Os Sem Nome escrita por Trashcan Bin
Notas iniciais do capítulo
Isso é um teste, pretendo fazer mais capítulos, mas depende de muitas coisas. Espero que gostem!
Tóquio, Japão - 1973
Aisha estava varrendo um cômodo, e às vezes aquela mansão parecia ainda maior do que era. Hoje, ela imaginava, não seria uma noite muito fácil.
— Você não parece muito legal, está tudo bem? - disse outra empregada, que passava pano nos móveis.
— Ah, Kumiko, tudo bem, não é nada. Obrigada. - respondeu tentando dar um sorriso.
— Você prefere trocar? Eu varro e você passa o pano?
— Não, não precisa. Não podemos ficar enrolando também, ainda temos que trocar a roupa de cama…
— Olha, acho que não ajuda muito, mas ele mantém contato mesmo com as que engravidam. Pelo menos é o que dizem os porteiros. Que elas mandam cartas. Parece que ele manda dinheiro. Só não quer um escândalo nos jornais. É o que dizem. Mas não sei.
— Oi?
— Todo mundo sabe, Aisha. Todo mundo percebe. Mas ninguém faz nada, pelo menos motivo que você.
— Foi sempre assim?
— Acho que sim. Nunca comigo. Mas com outras sim. Tem algumas que ele só olha, tem outras que, bem, você sabe.
— Ainda sou das que ele só olha, mas não sei por quanto tempo.
O senhor Kido havia viajado para a Grécia, e a mansão era quase um paraíso sem ele, e sem Tatsumi. Duas semanas inteiras em que Aisha trabalhou sem sentir medo. Às vezes, tinha vontade de sair, largar tudo, mas não podia. Aquele emprego era a melhor chance de um rejeitado, e todas as outras mulheres dali sabiam disso. Não por menos, eram muito jovens. Um olhar estranho, um toque desconfortável, uma chamada para o quarto do patrão à noite, não era muito diferente do que poderia acontecer na rua. Para uma imigrante filha de refugiados, era o melhor que dava para ter com alguma dignidade… ou quase isso.
Era verdade que todas sabiam que acontecia, impossível seria não saber. Uma colega um dia falava que a menstruação atrasou, e semanas depois ela “sumia”. Diziam que voltou para a cidade natal, que quis tentar algo novo, mas era óbvio. Quando Mitsumasa começou com gracejos, com piadas que seu nome em japonês poderia significar “amada”, ela começou a ter medo. Com certa vergonha, assumiu para si o pequeno alívio de saber que, se acontecesse, não seria abandonada. Ou ao menos esperava que fosse verdade a história da colega.
— Aisha, Kumiko, terminem logo aí e desçam. Tokumaru ligou e logo devem chegar - Ryoko era a chefe das empregadas na mansão, e quem ficava responsável por organizar tudo quando Tatsumi estava fora.
— Certo, já vamos - as duas responderam.
*-/-/-/-/-*
Uma limusine estacionava na entrada da mansão. Todos os funcionários estavam enfileirados, formando um corredor de gente entre o carro e a porta de entrada, esperando a chegada do dono daquela casa. Quando ele desceu, todos fizeram uma reverência e disseram em uníssono:
— Seja bem-vindo de volta, senhor Kido.
Embora de cabeça baixa, Aisha não pode deixar de notar que o homem carregava um bebê no colo.
Ao chegar na porta, Mitsumasa disse:
— A partir de hoje, minha neta, Saori, vai morar comigo. Nos próximos dias, farei algumas mudanças no quarto que irá ser dela.
Uma… neta? Aisha sabia que o Kido deveria ter um monte de filhos, mas nunca ouvir falar de netos. Ao olhar a cara de Tatsumi, desistiu de fazer qualquer indagação.
*-/-/-/-/-*
— Quem será a amante grega dele?
— Eu sei lá, não sabia nem que ele tinha alguma filha ou filho com idade pra já terem filhos.
— Deve ser um caso muito antigo, por que será que nunca trouxe ela pra cá?
— Deve ser alguma prostituta de luxo, que pelo jeito teve filhos e algum deve ter seguido o mesmo caminho.
— Essa história é muito esquisita.
— Mas não dá pra dizer que a menina não é linda, né? Que sorte teve.
— Aposto que só adotou porque ela é branca de olho claro, se fosse filha de uma prostituta africana estaria passando fome nas ruas. Ele nunca trouxe os filhos das amantes negras pra casa.
— Nem das negras e nem de nenhuma outra. Nem das japonesas. É tão estranho.
As fofocas não paravam de correr entre as empregadas desde o retorno do Kido com a tal neta.
— Ei, vocês, do que estão falando?
— Não é nada, Tokumaru.
— Parem de fofocar e vão trabalhar. Aisha, o que está fazendo aqui? É seu turno e a senhorita Kido está chorando.
— Desculpe, eu vim fazer uma pausa. Acho que já é hora de mamar.
— E vocês, circulando, vamos.
— Sim senhor.
Aisha voltou para o quarto onde ficava a bebê, pegou-a no colo e deu seu peito. Era um pouco desconfortável, às vezes a bebê sugava de um jeito que doía mais do que quando dava de mamar para seu filho, parecia que Saori sugava como se fosse dona dela, como se merecesse todo o leite dentro dela, até a última gota. Aquela era uma das vezes difíceis.
— Sabe, senhorita Kido - era um pouco esquisito ter que chamar um bebê com tanta formalidade - desde que você veio para cá, o senhor Kido ficou diferente. Aqueles olhares, aqueles toques, pararam… e não foi só comigo. Às vezes parece que ele está se controlando.
Aisha havia ficado responsável por amamentar a bebê, junto com outra empregada imigrante. As duas foram escolhidas por terem filhos pequenos. Uma ficava durante o dia, e a outra no turno da noite. Elas faziam por vezes plantão para a outra poder descansar.
— Seja como for, não aconteceu mais. Se o preço para poder cuidar do Takeshi sem me preocupar forem as dores no peito, as noites de plantão dando de mamar, então tudo bem.
Saori parou de sugar, e Aisha sentiu uma calma que só sentia com aquela menina. Era como se o universo todo estivesse em paz. Era estranho, mas confortável.
— É por isso, senhorita Kido, que às vezes eu acho que você é mais que um bebê. Não sei o que você tem. O senhor Mitsumasa ficou distante, mas ele ficou mudado. Você é um milagre - ela disse, enquanto colocava a bebê de volta no berço.
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