Eu no seu lugar escrita por annaoneannatwo


Capítulo 32
Regras: não há regras




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Katsuki teve alta no sábado à tarde, a Recovery Girl fez uma última avaliação e concluiu que tava tudo certo. Graças ao poder de cura dela, os ferimentos se fecharam e as cicatrizes começaram a se formar. Ele não quis ver, não só porque nem fodendo que ia ficar se olhando sem blusa na frente de um espelho, mas também porque… ele não quer se lembrar do tamanho da merda que isso foi. 

Katsuki conseguiu sentí-las ao tocá-las brevemente, protuberâncias borbulhando nessas costas macias e fortes. Tsk, mesmo quando ele voltar pro próprio corpo, não vai conseguir esquecer disso, imagina ela que vai ver essa merda sempre que tirar a roupa e se lembrar do quão escroto e imbecil ele é. 

Mas é melhor assim, Katsuki nunca teve problema pra lidar com gente que o odeia, ela vai ser só mais uma. Pelo menos a Uraraka já entendeu e não foi tão simpática, doce e gentil na última vez em que eles se viram. E logo ela nem vai ligar, ocupada demais com o Deku, e ai daquele nerd maldito se não deixá-la feliz como ela merece.

“Quanto antes tudo isso acabar, melhor.” Como sempre, ela tá certa. E “antes” não vai demorar. Assim que Katsuki foi liberado, o Aizawa marcou uma reunião com os pais dele e os dela, explicou sobre a individualidade da Menina Unicórnio e marcou a data para levá-los até o instituto de pesquisas da U.A.: essa segunda, depois de amanhã. 

Ele ainda passou um monte de instruções sobre o sigilo da coisa toda, explicou que todo mundo que sabe da troca de corpos assinou um termo de confidencialidade: o cagueta dos tentáculos, o Meio a Meio, a Rabo de Cavalo, o Deku maldito e o Kirishima não vão poder falar sobre isso, o Fita Crepe e o Pikachu… são burros demais pra terem percebido alguma coisa, então o segredo tá bem guardado. 

Depois que a reunião acabou, o Aizawa recomendou que ele e a Ochako passassem o fim de semana com os pais — os de verdade — e, pela primeira vez em muito tempo, ele ficou aliviado em ir pra casa, sentindo que se ficasse sozinho, ia ficar puxando o celular toda hora e tentar mandar mensagem pra ela. Pra quê? Pra perguntar se ela tá com medo? Pra pedir desculpas por ter sido um babaca na frente dos pais dela? Pra dizer que a ama? Tsk, idiota!

É melhor ele ir pra casa, aí a velha louca vai encher o saco, ele vai ficar puto e ter a chance de descontar toda essa raiva e frustração crescendo dentro de si.

Ou foi o que Katsuki pensou, porque o sábado passou, amanheceu o domingo, e a vaca não deu um berro sequer, até trouxe jantar pra ele no quarto ontem à noite e perguntou o que ele ia querer no café-da-manhã, é quase como se ela tivesse sendo… legal, se isso não fosse uma ideia absurda.

Com certeza uma ideia absurda quando ela aparece no quarto e arreganha a janela, fazendo os raios solares invadirem o ambiente.

— Anda, bota uma roupa decente que você tem visita.

— Pode mandar embora, não quero ver ninguém.

— Eu não tô pedindo, eu tô mandando, Katsuki. Cobre essas pernas aí porque a visita é menino.

— Eu não vou cobrir porra nenhuma, tá um calor do caralho! E o Kirishima nem gosta dessas coisas mesmo.

— Não é o Kirishima-kun.

— Porra, quem é então?

— Sou eu, Kacchan. — a cabeça do nerd brota na porta, e a reação imediata dele é pegar um travesseiro e esconder as pernas. Todos os pijamas dela são perigosamente curtos, ele meio que já se acostumou, mas o Deku nunca deve ter visto tanta pele dela à mostra, e se depender de Katsuki, nem vai — Desculpe já ir entrando, sua mãe falou que não tinha problema...

— E não tem mesmo, meu bem, os Midoriya são sempre bem-vindos! — a velha dá aquele sorriso de cobra dela — Fica à vontade, querido, quer beber alguma coisa?

