Fúria escrita por alegrrdrgs


Capítulo 10
Capítulo 9 - Penélope (2022)




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"Your integrity makes me seem small

You paint dreamscapes on the wall

I talk shit with my friends

It's like I'm wasting your honor"

 

 

— Por que você foi embora antes? Vocês não eram noivos ou sei lá?

Giovanna estava genuinamente curiosa, não era uma acusação como seria se essas palavras viessem da boca de Marcos. Ela era só uma garota entediada, ávida por uma boa fofoca antes de ir pra escola.

— Porque a minha mãe morreu. 

Ela assentiu, concordando, como se entendesse. Como se essas poucas palavras explicassem tudo.

— Mas agora que você voltou, por que vocês não ficam juntos?

Penélope deu uma risada, em parte para disfarçar a vergonha e em parte porque Giovanna era muito cara de pau.

— Respeita a sua madrasta - ela revirou os olhos. - Eu e o seu pai... nós não éramos bons um para o outro como casal. Mas nós somos bons como amigos, então vamos continuar assim.

— Não eram bons como?

— Vai estudar, Giovanna. - a voz de Marcos as surpreendeu, vinda da sala. Quando entrou na cozinha ele sorriu para a filha, mas logo cerrou os olhos para ela - Para de ser fofoqueira. É assim que você pretende recuperar sua nota?

— Peut-on parler en français? - ela se esforçou para arriscar as palavras, a pronúncia terrível.

— Non, le cours est terminé.

Marcos sentou à mesa, ignorando os resmungos da filha. Tinha acabado de voltar do trabalho, e Giovanna estava revisando francês com Penélope antes de ir para a escola fazer a prova de recuperação. Ele estava cansado, com olheiras sob os olhos, e parecia chateado. Penélope pensou que ele estava mais bonito que nunca.

O médico serviu café para os três, bocejando de sono, e apagou o cigarro aceso de Penélope que repousava no pires que ela tinha escolhido como cinzeiro. Penélope não reclamou, porque precisava maneirar nos cigarros e só naquela manhã tinha fumado quatro.

— Essa criaturinha tá aprendendo de verdade, Penélope?

— Sim, mas só porque eu sou uma ótima professora.

Penélope tinha feito uma coisa ruim.

Ela disfarçou o nervosismo, mesmo acreditando que Marcos estava cansado demais para notar. Nas manhãs em que ele chegava do plantão, exausto, normalmente deixava Giovanna na escola, então voltava para casa e dormia boa parte da manhã. Ele tirava entre um e dois plantões na semana, e ficava em casa no dia seguinte.

— Eu posso levar ela na escola se você quiser - ofereceu. Não precisava fingir demais, porque ela realmente ficava preocupada quando ele dirigia depois de tanto tempo acordado.

— Tem certeza? Eu posso... - ele foi interrompido por mais um bocejo.

— Eu levo ela. Vai dormir. - Penélope ficou aliviada quando ele concordou, porque precisava do carro.

Marcos jogou fora o café que tinha servido para si, deu um beijo na cabeça de cada uma, distraído, e subiu as escadas. Penélope se sentiu culpada, mas engoliu o sentimento com o resto do café.

No carro, Giovanna arriscava frases em francês e Penélope corrigia quando necessário. Ela era boa, e em duas semanas estudando tinha aprendido muita coisa. Era inteligente, e lembrava muito a tia, que ainda não tinha dado notícia e começava a deixar Penélope preocupada. Marcos insistia que era normal, que Marina passava semanas sem fazer contato, mas ela tinha certeza que alguma coisa estava errada.

— Você tá super a fim do meu pai, né? - Giovanna comentou, olhando de canto de olho enquanto arrumava o cabelo no retrovisor.

Penélope riu.

— Você está obcecada pelo meu relacionamento com o seu pai, eu hein. Nós somos amigos, já falei milhões de vezes.

— Eu não sou obcecada - bufou - Eu só acho que... Sabe.

Arqueou as sobrancelhas, como se tivesse dito algo relevante.

