, nem que isso significasse ficar com uma mulher promíscua e aproximar-se do lorde das gêmeas. Claro, ele havia se voltado contra os Frey que ajudavam os Lannister, mas Sansa sabia que ele os havia ajudado antes; apenas mudou de lado quando pareceu ter mais a ganhar se o fizesse.

Amerei, a esposa de Sor Lyle, era uma coisa tão feia quanto o resto da família paterna. Ela era chamada de “Amerei Portão”, pois diziam que ela sempre andava de pernas as abertas — e ela não fazia questão alguma de esconder isso. Seu pai, Merrett Frey, morrera pela Irmandade Sem Bandeiras, os “amigos” de Arya. Um fracasso total de humano, pelo que Sansa ouvira dizer dele — poucos tinham o que falar, mas nada do que tinham a dizer sobre o falecido Frey era positivo. O homem havia casado com uma Darry de Darry, e tido algumas filhas — uma delas, inclusive, era a gorda esposa do falecido usurpador Roose Bolton, que fora assassinada pelo enteado bastardo, enquanto estava grávida de seu meio-irmão.

Sansa não sabia muito da filha de Merrett, tanto quanto sabia sobre o pai dela, mas imaginou que ela talvez não fosse o orgulho de seu pai: quando era jovem, seus pais acharam-na tendo relações sexuais no celeiro do castelo com três homens ao mesmo tempo; após isso, ela foi casada as pressas com um cavaleiro andante, seu primeiro marido, que tinha boa indole, mas não servia para casamento; o segundo casamento o correu após o marido de Amerei ter morrido no começonda Guerra dos Cinco Reis — não que Sansa achasse que a moça tenha se importado com o fato de ter perdido o maridos, pois ela continuou tendo relações com os cavalriços do castelo —, e ela logo veio a se casar com Lancel Lannister, quando os Frey e Lannister se uniram na guerra, pois o sangue de Darry poderia anudar Lancel Lannister, primo da antiga rainha Cersei, a ter mais direito as terras de Darry. Não durou muito, entretanto, pois o primo da outrora rainha logo veio a larvar a esposa e ir para a Fé militante, unindo-se aos Filhos do Guerreiro.

Por fim, sobrara o astuto Sor Lyle, que tomou Amerei para si… E as terras de Darry, que vieram junto dela, como se fosse um dote.

— Ele é lorde de Darry atualmente — continuou Sandor, elogiando o marido arrogante da prima feia. — Pois a morte da mãe de minha querida prima deixou a linhagem de Darry extinta; embora creia que Sor Lyle logo poderá aceitar o nome.

Sor Lyle sorriu e acenou com a cabeça, mas não deu nenhuma garantia expressa. Era um homem velho, apesar de aparentar estar bem sadio. Muito mais velho que sua jovem e feia esposa.

Sansa tinha dúvidas de que um orgulhoso Crakehall iria adotar outro nome; de fato, achava tudo naquele homem dúbio. A mãe de Amerei Frey podia não ser jovem, mas não era uma idosa, ou mesmo uma enferma, para morrer tão rapidamente após o casamento da filha — casamento este que foi feito nas sombras, sem o consentimento de praticamente ninguém além dos noivos.

— Bem, é bom saber que o Tridente tem um guerreiro tão estóico quanto Sor Lyle — disse o irmão de Sansa, com neve derretendo do manto e pingando no chão sujo. Seu cabelo castanho e grisalho caia pelos seus ombros, molhado pela neve. — E espero contar com ele, e todos os membros e vassalos das Gêmeas neste salão, para ajudar-me a derrotar Euron, Olho de Corvo.

Sandor assentiu.

— Seria uma honra para mim e o restante da minha família lutar ao lado do rei do norte e a rainha do trono de ferro. — Acenou para Sansa. — Assim como será uma honra para minha querida irmã, Cynthia, servir a princesa do Norte em sua jornada e ajudar a estabelecer a paz em nossa casa.

A princesa olhou para a irmã do Lorde da Travessia. Cynthia era uma jovem moça feia; tinha nariz pontudo e cara chupada, assim como o irmão; todavia, apesar de também ter os cabelos oleosos como o dele, não tinha o largo nariz da família materna, parecendo não ter queixo. Dava até pena de olhar.

Sansa sorriu.

— Cynthia é um nome lindo, assim como você, minha cara. — Isso fez a jovem corar e dar um risinho. Era uma mentira chamá-la de mentira, mas era uma mentira boa. — É uma honra para mim aceitar a vossa irmã em meus serviços, milorde.

Sandor Frey sorriu e Sansa não teve coragem de olhar para o rosto de Wylla, que devia estar se roendo de ódio. Não podia censurá-la se o fizesse; o tio dela fora morto naquele salão, e o seu pai fora mantido preso pelos Frey em Harrenhal. Nada naquela viagem a agradaria.

— Milorde — disse Jon —, minhas instruções foram bem claras: as Gêmeas dever-lhe-ão ser deixadas de lado; ninguém ficará aqui… Espero que obedeça o vosso rei?

Sor Lyle pareceu não gostar daquilo, mas o pequeno Lorde da Travessia apenas acenou com a cabeça, como se não fosse importante largar as terras de sua família e o enorme castelo que tinha acabado de defender com unhas e dentes dos homens de ferro. Sansa sabia o motivo; a casa Frey era odiada como nunca antes fora. Sandor sabia que estava nas mãos dele fazer de tudo para defender o destino de sua casa. Os Frey e os soldados que observavam o pequeno de nortenhos acenou em concordância com o seu suserano, mas ela sabia que todos eles odiavam aquela ideia.

Não podia julgá-los, ela mesma detestava a ideia de largar o Norte sozinho e deixar Winterfell vazio mais uma vez; ela havia casado com Harrold para voltar para casa; aguentara as infâmias de Petyr Baelish, as agressões de Joffrey e o escárnio de Cersei com a promessa de que poderia voltar para sua casa. Ela e Jon reconstruíram praticamente tudo que os Greyjoy e os Bolton fizeram; Sansa até ousou ir contra um maldito dragão para 

Winterfell precisa de mim, pensou, tal como eu preciso dele. Não importava o quão mágico e belo fosse o Vale de Arryn e o quanto fora importante para seu falecido pai; Sansa nunca teve aquele reino em seu coração.

— Soube que minha irmã chegou a Correrrio — disse Sansa e o Lorde da travessia aquiesceu. — Por acaso Milorde saberia dizer-me se chegou alguma notícia sobre o meu irmão Rickon?

Sandor negou com um meneio de cabeça.

— Lamento, princesa — ele respondeu —, mas não me veio qualquer corvo que fosse de Correrrio.

Sansa e Jon trocaram olhares. Era para Rickon estar no tridente há pelo menos dois ou três meses.

  Ignorando qualquer problema que aquilo pudesse significar, o Reino do Norte disse:

— Bem, obrigado pela hospitalidade, Milorde, mas devemos nos dirigir para Correrrio de forma imediata.

Lorde Frey assentiu.

— É claro, Majestade — disse.

Sansa e os outros convidados se viraram, ansiosos para sair o máximo possível daquele local lúgubre. Talvez fosse um gesto indecoroso ao lorde anfitrião, mas não era como se os Frey pudessem reclamar. As Gêmeas estavam amaldiçoadas ao olhar dis deuses e dos homens; ninguém voltaria a ter confiança na casa Frey, não imporava o quanto os descendentes do falecido e abominável Lorde Walder tentassem.

 

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Drogon pousou a alguns metros das Gêmeas. Dany observava as carroças saírem da torre sul como formigas saindo do formigueiro. A ponte e os portões eram bem largos, espaçados o bastante para duas grandes carroças saírem lado a lado.

Não havia sinal dos Stark e Stannis. Ela não estava gostando daquela demora.

Por sorte, seus anseios eram em vão, pois logo viu a silhueta do Rei do Norte e do Rei Baratheon saírem de dentro dos portões, junto de Sansa e Bran. Era fácil reconhecê-los, pois os dois lobos gigantes sempre estavam por perto. Lembrava-se de Jon lhe dizer que seu irmão Rickon também tinha um lobo gigante e que ela devia tomar cuidado quando o visse.

Os Stark eram uma família curiosa, isso Dany já havia percebido; Sansa era praticamente sua inimiga declarada; Jon era o seu futuro marido, mas era cheio de mistérios e os resguardava apenas para si; Bran era um rapaz novo, mas que falava como um ancião, tendo um ar bem solene e distante; e Arya… Bem, ela matou o amante da rainha e ajudou a matar Sor Barristan. Isso era o bastante para que ela detestasse a garota.

Quem sabe Rickon não seja um garoto mais calmo se for bem educado? Bem, ela precisava de algum herdeiro, caso a semente de Jon não vingasse. Não conhecia bem os Velaryon e os Celtigar, e duvidava que os lordes de alguma das duas casas tivesse chance para ser rei — principalmente os Velaryon, pois o bastardo de derivamarca havia sido legitimado e estava agora unido a Aegon, não a ela. Não, nenhuma casa valiriana poderia servir. Bem, Stannis tinha uma filha, e esta estava prometida para o irmão mais novo de Jon. Se Dany ao menos pudesse fazer aquele duro Baratheon desistir de sua conquista pelo trono…

Entretanto, Lorde Stannis se provara mais duro que as escamas de Drogon — na verdade, se Balerion, o Terror Negro, estivesse vivo, nem suas escamas seriam tão couriáceas quanto a cara rígida de Stannis e seu ego.

Bem, quanto a Rickon ser um herdeiro, era outro problema: mesmo que deixasse Jon e seus irmãos na linhagem, ainda teria de lidar com o fato do rapaz chamado Brandon ser mais velho. Embora, a bem verdade, não fosse um grande problema para ela aceitar o rapaz como herdeiro no lugar de Rickon: era mais velho, calmo e, pelo que Dany viu, ele tinha habilidades úteis. Sim, talvez pudesse desfazer o contrato de casamento entre a princesa Shireen e uní-la a Bran. Afinal, a garota era trineta de uma Targaryen, então seria a última com este sangue caso Dany se fosse e não tivesse herdeiros.

Sim, era uma boa ideia. Teria de discutir ela com Jon assim que fosse possível.

Dany desceu da sela de Drogon, sentindo que deveria esticar as pernas dormentes. Seu filho estava menos irritado naquele dia, pois não estava nevando. Logo ele comeria dois bois e ficaria mais relaxado para montar.

Dany tirou as luvas de couro vermelho e forrado de pele de carneiro. Não precisava realmente delas; Drogon era sangue transformado em carne e ela nunca passava frio perto dele. Fumaça negra saia das narinas de seu filho, subindo pelo ar e sumindo.

Apesar de pensar em Bran como seu sucessor, Dany não tinha certeza de que ele poderia ter filhos próprios, visto que o rapaz não movia e nem sentia nada abaixo da cintura. Se ele realmente se mostrasse incapaz, a ideia de unir a linhagem dos Stark com a dos Baratheon. Se assim fosse, Rickon seria seu herdeiro, de qualquer forma, e seria melhor que ele se casasse com Shireen e eles produzissem um herdeiro para o trono de ferro o quanto antes. Era de extrema importância que existisse um monarca que unisse os sete reinos.

— Daenerys — a voz de Benerro soou em seus ouvidos. Dany virou a cabeça para um lado e, quando não viu nada, virou-a para o outro lado. Os sinos de prata em suas tranças prateadas A voz soou novamente em sua mente. — Daenerys, eu não estou onde você está. — Avisou o sumo sacerdote da religião vermelha.

— Onde você está, Benerro? — ela indagou, e Drogon soltou um grunhido.

— Eu estou com Sor Jorah — respondeu ele. — Estamos do lado do Tridente, nos aproximando de um castelo que Sor Jorah diz ser Darry, e os Dothraki tomaram algumas vilas como suas enquanto não vemos a nossa rainha.

Daenerys sabia que os dothraki estavam muito além de Correrrio e Harrenhal. O problema não era apenas a distância, mas sim o que o povo dothraki estava fazendo durante esse tempo no local.

— Diga-lhes que eu ordeno que parem qualquer morte e estrupo — avisou, indagando se não estava louca por falar com o vento. — E que devem deixar o povo em paz!

— Eu farei o possível — o vento respondeu. — Mas eles só escutam sua Khal suprema e Sor Jorah desistiu de tentar acalmá-los.

Dany franziu o cenho prateado, irritada por aquilo.

— Sor Jorah terá de responder a mim por isso — ela disse. — Ele não tem o direito de fazer o que quiser sem minha ordem, e ele sabe disso.

— Tentarei fazer o possível, Vossa Iluminada — disse a voz em sua mente. — Mas, volto a dizê-lo, os dothraki estão cada vez mais selvagens. — Continuou: — Todavia, Iluminada, eu temo mais por não termos um dragão para nos defender quando o Messias da Escuridão voltar.

Daenerys ficou confusa ao ouvir aquilo.

— Que quer dizer? Está a dizer que Euron está longe?

Mesmo sem ver ou ouvir o Sumo Sacerdote Vermelho, Dany pode sentir ele aquiescer às suas indagações. Era como uma sensação estranha em sua mente.

— Ele está longe, no mar — revelou Benerro —, mas logo voltar-se-á para cá. Estamos no caminho para o castelo.

Dany não imaginava onde Olho de Corvo poderia estar, mas sabia que, após ele voltar, seu exército Dothraki facilmente seria um alvo fácil e tentador para o Rei tirano das ilhas de ferro.

— Quanto tempo vocês estão de distância de mim? — ela indagou, enquanto as carroças chegavam perto dela. Seria péssimo continuar a falar sozinha e seus súditos a vissem fazendo isso. Andou para perto de Drogon e fingiu estar arrumando as suas correias.

— Nós estamos há menos de dois dias de Harrenhal, Iluminada — respondeu a voz.

— E Euron?

— Sua bruxa permanece no castelo sombrio, usando da magia antiga das pedras negras da gigantesca fortaleza retorcida — disse Benerro. — Ele… junto do dragão que outrora fora seu, Majestade, lamento-vos dizer… está longe, embora eu não saiba o motivo para tal; não o vejo com clareza em minhas visões, mas sei que não está no Tridente.

Dany assentou, pensativa, passando as mãos de forma aleatória pelo imenso arreio de Drogon. Era isso, não tinha tempo a perder: tinha de ir até os Dothraki.

— Estou indo até vocês — disse, soltando os elos da corrente que segurava sua cintura durante os vôos de Drogon. Ainda estavam quentes, como o corpo de seu gigante e voraz filho. Colocou as luvas novamente, sentindo a maciez do forro de lã que havia nelas.



Quando Jon e Stannis se aproximaram, junto dos irmão dos Stark e o copeiro de Sansa, Dany disse:

— Devo ir até o Sul antes de vocês — avisou-lhes. — Olho de Corvo está longe; devo aproveitar-me de tal situação e ir falar com o meu exército e mandar todos irem a Correrrio.

Sansa franziu o cenho.

— Como sabe que…?

— Tome cuidado — disse Bran. — Eu sinto alguém, talvez a mulher que dizem estar com Euron, a donzela Hightower. Sinto ela através das raízes.

Sansa olhou de soslaio para o irmão. Pelo visto, ele e Jon eram bem confidentes de Daenerys.

Dany, que pouco entendia das habilidades daquele rapaz, mas que sabia que deveria confiar nelas, assentiu. Olhou para Jon.

— Vou tentar evitar passar por perto de Harrenhal  — disse. — Por sorte, o caminho parece que passa longe da fortaleza; embora fosse de meu agrado queimar todos por lá.

É só o que sabe fazer, pensou Sansa. Sabia que deveria estar sendo injusta com a rainha de Jon; ninguém realmente iria se importar com a morte dos homens de ferro. Seria uma limpeza nos sete reinos.

Para ser justa com a rainha, Sansa pouco se importava com as terras de Darry: fora lá que Joffrey atacara o filho do açougueiro; onde Arya sumiu por dias e teve de se distanciar de Nymeria; mas o pior fora a morte de sua loba, Lady, que morrera pela lâmina valiriana do próprio pai de Sansa, por causa das futricagem asquerosas e ardilosas de Cersei Lannister.

Além do mais, Darry agora era terra de Sor Lyle, e ele em nada parecia uma pessoa boa para ter terras para comandar. Que os Dothraki fizessem um bom proveito. Que aqueles selvagens colocassem o castelo abaixo, queimassem as terras e depois jogassem sal por cima.

— Sabe onde fica Darry? — indagou Stannis?

Dany respondeu que não com cabeça.