— Não, não, obrigado! Eu… hã…

— Ele quer conversar comigo, velha, se manca e vaza daqui! — ele rosna, a velha o olha feio e sai resmungando, ela deve estar louca pra descer a porrada nele, mas não pode porque não quer machucar esse corpo… lindo, mesmo ferido, é lindo… perfeito! — Desembucha pra você sumir daqui logo também, Deku.

— Ah, sim! Eu… vou ser rápido, Kacchan. Nem posso ficar muito, tenho um monte de coisa pra fazer, e minha punição começa amanhã cedo. — ah é, o castigo deles por terem sido cúmplices. Segundo o Kirishima, eles vão ter que fazer o café da manhã de toda a classe e limpar a área de convivência dos dormitórios. Saiu barato se for comparar com ele e a Ochako, que vão perder as férias de verão inteiras fazendo prova — Como estão as costas?

— Como você acha que iam estar depois de levar uma sapecada de uma água-viva gigante? Tsk, se for ela que quer saber, fala que não tá ardendo mais, e ela tem uma consulta com um dermatologista na quinta de manhã pra ver se dá pra diminuir as cicatrizes.

— Ah sim, vou falar pra ela! É que o Iida-kun e as meninas tão preocupados, e ela não sabe o que responder, ela não sabe nem o que pode e o que não pode falar…

— O Aizawa falou que ia mandar um recado sobre mim e ela, que a gente tá bem, mas por motivo de segurança ou alguma merda assim, não vamo poder ir na aula essa semana.

— Entendi… não vai diminuir a curiosidade do pessoal, mas pelo menos diminui a desconfiança, né? Acho que a Tsuyu-chan e o Iida-kun já tavam começando a suspeitar de vocês… ah, mas não se preocupe! Eu já… os despistei.

— Tsk, é bom mesmo! — os dois ficam em silêncio, esse nerd não falou que ia ser rápido?

— Mas sabe, independente de qual fosse a suspeita deles, eles não diriam nada, eles… confiam muito na Uraraka-san. Claro, não tem como não confiar nela, né? — É — Ela é uma pessoa incrível, às vezes é difícil olhá-la diretamente, parece que ela brilha como o sol! — o nerd sorri com a cara vermelha, que porra, esse moleque veio aqui pra ficar falando o óbvio?

— Fala logo o que você quer aqui, caralho!

— Ah sim! Hã… aqui! — o nerd fuça na mochila e saca umas folhas de papel dobradas — Eu vim aqui pra te dar isso, Kacchan!

— Que merda é essa daí? — ele olha pro papel desconfiadamente.

— Bom, não sei se você notou, com certeza deve ter notado, mas quando eu te entreguei os cadernos sobre você e a Uraraka-san, faltavam algumas páginas no dela. Eu… escrevi no primeiro ano, ela sempre pareceu envergonhada por saber que eu fiz anotações sobre ela, então nunca mostrei, e… b-bom, a-acho que isso acabou me encorajando a escrever umas coisas que não são bem sobre a individualidade dela… — ele desvia o olhar — Tive que arrancá-las quando ela… bom, na verdade era você, Kacchan, veio me pedir os cadernos, não queria deixá-la desconfortável…

— Quê? Que merda você escreveu aí, seu maldito? — ele arranca as páginas da mão dele, desdobrando-as e correndo os olhos rapidamente.

“Comida favorita: mochi. (o ichigo daifuku é o preferido). Quando ela tá distraída, fica enrolando o lápis nas mechas mais compridas do cabelo e faz biquinho. Ela vive dizendo que é desengonçada, mas sabe dançar, eu percebi quando a vi tentando convencer a Tsuyu-chan a ir com ela naqueles videogames de dança. Ela tem sardas bem clarinhas no nariz, é muito difícil de ver, tem que chegar bem perto. Ela prefere os gatos, mas os cachorros a adoram, sempre que a gente passa por um na rua, ele acaba seguindo-a. Ela adora flores, mas não como presente, ela deve achar que são caras demais e que não é legal cortar as plantinhas. A Sailor favorita dela é a Júpiter.”

— Que porra… que porra é essa, Deku?

— São várias coisas que eu percebi nela e acho… fascinantes.

— Que doente! Por que caralhos você tá me dando isso?

— Achei que você poderia fazer bom uso delas, Kacchan. — ele sorri, mas logo fica sério — Você me perguntou o que eu quero, e eu respondi: eu quero que ela seja feliz.