— Acha o que?

— Que vocês ficam bem juntos, ora. Que ele também gosta de você e vocês são dois palermas.

— A vida é muito mais complicada que isso. Você é jovem demais pra entender. E não me chame de palerma. - tentou beliscar Giovanna, mas ela se esquivou, rindo

Penélope não sabia de onde tinha saído toda a sua paciência com Giovanna, logo ela que nunca tinha paciência com ninguém. Talvez fosse por ela ser filha de Marcos, ou talvez fosse o tempo que estavam passando juntas depois que Penélope começou a lhe ensinar.

"Ou...", Penélope pensou "Bem, você sabe exatamente o motivo de subitamente gostar de ficar bancando a mamãezinha."

— Essa é a pior desculpa que já inventaram.

Talvez fosse porque Penélope começou a se enxergar nela, como qualquer pessoa acabava se enxergando um pouco na juventude quando passava tempo demais com eles. O senso de liberdade, o jeito pouco complexo como enxergavam a vida. Ela também já tinha sido assim um dia.

— Vai estudar, garota - Penélope estacionou na esquina da escola, e se inclinou para abrir a porta para Giovanna antes que ela falasse mais alguma coisa. - É melhor você passar nessa prova, eu não vou bancar a professora de novo.

Giovanna fez uma careta lhe imitando, mas não era realmente uma ofensa.

Quando a filha de Marcos saiu do carro, Penélope ficou esperando ela entrar na escola. Quando ela entrou, Penélope suspirou.

Odiava ter que ir atrás de Iago. Odiava.

Mas já estava tentando contato com Franco há quase um mês, e não tinha conseguido. Tentou um email antigo, pois foi pelo instagram que Louis tinha descoberto sobre os dois da última vez. Para ela, isso indicava que precisava de um substituto. E Iago lhe ofereceu ajuda, além de ser a única outra pessoa ali disposta a lhe ajudar. Ela pegou o celular que Marcos tinha lhe presenteado pouco dias depois da ida ao shopping.

Ela tinha três úmeros naquele celular: o de Marcos, Giovanna e Iago. Tinha o de Franco também, mas não tinha coragem de mandar mensagem, sabia que Louis também veria e seria muito fácil de lhe rastrear.

Parecia uma traição abrir a conversa com Iago. Para ela, a sensação seria a mesma de convidar ele para jantar e então obrigar Marcos a cozinhar. Ela se sentia suja.

Mas se ela queria se vingar de Louis, esse era o caminho.

Penélope dirigiu para o endereço que ele tinha dado, indo parar num prédio novo em uma área rica da cidade, e com segurança estranhamente forte para que fosse apenas um condomínio. Ela estacionou o carro de Marcos na garagem depois de se identificar, se xingando mentalmente por não ter pensado em alterar a placa antes.

Uma mulher que parecia uma secretária lhe esperava em frente ao elevador. Ela tinha um tablet na mão, usava um conjuntinho social fora de moda, um sorriso falso e superior. Penélope tinha consciência da sua roupa sem grife, mas pelo menos não estava vestida com as blusas de Marcos. Sabia exatamente o que a mulher pensava pelo seu olhar: que ela era algum casinho de Iago, uma prostituta discreta que se vestia de maneira a não denunciar a profissão.

— A senhora é Penélope Bélanger? O senhor Santiago está esperando.

Penélope manteve a postura ereta, e então analisou a mulher dos pés à cabeça. Seu maior super-poder, a encarada que só ela sabia dar. A secretária tremeu.

— Sim. Me indique o caminho - Não era um pedido, e sim uma ordem.

Elas subiram o elevador em silêncio, parando no décimo andar. Penélope não ficou tão surpresa ao ver mais seguranças na porta do apartamento, carregando armas grandes e caras, cuja porta abriu num estrondo revelando Iago.

Ele usava roupa formal, como se estivesse a caminho do escritório e o encontro dos dois ali fosse apenas uma coincidência. Quando o segurança maior se precipitou na direção de Penélope para lhe revistar, ela deu dois passos para trás, o encarando furiosa.