— Preciso que me tragam um mapa, o quanto antes, melhor.

Hoster Tully, sempre solicito, acenou com a cabeça.

— Vou perguntar se o meistre da travessia tem um pronto — disse, e virou o cavalo, esporeou-lhe e fez o animal avançar até o castelo.

— Então — disse a princesa Sansa, quando o seu pajem se foi —, seu exército de selvagem agora vai atacar Darry?

Dany sentiu as bochechas arderem ao ouvir o que a cunhada lhe disse. Sabia que talvez merecesse ouvir aquilo, mas estava farta das censuras veladas daquela moça irritante e intrometida. Nem sequer sabia por qual motivo Jon se importava tanto em deixá-la por perto em questões de estado; aquilo claramente só servia para deixar a princesa Stark mais soberba.

— Espero que chegue lá há tempo — continuou Sansa. — Darry é pequeno, e foi um dos primeiros locais atacados pelos homens de ferro; é capaz que seus selvagens marchem até as torres de Harroway, embora o castelo também esteja morto.

Dany a olhou, furiosa pela ousadia daquelas palavras.

— Lady Sansa — disse Dany, que, assim como Sansa, evitava chamar a rival pelo título real —, eu não estou disposta a aguentar as vossas ofensas sarcásticas e indecorosas. — Tentou não deixar a ira falar por ela, segurando-se. — Sei que a sua situação não é boa, mas estou aqui para resolver os problemas do passado e tentar ajeitar as coisas.

Sansa respirou fundo, sentindo o gosto de bílis na boca, e assentiu.

— Então vá e faça-o, Majestade — disse, forçando um sorriso. — Mostre do que é capaz.

Dany não gostou daquele tom, mas preferiu não falar nada. Não posso culpá-la por não gostar de mim, os deuses sabem que eu não seria melhor do que ela se estivesse em seu lugar.

— Isto é ridículo — disse Jon. — Entendo o ódio de vocês duas, mas é ridículo que acreditem que realmente podem ter o luxo de criar querelas idiotas. — Virou-se para Sansa. — Principalmente você, irmã. Não tem 11 anos. trata-te de crescer e assumir os vinte e poucos dias de seu nome que você carrega.

Sansa enrubesceu e abaixou os olhos e a cabeça. Subiu o capuz, cobrindo um pouco do rosto envergonhado. 

Logo, Hos voltou, com um mapa de pele de cabra cozida.

— Tome, Majestade — ele curvou-se diante de Dany, ainda montado, e entregou-lhe o mapa.

Dany o desembrulhou e o analisou. Era bem pintado e fácil de entender. Enrolou-o novamente e virou-se para o Rei do Norte.

— Nos reencontraremos em Correrrio, meu Rei.

Jon assentiu.

— Eu lhe enviarei um corvo quando estiver perto de Correrrio — ele avisou. — É melhor chegarmos lá juntos.

Dany assentiu e nenhum dos dois disse mais nada um para o outro. Dany virou-se para Drogon e agarrou a escada de correntes e escalou. Prendeu as pernas com tiras de couro e correntes, para garantir que não caísse durante o voo. Dany estalou o chicote no imenso pescoço negro e vermelho de seu filho, fazendo-o rugir, assustando as montarias das pessoas por perto, que tiveram dificuldade para acalmá-las e não caírem da estribo.

Drogon abriu as asas coriáceas, vermelhas e transparentes, e as bateu, fazendo vento quente se espalhar. Um rugido de trovão pareceu soar quando ele as estalou, e o barulho se repetia conforme ele batia as asas para pegar voo. Uma nuvem de poeira quente erguia-se no ar conforme o Wyvern de fogo batia e subia no ar.

Dany bateu no filho de novo com o chicote contra as escamas do filho, que rugia em fúria para as nuvens do céu, como se as desafiasse para uma luta mortal.

Logo, Daenerys tomou a direção que devia seguir, sumindo no horizonte. Conforme sua imagem diminuía, as cavalarias se acalmavam.

Sansa fixou o olhar azul na figura de Daenerys, que voava para cima das nuvens, tentando ser despercebida caso os inimigos não estivessem tão longe quanto ela pensava.

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

Dany pousou Drogon solo coberto de neve. A camada branca derreteu com o calor do corpo negro do dragão, expelindo fumaça. Seu filho ainda odiava o frio e grunhiu quando sentiu o gelo pelos seus pés e em sua barriga. Preferia já estar dentro das muralhas do castelo, mas Darry era muito pequeno para ela pousar no pátio.

Os dothraki urraram de alegria quando viram seu khal, mas Dany não poderia dizer o mesmo: ela viu um amontoado de cadáveres mortos em várias pilhas, com cheiro podre empesteando o ar, unindo-se ao cheiro acre de fumaça das terras queimadas; moscas roxas, do tamanho de abelhas, trazidas de Essos pelos Dothraki, zumbiam no ar e círculavam os cadáveres. Eram uma praga, pincando mesmo os cavalos e humanos, sugando seu sangue, como se fossem mosquitos se alimentando. Havia mulheres estavam presas em gaiolas de madeira, servindo para os Dothraki abusarem delas quando quisesse, como se fossem um depósito para as sementes do imenso Khalasar.

 Aquilo embrulhou o estômago de Dany, que virou o rosto, enojada. Não era isso que ela queria; ela queria apenas o bem do povo pequeno, não sua dor e sangue. Os dothraki levaram seus cavalos para perto de Dany, gritando em sua glória. Ela os olhou, horrorizada.

Este é meu povo?, se indagou, enojada, enquanto os cascos sujos batiam com fúria no solo cheio de sangue e lama. Os sinos das longas e belas tranças dos dothraki. Isto é guerra, disse a si mesma, sabendo que teria de encarar aquilo uma hora ou outra.

Os portões de Darry se abriram e de dentro deles saíram Sor Jorah, Benerro e Moqorro. Ambos cavalgaram até ela.

— Minha rainha — Sor Jorah a saudou, descendo da sela do cavalo. Sua armadura branca estava suja e seu manto branco estava rasgado e sujo. — Eu…

— Vamos entrar — ela o cortou, irritada por ele ter permitido tudo aquilo.

O castelo estava destruído por dentro: tapeçarias queimadas e rasgadas, mesas reviradas, e marcas de fumaça e sangue em vários lugares. 

— Os Dothraki raramente entram aqui depois do ataque — comentou Sor Jorah. — Eles às vezes vem beber vinho e usam as roupas caras dos antigos lordes da casa. Eles preferem sair e saquear as aldeias, levando-as abaixo — Continuou: — No geral, apenas eu e os sacerdotes ficamos por aqui e…

— Sor Jorah — a voz de Dany era ríspida —, explique-me para mim as palhaçadas que vi aqui hoje.

Sor Jorah enrubesceu. Era uma homem feio, de cara amarga, barba preta desgrenhada e salpicada de cinza, e sem cabelo na cabeça. Uma tatuagem de demônio marcava a bochecha de seu rosto, dada pelos escravagistas de Essos, por causa de sua fúria.

— Khaleesi… Isso é guerra…

— Eu sei o que é guerra, sor — rebateu. — Eu entendo o desespero de onde vocês iriam ficar, mas matar pessoas assim e prender mulheres em gaiolas?

— Nem todos morreram — ele se defendeu. — Alguns homens foram capados e servem de escravos… — Ele arrependeu-se rapidamente por ter dito aquilo ao ver a fúria no olhar da rainha. — Lamento, Vossa Graça, mas os Dothraki estavam descontrolados sem você. Apenas fiz o que pude para acalmá-los e acabar com o inimigo.

— Eu tentei avisá-lo, Vossa Iluminada — disse Benerro. Sor Jorah o olhou, furioso.

— Como está o pessoal do castelo? — indagou Dany.

Sor Jorah desviou o olhar.

— Mortos.

Daenerys meneou a cabeça, em descrença. Tinha que admitir, não podia julgar a princesa Sansa e os seus por odiá-la; a facção de Dany só estava piorando as coisas para eles.

— Não importa — disse Dany. — Temos tempo até ir para Correrrio. Vamos libertar as pessoas e deixar elas se abrigarem no castelo. — Suspirou. — Embora você tenha estragado qualquer forma delas confiarem em mim, como pode Sor?

— Vossa Graça vai mesmo casar-se com o bastardo do Norte? — ele indagou, cheio de fúria. — Ele é nosso inimigo.

Vendo que Sor Jorah estava perdido em fúria e ciúmes, Dany meneou a cabeça, sabendo que era um caso perdido. Seu velho urso era um guardião bruto e burro.

Teria sido melhor ele morrer no lugar de Barristan, pensou. Ou até Daario — sim, ela sabia que o falecido mercenário era tão violento quanto, mas pelo menos ele lhe dava algum tipo de prazer íntimo.

— Eu vou e não estou disposta a ouvir sobre suas lamúrias e ciúmes — ela disse, retirando as luvas de couro vermelhas. — Agora, vamos, precisamos limpar esta sujeira.




X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

Estavam perto do ramo azul do Tridente, o rio mais importante das Terras Fluviais. Boa parte dele estava congelada, parecendo uma ponte de cristal rachada. Perto de onde estavam ficava Guardamar, dos Mallister, que resistiu com dificuldade aos ataques dos Homens de Ferro. As terras por ali não estavam em bom estado, cheias de lama e neve derretida, e cadáveres podres de soldados dos rios e das ilhas de ferro. A maioria estava comida por animais selvagens e erva daninha. Até os cavalos eram comida para corvos.

Sansa não era uma montadora habilidosa como Arya, Mya, ou mesmo Margaery, mas estava tendo que aprender a ser; passara a usar culottes de montaria após sua partida de Winterfell, pois o trote de sua égua não era tão útil com sua montadora sentada de lado, impedindo-a de dar longos passos — e uma liteira poderia ser uma forma tentadora de se locomover, mas atrasaria muito a caminhada do exército. Não, era melhor a cavalgar como sua irmã Arya ou sua colega Mya, como tivera que fazer ao subir e descer do Ninho da Águia.

Suas coxas logo começaram a sangrar nos primeiros dias em que sentou-se numa cela com as pernas abertas, como se fosse um soldado, e ela teve de se segurar para não chorar ou fazer a égua parar para que ela descesse do arreio. Por sorte, depois, os machucados sararam, e as bolhas finalmente estouraram e as nádegas e coxas ficaram duras feito couro fervido. Sansa nunca iria entender o que sua irmã e a sua antiga colega da corte vinham na equitação, pois parecia mais uma forma de tortura.

Apesar da dor, Sansa estava orgulhosa pela rápida adaptação que teve ao envergar as calças e botas de montar e usar estribos. De fato, estava feliz por não causar qualquer tipo de atraso na marcha nortenha. Alysanne Mormont até chegou a elogiar seus avanços na equitação, conforme via a princesa galopar sobre o terreno instável e gelado do Gargalo.

— Sabe — Sansa comentou com Wylla, enquanto desciam pelo terreno enlameado, guiando a égua com cuidado —, creio que cavalgar pode ser mais revigorante do que eu pensava.

Wynafryd lhe dirigiu um sorriso cansado, enquanto a sua irmã Wylla deu um sorriso amarelo.

—  Fico feliz que esteja se acostumando, princesa — ela disse, visivelmente cansada e suja. Sua trança verde estava desbotada quase que por completo, mostrando o loiro cor de mel do cabelo. — Infelizmente, não posso compartilhar dessa alegria. — O arnês de suas damas de companhia ainda era uma simples sela lateral, que limitava o movimento das jovens damas. Apenas Barbara Bracken tinha uma sela útil para longas viagens e usava culottes de montar como se fosse um homem, com a saia do vestido jogada para o lado, mostrando as pernas cobertas e as longas botas de couro vermelho.

Os selvagens também estavam se adaptando ao uso de selas, arnês e esporas. Muitas tribos já usavam cavalaria, mas ainda não estavam acostumadas a usar cavalos de guerra ou cavalos lanosos do Vale, preferindo garranos, pois estes eram adaptados a climas de frio extremo, terrenos irregulares e demandam menos alimentos; diferente dos palafréns e corcéis usados pelos lordes e cavaleiros. As estribos e as esporas eram algo novo para eles, deixando-os melhores na arte de cavalgar, sem risco de cair com facilidade da montaria e conseguindo direcioná-la para onde quisessem.

Os selvagens — ou Povo Livre, como eles se denominavam e como o Rei dos Norte os tratava — também estavam adaptando-se a usar armas mais avançadas do que as que usavam além-muralha: como não conheciam a arte da metalurgia, a maioria usavam armas que variam de madeira, ossos, pedra e obsidiana, desde lanças pequenas com ponta em forma de folha, machados de guerra, e pontas de flecha enegrecidas pelo fogo — com exceção dos Thenn, que usavam bronze, como os primeiros homens —; escudos também eram simples, feitos de pele esticada por vime, e as armaduras, quando não eram feitas de couro fervido ou lã, eram apenas alguns espólios roubados por patrulheiros mortos que tiveram seus cadáveres saqueados.

Agora, aliados ao Norte, Jon os armou com ferro. Agora eles treinavam espadas e usavam cota de malha, e outras partes de armadura que eram feitas de aço, forjadas por ferreiros. Também dispunham de arcos mais longos e resistentes dos guerreiros Westerosi. Sansa, juntos de muitos lordes, não gostaram de tal decisão, mas o Rei insistiu que todos deveriam estar armados até os dentes para se prepararem para os perigos do futuro.

Naquele dia não estava mais nevando, e sim chovendo. A água derretia mais a neve e revelava os cadáveres cobertos, fazendo-os ficar inchados com a absorção do líquido. Sansa sabia que muitos homens iriam saquear aqueles corpos, buscando pedaços de armadura e objetos de valor para usarem. Muitos estariam prontos para matar por um mero pedaço puído de lã para se proteger do frio.

Sansa abaixou o capuz de lã do manto forrado de arminho, e sentiu a chuva pingar em seu rosto. Sorriu, erguendo a cabeça. Seu cabelo estava trançado com fitas azuis.

— Deveria botar o capuz, Milady — recomendou Hoster Blackwood. — Vai acabar por se resfriar.

— Ora, é só chuva, Hos — respondeu Sansa, sentindo o toque gélido e molhado das gotas que caíam das negras nuvens no céu. Era como sentir o toque suave de sua mãe novamente. Sentia falta dela e de seu toque acalentador.

— Sua mãe adorava chuva — confidenciou Lorde Baelish. Ele sorriu ao lembrar da mãe de Sansa. — Eu me reunia com ela e seus irmãos nos jardins do bosque sagrado e fazíamos bolos de lama.

Sansa lembrava-se que Arya também fazia isso quando era mais nova, mas ela nunca se juntou à irmã, achando que era muito velha e polida para tais brincadeiras infantis.

Arrependia-se por não ter se divertido mais quando era jovem. Devia ter feito quantos bolos de lama quisesse; devia ter cavalgado mais; devia ter brincado mais com Jeyne e a irmã. Deveria ter aproveitado mais o tempo com sua família em Winterfell.



Quando estava quase anoitecendo, haviam deixado aqueles espólios horrorosos de batalha, ficando em terreno menos enlameado e com árvores retorcidas pela queima.

— Estamos há menos de três dias de Correrrio — seu irmão disse, olhando para o meistre de Winterfell que viera com eles. — Envia o corvo para a rainha — ordenou. — Diga-lhe para se dirigir a Correrrio de imediato.

O meistre assentiu e parou o burro que estava montando e foi até uma das gaiolas de corvos na sela. O rei do Norte ergueu a mão e parou o garanhão cinzento e castrado e todos que estavam em volta pararam.

— Ficaremos acampados por aqui — anunciou.

Grande Jon Umber assentiu.

— Bem, será bom parar e comer um pouco. — Olhou em volta, analisando a área morta onde estavam. — Hmm… Creio que não teremos muito o que caçar. Dúvido que até mesmo andorinhas e lobos estejam por perto. — Ergueu o olhar para uma árvore enegrecida, cujos altos galhos estavam infestados de corvos, observando-os. — Quem aí quer corvo?

O corvo no ombro de Jon soltou um grasnar com as palavras do enorme nortenho, batendo as asas escuras, como se tivesse entendido o comentário dele. O rei do Norte riu com a reação do animal.

Tormund, um selvagem bruto e de baixa estatura, com uma imensa barba branca, que sempre servia de companhia, gargalhou de forma barulhenta ao ver a reação do animal. 

— Ha! Este aí sabe que muitos querem fazer uma sopa com ele, só para se verem livres da tagarelice dele! — Grande Jon Umber também gargalhou. Os dois eram brutamontes bem alegres.