— Porra, então… tá fazendo o quê aqui? Vai lá ficar com ela, a gente vai destrocar amanhã. Ela deve tá apavorada, precisando conversar-

— Não sou eu quem ela quer, Kacchan. — ele o interrompe, esse moleque é maluco? — Sabe, quando os rumores sobre vocês estarem juntos começaram a surgir, eu não queria acreditar. Eu realmente achei que o pessoal estava vendo o que queria ver, mas você me contou o que tava acontecendo de verdade, e depois dali eu comecei a perceber. Os olhares, os sorrisos, a facilidade que ela tem pra te entender, o jeito que você a protege… eu vi quando ela te beijou no rosto antes de vocês se separarem pra enfrentar a água-viva. Ela… não me ama mais, Kacchan, pelo menos não desse jeito.

Que porra esse nerd tá falando? Mas é um inútil do caralho mesmo! Fica aqui falando merda ao invés de ir atrás dela pra ajudá-la no que precisa, ela já não pode ver o Quatro-Olhos e a Menina Sapo, então só tem ele de amigo próximo pra conversar, pra consolá-la pela babaquice dele.

— Você é um imbecil, Deku! Eu só- Eu só não mandei tudo isso à merda porque achei que você estaria lá com ela pra fazê-la esquecer dessa porra toda!

— O imbecil aqui é você se acha que ela vai simplesmente se esquecer disso tudo, Kacchan! Ela te adora, você precisava ver o brilho no olhar dela quando viu que tirou a maior nota da sala na prova do All Might, tudo que ela queria era mostrar pra você, eu nunca a vi tão… apaixonada por algo como ela é quando você está envolvido, não importa como.

— O que você tá falando, seu bosta? Que ela tá… ap-apaixonada por mim? Vai se foder, não tem nada a ver!

— Você nunca vai saber se ficar enfiado no quarto fazendo pirraça, Kacchan!

— Fazendo o quê?

— Você me ouviu, PIRRAÇA!

— Morre, Deku! O que é que você sabe sobre mim? Você é mesmo frouxo a esse ponto de ficar tentando empurrá-la pra mim? E se eu for um tarado? Eu tô no corpo dela, se eu quiser, eu arranco essa roupa na frente do espelho e encosto onde me der na telha, quem te garante que eu já não fiz isso? — ele se aproxima, esperando o nerd recuar, mas pra surpresa dele, o desgraçado dá um passo à frente também.

— Você tá tentando me irritar, mas não vai conseguir, Kacchan! Você nunca faria isso com ela!

— Não mesmo, porque EU AMO AQUELA MENINA, PORRA! — os dois se encaram com olhos arregalados — E eu… só faço mal pra ela, as costas são a prova.

— Não tem como você afirmar isso se não falar com ela. Você não quer vê-la feliz também?

— Porra, mais do que tudo!

— Pois é, ela não tá feliz agora, e não tem nada que eu possa fazer pra ajudá-la, talvez eu… pudesse tentar antes, mas… não seria justo nem com ela nem comigo. Eu a amo também, mas… não do jeito que ela precisa. Então… v-você tem tudo, Kacchan, você a ama, quer estar com ela do mesmo jeito que ela quer estar com você e… é a única pessoa que eu sei que vai fazê-la feliz como ela merece. Era só isso que eu queria falar, até mais. — e com isso, o nerd sai em disparada pela porta. Já ele fica lá, contemplando os papéis que o Deku lhe entregou, e é esquisito pra porra como Katsuki percebeu quase todas as mesmas coisas que estão escritas aqui.

— Tô saindo. Não sei que horas vou voltar. — ele vai até o estúdio do velho, que tá assobiando enquanto rabisca tranquilamente em um papel.

— Precisa de carona?

— Não… valeu.

— Certo, sua mãe fez um lanchinho pra você levar, não se esqueça de pegar com ela. — ele sorri brevemente enquanto ajusta os óculos.

***

 

Ochako acordou bem tarde, mas ao se levantar, parece que não dormiu nada, ela se sente cansada, os olhos não param de lacrimejar e as pernas parecem pesadas. Ela queria tanto ter acordado cedo e ajudado a mãe a fazer o café, é tão raro ter esses momentos com os pais dela, ainda mais nas pouquíssimas ocasiões que eles vêm visitá-la, o que só a faz se sentir mais culpada. Eles não estão aqui para fazer uma mera visita, mas sim para cuidar dela como se ela fosse criança. Talvez parte sua ainda seja, o que é um luxo ao qual ela não tem direito.