Iago deu uma risada alta, achando graça.

— Tudo bem, JP. A Pê é minha amiga. Tratamento vip pra ela, ok?

Penélope odiava o ar risonho no rosto dos homens ali, como se ela tivesse ido até aquela casa para arrancar as roupas de Iago e transar com ele na sala, gemendo alto para todos ouvirem. Ela passou por eles, e Iago fechou a porta atrás de si.

— Gostou da casa? Bem melhor que aquele lugarzinho onde você tá ficando.

— Você me chamou pra debater decoração? Porque, pra ser sincera, eu faria uma ou duas coisas diferentes por aqui. - e era verdade, porque Penélope nunca tinha gostado de estilo industrial, como todo aquele alumínio e vidro.

Iago lhe olhou, sério. Já tinha mudado completamente de humor. Ela engoliu o nervosismo. Já tinha lidado com ele muitas vezes antes, aquilo não seria diferente.

Ele piscou, irritado.

— Por aqui.

O escritório tinha portas pesadas de madeira, e ele se jogou na cadeira atrás da mesa, com as pernas abertas e parecendo entediado. Um empregado fechou as portas, permanecendo do lado de fora. Penélope ficou em pé, não queria demorar mais que o necessário.

— Eu não achei o cara, Pê. Acho que ele não quer ser encontrado. O que você fez pra ele, hein? Mandou pra cadeia, igual fez comigo? Ele deve tá puto.

Penélope ficou grata pela blusa de mangas compridas, pois assim ele não percebeu seu arrepio. Talvez Louis tivesse feito alguma coisa, apesar das promessas de que não faria. Sua mente voltou para aquele dia fatídico, o rosto de Franco sangrando quando ele se afastou dela, deixou que Louis a levasse.

Talvez ela tivesse acabado com a vida dele. Talvez por isso ele não lhe respondia, por isso nem Iago conseguiu lhe encontrar. Talvez Franco estivesse morto. O pensamento lhe trouxe algum senso de justiça.

— Você não ficou preso nem por um dia. Até eu já fiquei na cadeia mais tempo que você.

— Por que quis, né? Podia ter ido embora comigo, mas quis ficar com o seu pobre de estimação. Esse Franco... Não vai me dizer que ele era seu namoradinho também - ele sorriu, um sorriso que ela odiava - Você é difícil, Pê, tem sempre uma fila. A minha chance vai voltar quando?

Penélope sorriu, como se fosse uma piada.

— Você sabe que nós somos amigos. Você quer estragar essa dinâmica?

— Eu ficaria muito feliz em estragar. Você tá gostando de brincar de família com aquele otário? A garota é gostosinha, isso eu vou admitir. Deve ter puxado pra mãe.

Penélope sentiu o sangue ferver ao lhe ouvir falar assim de Giovanna. A menina tinha apenas catorze anos.

— O que eu entendi de tudo isso é que você me ofereceu ajuda e então não conseguiu fazer nada por mim, e mesmo assim me pediu pra vir até aqui - ela sorriu, sem humor. - Você costumava ser mais competente. O seu cérebro derreteu pela quantidade de droga?

Os olhos dele faiscaram. Penélope podia ver a raiva neles.

— O que eu sei é que você ainda me deve pela última vez. Eu nunca recebi o meu pagamento.

— Encontra Franco pra mim, vivo ou morto, e eu te pago o que você quiser. 

— O meu preço é caro - avisou, se inclinando na cadeira. - Eu não ajudo qualquer um, sabe. Você é exceção. A gente tem história, não tem?

Penélope concordou.

— Como Mimi está?

— Ah, meio louca, sabe - ele fez uma careta de desdém, voltando a se jogar para trás na cadeira e fechando os olhos - Como sempre. Pelo menos deixou de ser sapatona, já que vai casar com o seu pai. Ele sabe que você voltou, ficou puto com a mesa quebrada.