Sansa não estava muito feliz em parar de cavalgar. Queria chegar logo a Correrrio e reencontrar sua irmã e seus tios — embora quisesse evitar o marido, mas sabia que teria de falar com Harrold sobre tudo aquilo.

Olhou pela paisagem enlameada e percebeu onde estavam:

— Aquela colina é…

— Pedravelhas — confirmou Petyr Baelish. — Aqui foi onde Jeyne de Pedravelhas viveu e morreu após a morte de seu amado príncipe encantado, Duncan Targaryen, o príncipe das libélulas. — Sorriu. — Uma vez eu e os Tully brincamos por aqui. Eu era o Duncan e Cat era Jeyne. Ela sempre foi minha Jeyne.

Parecendo nem ouvir o que Petyr Baelish dizia, Sansa sorriu e virou-se para as damas de companhia.

— Venham, acompanhem-me! — disse e bateu as esporas na égua e fazendo-a avançar a trotes rápidos e espaçados, passando pelos soldados nortenhos, que não esperavam por essa atitude dela (embora certamente esperassem por algo assim vindo de Arya, se a conheceram quando jovem).

— Princesa! — berrou Hos, fazendo a montaria ir atrás dela. Bárbara Bracken vinha logo atrás. — Cuidado, não vá para longe!

Sansa virou o rosto, olhando para a dama de companhia que lutava para alcançá-la. Lembrou-se de como sempre estava lutando para alcançar a rainha Margaery.  

— Venha, Hos! — bradou Sansa, rindo, enquanto as duas tranças de seu cabelo balançavam no ar. — Divirta-se um pouco! Acompanhe a vossa ama! — Bateu as rédeas no pescoço do animal, como se fosse um chicote, obrigando-o a avançar e subir a colina verde que era cercada por muralhas caídas.

Conforme alcançava o lugar, podia ver as ruínas do local. Quando chegou perto o bastante, fez a égua diminuir o trote e depois a fez parar. Passou uma perna por cima de sua montaria e desceu da estribo, com cuidado. Afundou as botas de cano alto na relva molhada e andou pelo musgo verde no chão. Enquanto andava, segurava as rédeas de couro vermelho de sua égua para fazê-la acompanhar.

O local era uma velha ruína de um castelo cujo nome há muito havia se perdido — atualmente era chamado de Pedravelhas. Ali fora o castelo da extinta casa Mudd; uma antiga casa que gorvernara as Terras Fluviais por séculos, até ser extinta. Os Mudd foram uma das várias casas que deixara de existir após intensas batalhas em seus domínios conturbados.

Sansa caminhou um pouco, adentrando nas muralhas velhas e cheias de musgo que circulavam o local que um dia fora uma moradia Real. O céu escurecia-se, tomando um tom de azul-acinzentado bem escuro. Sansa soltou as rédeas da égua, deixando-a pastar um pouco. Percorreu os dedos pelos muros quebrados, sentindo a poeira e o musgo tocar a ponta de seus dedos. Havia estacas podres que ainda resistiam ao tempo, mas que não chegavam até a cintura e estavam esverdeadas pelo líquen que crescia nelas, cobrindo-as.

Andou até um túmulo quebrado que havia por ali. Ao chegar perto, viu que o rosto do monarca esculpido em pedra estava totalmente quebrado, podendo-se ver os restos mortais dentro. Apenas o nome esculpido na pedra era o que tornava a figura que ali jazia reconhecível: Tristifer IV da casa Mudd, o Martelo da Justiça, Rei dos Rios e das Colinas.

Sansa conhecia bem aquela história: Tristifer governou todas as terras banhadas pelo Tridente até o Gargalo; erguera o Castelo esquecido cujas ruínas eram chamadas de Pedravelhas; esmagou Roland II Arryn e seu exército do Vale; apenas quando sete reis ândalos do Vale se uniram contra ele e a Casa Tully, que tanto o havia apoiado em outras batalhas, o traiu. Dizem que Tristifer havia lutado e ganhado noventa e nove batalhas, mas perdera a centésima. Seu filho de mesmo nome foi o último de sua linhagem, não conseguindo vencer os inimigos e morrendo em batalha — e, com ele, toda a glória da casa Mudd morreu junto.

Robb nunca perdeu uma batalha, pensou Sansa, mas perdeu a guerra mesmo assim. Agora, seu falecido irmão mais falecido existia apenas nas canções.

Ela se viu indagando se um dia Winterfell também seria esquecido. Poderia, um castelo tão antigo e importante ser realmente descartado pela história? Poderia o lugar onde Sansa cresceu e foi feliz ser um dia tão insignificante quanto a ruína em que ela estava?

Não. Não poderia aceitar.

Winterfell era mais do que um castelo; era parte dela. Podia não ser tão grande quanto Harrenhal, ou belo como Highgarden; mas era muito mais valioso do que todos eles. Winterfell era o lugar onde ela crescera e era realmente feliz e era ela mesma; era dentro de suas muralhas que Sansa sentia realmente feliz; era no seu bosque sagrado e em seu pequeno septo que sentia as presenças dos deuses; era suas lareiras e a forja do falecido ferreiro Mikken que sentia-se aquecida. Era no enorme castelo do Norte que sua mãe penteava seus cabelos e seu pai limpava a Gelo no bosque sagrado; era onde Bran aprendeu a escalar; era onde os seus irmãos e Theon lutaram de espadas.

Fora lá que ela costurara enquanto homens brandiam espadas; fora lá que ela cantou, brincou com Jeyne e Bess, e onde tanto se desentendeu com Arya.

Eram nos salões de Winterfell que todas as músicas eram verdadeiras. Ela era uma Stark, e seu lugar era lá.

Sansa olhou para a trança que caía sobre seu ombro e ia até o peito e notou que a mecha acobreada estava ficando com tons azul. Ao tocar o tecido da faixa, as pontas de seus delicados e pálidos dedos ficaram pintadas de azul também. Fez um estalo com a língua ao ver que a tinta estava escorrendo. Aquelas fitas eram caras, mas mal tingidas. Esfregou as pontas dos dedos manchados umas nas outras, vendo a tinta escorrer entre eles. 

Ouviu cascos de cavalos se aproximando, mas nem se importou, sabendo que deveriam ser os cavalos dos soldados nortenhos — bem, eles podiam até não gostar, mas teria de esperar ela relaxar por ali até que resolvesse voltar.

Sansa começou a desatar a trança do cabelo, sujando mais as mãos ao fazê-lo.

— Princesa? — ouviu uma voz chamá-la. Pelo som dos passos, era mais de uma pessoa.

— Aqui! — ela gritou de volta, sem tirar os olhos dos dedos que desfazia o nó da trança. Soltou uma praga quando o nó se mostrou muito apertado e a faixa não se soltava. Franziu o cenho, irritada. — Ora, pelos deuses…

— Princesa — ouviu Hos, que se aproximava dela, chamá-la —, precisa voltar. — O ambiente ficou iluminado conforme o rapaz se aproximou dela, provavelmente o lume era de algum archote ou uma lanterna de óleo que o jovem segurava.

Sansa nem sequer olhou em seu rosto, estava distraída pelo nó em sua trança.

— Não tenho vontade alguma de voltar, Hos — respondeu, finalmente conseguindo desfazer o nó da fita.

— Princesa — agora era a voz de Aly Mormont quem Sansa ouvia —, não pode sair assim, existem lobos…

Sansa se virou para encarar a moça:

— Eu também sou um lobo, Lady Alysanne — cortou-lhe. Agora a faixa estava desamarrada e seu cabelo estava quase totalmente solto. Seus fios acobreados brilhavam ante o lume da tocha erguida por Lady Mormont. — Se ouvir bem algumas algumas canções, saberá que virei um lobo com asas após matar Joff.

Tormund, o Terror dos Gigantes, riu perante o comentário da princesa.

— Essa aí tem o sangue de lobo tão quente quanto o da irmã! — pilheriou o selvagem. Seus braceletes de ouro com runas dos antigos homens também brilhava pelo lume da chama. — De fato, o cabelo já mostra isso, pois os deuses a fizeram nascer beijada pelo fogo!

Sansa não entendeu bem o que o selvagem dizia, mas riu também. Lembrava-se dos povos selvagens a chamarem de “Princesa beijada pelo fogo”, na caravana.

Alys Mormont não compartilhava de sua pilhéria.

— Princesa, por favor — pediu a Lady novamente.

Carrancuda, Sansa assentiu e foi com eles. Não queria voltar, não queria ouvir falar de como teria de reencontrar Daenerys, ajoelhar-se para ela, abaixar a cabeça, enquanto aquela insana cavalgava um dragão de sombra e fogo. Não suportava ter de dobrar os joelhos para uma mulher que matou tantos e não iria responder por isso — pelo contrário, os parentes teriam de aceitar ela como a rainha suprema deles.

Detestava Daenerys. Olhar para ela deixava Sansa com gosto de bílis na boca; sentia a cólera tomar conta de seu corpo. Talvez, tal ódio não fosse o único motivo para ela detestar a Rainha Targaryen: também sentia inveja da usurpadora.

Não era inveja do poderio que Daenerys dispunha que a deixava Sansa naquele estado, nem a beleza ou a adoração para muitos para a Targaryen. Sentia inveja da infelicidade e solidão da rainha. Daenerys nunca teve um pai amoroso; tinha apenas um pai insano, que destruiu o próprio reinado ao tentar sufocar; nunca teve um abraço acalentador de uma mãe; nunca viu o rapaz que um dia ela jurou amar — e que havia feito juras de amor por ela — mandar pressionar guardas deixarem o seu pai de joelhos, decapitando-o, enquanto você assiste tudo, indefesa…

Não tinha inveja dos sucessos de Daenerys; tinha inveja do fato dela nunca ter conhecido a felicidade e ter visto ela virar cinzas diante de seus olhos.

 

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Quando voltou ao acampamento, havia voltado a nevar.

O pavilhão onde seus irmãos estavam era bem grande, mas simples, feito de tecido grosso e branco. Conforme Sansa cavalgava até o local, homens e mulheres, chefes de clãs, lordes e ladies. Alguns apenas acenavam com a cabeça ou grunhiam — estes eram em sua maioria os selvagens, que recusavam-se a ajoelhar a quem quer que fosse e nunca reconheciam a importância dos títulos.

Lidar com aqueles povos era uma tarefa e tanto: um membro do clã dos Wull havia matado um selvagem e ferido outro; Um lorde das terras da tempestade entrou em briga com os homens de arma Umber; um selvagem tentou sequestrar Alysanne Mormont durante a noite, e ela o decapitou com um machado. Sansa achava que os Frey por perto só pioravam os nervos das pessoas. Por sorte, Jon estava sendo bom em acalmar a todos.

Hos a ajudou a descer da sela e ela entrou dentro da enorme tenda. Seu irmão mais velho e Stannis estavam olhando para um mapa do tridente. Cetim, o pajem de Jon, que ele trouxera consigo da muralha, estava nu da cintura para cima, e dormia na cama do Rei, com um cobertor de peles cobrindo suas pernas, deixando apenas os pés à mostra. O cabelo castanho encaracolado e o olhar afeminado do rapaz faziam-no parecer uma moça. Se não o reconhecesse, Sansa poderia jurar que era alguma prostituta que dormia na cama de seu irmão mais velho.

Bem, ele meio que é uma prostituta, pensou, lembrando-se de que ouvira alguns lordes falarem mal do acompanhante do rei, pois era um apenas um catamita, que havia se prostituído em Vilavelha antes de ir para a patrulha.

Fantasma foi até Sansa e lambeu a sua mão. Depois, mordeu os dedos, de forma brincalhona, movendo a mão dela de um lado para o outro.

— Acha que o navio de Rickon pode ter tido problemas para adentrar no rio? — indagou Jon ao rei Baratheon. — Talvez esteja aportado no Vale, ou em Salinas. — O corvo em seu ombro pulou no mapa, batendo levemente as asas para ter um pouso calmo, e descendo no mar, perto da ilha de Skagos, de onde o príncipe Rickon já devia ter deixado.

Stannis meneou a cabeça.

— Dificilmente — o rei respondeu —, os skagosi têm galés para rios. E mesmo que tivessem aportado no Vale, já teríamos algum corvo nos avisando a esta altura.

Bran, sentado numa cadeira que era tão grande como um trono, percebeu a presença de Sansa e a olhou com os profundos olhos azuis. Seus quatro lobos também a olharam, erguendo a cabeça. Os dois reis a perceberam logo depois.

— Rickon e Shireen ainda não deram notícias? — Sansa indagou um tanto temerosa. Tirou as luvas com forro de pele de raposa branca e abaixou o capuz. Seu cabelo estava molhado e sujo, desgrenhado.

Jon respondeu que não com a cabeça.

— Só posso rezar para que os príncipes estejam bem — Jon disse, olhando o mapa com seus olhos desiguais. Sansa retirou o manto molhado e sujo e o deixando por cima de um banco que havia ali. — Daenerys nos disse que Euron está longe… — Olhou para Stannis. — Acredita que foi até a rainha?

Stannis rangeu os dentes.

— Temo ter de acreditar no pior — respondeu. — Não vejo como Olho de Corvo poderia saber dos navios, mas… — rangeu os dentes novamente. Parecia mais nervoso do que bravo. — Não vejo por qual motivo não estaria no Tridente se não fosse por isso.

Jon acenou, temeroso. Sansa aproximou-se do irmão, esfregando as palmas e costas das mãos, nervosa com a expectativa de ter perdido seu irmão Rickon novamente. Desta vez, seria para sempre.

— Não podemos nos deixar levar pelo medo — Sansa disse. Esticou as palmas da mão para um braseiro que havia ali. — O tempo está muito ruim, só isso.

Jon e Stannis nem pareceram ouvi-la falar algo. A expectativa de ter as duas crianças dadas como mortas já estava marcada na mente deles.

— Seja lá o que for que aconteceu — Bran disse, depois de muito tempo —, não podemos nos deixar abater agora. Não quando os sete reinos dependem disso. — Continuou: — As lágrimas devem esperar, não podemos nos dar ao luxo de chorar e ignorar a ameaça que está sobre nós.

Jon aquiesceu.

— Está certo, embora isto me doa admitir. — Finalizou: — Assim que o sol raiar, devemos voltar a marchar.



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Arya estava dormindo sob o dossel azul com renda de prata em formas de peixes nadando. Os lençóis de veludo cobriam seu corpo nu e o aqueciam. Se virou, sentindo o peito de gendry contra seu rosto e seus pequenos seios. Deve ter acordado ele, pois sentiu ele a abraçar, rodeando as costas dela com os braços fortes de ferreiro que o cavaleiro tinha, e dar um beijo em seu couro cabeludo desgrenhado. Edric estava do lado dela da cama, dormindo calmamente.

Ainda estava bem cedo. Não precisava levantar. Até Nymeria dormia no chão do cômodo, junto de seus cinco filhotes. A lareira ainda queimava, mesmo que fracamente, queimando a lenha. Havia feno fresco jogado no chão — os juncos e pinhos e outras ervas aromáticas estavam em falta para dar um bom cheiro no quarto, mas a palha já servia. Havia uma estreira no chão, vazia, onde ficaria uma dama de companhia se Arya tivesse alguma — às vezes, Doninha entreva e dormia nela, até quealguém a via e a colocava na cama para dormir junto deles, quase como se fosse deles. Às vezes Nymeria também dormia em cima da esteira.

Arya estava voltando a cair no sono enquanto sentia o coração de Gendry bater ao lado de sua bochecha…

…Até que alguém bateu na porta dos aposentos de forma barulhenta e a acordou.

Arya abriu os olhos, irritada. Abriu os olhos com dificuldade, fazendo uma careta. Edric fez o mesmo, coçando a nuca loura.

— O que é!? — indagou, irritada. A trança de seus cabelos estava emaranhada.

— O Rei do Norte se aproxima, minha princesa — respondeu a pessoa que batia na porta. Arya e Gendry se olharam, despertados pelo aviso. — A senhora me pediu para avisá-la quando…

— Sim, sim, certo — Arya disse, empurrando o cobertor de veludo. — Eu mesma me arrumo. Obrigada por avisar. — virou-se para Ned. — Temos alguma moeda para dar para ele? — O amante assentiu e começou a se levantar, revelando o corpo nu e empurrando as camas do dossel.