— Ok, fica paradinha. — o pai dela fala baixinho enquanto passa a lâmina cuidadosamente por debaixo do pescoço — E… pronto, rosto lisinho, a barba do seu amigo é bem clara e ralinha, nem aparece muito.

— Sim… — ela responde mecanicamente. O Bakugou não lhe ensinou a se barbear, e, pensando bem, talvez tenha sido melhor assim, imagina ter que ficar tão perto dele, olhando-o diretamente e sentindo as pontas dos dedos correndo pelo rosto dela com delicadeza. Teria sido outro momento que faria o coração dela bater mais forte na hora, mas que apenas a faria se sentir enjoada quando ela se lembrasse depois, assim como as vezes que eles se abraçaram, e a expressão dele quando ela o beijou na bochecha… foi ótimo na hora, mas agora Ochako só consegue pensar o quanto entendeu tudo errado.

— Então… você não quis tomar café-da-manhã?

— Não tava com fome…

— Não consigo imaginar como, se você não jantou ontem à noite. — o pai dela sorri, mas ela consegue perceber o tom de preocupação — Você precisa comer, filha, se não vai acabar passando mal. Não só por você, mas também por esse corpo aí, você quer devolver o corpo dele em boas condições, não quer? — ela acena com a cabeça — Ele deu notícias?

— O Deku-kun acabou de me mandar mensagem, eles moram na mesma vizinhança, então ele foi dar uma conferida, parece que as cicatrizes já se formaram, um dermatologista vai lá na escola na quinta para dar uma olhada…

— O garoto não teve a decência de te falar isso ele mesmo?

— Ele não quer falar comigo. Tudo bem, acho que eu também não quero falar com ele agora… — ela abaixa a cabeça.

— Então, por que você está tão triste?

— Hã? Eu não… eu não tô triste, papai, não se preocupe. — ela se esforça para dar um sorriso, seu pai a encara com atenção e se lança pra frente, abraçando-a.

— Você é muito forte, Ochako, mas isso não significa que você não pode pedir ajuda para nós quando precisa.

— Eu só não quero deixar vocês preocupados, vocês… confiam tanto em mim para me deixar morar sozinha, tão longe de vocês e eu… olha o que eu faço, papai. — ela o aperta um pouquinho mais antes de soltá-lo.

— Querida, você vai cometer alguns erros, isso é inevitável, o que não pode acontecer é você achar que tem que carregar todo esse fardo sozinha. Você está crescendo, Ochako, mas aos meus olhos, você vai ser sempre minha menininha, e sempre que eu puder, eu vou ajudar minha menininha, eu e sua mãe estamos aqui pra você, sempre estaremos, mesmo quando você… estiver parecendo um meninão. — ela ri por entre os olhos marejados — Quer dizer, tem certeza que esse menino tem mesmo sua idade? Ele tem mais músculo que eu!

— Ah, ele treina igual a um louco pra ficar assim, você não tem ideia, papai! — ela sorri preguiçosamente — Muita gente acha que ele é um metido que nasceu com uma individualidade boa, mas o Katsuki-kun se esforça muito pra ser tudo que ele é, chega a ser… inspirador o quanto ele é dedicado. Eu… tenho muito a aprender com ele se quiser realizar meus sonhos.

— Você vai realizar seus sonhos, querida.

— Ele me disse a mesma coisa. — ela morde o lábio, tentando entender como ele pode ter mudado tanto de comportamento em menos de dois dias.

Ochako deveria estar aliviada, há uma grande possibilidade de isso tudo acabar amanhã e, olha só, ela não disse que o amava, a dignidade dela continua intacta, tudo que resta é seguir em frente e esquecer que isso tudo aconteceu. Então… por que ela não consegue? Por que ela sente que vai deixar algo inacabado?

— É, bom… ele deve ter dito isso porque é o que você queria ouvir, me parece que ele disse e fez muitas coisas pra te convencer a continuar com ele nessa… loucura toda.