Ela queria não ter sentido uma pontada quando Iago mencionou o seu pai. Eles não se falavam há anos, um relacionamento completamente rompido e amargurado.

— É verdade que você roubou um milhão dele quando foi embora? - ele lhe olhou com expectativa, como se duvidasse mas esperasse que fosse verdade - Depois que a sua mãe morreu?

— Eu sou filha dele, o dinheiro era meu - corrigiu - Considere um adiantamento de herança se quiser.

— Então quando o velho morrer você não brigar com a Mimi pela herança?

— Ele tem quatro filhas - bufou, - ela vai ter muita briga por herança.

Iago riu alto, batendo na mesa de maneira exagerada. Ele tinha o olhar desfocado, e Penélope se perguntou se ele tinha usado alguma coisa.

— Quer saber, Pê? Quando a hora chegar eu testemunho por você.

— Obrigada. Mas no momento eu não preciso do dinheiro do meu pai, eu preciso que você faça o que me prometeu que faria. Consegue isso ou não?

Ela já estava ficando sem paciência. Queria sair dali o mais rápido possível, voltar para a segurança da casa de Marcos. Até as besteiras que Giovanna falava seriam bem vindas, porque pelo menos lhe distraíam.

Iago lhe olhou sorrindo, mas havia algo de estranho no seu olhar.

— Qualquer coisa por você, Pê.

*

Quando Penélope voltou para casa, estava tudo silencioso. Ela não fez barulho, imaginando que Marcos estava dormindo. Quando subiu as escadas o encontrou no próprio quarto, cochilando com a porta aberta.

Ela parou ali um momento, o observando dormir. O quarto dele tinha paredes azul marinho, uma janela enorme e uma cama confortável. Era organizado, com poucas coisas fora do lugar. O completo oposto do quarto de Giovanna, do outro lado do corredor, que parecia sempre um cenário pós-furacão.

"As coisas poderiam ser diferentes. Tão, tão diferentes" pensou, não pela primeira vez, fechando os olhos.

Brincar de família, como Iago tinha dito. Ele tinha razão em relação a isso, não tinha? Era o que ela estava fazendo. Penélope podia facilmente se deixar levar pela imaginação e fingir que eram um casal, criando uma filha juntos. Ela levando a garota na escola e voltando para casa para se deitar ao lado dele no quarto mal iluminado, uma família comum e feliz.

Ela poderia ter tido aquilo. Eles poderiam ter tido. Uma existência tranquila e descomplicada, com muito amor. Tanto amor que seria ridículo, um comercial de margarina, uma novela das 19h.

— Ei - ele falou para ela da cama, sonolento - Você demorou. Eu já tava ficando preocupado.

— Eu posso ver o quanto - ela sorriu, indicando a cama. Marcos sorriu brevemente, olhando no relógio. Ainda era cedo, e ele se jogou novamente contra o travesseiro. Seu rosto amassado de sono era um encanto a parte.

— Eu passei a noite toda em cirurgia, um garotinho foi atropelado... Ele não resistiu. É uma merda, sabe? Odeio quando isso acontece - desabafou.

Penélope não sabia como o consolar então se aproximou, sentando ao lado dele na cama, e segurou a sua mão.

— Faz parte, não é? Todo médico passa por isso.

— É - concordou, ainda parecendo chateado - Mas eu queria que não fizesse.

— Eu sempre disse que você era bonzinho demais para ser médico. - ela sorriu, carinhosa, e um sorriso cansado se espelhou no rosto dele. Ele hesitou por um momento, como se pensando em falar alguma coisa. Finalmente, ele disse:

— Isso não te impediu de pagar a minha faculdade, não é?

Penélope soltou a sua mão, sentindo o rosto ficar vermelho. Depois de um mês ao lado dele sem que Marcos trouxesse o assunto a tona, ela realmente achou que ele deixaria para lá.

— Marcos...

— Obrigado, a propósito. Quer dizer, eu teria preferido que você não tivesse feito isso como um presente de despedida. Mas me ajudou muito - ele entrelaçou os dedos nos dela novamente, e Penélope encarou suas mãos juntas ali, sem conseguir olhar para ele.