Gendry também se levantou e empurrou as cortinas azuis. Seu corpo também era belo, com coxas grossas e estrias que iam das nádegas até as pernas robustas e cabeludas. O corpo era mais musculoso do que o de Ned, mas também mais peludo e cheio de veias e cicatrizes e cheio de crostas de sujeiras enormes e escuras. Arya, entretanto, tinha mais cicatrizes que os dois amantes. Gendry sempre parecia percorrer os dedos calosos entre as linhas dos ferimentos cicatrizados, alisando-as e beijando-as com lábios carnudos e babões que ele tinha.

A princesa Stark também levantou-se da enorme cama. Seu corpo cheio de cicatrizes e peito chato estava bem exposto, tanto quanto o corpo dos dois rapazes.

Ned vestiu uma camisa de linho e tomou cuidado de ficar atrás da porta quando a abriu, para que o servo não o visse nu.

— Tome — o rapaz disse, entregando uma bolsa cheia de dragões de ouro. — A princesa agradece por seus serviços. E mande trazer mais lenha depois

O servo assentiu.

— Não querem que eu chame ajuda para ajudá-los a vestirem-se?

— Não. — Ned fechou a porta no rosto do homem.

Arya não tinha paciência de vestir um vestido estúpido e parecer estranha ao olhar dos irmãos. Não, essa não era ela. E sabia que seus irmãos não se importavam. Ao invés de jóias e veludo, Arya vestiu um gibão de couro fervido com rebites de ferro sem mangas, calças de lã, e o velho par de botas de couro marrom desgastado e cheio de lama seca de cano alto. Trançou o curto cabelo castanho com a ajuda de Ned. A única coisa mais “rica” em sua vestimenta era o alfinete de prata que prendia manto de lã grossa e gordurosa.

Edric, como sempre, era o mais bem vestido de todos: um longo manto púrpura que ressaltava a cor de seus olhos da mesma cor que o tecido, um gibão de veludo roxo com renda de prata e botões de ouro com ametistas. As mangas da roupa eram bufantes, com cortes no braços e no corpo da veste que mostravam o tecido de prata que havia por baixo. O seu cabelo caía até os ombros e brilhava como ouro batido, parecendo mais loiro que qualquer louro Lannister que Arya já tivesse visto. Os calções também eram almofadados como as mangas, com cortes que revelavam o tecido prateado que havia por dentro. As pernas eram cobertas por longas mangas cor-de-rosa.

— A puta da rainha dragão também vai estar ao lado de seu irmão, imagino? — Gendry indagou. Ele estava mais bem vestido do que geralmente ficava, com uma manta verde que cobria até os pulsos. Não era um veste de grande padrão, mas ainda era melhor do que qualquer tecido sujo que o companheiro de Arya houvesse usado em toda a sua vida.

Arya franziu o cenho.

— Cuidado com a língua.

Gendry riu.

— Óbvio que não vou chamar a puta de prata de puta de prata na frente dela — pilheriou ele. —  Ou me acha tão burro assim, princesa?

Arya não viu graça alguma.

— Te acho burro como um auroque — disse ela. — Trate de controlar a língua. Nem sequer deveria ir ver a rainha.

Gendry fez uma carranca. Seu belo rosto ficava feio com a sua careta, mas a cicatriz de queimadura cheia de crostas só piorava tudo; as cascas que mais parecia escamas negras e vermelhas se contorcia ruidosamente em seu rosto, parecendo um animal retesando na bochecha do ferreiro.

— Oh, claro — ele exclamou com escárnio na voz —, o bastardo pode chupar a buceta da princesa, mas nunca ser visto ao lado dela.

Nymeria, que estava deitada de lado no chão, ao lado da lareira, com os filhotes sugando o leite em suas mamas, pareceu entender o que o cavaleiro disse e ergueu a cabeça para Gendry, rosnando e mostrando os dentes.

— Eu devia mandar meu tio chicotear você por isso — Arya disse, fixando o olhar cinza e furioso no ferreiro. — Não tenho tempo para as suas lamúrias obscenas, Sor. Se continuar assim, pode ficar aqui. Você escolhe.

Gendry deixou o olhar colérico de lado e abaixou a cabeça e os intensos olhos azuis. Enrubesceu, parecendo envergonhado.

— Claro que quero ficar com você, princesa. — Respondeu.

Arya assentiu e pegou um par de luvas de couro vermelho.

— Ótimo — ela disse, colocando uma das luvas. — E comporte-se, não quero os lordes irritados com você.

Ele assentiu, ainda de cabeça baixa e avermelhado. Cerrou as duas mãos em punhos. Sentia-se como uma criança levando bronca.

— Temos que ir — disse Ned, indo até Nymeria e se ajoelhando ao lado da loba. — Os reis logo vão estar aqui. — Afagou a cabeça felpuda da loba, e ela retribuiu o gesto lambendo sua bochecha avermelhada.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

 

Os portões da muralha estavam abertos. Por ordens de Edmure, eles fecharam as passagens que deixavam a água entrar e transformavam Correrrio em uma ilha.

— Dificilmente teremos que nos preocupar com ataques e cercos por agora — ele dissera. — E, mesmo que nos ataquem, duvido que nos cercar de água vá nos proteger de um sopro do dragão.

Arya e seus companheiros foram até perto de seus tios. Edmure usava uma linda e longa manta vermelha-vinho com peixinhos bordados em renda prateada. Safiras escuras e azuis enfeitavam o peito e serviam como botões para a veste ricamente bordada. O lorde de Correrrio pareciam melhor desde que chegara: a barba estava bem aparadas, os hematomas escuros e a sujeira haviam sumido do corpo, e ele estava com o corpo sadio novamente. Seu belo cabelo acobreado estava bem cortado e penteado para trás. Até as sombras embaixo dos olhos haviam sumido, embora Arya não achasse que ele e a esposa dormissem muito desde que voltaram a se encontrar.

— Seu tio parece estar querendo fazer logo outro herdeiro sobressalente — disse Gendry, enquanto eles ouviam o barulho do quarto de cima.

E ele não estava errado: Roslin estava grávida de quase quatro meses; entretanto a barriga estava bem avantajada. Arya acreditava que poderiam ser gêmeos pelo tamanho e uma parteira confirmara isso após analisar a Lady de Correrrio. Os laços do vestido azul que Roslin usava estavam mais frouxos, mas ela ainda parecia sufocar em seu vestido.

Peixe Negro, o tio-avô de Arya, usava uma manta de lã branca. Em seu peito, estava o símbolo da casa Tully: uma truta em um campo de linhas onduladas que variam entre azul-escuro e vermelho-marrom. A truta no centro, entretanto, não era tecida de fios de prata como no símbolo original, mas sim negra e feita de azeviche.

Todos os lordes e soldados enviados estavam aglomerados no pátio: Redfort, Waynwood, Royce, Thenn, Hornwood, Smallwood, Umber, Karstark, Dayne, Magnar, Bracken, Blackwood, Mallister, Hunter, Belmore… Todos aguardavam a chegada de seu rei e sua futura rainha.

O povo pequeno também estava entre as pessoas dentro das muralhas do castelo. Estavam perto das paredes vermelhas do pátio, comendo um pouco de mingau e mel. Estavam fracos, famintos e assustados. Quando chegaram no castelo usavam trapos queimados e rasgados, mas Edmure logo conseguiu roupas de lã grossas para eles se protegerem do frio e ofereceu serviços no castelo para pais e mães que tinham família para sustentar. Muitos lordes não gostavam de ter tantas bocas famintas e comuns com eles, mas o Lorde Supremo do Tridente os convenceu a dar tomarem como servos alguns do povo aos seus serviços, pois vários servos e soldados morreram no ataque a Harrenhal ou durante a viagem a Correrrio.

— Onde está seu filho, tio? — indagou Arya ao tio Edmure. Não se tratavam de forma formal como os outros. Não precisavam.

— Robb está a dormir — ele respondeu. — Não achei bom acordá-lo e tirá-lo do berçário.

Arya assentiu.

— Fez o certo — olhou para diante. — Ninguém realmente quer estar aqui.

 

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Sansa estava tão apavorada quanto a sua égua quando se aproximou do acampamento. Gatos-das-sombras, lobos gigantes, lagartos-leões, ursos, unicórnios… Não eram seres novos para ela, mas ainda assim era bizarro vê-los servindo como montaria. Os mamutes e gigantes eram seres que por si só já eram bizarros para ela; todavia, nunca imaginou que veria filhos da floresta antes: seres pequenos, com a pele castanha e pontinhas brancas, como cervos; o olhar dourado era como o de um felino: grandes olhos de íris cortada; eram minúsculos, talvez menores que seu marido anão, e usavam folhas como roupa e seguravam arcos e lanças de ponta de obsidiana.

Todos os clãs das montanhas, soldados e filhos da floresta fizeram reverência aos Stark conforme eles passavam. Apenas os selvagens não o faziam, mas acenavam com respeito para Jon.

Os lordes os esperavam dentro das muralhas de arenito vermelho de Correrrio. Eram diversos lordes, mas um número surpreendentemente menor do que Sansa imaginava; a captura de Harrenhal provavelmente matou muitos mais do que ela e Jon haviam imaginado: mais da metade do exército havia perecido.

Isso quer dizer que estamos à mercê do exército de Daenerys, pensou desgostosa. Não gostava de pensar que três reinos estavam quase todos mortos; isso só impossibilitaria mais a recuperação pós-guerra.

Os lordes dobraram o joelho quando o Rei do Norte atravessou a umbral dos portões e entrou no pátio. Jon usava um gibão branco com renda prateada e rebites de prata. Os cortes no tecido revelavam o tecido preto. Em sua cabeça havia a antiga coroa dos reis do inverno: um círculo de bronze com runas dos primeiros homens, acima do círculo haviam pequenas espadas de ferro bem pontudas.

Edmure e Arya também dobraram os joelhos.

— Meu Rei — disse Edmure, de joelho dobrado e acenando com a cabeça. Ergueu-a e disse: — És uma honra ter Vossa Graça por aqui.

Jon assentiu e passou uma perna pela montaria e saltando da cela.

— Podeis levantar, Milorde — O rei disse. Não retirou as luvas de montar. — Espero não vos criar problemas, mas o Norte inteiro vem para as tuas terras. — Continuou: — Stannis está na retaguarda, logo chegará também.

Edmure, já de pé, assentiu.

— É muito, mas Correrrio sempre teve espaço para o dever, Majestade.

O rei assentiu. Voltou seus olhos cinzas para Arya.

— Que faz ajoelhada? — indagou Jon. — Levanta e abraça o teu irmão.

Levemente corada, Arya sorriu e fez o que era mandado. Sentir o abraço de Jon quase a fez chorar, pois ela achou que talvez nunca mais visse Jon na vida. Ele bagunçou seus cabelos, como sempre fazia quando ela era mais nova e Arya sentiu-se uma criança de novo.

 Edmure olhou para Sansa, ficando chocado ao ver sua sobrinha tão feminina com culotes de montar.

— Milorde — disse Sansa, passando uma perna com cuidado uma perna por cima da cela e pegando a mão de Hoster Blackwood para descer. Voltou-se a olhar o tio. — É um prazer o ver novamente.

Edmure sorriu e acenou.

— A recíproca é verdadeira — beijou os dedos da mão pálida da sobrinha quando esta retirou as luvas de montar. Virou-se para a esposa. — Esta é minha esposa, Roslin. Nosso filho está dormindo por agora, mas logo poderá vê-lo.

Sansa sorriu e acenou com a cabeça.

— É uma jovem adorável — disse ela. — Ficar-lhe-ei feliz em ver o vosso filho, que tenho a certeza de ter a beleza dos pais.

A lady de Riverrun corou com o elogio. Ela era só alguns anos mais velha que Sansa, mas era tão baixinha que parecia ter quase a mesma idade ou até ser mais nova. Por sorte, não era feia como os parentes Frey.

Olhou para a moça de preto e olhos castanhos grandes.

— Você é a rainha viúva do Norte, imagino? — indagou Sansa, sorrindo para a mulher mais velha que lhe fez uma profunda vénia. Ajudou-a a levantar-se. — Levante-se, por favor, sou eu quem deveria lhe fazer uma vénia. Vós sois a rainha viúva do Norte.

A viúva corou.

— Pode me chamar de Jeyne, por favor.

Sansa fez uma vénia.

— É um belo nome — disse. — É o nome de minha melhor amiga. — Sentia falta de Jeyne Poole.

O Lorde de Riverrun olhou para o cavalo onde estava o príncipe de Winterfell, Bran Stark. O rapaz era magro, de ar solene, e com as características dos Tully que herdara de sua falecida mãe.

— Meu príncipe — disse Edmure. — É um prazer o conhecer.

O rapaz olhou por cima da cela e sorriu. Ele era bem magro, e Edmure imaginou que ele não teria pego luz do sol há um bom tempo: o corpo era muito magro e a palidez superava a dos Tully. E o rapaz ainda parecia estar na idade das espinhas, com vários pontos vermelhos e verdes na cara, prestes a estourar. O grosso cabelo acobreado não parecia ser cortado há anos, indo até a cintura do rapaz.

— Olá, meu tio — disse o rapaz, gentilmente. — É um prazer vê-lo, finalmente. Não posso imaginar como tem tido períodos difíceis em seu governo. — Continuou: — Fico feliz em ver que logo sua esposa lhe dará mais filhos adoráveis.

Edmure sorriu, sem jeito. O rapaz era bem polido e calmo para alguém da idade dele — ainda tendo passado a maior parte da vida na floresta, longe de todos.

Uma pequena criança da floresta foi até o príncipe do inverno. Edmure a olhou com o olhar azul fixo, ainda não parecendo acreditar em tal ser. Era estranho.

— É bom tê-la de volta, meu princípe de inverno — ela disse na língua comum, para o espanto de Edmure. Sua voz era a canção mais triste que o lorde já ouvira em toda a sua vida, fazendo-o sentir um aperto no peito e quase chorar.

Bran sorriu.

— É um prazer revê-la, Folha.

Minha irmã teve filhos estranhos, pensou Lorde Edmure. Deve ser o sangue dos homens do Norte.

Enquanto Grande Jon ajudava o princípe a descer do cavalo, Sansa tocou no ombro do tio, fazendo-o voltar a olhar para ela.

— Meu tio, por acaso teria recebido notícias de meu irmão, Rickon?

Edmure negou com a cabeça. Antes que Sansa pudesse falar algo, alguém a chamou:

— Princesa — disse Roland Waynwood, tomando a dianteira dos outros lordes. — É um prazer voltar a vê-la.

Sansa forçou um sorriso. Ela temia o que estava por vir mais do que temia rever a rainha dragão.

— Sor Roland — Sansa o saudou enquanto ele ajoelhava. Esticou a mão e ele a beijou com os lábios franzidos e feios. Era um homem bem feio. — É um prazer revê-lo. — Mentiu. Retirou a mão dos dedos dele, achando que ele estava a beijá-la por demasiado tempo. Sansa sabia que ele estava encantado por ela, mas não era recíproco da parte dela. — Lamento pelo vosso pai.

Roland ergueu-se.

— É um prazer para mim também, princesa, mesmo que seja em tais momentos sombrios — ele disse. — Temos de resolver a situação de Sor Harrold.

Petyr Baelish se aproximou dela e falou:

— Ainda está vivo? — ele indagou com escárnio óbvio. — Ora, pelos deuses, cortem logo a garganta dele e o deixem morrer!

Sansa estranhou a atitude; Petyr Baelish nunca fora dado a fúria.

— Não tão rápido, Lorde Baelish! — Exclamou Lady Waynwood. Ao vê-la, Roland foi até ela e a ajudou, junto de outro cavaleiro, a descer do cavalo. Ela estava velha, fraca, e parecia mais frágil do que nunca.

Essa aí não vai viver muito, pensou Arya, olhando a senhora ser descia de sua montaria pelo neto e andava até perto da princesa. Tinha visto-a há menos de 4 ou 5 anos, mas ela parecia muito mais velha do que deveria. Duvidava que, no estado em que estava, a velha Lady Waynwood não sobrevivesse mais seis ou sete voltas da lua. Com toda a certeza não sobreviveria até o fim do ano.

Roland ajudou a sua avó a ir até Lorde Petyr e Sansa. Todos os lordes do Vale se aproximaram.

— Lorde Harry pode não ter mais coroa — disse a velha, com vivacidade para além de seu frágil estado enfermo —, mas ainda é lorde do Vale de Arryn. Ele é o protetor do Leste!

Um dos Redfort, o mais velho, deum um passo adiante.