— É, ele… disse que eu ia realizar meus sonhos do jeito mais… grosso e inapropriado possível, porque ele é assim, rude, inconveniente, afobado, mas… ele não é mentiroso, papai, e é por isso que… — por isso que Ochako sente que ele não foi sincero aquele dia na enfermaria, é isso que tá inacabado, ela precisa saber porque ele disse aquelas coisas cruéis que não combinam nada com ele.

— Por isso que?

— Por isso que… — ela precisa falar com ele, pô-lo contra a parede. Ochako sai do banheiro e corre até o quarto para se trocar.

— Ochako? — o pai dela pergunta, mas ela só se concentra em não olhar pro espelho na porta do guarda-roupa. Ela consegue ouvir a mãe falando algo como “Deixa ela…” e internamente agradece por, mesmo ela não parecer uma menina agora, ela e a mãe continuarem compartilhando essa conexão que só uma mãe pode ter com uma filha.

— Eu… tô muito feliz que vocês estão aqui, de verdade, por isso que não vou demorar, vou voltar logo! Meu castigo só começa amanhã, então não deve ter problema, eu... — Ochako sente que está dizendo isso tudo mais pra si mesma do que para eles, quando dá de cara com a mãe na cozinha.

— Tudo bem, pode ir. Leva um lanchinho. — ela sorri serenamente enquanto entrega um bentô pra ela.

— Mamãe… — ela sente que vai chorar, então dá um abraço bem forte nela. A mãe faz um carinho nesse cabelo loiro bagunçado como se não fosse a primeira vez que abraça esse corpo — Eu volto já…

Ochako corre até a porta e assim que a abre, recua ao dar de cara consigo mesma, olhos arregalados e a mão estendida, como quem ia tocar a campainha.

— K-Katsuki-kun?

 

***

Katsuki tá fodido. O que dá na cabeça dele toda vez que essa menina tá por perto? A ideia era simples, era chegar na casa dela e pedir pra trocar uma ideia, torcendo pra ela não querer descer a porrada nele depois do jeito que ele a tratou na última vez que eles se viram, mas foi ela botar a cara na porta na hora em que ele ia tocar a campainha e é como se tudo que ele planejava falar tivesse evaporado do cérebro, então ele a chamou pra sair de lá, e ELA VEIO, acenou com a cabeça, deu um tchauzinho pro pai e pra mãe e mandou um “Vamos, então?”. Vamos, porra, pra onde? Ele não tem ideia.

É só quando eles tão no metrô que Katsuki se liga que acabou pegando o caminho que costuma fazer pra ir pras montanhas fazer trilha e escalada, ele não trouxe nada de equipamento, então os dois vão acabar ficando pelo parque, a essa hora não vai ter quase ninguém, que bosta! 

Como caralhos ele vai ficar sozinho com ela e conseguir ficar de boa? O coração dele tá quase pulando pela garganta, as mãos estão suadas e pra ajudar, esse cérebro que nem é dele fica repetindo tudo o que o merdinha do Deku falou, isso e aquele maldito beijo na bochecha, e o jeito que ela passou por cima dos próprios velhos pra defendê-lo. Porra, ele é inteligente pra caralho, é um dos melhores alunos da escola inteira, e ainda assim não consegue entender o que essa menina tem na cabeça e porque toda vez que ele decide que vai mandar tudo isso se foder e esquecer que gosta dela, ela vem e o faz se apaixonar de novo e de novo. Katsuki já tava se conformando que ela ia acabar com o nerd, isso seria fácil, mas o nerd acha que ela não quer mais saber dele? Que porra isso tudo significa?

Então, quando os dois acabam sentados em um tronco caído depois de andar um pouco pelo parque adentro, Katsuki só torce pra que ela não escute o quão alto o coração dele tá batendo.

— E aí? Seus pais estranharam muito de ter você em casa desse jeito? — ela quebra o gelo, lógico, porque se depender dele…

— Tsk, a velha queria porque queria me fazer experimentar uns vestidos que ela fez. Aquela cretina nem disfarça, eu sempre soube que ela queria ter parido uma menina. — ela dá uma risadinha, e só aí ele percebe o quanto tava com saudade de fazê-la rir.

— Bom, tá melhor que meus pais, pelo menos. Ontem, na hora que eu saí do banho, eles acharam que tinha um estranho na casa, eu cheguei na cozinha e minha mãe pegou a frigideira pra me bater, acredita? — ela ri, ele balança a cabeça, imaginando a cena — Katsuki-kun, o que a gente tá fazendo? — a Ochako fica séria e o olha diretamente — Por que a gente tá conversando de boa depois daquilo?