— Eu não achei que você fosse aceitar - sussurrou, se sentindo tola. Não queria falar sobre aquilo, não queria relembrar aquele último dia. - E... Eu não tive coragem de me despedir. 

— Eu não usei o dinheiro por meses - confessou, sua voz mais baixa e trêmula, mas Penélope ainda podia sentir o olhar dele nela - Eu... Eu achei que você fosse voltar, e eu poderia te devolver. Mas Marina me convenceu. Nós alugamos um apartamento, saímos da casa da nossa mãe. Foi um puta reviravolta na nossa vida, finalmente livres dos nossos pais e eu odiava cada parte. Você entende isso? - ela se obrigou a olhar para ele, mas não estava preparada para a intensidade do seu olhar - Você entende que eu finalmente estava livre do meu pai, estudando e vivendo a minha vida, e eu odiava cada parte disso? Eu odiava porque você tinha ido embora. Porque eu fui obrigado a repensar uma vida para mim mesmo que não envolvia você.

Quando Penélope falou, até ela se surpreendeu pela dor na sua voz, pela vontade que tinha de chorar nos braços dele de novo.

— Eu me sentia culpada, Marcos. Por tudo. Eu sei que eu não fui fácil, que eu fiz mais mal que bem, que eu não fui uma boa filha, uma boa irmã, namorada e nem uma boa amiga. Eu tinha um milhão de defeitos e você aceitou todos eles, e mesmo assim eu... - Penélope desviou o olhar, encarando a cortina iluminada pelo sol -  Eu só conseguia pensar em como eu era um peso pra todo mundo, e como eu ia te puxar pra baixo também. Tudo que a sua mãe dizia, que todo mundo dizia, de como você merecia alguém melhor que eu, e era verdade. Eu só não queria ficar aqui, minha família me odiava, e estava atrapalhando você.

Marcos arfou, indignado. Daquela vez Penélope não se retraiu quando ele segurou seu rosto entre as mãos, a obrigando a olhar para ele e sustentar seu olhar incrédulo.

— Me atrapalhar? Você era o amor da minha vida, Penélope. Você era tudo pra mim.

— Eu não me arrependo de nada - afirmou, ignorando o que o rosto dele tão próximo do seu, ou a sinceridade das suas palavras causava nela. - Eu não me arrependo de nada porque você construiu tanta coisa, e eu tenho tanto orgulho disso. Eles estavam certos, a melhor coisa que eu pude fazer por você foi ter ido embora. O lance da faculdade foi só um empurrãozinho a mais, todo o resto foi você. Olha a bagunça que a minha vida é, Marcos, e olha como a sua é estruturada. Isso só prova que eu fiz a coisa certa. Você merecia mais, e você teve mais.

Marcos comprimiu os lábios, como se quisesse falar algo. Eles estavam tão próximos que ela poderia se inclinar e sua boca tocaria a dele, mas ele tinha dito para ela que não a beijaria de novo, então ela não se inclinou.

— Eu não queria mais, eu queria você. Você era o suficiente. Nós podíamos ter tido uma vida juntos. 

— Você ficou melhor sem mim - insistiu, querendo ignorar o que as palavras dele causaram nela. 

— Melhor sem você? - havia desafio na sua voz agora, um tom de irritação - Você realmente acredita nisso? Porra, Penélope...

O coração de Penélope acelerou, e ela queria responder mas palavras não pareciam o suficiente. Antes que ela falasse o que tinha a dizer, antes que pudesse mudar de ideia e se jogar sobre ele novamente, como tinha feito naquela primeira noite, o celular tocou, assustando os dois. Era uma chamada de vídeo, e o nome de Marina brilhava na tela.

Penélope sentiu tanto alívio que era como se ela estivesse vendo a ex-cunhada desviar de uma bala. Marcos também pareceu aliviado, relaxando quando atendeu a irmã.

O rosto bronzeado de Marina apareceu na tela, parecendo preocupado.