— É que protetor ele tem sido! — vociferou Jasper Redfort. O homem parecia doente também, pálido e magro, com profundas sombras embaixo dos olhos. — Graças a ele esta guerra está perdida! Todo o tridente teve seu território perdido para os inimigos bárbaros; o Vale está tomado por revoltas e clãs selvagens; todo o estoque de comida que tínhamos ficou em Harrenhal; e ele quase matou o seu neto assim que chegamos aqui! Meu pai morreu a caminho de Correrrio por culpa de Harrold! — Escarrou e cuspiu pigarreio no chão vermelho e cheio de feno do pátio. — Isto é o seu reinado de seu antigo protegido! — Cuspiu novamente. O cuspe era mucoso, num tom esverdeado e grosso.

— E ele prendeu Lorde Edmure — Lorde Bracken se intrometeu. — Ele o prendeu e mandou espancá-lo e largou-o por dias na escuridão! Se não tivéssemos o prendido a tempo, poderíamos ter morrido nas mãos de Euron e seu bicho infernal!

Lorde Tytos Blackwood deu um passo adiante, usava um manto de penas de corvos:

— Pela primeira vez Lorde Jonos fala algo que preste — disse. — Harrold não presta como lorde, muito menos como rei; ele é um ser incompetente. — Apontou para a princesa Sansa com a cabeça. — Só lamento que a filha do honroso Ned Stark tenha tido de compartilhar o leito com aquele rapaz pífio.

Sansa corou com o comentário, sentindo-se exposta pelas críticas do lorde para com o Lorde Harrold.

— Harry pode até ser um homem incompetente em tudo que faz — concordou Lyonel Corbray, o Lorde de Lar do Coração, sem sede de sangue de seu irmão mais novo — Mas todos têm o direito a um julgamento. — Ele esperou os homens que gritavam vaias se acalmarem e continuou: — Falo-o, não por pena de Sor Harrold, mas sim porque o Vale não possui mais nenhum herdeiro direto depois dele; a linhagem Arryn está morta e ele é o último de seu sangue. Se o matarmos, ninguém terá nada além de séculos de casamentos antigos para tentar reivindicar o Vale, e todos nós podemos que todas as casas do Vale… e até de outros reinos… podem traçar esses casamentos. — Finalizou: — Se matarmos Harrold sem que ele tenha um herdeiro de seu sangue ou presuntivo, apenas estamos condenando o Arryn a mais briga e sangue.

Todos ficaram em silêncio e se entreolharam. O que o Lorde de Lar Coração falava era verdadeiro; ninguém iria perder tempo em tentar ter o Ninho da Águia, junto de todo o Leste de Westeros, para si. Apesar disso, Harrold não poderia exercer sua posição livremente após causar tantos desastres.

— A princesa Sansa também é culpada — disse Lady Waynwood, antes que mais alguém falasse algo. Sansa a olhou, chocada com a abrupta culpabilização da mulher que tanto a apoiou. Os olhos de Lady Anya se fixaram nela, duros. — Ela fracassou em ter um herdeiro com meu sobrinho, e fracassou em mantê-lo em seu leito quando ele cansou-se dela e de suas maquinações!

Peixe Negro deu um passo adiante e a mulher pareceu assustar-se com o avanço dele, incolhendo-se para mais perto do neto, como se temesse que o homem lhe batesse.

— Quem você pensa que é para falar assim com a minha sobrinha? — indagou Sor Brynden. — Seu querido Harry, o imbecil, é um inútil e incapaz de cumprir seus serviços dentro e fora do leito conjugal; que ele carregue esta sina apenas consigo mesmo.

Sansa sentiu as bochechas arderem. Logo, a surpresa se tornou escárnio, e ela fixou os olhos azuis no rosto velho e enrugado de Lady Anya.

— Se o seu tão amado e protegido sobrinho não consegue controlar a líbido dele e deve tomar prostitutas ao invés de sua esposa, é um problema conjugal entre ele e eu — respondeu, tentando manter-se calma, mas sentindo o gosto enjoativo de bílis na boca. — Se eu falhei em satisfazê-lo em meu papel como esposa eu lamento por isso e me resolverei com ele e os deuses. — Respirou fundo e continuou: — Entretanto, o fato de Harrold mostrar-se inadimplente para com os seus serviços como Rei é culpa dele e da senhora, que fracassou em cuidar dele em todos os seus anos como o seu protegido!

A velha arfou ao ouvir a maledicência da princesa Stark.

— Com que direito você atreve-se a condenar-me pelos meus papéis como matriarca de Harry? — indagou a mulher, com a papa embaixo do queixo movendo-se para lá e pra cá, como uma sapa.

— Com o mesmo que a senhora ousa culpar-me pelos erros de meu marido, sendo que ele sempre provou-se um ser pífio em questões de estado, simplesmente incapaz de tomar boas resoluções para os problemas. — Rebateu. — Se eu, que sempre fui fiel ao meu leito conjugal, que sempre tomei as melhores decisões para com o reino e o meu marido, e que sempre tentou dar-lhe um herdeiro varão, por mais que os deuses tenham negado-me tal tarefa. 

Um murmúrio começou entre os lordes, e Lady Anya tremeu os lábios. Roland tentou acalmar a situação:

— Vamos para dentro, avó, a senhora precisa descansar — disse, tocando no braço da avó de forma a acalentá-la.

— Não — ela exclamou a velha. — Eu não sou uma velha caquética que vai deixar estes homens tirarem o direito de Harry de reinar!

O direito dele ou o seu?, indagou-se Sansa. Virou e procurou por um meistre. Quando achou um, disse:

— Leve Lady Anya para os seus aposentos e dê um pouco de sonodoce ou leite de papoula para ela. — Ordenou. — Ela está cansada pela viagem e pelo pesar e não está pensando bem.

— Eu não estou cansada.

Sansa a ignorou e meneou a cabeça para Roland, que assentiu e levou-a para os aposentos onde dormia, puxando-a pelo braço.

— Eu quero ver o Harry! — ordenou a velha, enquanto o neto a puxava para fora do pátio, agitado, querendo tirá-la logo da vista dos monarcas Stark e dos membros da casa Tully. — Deixem-me vê-lo! Largue-me Roland, eu ordeno que me solte, imediatamente! — Quando ele não o fez, ela pareceu ficar mais colérica e tentou soltar-se dele e andar livremente, mas sem sucesso. — Soltai-me, agora! ROLAND!

Quando ela sumiu de vista, o Rei Jon voltou-se para Edmure.

— Temos que falar para que os soldados no acampamento fiquem calmos quanto a rainha dragão — avisou-o. — Ela estará aqui no mais tardar.

Edmure, apesar de não parecer não ter gostado daquilo, assentiu. Os outros lordes não pareciam gostar de ter ouvido aquilo.

— Vamos conversar no salão, meu rei.

Jon assentiu.

— Grande Jon e Alys, comigo. — chamou o rei e eles foram rápidos em obedecer. Quando os viu, o rei olhou em volta e falou: — Por favor, milordes, venham comigo para que possamos conversar com calma.

Sansa em nada se apetecia de falar sobre Daenerys.

— Eu posso me trocar antes, meu Rei? — indagou ela. — Temo estar cansada e preciso trocar de roupa. Na verdade, creio que muitos aqui merecem descanso e falar com os seus parentes e comer algo.

Um murmúrio recomeçou no pátio e várias pessoas acenaram em concordância.

Jon pareceu irritado com a atitude da irmã, mas aquiesceu.

— Como queira, irmã. — Voltou-se para Cetim. — Venha, Cetim. Quero que me ajude a sair logo desta roupa suja e me ajude a relaxar.

O patrulheiro assentiu. Arya o olhou com estranheza, pois, por um instante, achou que era uma moça. O olhar era escuro e feminino.

Sansa virou-se para as damas em seu serviço:

— Podem ir para seus familiares — disse. — Quero falar com minha irmã.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

 

Ela é realmente linda, pensou Gendry, observando as duas irmãs Stark. Havia visto a irmã de Arya em Winterfell, mas raramente de perto. Ela era tão oposta à sua irmã mais nova que seria impossível dizer que eram irmãs: Sansa era alta, de pele alva, com nariz arrebitado e bem alinhado, e maçãs do rosto cheias e avermelhadas; Arya era baixa, de pele amorenada como uma moça do campo, com nariz achatado e um rosto reto e longo como o de um cavalo; os olhos de Sansa eram de um azul claro e profundo, com um longo cabelo espesso, ondulado e acobreado; Arya, por outro lado, tinha cabelo um simples cabelo castanho, curto e trançado, e seus olhos eram cinzas e escuros, como fumaça. A irmã mais velha era alta, com quase um metro e oitenta, e um corpo voluptuoso, com boas ancas e seios fartos; enquanto a mais nova era baixa e magra para a idade, magra, de peito chato. 

Uma era o sol e a outra era a lua.

Até o cheiro é diferente, pensou ele, a princesa cheira a lavanda e rosas, e minha Arya cheira a fumaça e terra batida.

Ele preferia o cheiro de Arya, apesar da doçura que a sua irmã transparecia. Sempre iria preferir Arya.

— Acho que Jon não gostou de sua atitude, irmã — comentou Arya enquanto andavam até os aposentos onde ela estava.

— Nosso irmão pode defender a própria rainha — disse Sansa, irritada. Os canos de suas botas batiam com força no chão de pedra conforme ela andava com raiva. Era um sensação um pouco estranha, pois ela estava acostumada a usar sapatos simples e chinelos de seda.

A porta dos aposentos da Lady de Correrrio era vermelho de madeira pau-Brasil com trutas talhadas em alto relevo. Um guarda de Winterfell abriu a porta para que Sansa entrasse com os outros.

Quando entraram, Nymeria ergueu a cabeça e as orelhas, olhando para as pessoas que entraram lá. Seus pequenos filhotes estavam aconchegados na barriga dela, dormindo e sentindo o calor acalentador de seu corpo. Havia panelas de ouro aquecendo os lençóis na cama.

— Preparai uma banheira — ordenou Sansa. Soltou o alfinete do manto e deixou uma serva pegar a sobreveste forrada de arminho. Estava pingando pela neve derretida e suja de lama. A serva a colocou num gancho na parede, fez uma profunda vénia para as princesas, e saiu do cômodo.

— Pode ficar com o quarto se quiser — disse Arya, retirando as luvas de couro, enquanto a irmã ia até uma mesinha pegar uma jarra de estanho com cerveja preta do norte.

— Pode ficar se quiser — Sansa disse. Quando verteu o líquido negro e grosso numa caneca ela fez uma careta. — Não tem água? — indagou. A cerveja era boa para aquecer durante o frio inverno, mas não lhe apetecia.

Arya andou até a mesa.

— Cerveja é boa para aquecer — pegou a taça de cristal da irmã e deu uma tragada. A cerveja nortenha era grossa, parecendo quase uma gosma. O líquido desceu como areia quente em sua garganta, abrindo caminho pela traqueia e aquecendo tudo pelo caminho. Quando terminou o gole, limpou os lábios com as costas da mão, de forma rude.

— Ainda não tomei gosto pela bebida, principalmente pela cerveja, temo — Sansa disse, após sentar-se numa banqueta. Estava cansada. Nymeria foi até ela e Sansa sorriu para o animal. Sem medo, acariciou a cabeça da loba selvagem, que lambeu seu pulso. — Sua loba teve filhotes — Sansa notou ao ver os filhotes dormindo perto da lareira. Sorriu: — serão o próximo terror das terras de nosso tio, imagino?

Arya assentiu e pegou outra banqueta e ficou ao lado da irmã.

— Pelo visto finalmente tomou gosto por cavalgadas — Comentou.

Sansa sorriu:

— Bem, eu não poderia atrasar o exército — alisou as saias do vestido, os culotes de montaria estavam por baixo do longo tecido branco como a neve e as anáguas douradas. — Lorde Umber disse-me que cavalgo como um homem e Lady Alysanne disse que estou aprendendo rápido; porém, minhas damas de companhia odeiam que eu seja tão boa e rápida, pois, com exceção de Bárbara Bracken, todas têm extrema dificuldade de me acompanhar. — Continuou: — Mas Wylla tem se adaptado a usar a cela com as estribos e Lady Karstark também tem sido boa nisso.

Arya assentiu, feliz pela irmã, mas querendo ir logo ao assunto que realmente importava.

— Conte-me sobre a rainha dragão — pediu ela. Sua irmã olhou para Gendry e Ned. — Eles são confiáveis — garantiu Arya.

A luz da lareira fez Sansa lembrar-se de Winterfell no dia do ataque. Dos corpos queimando. Respirou fundo antes de falar:

— Ela é um monstro — disse Sansa. — Eu vi aquele monstro que ela chama de filho comer meus aliados. Duas de minhas damas de companhia tiveram de ver o pai morrer, oh, foi horrível! — Cobriu o rosto com as mãos, horrorizada com a imagem dos corpos imbuídos pelas chamas negras e vermelhas da fera alada. Ainda podia lembrar-se deles se contorcendo e enegrecendo conforme queimavam. Ainda podia sentir o cheiro defumado da carne…

Quando retirou as mãos do rosto, estava com lágrimas escorrendo pelas bochechas rosadas. Seus olhos azuis brilhavam ainda mais pelas lágrimas.

Arya levantou-se e foi até a irmã.

— Está tudo bem, calma — ela envolveu Sansa nos braços. — Calma, calma…

A tristeza deixa-a mais linda, Gendry pensou, observando o cabelo brilhante da princesa do Norte, parecendo fogo, e seus olhos azuis pareciam safiras. Arya também tinha sua beleza selvagem, contrastando com a beleza delicada da irmã mais velha. Sentiu o falo endurecer e abaixou a cabeça, enrubescendo de vergonha ao pensar nas duas irmãs de forma indecente.

Ned, sempre prestativo, trouxe um pequeno caneca de prata com cerveja preta.

— Beba um pouco, princesa — disse ele, passando a taça para ela. — Vai fazer-lhe bem.

Sansa sorveu um pouco da bebida nortenha. O líquido era amargo, sentiu difícil não cuspir fora, e era tão grosso que foi difícil engolir. O gosto forte a fez fazer uma careta e apertar os olhos, forçando-se para engolir. A cerveja do Norte era a cerveja mais forte de Westeros, e tinha que ser: o Norte era duro, frio e cruel. Para viver nele, tudo tinha que ser forte também, ou pereceria.

— Obrigada — disse, entregando a taça para Ned. Ele assentiu e pegou a taça.

Sansa passou os dedos pelo lábio inferior, para tirar um pouco de cerveja do lábio rosado. Gendry não pode ignorar o gesto, sentindo suas tripas arderem. A irmã de Arya tinha lábios rosados que apetecia serem beijados.

Quando se recompôs, Sansa ficou ereta na cadeira.

— Bran e Jon parecem ter total confiança nela — disse Sansa. — Parecem achar que ela é a única que pode derrotar Euron e que o casamento entre ela e Jon pode selar a paz.

— E você? — indagou Arya.

Sansa deu de ombros.

— Você e seus colegas viram um dragão — lembrou Sansa. — Então, diga-me, como foi o ataque?

Arya e seus colegas ainda lembravam bem do ataque: a fera pálida e dourada; as chamas de ouro batido explodindo no céu, como se fosse um novo sol nascendo; o ar ficando quente com a presença do Wyvern de fogo; a excitação febril e o medo ao verem a majestosa criatura voar e bater suas asas douradas transparentes, as batidas das asas coriáceas estalavam como no céu e retumbavam como trovões, cortando o ar.

— Quão grande é o dragão de Daenerys? — questionou Arya.

Sansa parou para pensar em um exemplo de tamanho. A fera que Daenerys usava como montaria era enorme. E assustadora.

— Maior que um drakar, eu diria — respondeu. — Muito maior, ocupando um enorme espaço no pátio de Winterfell.

Arya assentiu, pensando naquilo. Já havia visto os dragões em Porto Real, mas nunca de perto, pois estavam no fosso dos dragões, mas o mais escuro sempre parecia o maior. O dragão que atacou Harrenhal era grande, mas pelo que ela ouvira dizer, o dragão de Daenerys, chamado de “A Sombra Alada”, era muito maior.

— Se Daenerys é a única capaz de impedir Euron — disse Arya —, então devemos dar uma chance.

Sansa assentiu, obviamente a contragosto.

— E, se o dragão dela for tão terrível — continuou Arya —, então ela não deve ser uma inimiga. Não podemos derrotar um dragão.

Sansa assentiu novamente, aquiescendo as decisões da irmã.