— V-você que puxou assunto. — ele diz, na defensiva.

— Porque você sentou aí e ficou quieto, depois de já ter ficado quieto o caminho todo pra cá! Você… eu sei que você não é o babaca que todo mundo acha que você é, mesmo que às vezes você se esforce muito pra ser. — ela o encara sem piscar, mas ele percebe que a mão dela tá ligeiramente trêmula.

— Tsk, você parece ter muita certeza disso, mas o que você sabe de verdade sobre mim, Cara de Lua?

— O que eu sei? Que você tem uma caligrafia linda, eu sei que você tem um pouquinho de cegueira noturna e precisa usar óculos à noite, eu sei que você torce muito pro sucesso e felicidade do Kirishima-kun, e que usa o Deku-kun como parâmetro pra ver o quanto você ainda tem que crescer e melhorar. Eu sei que você se importa demais com o que pensam de você, muito mais do que parece, e que você se apega a detalhes pequenos como a cor favorita de alguém. E eu sei que quando eu tô perto de você, eu fico corajosa, a ponto de falar isso tudo sem gaguejar ou ficar vermelha, porque é isso que você faz pras pessoas que conseguem se aproximar um pouquinho, você as inspira! A única coisa que eu não sei, que eu não consigo entender, é porque você disse aquelas coisas maldosas e sem propósito, porque eu não acredito que você me salvou pro seu corpo não terminar machucado! Então você pode, por favor… por favor, Katsuki, dizer porque você me salvou? — Katsuki consegue ver o rosto dela no reflexo de seus olhos escarlates, brilhando com ferocidade e… algo absurdamente intenso.

— Porque no meu lugar, você faria o mesmo. — e ele devolve o olhar. Não é inteiramente verdade, mas também não tem um pingo de mentira nisso. 

Ela continua o observando, como se tivesse tentando ver além do que ele disse, bom, se ela continuar procurando, com certeza vai achar. Mas a determinação no olhar dela se esvai quando lágrimas o inundam, dando lugar à doçura e felicidade que são próprias dela, não importa em que corpo ela esteja. 

Ochako funga e o aperta em um abraço, revivendo a sensação que ele teve aquele dia na lavanderia quando foi abraçado por ela assim pela primeira vez.

— Eu sabia... — ela diz baixinho — Katsuki-kun, eu não… quero sair dessa do mesmo jeito que a gente entrou, eu… eu q-quero ficar… perto...

— Eu também… — ele admite, hesitando bem menos do que aquela primeira vez em devolver o abraço.

 

—-

O caminho de volta é tão silencioso quanto a ida, a diferença é que por mais que tenha uma caralhada de coisas que ele queira dizer pra ela, Katsuki sente que muitas delas não precisam ser ditas, pelo menos não agora. Disso ele tem certeza quando ela desliza a mão pra segurar a dele por sobre o banco do metrô, ela tá apavorada e confusa, tanto quanto ele, mas sabe disfarçar mexendo no celular e comentando sobre as besteiras que os figurantes da sala ficam postando nos grupos, todo mundo combinando de ir ao Hanabi Taikai amanhã pra comemorar que já tão quase de férias, bando de cuzão esfregando na cara deles que eles vão ficar enfiados na U.A. fazendo prova. Se bem que… só ele e ela durante quase um mês inteiro na escola? Não parece um castigo tão ruim agora que ele pensa melhor sobre o assunto.

— Tsk, você não precisava me acompanhar até em casa, sua idiota. — algumas outras coisas ele só consegue dizer desse jeito escroto mesmo, o que ele quis dizer é que é bom que ela tenha o acompanhado.

— Meu grande amigo Iida me ensinou que um cavalheiro sempre deve acompanhar uma dama até a casa dela. Que tipo de menina é você que não se dá ao respeito e fica zanzando pela cidade sozinha? — ela mostra a língua, e ele dá um peteleco no nariz dela.

— O tipo de menina que pode mandar um cara folgado à lua só com um bom tabefe, tá pensando o quê? Esses músculos aqui não são de enfeite! — ela cora, e ele precisa se segurar pra não beijá-la. Porra, ainda não! Ele não quer perder o BV no corpo dela, ele quer… beijá-la sendo ele mesmo. Katsuki precisa se distrair, e rápido! — Hum, falando em cara folgado, você recebeu uma confissão esses dias. — ele fuça no bolso da calça e entrega uma rosa pra ela.