— Marcos. - a voz dela denunciava preocupação. Penélope grudou o rosto no de Marcos, ávida por receber notícias. Atrás de Marina uma janela mostrava diversas tendas e um sol alto.

— Eu estou tentando falar com você há semanas - reclamou, o mesmo tom de irmão mais velho que Penélope tinha ouvido pela primeira vez anos atrás, no banco de carona do carro dele. - Achei que tinha morrido. Custa mandar notícias?

— Eu sei, eu sei, desculpe. Eu não estava no acampamento, estava no navio e o sinal era terrível, depois tivemos uns problemas com a guarda costeira líbia, cheguei hoje... Penélope - seu tom de voz baixou, quase um sussurro. Ela estava visivelmente preocupada - Tem um homem aqui atrás de você. Me falaram que não é a primeira vez que ele aparece, tem vindo aqui e perguntado por você.

Penélope sentiu o seu coração acelerar, e esperou que estivesse conseguindo disfarçar o nervosismo. Era Louis. Com toda certeza, era Louis. Ele estava seguindo os seus passos, lhe caçando, e estava perto de lhe encontrar.

Ela ainda não estava pronta. Ela ainda não podia ir até ele, não sem Franco. Não quando todo o seu dinheiro estava nas mãos dele.

Marcos apoiou o celular nos travesseiros, ignorando Marina quando ela continuou falando, e tocou sua cintura.

— Penélope? Penélope, olha para mim. - ela olhou, mas era como se não o visse. Não com a sua cabeça tão cheia de pensamentos borbulhantes como lava, não com a ameaça de Louis sobre ela. - Vai ficar tudo bem, fica calma. Ok? Ele não tem como saber que você está aqui.

Ela balançou a cabeça, tentando se concentrar. Agarrou o celular de Marcos com força, encarando Marina e a sua própria imagem desnorteada na tela.

— Me mostra ele. Você consegue filmar sem ele perceber?

Marina olhou ao redor, pensando, e então concordou com a cabeça. Ela clicou na tela, mudando a câmera, e então começou a andar para fora de onde estava.

— Aqui ficam as barracas. - ela falou alto, como se estivesse gravando um vídeo, e mostrou uma parte do acampamento - Ficam duas famílias por barraca, mas se forem famílias pequenas ficam até três.

A imagem começou a travar, provavelmente porque ela estava se afastando do roteador, e Penélope prendeu a respiração, nervosa. Ela apertou as mãos de Marcos com tanta força que sabia que estava machucando, mas ele não reclamou.

— Por aqui tem... Os... Eiros... - A imagem tremeu mais, a voz de Marina saindo entrecortada. Ela filmava um grupo de pessoas conversando, entre eles um homem alto e magro, vestido de preto. Ele tinha uma expressão preocupada que ela tinha visto pouquíssimas vezes, e parecia ter um conversa séria.

Mesmo com a imagem ruim, Penélope sabia bem quem ele era.

E então, como para que suas dúvidas fossem confirmadas, a imagem ficou novamente boa quando Marina se aproximou do prédio em frente ao qual o grupo conversava.

— ... e este é o prédio de alojamento dos voluntários - sua voz disse.

Os olhos azuis dele encaram Marina por um momento, curiosos, antes de se voltar para o seu grupo. Dois homens o acompanhavam, ela percebeu. Penélope reconhecia os seguranças de Louis, mesmo que não lembrasse os nomes.

Ao entrar no prédio, após se afastar o suficiente, Marina voltou a câmera ao normal e encarou os dois, ainda visivelmente preocupada.

— Você conseguiu ver? Acho que não consigo voltar lá sem dar muito na telha.

Penélope concordou com a cabeça, sentindo que conseguia finalmente voltar a respirar.

Não era Louis quem estava no acampamento, lhe caçando. Era Franco.


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Notas finais do capítulo

O Franco tá chegando! Quem vocês acham que ele é? Façam as suas apostas!

Não esqueçam de comentar e curtir, e o próximo capítulo deve sair ainda essa semana ♥



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