— Ela daria uma boa esposa para nosso irmão? — perguntou Arya, temendo a resposta. Sabia que era um detalhe leviano, pois raramente o coração entrava na área política dos casamentos, mas a felicidade de Jon era tudo que importava para ela.

— Bem, ela é um tanto pequena e não tem ancas muito boas para um parto — respondeu a irmã mais velha. — Fora que já esteve casada com três homens e ainda não teve filhos. Não sei se…

— Eu me refiro a ela ser boa para nosso irmão, Sansa — Arya a interrompeu, rispidamente, com o cenho franzido.

Sansa mostrou as palmas da mão, mostrando que não tinha nada a dizer.

— Bem, eu não sei, quase não os vejo juntos e, quando estão, nem parecem um casal. — Continuou: — Nem todos eram como nossos pais, Arya. Amor raramente vem junto aos laços matrimoniais, mesmo que juremos tê-lo aos deuses.

Arya suspirou e voltou a sentar-se na banqueta.

— Bem, então basta rezar para que eles se dêem bem. — Fixou o olhar cinza e escuro no rosto claro da irmã. — E você, Sansa? Acha que os lordes podem aceitá-la?

Sansa negou a possibilidade com a cabeça.

— Ela matou muitos dos nossos — disse. — Creio que ninguém que logo teremos de lidar com várias tramas de assassinato. Devemos cuidar para que ela tenha algum provador real para a comida dela — começou a divagar. — Talvez algum daqueles imaculados…

Arya olhou para Gendry e Ned e depois voltou o olhar para a irmã. Levantou-se e disse:

— Eu e meus companheiros vamos deixá-la para arrumar-se, princesa — Fez uma rápida reverência e virou-se. Sua irmã pareceu um pouco surpresa pela reação, mas nada disse, apenas acenou com a  cabeça.

Os colegas de Arya também fizeram uma reverência antes de saírem. Edric Dayne beijou os dedos de Sansa de forma gentil e cavalheiresca. Gendry fez o mesmo gesto, mas parecia desconfortável com tais cortesias e Sansa achou seus dedos ásperos e os lábios babados, mas rápidos.

Enquanto o cavaleiro de Arya era belo, parecia desconfortável em roupas mais requintadas e tinha uma estranha cicatriz carbonizada em seu rosto. Ned Dayne, por outro lado, era um rapaz belo e sem defeitos: olhos púrpuras e cabelo loiro caindo até os ombros. Se sua irmã quisesse um bom marido, poderia ser com ela.

Isso a lembrou: devia indagar a Edric do porque os Dayne os estavam apoiando na guerra. Sentia que tinha algo ali que devia saber.

Pouco depois da irmã e seus “amigos” saírem, uma banheira de madeira foi trazida para Sansa poder se banhar e foi colocada ao lado da lareira. As serviçais ajudaram-na a se despir do vestido e tirar as calças e botas sujas de lama.

A água estava bem quente, mas ela não sentiu que estava boa o bastante. Ainda sentia um arrepio percorrer o corpo.

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

— Não acredito que este maldito bastardo irá nos entregar para aquela puta de Essos — disse Lorde Bracken, sentado de forma aconchegante numa poltrona e bebendo hipocraz aquecido em um corno enorme e cravejado de granadas e opalas, depois que a sua filha mais velha tirou os culotes de montaria, tomou um banho rápido e botou um vestido laranja, auxiliada pelas suas irmãs, refugiadas em Correrrio.

Bárbara fez um gesto, indicando que as irmãs deviam ir para uma saleta conectada ao aposento e deixá-los falar a sós.

 — Jon agora é Stark, pai — Sentou-se ao lado dela. — E nosso rei. Devemos obedecer a vontade do falecido Jovem Lobo e confiar nele para nos guiar.

Seu pai fez um barulho de desdém com a boca, ainda olhando para as chamas da lareira.

— Minha senhora confia nele — comentou Bárbara. — Ela parece não gostar da rainha também, mas sabe que deve fazer o que Jon lhe pede.

Seu pai a olhou.

— Ah, é claro, a sua senhora — disse ele, com zombaria na voz. — Que boa ela é! Imagino que tenha conseguido pensar em um bom partido para você, já que ela vale tanto?

Bárbara abaixou os olhos escuros e a cabeça, sentindo as bochechas arderem.

— Que é? — ele indagou, estranhando a reação da filha. — Não me diga que ela lhe prometeu para àquele rapaz imberbe dos Blackwood.

Bárbara negou com a cabeça.

— Não, não, ela não me prometeu a ninguém — explicou. — É só que… tsc, pai, eu não sinto vontade de ter um homem comigo — Confessou, retraindo-se. Sentiu as lágrimas começarem a forçar o caminho até os seus olhos, lutando para saltar das pálpebras. — Eu não sinto vontade de ter mais ninguém, desde que…

— Eu sei — seu pai a interrompeu, não querendo ouvir. — Eu entendo, filha, acredite. — tomou mais um gole no corno e pegou na mão dela. — Não iria obrigar-te a tal coisa; entretanto, sua mãe se foi, e não tenho filhos homens, e, sendo sincero, não creio que eu saia vivo dessa guerra…

— Pai!

— Deixe-me terminar — ele pediu. — É a minha herdeira, herdeira de Barreira de Pedra. — Continuou: — Deve cumprir o seu dever para com sua família, tal como as suas irmãs. A linhagem Bracken depende de vocês para continuar.

Sem escolha, Bárbara assentiu, afastando a mão da dele.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

 

— Eu não o deixei no Norte para ser copeiro da princesa, Hos — ralhou lordes Tytos. — Eu deixei-o no Norte para servir ao rei e ele ensiná-lo a usar espadas e deixar os livros de lado! Não para servir uma mulher e ajudar a arrumar a casa!

— Mas senhor meu pai — disse Hos, mantendo a viz calma —, foi por ordem do rei que servi a princesa Sansa — defendeu-se. — E ela me elogiou muito pelos meus serviços; falou que minha voz é linda para cantar e que sou bom em leitura.

— Humpf! — seu pai fez um som de desdém. — Habilidades fúteis para um homem.

Seu irmão mais velho, Brynden, se intrometeu:

— Eu espero que ela não tenha deixado aquela prostituta de Lorde Boros como sua prometida, Hos — disse ele. — Mulheres como Sansa sempre ignoram o sangue e tentam fazer a paz, ignorando os problemas de verdade. São débeis demais para lidar com tal coisa.

Hos negou a possibilidade com a cabeça. Sorriu, ficando vermelho.

— Na verdade, ela prometeu-me para Wylla Manderly.

O pai o analisou com os olhos escuros.

— A lady de Porto Branco? — indagou, de cenho franzido. — Hmm… Sim, seria um partido mais que perfeito. Ótimo.

Hos se retraiu, como se as palavras do pai fossem um tapa em seu rosto.

— Não, pai… Wylla é a irmã mais nova — explicou. — Wynafryd é a herdeira.

Lorde Tytos bufou.

— Se você for se casar com uma Manderly, que seja a mais velha.

— Mas, pai, não gosto dela — disse, angustiado com a ideia de casar com uma mulher que não o suportava. — Wylla e eu gostamos um do outro, até nos beijamos no bosque sagrado!

Seu pai revirou os olhos. Brynden disse:

— Você viveu muito entre mulheres — ralhou. — Se Sansa tivesse leite nas tetas, claramente daria de mamar para você! Ou por um acaso ela lhe deu uma ama de leite? Fora que vi aquela irritante Wylla em Winterfell; uma garota intrometida que acha que pode se envolver em assunto de homens. — Fez uma careta. — Fora que pinta o cabelo. Quem raios faz isso em Westeros? Só pode ser uma rebelde. — Finalizou: — É óbvio que ela viu em você uma marionete.

Em outros momentos, Hos teria se calado e se retraído, mas ao invés disso, disse:

— Tenho pena da mulher que casar-se contigo irmão; nem todas as terras banhadas pelo Tridente valem dividir o leito para convosco.

Brynden franziu o cenho com o sermão.

— Tenho pena da mulher que casar contigo — rebateu —, pois ela terá praticamente uma outra mulher na cama!

Tytos deu um tapa na nuca do filho.

— Já chega, Brynden — ordenou. Virou-se e encarou o filho. — Eu falarei com nosso Rei sobre isso…

— O Rei Jon já aceitou o noivado — avisou Hos. — Ele iria lhe falar…

— Ah, é claro! — Brynden fez troça. — Aquele bastardo deve ser tão maricas quanto você, irmão; pois deixa a princesa Arya abrir aquela xota cheia de lama e fumaça para qualquer um e veste-se como um homem; deixa Sansa resolver questões de estado; agora, ajoelha-se a uma puta que vendeu a buceta para homens que trepam com cavalos e que montou outros homens antes. — Meneou a cabeça. — Deuses, e o que é aquele catamita que trouxe com ele? Era mesmo homem?

— Chega! — ordenou Lorde Tytos, rubro de ódio. — Goste ou não, ele é nosso rei — apontou um dedo para a cara do primogênito —, e não te quero mais falando assim dos teus irmãos e nem das princesas Stark. — Continuou: — Ou te esqueceu de ter sido humilhado pela princesa Arya, que, além de mais baixa que você, usava um graveto de ferro quando te cortou.

Brynden enrubesceu e Hos deu um sorriso.

— Isso é sério? — ele indagou, divertido. — A princesa Arya fez isso?

Brynden o olhou com cólera, ainda ruborizado.

— Quieto, seu maricas!

— Você também fique quieto, Brynden — ordenou o pai, mais uma vez. De repente, a fúria sumiu de seu rosto e ele deu um suspiro prolongado. — Já perdi Luca no Casamento Vermelho e Alyn no caminho para Correrrio; não quero mais brigas.

Os dois irmãos, sentindo-se culpados, se entreolharam e assentiram com a cabeça.

— Desculpe, Senhor meu pai — ambos falaram em uníssono.

Tytos assentiu. Botou uma mão no ombro de cada um dos dois.

— Somos família — ele disse — e a família não briga entre si.



X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Arya e seus amantes foram até o quarto da viúva Jeyne para conversar. A antiga rainha estava provavelmente ajudando Roslin em todo aquele alvoroço de dia que estavam tendo.

— E então? — indagou Gendry. — Daenerys vive?

— Precisamos dela para tomar Harrenhal — respondeu. — E para derrotar Aegon.

Gendry assentiu. A pequena Doninha sentada no seu colo, brincando com um abanador de plumas encrustado de jóias que pertencia a rainha viúva. Estava usando um rico vestidinho azul, muito acima de seu nascimento. O abanador estava preso ao vestido com uma corrente dourada.

— E depois? — ele indagou. A pequena criança levou as plumas brancas do abanador até as suas narinas e ele afastou o rosto, sorrindo. — Agora não, pequena. — fez um cafuné nos cabelos castanhos dela. Esta riu, como se não o entendesse.

— Depois nós vemos como ficam os reinos — Arya respondeu.

Gendry arqueou uma sobrancelha negra.

— Sério?

Arya franziu o cenho.

— Sério — ela respondeu.

O cavaleiro meneou a cabeça em desaprovação e balançou a pequena criança em seu colo enquanto ela pilheriou com o abanador, olhando para as plumas brancas. Ela as levou até o nariz e deu um espirro.

— Não sei, princesa — ele disse. — Acredita que é uma boa ideia defender Daenerys no fim de tudo? — indagou.

Arya deu de ombros.

— É ver para saber — disse. — Ela matou escravagistas nojentos e estúpidos, mas também matou meu povo. — Deu de ombros.

— Vamos aguardar o regicídio para os próximos eventos, amigos — disse Edric. — Os deuses sabem como detesto isso.

— Você é um Maricas — Ralhou Gendry. — Aqui, faz alguma coisa que presta e cuida da pequena.

Gendry entregou Doninha para Edric, que a pegou e posou em seu colo. Envolveu-a em seus braços e balançou um pouco o corpo, para fazê-la dormir. Quando ela abanou as plumas em sua face, sorriu. Gendry pegou um pão, arrancou um naco com as mãos grossas, e afundou o pedaço em gordura.

— Certo — disse Arya, um tanto apreensiva. — Então vamos aguardar.

— E aquela velha caduca? — indagou Gendry. Levou o pedaço de pão gorduroso até a boca e começou a mastigar de modo rude.

— Lady Anya? — indagou Ned, balançando Doninha.

— Essa mesmo — confirmou Gendry, de boca cheia, fazendo a gordura de porco respingar para fora. Engoliu o naco de pão, que deslizou como uma papa pela sua garganta. — Temos de nos livrar dela.

Arya pegou um pedaço de queijo.

— Por que diz isso? — indagou. Separou um naco minuscúlo do queijo e o levou até a boca.

— Ela defende aquele cuzão do seu cunhado.

— Xiu! — censurou Arya e indicou a Doninha com os olhos cinzentos.

Gendry olhou para a criança. Ela estava abanando as plumas na frente do rosto. Ele a fez abaixar o abanador.

— Não esconda o teu rosto, pequena — ele disse e deu um apertão gentil na bochecha. — É bonita demais para isso. — A jovem sorriu corada e bateu as penas do abanador no rosto de Gendry. Ele sorriu, mas depois voltou a encarar Arya e o riso morreu. — Bem, ela vai defender aquele… Er, aquele imbecil do Harry, enquanto continuar a respirar.

— Rolland é o neto dela e parece louco para acabar com Harry — lembrou Arya.

— Mas ele não é o lorde Waynwood — rebateu Gendry. — E não sabemos se ele e os seus vão mudar de ideia por ela.

Ned pegou um pedaço de queijo e deu para Doninha que o comeu de forma obediente.

— Ela pode morrer logo — argumentou Arya, mas nem ela sabia quanto tempo a velha ainda poderia durar. — Mas… — Mordeu o lábio. — Talvez esteja certo. Pode ser melhor livrar-nos dela agora. — Então indagou: — E quando seria?

 — A rainha dragão logo vai chegar — Lembrou-lhes Ned, sem olhar para nenhum dos dois, enquanto dava mais queijo para Doninha. — Os lordes estarão ocupados, e todos vão querer ver um dragão, mas talvez Lady Waynwood ainda esteja dopada até lá.

Arya e Gendry assentiram.

— Mas não pode faltar na reunião — disse Arya. — Muitos iriam dar nossa falta.

Gendry sorriu.

— Muitos iriam sentir falta da princesa selvagem e do lorde pomposo de Dorne — O cavaleiro pegou um pedaço de queijo para si. Era fedido, mas de boa qualidade. — Ninguém vai dar a falta do bastardo que fodeu a princesa. — Recostou-se na cadeira, sorrindo, pensando que, às vezes, ser um bastardo tinha suas vantagens.

 

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Ouviu um barulho fugaz ao seu lado. Rápido como uma cobra, levou os braços até a direção que vinha o som e agarrou o bicho que estava ao seu lado. Seus elos tilintavam quando se movia. Fechou os dedos em volta do corpo agitado do rato peludo, que debatia-se pela vida, tentando escapar dos dedos de Harry.

Tentou apertar o animal para que ele acabasse por morrer por sufocar e morrer, mas, quando não obteve sucesso, se irritou e abriu a boca, faminto, e levou a barriga do bicho até ela. Seus dentes se fecharam em volta da carne peluda, sentindo os pelos dela tocarem em sua língua seca. Fechou o maxilar, fazendo o bicho soltar um guincho de dor e medo. Sangue morno jorrou da carne perfurada pelos dentes de Harry, como se fosse o sumo de alguma fruta. O líquido vermelho e espesso, com gosto de ferro, escorreu pelo queixo de Harry, passando pela espessa barba emaranhada e suja dele.

É tão bom, pensou, enquanto saboreava o gosto e terminava de fechar a boca e virando o rosto, arrancando um bom pedaço de carne. O animal jazia morto em suas mãos. Lágrimas ardentes brotaram pelo rosto sujo de Harry, queimando-o. Era humilhante, mas seus carcereiros filhos das putas quase não o alimentavam. Deixaram-no ali, esquecido. Quando não era carcereiro trazendo comida para Harry, apenas os ratos e insetos lhe faziam companhia — os ratos sempre mordiam os dedos de seus pés e mãos, e os insetos passavam pelo seu corpo, como se achassem que ele nem era um ser vivo, isto quando não picavam sua carne.

Apesar de sempre chutar os ratos quando o mordiam e tentava esmagar os insetos que o picavam e o faziam se coçar até a carne ficar viva, gostava de ter companhia. Estava se sentindo sozinho, largado, sem ninguém que se importasse com ele. Ter os animais rastejando sobre ele era acalentador.