— O-o quê?

— Foi o tal do Monoma da turma B. Ele te deu uma rosa também, tá num copo de água no teu quarto, mas logo vai começar a murchar.

— E-ele o quê? Q-quando?

— No dia da prova, você tava ocupada com o nerd maldito, então acabou não dando pra te falar. Ele se confessou, gosta de você desde o primeiro ano. Na cabeça dele, deve ser um negócio tipo Romeu e Julieta das classes A e B, tsk… moleque idiota!

— Você não chamou ele de idiota, né, Katsuki-kun? — ela lança um olhar repreensivo.

— Deveria, mas não chamei. Só falei a verdade, que você não pode aceitar porque já gosta de outra pessoa. — os olhos dela brilham e ela ruboriza ainda mais, fofa pra caralho — Falei besteira?

— N-não, não falou… — ela desvia o olhar — E ele entendeu?

— Claro que não, você não conhece o otário? Saiu todo mordido falando que ia se vingar de você e da turma A inteira! — ela arregala os olhos, fazendo-o rir levemente — Tô te zoando, Cara de Anjinho, ele levou na boa.

— Que bom… — ela suspira, e eles avistam a rua da casa dele. Katsuki adora como ela diz coisas sem abrir a boca, o olhar dela de tristeza já indica que não quer falar tchau — Bom, é melhor eu ir só até aqui.

— É, se não a velha vai querer te pôr pra dentro e você não vai conseguir ir embora nunca. — ela acena levemente com a cabeça.

— Amanhã a essa hora… a gente já vai ter voltado ao normal… — ela murmura, olhando pro horizonte.

— Ou não. — ele dá de ombros, tentando fingir que tá tranquilo.

— Katsuki-kun, e se a gente não conseguir destrocar? E se a gente ficar assim pra sempre? — ele observa o olhar preocupado dela, depois ruboriza ao notar que eles ainda tão de mãos dadas. Katsuki traz a mão dela até os lábios, atraindo a atenção dela.

— Você eu não sei, eu só sei que é melhor os caras prepararem o cu, porque eu vou fazer uma mulher se tornar a heroína número 1. — ele sorri, ugh… ele é uma desgraça nessa merda de flertar, por sorte ela também é, então só fica envergonhada e sorri timidamente.

— Bom, eu… não acharia ruim poder sair sem camisa sempre que eu quiser. Além do mais, ser homem é muito mais fácil mesmo, não tem sutiã, não tem menstruação... — ela finge dar de ombros, fazendo-o revirar os olhos — Fora que… estar no seu corpo é muito diferente do que eu conheço, é… cansativo, mas muito empolgante! Seu corpo é muito gostoso! — e às vezes ela diz algumas coisas que podem soar bem esquisitas, essas são as favoritas dele.

— Gostoso, é? — ele sorri arrogantemente.

— Não, pera… aargh! Não foi isso que eu quis dizer! Eu não… para de me olhar desse jeito, seu...!

— O seu corpo é perfeito. — ele murmura, ficando na ponta dos pés para encostar a testa na dela, que porra, ele precisa beijá-la! Não, caralho, não! — Anda, vai logo pra casa, seu pai já não vai com a minha cara, ele vai acabar chamando a polícia achando que eu te sequestrei — ele se afasta, virando a cara pra ela não ver o quanto ele tá vermelho.

— É- É, eu já vou. B-bom, então… até amanhã, Katsuki-kun. — ela se abaixa e dá um breve beijo na testa dele.

Assim que ele bota o pé dentro de casa, Katsuki já espera a velha vir encher o saco, e normalmente ele a mandaria catar coquinho, mas Katsuki tem uma coisa mais importante pra falar.

— Eu vou precisar de um favor seu e do velho.

Porque tem uma porrada de coisas que Katsuki quer dizer pra Ochako, mas algumas outras são melhores mostrando mesmo.


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Notas finais do capítulo

Oooi! Tô aqui com o penúltimo capítulo, tamo quase lá!

Eu queria botar esse título de capítulo há muito tempo, achei que seria apropriado usar mais pro fim da história hauhaushs

Obrigada por ler! Espero que esteja curtindo!



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