O lugar era duro e frio, e Harry não tinha nada além de um cobertor para se proteger — cobertor este que pinicava sua pele horrores. O lugar também era fedido, com o ar viciado, e o cheiro fétido dos dejetos que Harrold fizera no balde. Para piorar, o balde estava há muito cheio, e Harry teve de fazer as suas necessidades em locais diferentes do lugar da sua cela. Por vezes se urinara e dormira por cima das próprias fezes. Era bom para se aquecer, e, apesar de atrair os insetos, isso facilitava-o a pegar os animais. O problema é que isso devia fazer os carcereiros demorarem mais para vir lhe trazer comida, pois o cheiro fazia até Harrold chorar.

Lambeu o bigode e a barba empapados de sangue, saboreando o gosto. Coçou o queixo peludo e depois o couro cabeludo da cabeça, que estava a pinicar horrores. Agora que o bicho estava morto e não podia mais mordê-lo, Harry enfiou a cabeça dele na boca e começou a comprimir os dentes e puxar a carne, debatendo o rato moribundo, como se fosse um cão dilacerando a presa pequena que conseguiu pegar numa caça.

Sentia falta da luz também. Quando a luz surgia, junto da comida, Harry sentia-se tocado pelo sol. Era como ver a liberdade dos raios de sol à sua frente, como se os deuses o iluminassem.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

 

Sansa escolheu usar um vestido azul com bordados de prata. A gola era alta, com pele de esquilo. Provavelmente era de Roslin — e da mãe e talvez da avó de Sansa antes dela — mas a princesa de Winterfell ainda não tinha suas roupas trazidas para o castelo do tio para se dispor delas. Estavam sendo trazidas em sacolas, mas demoraria até o dia seguinte para chegarem. As mangas eram curtas e sinuosas, mostrando de forma provocante seus pulsos alvos. O vestido era apertado no peito como quando vivia em Porto Real e todos olhavam seus seios a desbotar. Trocou a coroa de rainha do vale, cravejada de safiras, por uma tiara simples de prata sem jóias.

Quando terminou de se vestir, Petyr entrou nos aposentos. Sansa ordenou que os servos saíssem e os deixassem a sós.

— Espero que não pretenda ver Harrold, princesa — disse Petyr. Estava lavado da poeira da viagem e usava uma manta folgada e verde, rendada com passarinhos verdes. — Vossa imagem deve se desvenciliar a dele, ou pode a ver consequências.

Sansa o olhou de soslaio. Havia algo deixando Petyr nervosoz ela sabia. As pessoas que não o conheciam podia não perceber, mas ela sim; podia ver o nervosismo em seus olhos verdes e cinzentos.

— Indago-me, lorde Baelish: por que desde que Harrold fora preso você anda tão nervoso sobre ele? Por acaso não seria você quem teme as represálias de ter auxiliado ele? Ou então… Algo mais?

Petyr sorriu:

— Nós todos temos pecados, princesa — ele disse. — Eu mesmo, sou um homem cheio de pecados, e não tenho boa estirpe para ser salvo de nem do mais simples deles; então, diga-me: por que eu deixaria alguém como Harry viver e afundar-me?

Sansa estava preste a perguntar se era mesmo aquele motivo quando alguém bateu na porta e identificou-se ser Edmure.

— Deixai-me — ordenou a Lorde Baelish, que fez uma vénia e saiu do quarto.

Seu tio Edmure entrou, junto de Roslin, que trazia o bebê deles no colo. Era um bebê gordinho, olhos azuis grandes, com não mais do um dia de seu nome.

— Vim mostrar-lhe meu filho e herdeiro, Robb, Majestade — Edmure disse.

O garoto com uma leve pelugem ruiva na testa sorriu ao ver a tia e esticou os braços. Sansa nunca tinha visto o sobrinho. Roslin o esticou para ela e a tia o tomou nos braços.

— Ele é bem forte — elogiou Sansa. — E bem vivaz, pelo que posso ver.

Roslin sorriu e acenou com a cabeça.

— Bem — disse Edmure, pegando o filho rechonchudo com cuidado dos braços de Sansa e beijando-o na bochecha antes de entregar para Roslin —, hora de meu campeão e minha esposa deixarem-me falar com a minha sobrinha a sós.

Roslin pegou o bebê e trocou um beijo com o marido antes de deixá-lo com a princesa.

Quando ambos se foram, Edmure virou-se e encarou a sobrinha.

— Espero que esteja bem — disse ele.

Sansa assentiu.

— Eu estou.

Edmure sorriu e acenou, parecendo desconfortável. Provavelmente ele queria indagar sobre Daenerys antes que o Rei se uni-se com ele no salão.

— Tio, você vai se aliar mesmo a Daenerys? — Sansa indagou, indo direto ao ponto. — Seja sincero comigo.

Edmure titubeou um pouco, mas logo respondeu:

— Sim. Sim, eu vou — ele respondeu. Andou até a mesinha com a jarra de cerveja preta e encheu uma pequena taça de estanha para si. Gesticulou com a jarra de estanho, oferecendo cerveja para a sobrinha, que negou a oferta com a cabeça.

— Nem sequer vai ouvir a opinião dos seus lordes? — questionou Sansa.

Edmure deu de ombros e sorveu um pouco da bebida preta e engrossada. Fez uma careta com o gosto forte.

— Não suporto este gosto da cerveja do Norte — disse ele, deixando a caneca na mesa novamente. — Prefiro a cerveja de sevada ou a marrom, ela é mais rica nas minhas terras. — Deu de ombros. — Bem, a cerveja preta é melhor neste tempo, creio…

— Tio — interrompeu Sansa —, Teus lordes odeiam a rainha.

Edmure assentiu.

— Eu sei-o, princesa — disse ele.

— E mesmo assim pretende ajudá-la? — questionou, um tanto irritada. — Depois de tudo que ela fez ao meu povo?

Edmure assentiu, de forma simples.

— Por que? — ela quis saber.

— Daenerys pode ajudar-nos a pegar a comida a alimentar o povo — explicou Edmure. — E eu não quero-a como inimiga depois do que soube dela. Na verdade, considerando que ela libertou tantos escravos, talvez seja boa para o reino, não?

Sansa não acreditava nisso.

— Dúvido que ela se importe com o povo depois de tudo o que fez a eles.

— A guerra é cruél, sobrinha, acredite em mim. — Continuou: — Se Daenerys ajudar-nos a alimentar e proteger o meu povo, eu a aceitarei no trono de ferro de bom grado. Serei o primeiro a ajoelhar-me para ela. — Andou até janela e afastou as cortinas. O céu estava vermelho e as nuvens roxas e rosadas. Logo seria noite. — Além das muralhas vermelhas de meu castelo, existem dezenas de milhares de pessoas com fome, sem casa e roupa, muitas perderam os parentes; mulheres são abusadas, criancas são mortas, pais usam armas numa guerra que não vai dar nada para eles além de lágrimas e sangue. — Virou-se para encarar a sobrinha: — É por isto, princesa, que eu luto: pelo povo. Um lorde que não pensa nas pessoas simples que ele nasceu para governar, não merece as terras e o assento que tem. — Finalizou: — Lembre-se disso sempre que for tomar uma decisão difícil, pois é na resposta mais dolorosa para você, mas boa para seus súditos, que você estará fazendo a escolha certa.

Sansa o olhou, sem saber o que responder. Antes que pudesse falar algo, entretanto, ouviram uma batida e um servo entrou.

— O Rei do Norte vos convoca — avisou. Edmure assentiu.

— Vamos, princesa? — ele indagou.

Sansa ficou apreensiva. Não queria ir. Não queria falar sobre Daenerys e dar-lhe apoio, mesmo que o tivesse de fazer.

Foi então que soube de uma opção menos dolorosa.

— Eu devo ir ver o meu marido, milorde — disse e andou até a porta onde o servo estava. Empurrou-o e passou pelo umbral da porta, antes que qualquer um pudesse falar algo.

 

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Sansa descia os degraus da escada caracol. Não queria falar com Harrold, mas iria ter de fazer isso uma hora ou outra. Estava sem qualquer guarda, mas imaginou que logo iriam achá-la. De qualquer modo, não temia Harrold, ele não ousaria tocá-la.

Ao entrar no corredor das celas, ela ordenou que o carrasco a levasse para a cela onde seu marido estava. Ele ficou um tanto apreensivo, mas, no fim, a obedeceu e pegou uma lanterna a óleo e levou-a até a cela de Harrold.

— Obrigada — disse ela ao chegarem na porta de madeira e ferro. Pegou o lume da mão do vigia. — Saia. Eu o chamarei se precisar de ti.

O homem assentiu e deu passagem para ela. Ao entrar e fechar a porta, sansa sentiu um bafo abafado e fedido dentro do cubículo. Fez uma careta. Ergueu a lanterna, tentando iluminar o local sombrio e fedorento.

— Harry? — ela o chamou, com dificuldade para vê-lo.

Algo se contorceu na escuridão, e ela fixou o olhar na direção que via algo se mover. Harry ergueu a cabeça e botou a palma da mão na frente do lume, apertando os olhos feridos.

Quando Harry viu luz fúgida e ouviu uma voz o chamando, achou que era a Idosa no Céu, erguendo sua lâmpada dourada que enchia a mente dos homens com sabedoria; após conseguir enxergar um pouco melhor a figura esbelta a sua frente, pintada de dourado, e expulsando os animais, que fugiam da sua luz, adentrando na escuridão, achou que era a própria donzela, descida dos céus, que veio para resgatá-lo. Seus cabelos eram como de fogo. Seu falo endureceu-se, e ele lembrou-se de Melisandre.

Conforme reconheceu a mulher à sua frente, percebeu que não era a Velha, segurando sua lâmpada da sabedoria, nem a Mãe do céu, ou a Donzela. Nem mesmo era Melisandre. Não, ele sabia bem quem era a mulher a sua frente, parecendo uma figura de ouro. Ele mesmo já a vira pintada de dourado, com o corpo exposto em seu leito conjugal.

— Esposa? — ele indagou. Sua voz estava embargada. Fraca, pois havia meses (ou já eram anos?) sem falar. Seu cabelo loiro estava tão sujo que estava castanho e a pele alva estava marrom de tanta sujeira. O rosto estava inchado e com sangue seco. — Veio salvar-me? — Ele lambeu os lábios rachados. Conforme ele se movia na escuridão imunda e lúgubre, seus elos tilintavam. O olho esquerdo estava com as pálpebras inchadas e coberto de sangue seco que descia da testa. Provavelmente ele não o abria desde que fora preso.

Sansa franziu o cenho e bufou.

— Salvar-lhe? Salvar-lhe? — indagou, irritada. — Você ficou louco, marido? Crê que vim mesmo para salvar-lhe de seus pecados?

Harry pareceu se assustar com as falas delas, como um animal moribundo.

— Mesmo que eu quisesse — continuou Sansa —, os lordes não aceitariam. Todos o odeiam, sor. Você não tem mais qualquer amigo que seja.

Harrold fez um som amuado. Estava claramente em agonia, como um animal encurralado prestes a ser abatido.

— Lady Anya…

—... Não poderá salvá-lo — avisou-lhe. — Todos os Waynwood parecem querer ter a sua cabeça numa bandeja, Harry. O Vale inteiro quer; principalmente os Redfort. Eles o culpam pela morte do pai deles.

Harry franziu o cenho e fez uma careta aterrorizante. Sansa se segurou para não dar um passo para trás.

— O lorde Hunter era um velho fraco — disse, com a voz um pouco mais alta. — Ele deveria ter ficado em Winterfell, ou então no Vale, já que era tão fraco assim.

— Os Blackwood também o culpam pela morte do filho.

— Que culpa eu tenho? — indagou, recostando-se na parede úmida. — Eu agora controlo o clima? Ou por um acaso eu controlei o dragão que invadiu Harrenhal?

— Você destruiu todo o tridente — lembrou-lhe Sansa. — O Vale também está totalmente fora de nosso controle! O pai de sua amante foi até morto pelos seus malditos impostos! Que estava pensando, Harry?

Ele se encolheu, como se fosse um cachorro smilinguido e que havia sido chutado, não um homem de trinta anos e que era lorde de um reino dos sete reinos.

— Eu só quis ajudar — exclamou ele, mas a voz soou fraca, como um sussurro alto. Seu olho aberto ficou marejado. — Eu apenas quis conseguir dinheiro para aqueles vermes ingratos que eu achava serem meus súditos!

Sansa meneou a cabeça em total descrença das palavras fracas e pífias do marido. Como pude me casar com alguém tão fraco?

— Como pode realmente achar que seus malditos impostos poderiam ter sido bons? — indagou com escárnio óbvio. — De onde tirou tal loucura, marido?

Harry coçou o couro cabeludo, fazendo as correntes cantarem de forma irritante. Devia estar cheio de bichos, picando-o. Sansa fez uma careta ao ver ele mover as mãos no louro sujo e ouviu o som das unhas de seu marido arranhando o couro cabeludo com força, como se estivesse tentando quebrar palha.

— Eu apenas segui os conselhos que Lorde Petyr me deu — defendeu-se Harry, ainda coçando a cabeça. Arrancou alguns fiapos do cabelo seco que ficou emaranhado em seus dedos. — Ele conseguiu ajudar o tesouro da coroa e de Vila Gaivota antes disso.

Sansa arregalou os olhos azuis e arqueou as sobrancelhas rubras.

— Você fez o quê!? — indagou, sem fôlego com a respiração.

Harry assentiu.

— É a verdade, esposa — jurou. — Petyr me aconselhou a usar estes impostos… deram certo para Jaehaerys, então por quê não para conosco?

Sansa bufou.

— Procure ver se deu certo para a princesa Rhaenyra Targaryen seu idiota — ela disse.

Sansa virou-se e pegou no ferrolho da porta. Girou-o com dificuldade, pois estava enferrujado, e, quando ia puxar para abrir a porta e sair, sentiu Harrold puxar a saia de seu vestido.

— Por favor, Sansa — exclamou ele, desesperado —, se for deixar-me aqui, na escuridão, não leve a luz com você! Eu vou ficar insano sem luz!

Sansa puxou a anágua azul, afastando-a das mãos sujas de Harry, e chutando seu marido, que estava fraco, esvaído de forças, e acabou por cair para trás com facilidade. Os elos da corrente começaram a tilintar na escuridão.

Sansa virou-se e saiu, abrindo a porta e passando pelo umbral. Virou-se rapidamente e pegou a chave do molho de chaves. Levou-a até a tranca e girou, deixando o marido trancado na escuridão, apenas com os ratos e insetos para fazer companhia.

Harry bateu várias vezes na porta, fazendo o som ecoar na escuridão do corredor.

— Não! — ele implorava. — Esposa, por favor, eu te imploro; livrai-me deste inferno onde estou! Não me deixe aqui na escuridão!

Sansa afastou-se, junto do carcereiro, indo para longe dos gritos.

— Sem você eu ei de morrer! — disse Harry, desesperado, sentindo a garganta arder mais ainda com tanto esforço. — Morreeeeeeeeeer… — a última palavra ecoou longamente pelo corredor sombrio e frio, como os fantasma de Harrenhal murmuravam para Harry.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

 

Arya estava ao lado do irmão, todos os lordes se empurravam para ficar no salão de Correrrio. Stannis estava do lado direito de Jon, com Sor Davos e Melisandre ao lado dele. Do lado de Arya, estava o Lorde Edric Dayne e Sor Gendry. O bastardo havia recebido olhares duros dos outros lordes conforme andou com a princesa do Norte até a mesa do rei. Ele desafiou os olhares com outro olhar duro. O príncipe Bran estava em uma cadeira alta, com um ar solene e atento.

Atrás do rei, estava Cetim, como se fosse sua sombra. Estava próximo dele, com o rosto esticado para observar os planos na mesa. O rosto estava quase colado ao do rei, como um amante na cama. Arya podia sentir o perfume da barba rala do homem, que era alguns mais velho que Jon, mas parecia ter quase a mesma idade — mesmo que já tivesse um pouco mais de trinta dias de seu nome.

A mesa onde todos estavam com o olhar fixado tinha um imenso mapa do tridente aberto por ela. O mapa havia sido belamente pintado por um meistre e era rico em detalhes, com ênfase nos detalhes de Harrenhal e dos rios.

Os lordes estavam praticamente todos no salão — apenas a adormecida Lady Waynwood; o adentado Lorde Redfort, que estava doente desde que chegara e demorou para melhorar desde que ficou sete dias vigiando o cadáver do pai no septo, ao invés de ir se tratar com o meistre; as filhas mais novas de Lorde bracken; os de baixo nascimento que não trabalhavam lá, juntos dos filhos da florestas.

Mas nenhuma ausência foi mais sentida do quea da princesa do Norte mais velha.

— Onde está a princesa Sansa? — indagou o Rei do Norte, um tanto irritado. — Ela está demorando por demasiado.

Um murmúrio começou, mas ninguém pareceu ter ideia de onde estaria a princesa.

— Ela disse-me que ia ver o marido — avisou Edmure.

Jon franziu o cenho.

— Harry é peso morto para perder tempo — Jon disse, sem rodeios.

— Creio que a princesa — disse Stannis — não compartilha de vossa vontade de querer falar sobre a rainha dragão.

— Ninguém tem — comentou lorde Jonos Bracken, com sua filha mais velha, Bárbara, ao seu lado. Muitos homens achavam desprezível ter uma mulher em assuntos de guerras, e muitos achavam ainda mais desprezível ter uma que dera prezar ao inimigo. — Daenerys não é nossa amiga. — Cuspiu. — É uma puta estrangeira assassina de parentes.

— Não é — concordou Stannis. — Mas ela é nossa aliada e salvadora.

— Com todo o respeito lorde Stannis — disse Tytos Blackwood —, mas você não fala por nós; não é nosso rei. — dirigiu um olhar duro e escuro para Sor Davos. — E sua mão do rei é uma piada; além de ser a mãe de um ladrão, ainda teve os dedos aparados.

Os lordes da tempestade que vieram com Stannis começaram a falar reclamações pelas palavras de Lorde Blackwood. Stannis parecia prestes a falar algo, mas Lorde Edmure se levantou da cadeira.

— Milordes, paz! — Ele pediu. — Jon e Stannis querem o nosso bem; devemos lhes dar votos de confiança.

— E como…? — Lorde Bracken estava prestes a indagar, mas os portões do salão se abriram, fazendo todos voltarem suas atenções em direção ao som, e a princesa Sansa entrou, agitada.

— Ah, irmã — zombou o Rei Jon —, vejo que finalmente resolveu se juntar a nós e dar-nos o ar de sua…

— Lorde Baelish! — ela o chamou, olhando pelo salão de Correrrio. — Onde está Lorde Baelish?

Os lordes olharam em volta, cada um para uma direção diferente, mas nenhum o achou.

— Achem-no! — ordenou ela. — Achem-no, agora!

— Que houve? — Jon franziu o cenho.

Sansa fixou o olhar nele, com os olhos azuis vidrados.

— Petyr foi quem deu a Harrold a ideia de usar aqueles impostos malditos! — ela explicou, gritando. Todos se entreolharam e trocaram palavras, chocados. — Achem-no! Procurem-no e tragam-no até mim; nem que seja com a cabeça numa bandeja de ouro!

Os lordes e cavaleiros foram rápidos em fazer o que a princesa mandava e saíram às pressas do salão, indo vasculhar o castelo.

 

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Lorde Petyr nunca foi achado. Em seus aposentos, tudo estava no lugar. O lorde do menor dos Dedos simplesmente sumiu sem deixar pistas.

— Lamento, irmã — disse Jon, tocando a mão enluvada em seu ombro, de forma acalentadora. Todos os lordes estavam novamente no Grande Salão de Correrrio, e Sansa estava sentada em uma cadeira de frente ao mapa pintado.

— Isto não há de ficar assim! — prometeu Sansa, irritada com tudo aquilo. Lorde Baelish iria lhe responder por aquilo com a sua vida.

— Isto pode esperar — disse o príncipe Bran. — Devemos nos preparar para Daenerys.

Sansa fez um “humpf!" ao ouvir o nome da rainha tirana. Não queria ouvir ou falar nada acerca daquela mulher; todavia, parecia impossível se livrar daquela praga alada. Aquela mulher havia matado nortenhos e, graças ao seu irmão, todos teriam de ajoelhar para ela.

Antes que mais alguém pudesse falar nada, um som começou a ser ouvido, e foi ficando mais, e mais alto.

— Daenerys se aproxima — disse Bran, ela se aproxima.

“Aproxima”, gritou o corvo de Jon. “Aproxima, aproxima”.

— Devemos ir vê-la — o rei do Norte disse. Os lordes se entreolharam, desgostosos com a ideia.

— Vamos seguir nosso rei — bradou Jon Umber. Os nortenhos bradaram em concordância. 

Os lordes do Vale e do Tridente não compartilhavam tal empolgação. Vendo aquilo, Edmure disse:

— Precisamos confiar no nosso rei. Por favor, milordes, eu acredito em Jon Stark, então, confiem em mim, como fizeram antes.

Os lordes do Tridente apenas assentiram, sem entusiasmo dos nortenhos. Os lordes do Vale permaneceram parados. Alguns até cruzaram os braços.

Vendo aquilo, Jon virou-se para Sansa, que permanecia sentada. Seu olho de obsidiana brilhava pelas chamas, furioso. Fixando o olhar nela.

— Venha comigo irmã — pediu ele, não como o seu rei, mas como o apelo de um irmão. — Por favor.

Sansa sentiu todos olhando para ela. negou com a cabeça.

— Não posso, Jon — disse ela. — Em tudo mais, sim, menos nessa… Nessa loucura. Não me peça para fazer isso.

Seu irmão fez uma carranca.

— Eu não preciso de sua aprovação — ele respondeu —, eu sou um rei.

Jon saiu do salão a passos largos, ressoando no chão de pedra vermelha.

Arya deu um rápido olhar de desaprovação à irmã e depois foi atrás do irmão, junto de Lorde Edric. Edmure e seu tio os seguiram. Todos os lordes da Tempestade, Norte e Tridente foram atrás. Alguns do vale também, mas não todos. Muitos permaneceram.

Eles me deixaram, pensou, amargurada, sentindo-se traída. Eu, que tanto lutei contra Daenerys, a assassina de nortenhos, que matou os amigos e familiares deles.

Jon Umber pegou o príncipe Bran pelos braços e o levantou.

— Vai fazer a escolha certa, irmã — seu irmão disse, sorrindo. — Sei que vai.

Quando muitos já haviam saído, Stannis permaneceu por um tempo, e os olhos azuis duros dele encontraram os olhos azuis e gentis de Sansa. Será que ele está do meu lado?

— Há muito tempo, em Winterfell, eu disse que você tinha material para uma rainha — ele lembrou. — Mas pelo visto, eu estava enganado; você não põe o povo em primeiro lugar. — O rei de coroa em forma de chamas deixou o salão, seguido por sua Mão do Rei e sua sacerdotisa.

Os lordes do Vale que restaram olharam para Sansa. Wylla, que ficou quando a irmã se foi junto dos outros, subiu no palanque e foi até a princesa.

— Não o escute, princesa — disse Wylla com convicção. — Você é perfeita para reinar e se importa com o povo!

Sansa deu um sorriso triste para a jovem ao ouvir aquilo.

— Estamos com você, princesa — disse Sor Roland. — Harry está preso, você é a regente do Vale. Seguiremos você.

— O povo de Winterfell também está com você — disse Wylla. — Eles sabem que você se importa com eles.

O povo…

Ela cuidou do povo do Norte enquanto Winterfell estava sem rei, cavalgou e ajudou a dar comida para eles na marcha para Correrrio. Lembrava-se de como eles estavam fracos, assustados, famintos, e com frio.

Sansa podia não gostar, mas não importava; sabia o que devia fazer.

 

X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X I X

 

Daenerys pousou Drogon no solo, perto do acampamento de Correrrio, a neve e a grama arderam sob os pés do imenso animal. Os cascos dos Dothraki batiam contra o chão de terra de forma selvagem, parecendo trovões. Milhões de cascos batiam contra o solo, assustando qualquer um que os ouvisse a quilômetros de distância.

Os cavalos pararam perto do dragão, não dando nem um trote a mais. Os montadores estavam agitados, gritando. Os relinchos e gritos ecoavam na mata escura. Benerro e Sor Jorah cavalgaram para perto da rainha.

Ao ver as luzes dos archotes que se aproximavam, Dany desceu do Drogon. Estava tensa. Não sabia o que poderia acontecer. Se algo desse errado…

O rei Jon e o Rei Stannis estavam à frente de todos que cavalgavam até perto do dragão, que rugiu ao vê-los aproximarem, assustando todos os cavalos. Alguns soldados seguraram os cabos das espadas e Dany pôde ouvir o raspar de aços contra o couro das bainhas.

Pelos deuses, rezou, que tudo dê certo. Eu sou o Sangue do dragão. Não devo ter medo. Devo ser forte.

Jon colocou o garanhão cinza a um galope mais a frente, apesar do desespero do animal. Desceu da sela e andou até a rainha.

Dany o encarou com o olhar violeta os olhos desiguais do filho de Ned Stark. ambos pareciam tensos. Sor Jorah deu um trote adiante, querendo ficar entre a rainha e o rei, mas Dany o parou com o olhar rápido e furioso. Stannis desceu da montaria e foi até Daenerys, ficando ao lado do rei do Norte. Ele em nada parecia impressionado com o dragão.

— Parem de drama — ralhou ele. — Vamos logo com essa baboseira.

Jon assentiu. Finalmente, os dois ajoelharam-se perante Dany. 

A rainha olhou para frente, para além deles. Vários lordes desciam das celas e iam para perto dela, ajoelhando-se, mas muitos outros permaneceram nos cavalos. Aquilo a deixou apreensiva; se os lordes não concordassem, talvez ela apenas causasse uma guerra civil entre os três reinos.

De repente, mais barulhos de cascos foram ouvidos, os homens deram espaço para a princesa do Norte, Sansa Stark, que avançava a galope entre eles, alta, com os cabelos esvoaçando e brilhando pelos archotes. 

Dany a olhou, apreensiva. Fechou as mãos e formou dois punhos, esperando para ver o que a irmã do rei Jon estaria tramando.

Sansa desceu da montaria e andou até o lado do irmão que permanecia ajoelhado. Parou, olhando para Daenerys. Era bem maior que a rainha, que era um pouco baixinha, enquanto a princesa era bem alta.

Um silêncio pairou por um tempo, enquanto as mulheres se entreolhavam.

Quando Daenerys pareceu prestes a falar algo, Sansa fez uma vénia profunda, abaixando a cabeça de forma profunda, e dizendo:

— Minha rainha — disse. — É uma grande honra para mim revê-la.

Dany sorriu.

— É uma honra para mim revê-la também, princesa. — Ajudou Sansa a se erguer e ambas deram um beijo nas bochechas. O rei Jon se levantou e ficou ao lado da rainha e segurou a mão dela.

Todos os lordes que pareciam apreensivos em dobrar os joelhos se olharam. Finalmente, eles desceram das montarias e dobraram os joelhos para a nova rainha.

Bran sorriu ao ver aquilo. Tudo estava indo como deveria ser. No fim, uma nova época iria se erguer para Westeros.

Uma pena que poucos iriam viver para ver aquilo acontecer.



X O X O X O X O X O X O X O X O X O X 

Lady Waynwood estava acordada, mas ainda sonolenta. Teve que tomar um remédio doce para dormir, a mando daquela maldita Stark. Ela iria pagar por isso. 

— Roland — ela chamou pelo, fracamente. — Roland, você está aí?

Nada. Onde estavam todos? Lembrava-se algumas pessoas terem entrado e revistado o quarto, mas estava sonolenta demais para falar algo… Ou teria sido um sonho?

Sua garganta estava seca. Lambeu os lábios enrugados e ressecados. Ainda estava tonta e molenga. Parecia um animal abatido e indefeso. Havia tijolos em seus pés, para aquecê-los, mas já estavam frios aquela altura.

Detestava sentir-se assim, tão frágil. Era uma mulher que sempre se orgulhara da boa saúde que tinha. E ainda era Lady de Waynwood, não podiam deixá-la de lado e esquecida naquela cama.

— Olá? — ela voltou a chamar por alguém. Quem quer que fosse. — Tenho sede… Alguém?

Teriam realmente esquecido-se dela?

De repente, uma mão grossa, com as costas peludas e cheia de calos grossos afastou as cortinas da cama dela e revelando um rapaz alto, com quase dois metros e bem musculoso. Os cabelos eram pretos como tinta, com alguns detalhes grisalhos, e olhos azuis intensos. Lembrava-a um pouco o rei Stannis. Mas o que mais chamava atenção era a ferida na bochecha esquerda: uma longa crosta de cascas vermelhas e negras.

Já vi esse rapaz em algum lugar…, pensou. Mas sua mente estava muito atordoada demais para conseguir pensar com clareza.

— Quer algo, M’lady? — o  rapaz perguntou. Tinha um jeito bruto de falar e um sotaque da baixada das pulgas.

— Água… Traga-me água…

O rapaz sorriu e esticou uma taça de estanho para ela, levando-a até os lábios da mulher. Lady Anya esticou o braço com uma pelanca pálida, para agarrar o objeto, enquanto o rapaz ajudava-a a erguer a cabeça, segurando sua nuca com a mão calosa e dura. Sorveu o líquido de forma um tanto desesperada, saboreando o gosto metálico e refrescando a garganta. Suspirou de forma pesada e prolongada, enquanto o rapaz pousava a pequena taça na mesa ao lado da cama.

— Onde está meu neto? — indagou a moça. Quando o rapaz não respondeu, ela perguntou novamente: — Onde está o meu neto, Sor Roland?

O rapaz deu de ombros. Anya franziu o cenho, irritada.

— Os tijolos em meus pés estão frios — reclamou. — Troque-os.

O rapaz estalou a língua, num tsc.

— Está demorando muito — ralhou o rapaz. Ele se abaixou para ajeitar o travesseiro dela.

— Não quero que arrume meu travesseiro! — ela disse, enquanto ele tirava o imenso travesseiro com penas de baixo da cabeça dela. — Eu disse que quero ver o meu…

Antes que pudesse terminar, tudo ficou escuro e ela sentiu algo comprimir-se contra seu rosto, de forma macia. Ela tentou falar, mas a voz saiu sufocada. De repente, uma pressão esmagadora recaiu sobre sua barriga, fazendo-a gritar, mas o som também saiu abafado. O ar era expelido de seus pulmões, contra sua vontade, enquanto a pressão contra a sua barriga aumentava. 

O rapaz estava-a tentando sufocar com o travesseiro.

Lady Anya tentou se contorcer, mas ele era muito mais forte, e ela estava fraca. Ela tentou, sem sucesso, tirar o travesseiro de cima de sua cabeça, mas não conseguiu, pois seu algoz o segurava com força. Um de seus braços estava preso, esmagado pela perna que pressionava o joelho contra a sua barriga, expelindo seu ar.

— Minha nossa, você não morre? — ralhou Gendry, sentindo os tapas débeis que a idosa dava contra a sua perna. O veneno da Arya havia demorado demais.

Seja pelo veneno ou pela sufocação, logo a velha parou de lutar.

Gendry esperou um pouco antes de tirar o travesseiro do rosto dela. Os olhos da falecida estavam abertos e a boca escancarada em uma expressão de puro horror. O cabelo grisalho estava trançado, mas havia saído um pouco da coifa de linho. O braço que havia se debatido contra a sua perna estava caído para fora da cama.

Levantou a cabeça, como fez antes para ajudar a idosa a beber, e encaixou o travesseiro embaixo dela. Fechou os olhos e a boca e colocou o cabelo dentro da coifa. Colocou as duas mãos da moça juntas. Fechou as cortinas da cama. Tinha que sair logo dali; não tardaria para todos voltarem lara o castelo.

Quando virou-se para sair dali, viu a pequena Doninha o olhando, e assustou-o por um instante. Quando se acalmou, Gendry sorriu e foi até ela. Agachou-se para ficar de altura um pouco menos contrastante com a dela.

— Olá, pequena — ele disse, sorrindo. — Estava ajudando a velha senhora a dormir.

Doninha, sem expressão, olhou para a cama onde estava Lady Anya. Não podia ver a mulher, pois estava coberta pelas cortinas brancas da cama.

Gendry estalou os dedos, fazendo-a voltar a olhar para ele.

— Ei, vamos para o seu quarto, está bem? — disse. — Vou contar uma história de ninar de cavalheiros para você, que tal? Ou podemos comer bons doces até Arya e o Ned voltar, hein? Que me diz?

A pequena o fitou em silêncio por um momento, mas, depois, assentiu. Gendry pegou a sua mão e a levou para longe dali, antes que alguém chegasse e os visse.

 


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