Eu no seu lugar escrita por annaoneannatwo


Capítulo 21
Uma regra só pra mim: não se apaixonar




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O caminho de volta para os dormitórios é silencioso, muito mais porque seria difícil conversar do que pela falta de assunto. Ah não, eles têm muito o que conversar depois do que aconteceu na casa do senhor Kisaragi, o que os impede é a caudalosa chuva que começou a cair pouco depois de eles descerem na estação. Correndo desajeitadamente enquanto tentam se proteger com suas mochilas, Ochako e Bakugou conseguem entrar no prédio da U.A e buscam refúgio embaixo de uma árvore próxima aos dormitórios. Bakugou chuta a grama e murmura ofensas, que Ochako acredita serem destinadas à chuva.

—  Tsk, não tinha nada disso na previsão. —  ele rosna.

—  Chuva de verão, né? —  ela oferece com um sorriso sem-graça, ele só revira os olhos —  Bakugou-kun, o que a gente vai fazer agora com a-

—  Nem fodendo que a gente vai falar sobre isso aqui, Bochecha, perdeu o juízo? —  ele olha para a direção do Heights Alliance — Vai na frente e sobe pro meu quarto, deixa a porta da sacada aberta que eu vou levitar e entrar.

—  O QUÊ? M-mas…

—  Você prefere que a gente entre junto? —  ele a interrompe, e ela imediatamente se cala. É, os dois chegando juntos sabe-se lá de onde, ensopados e com cara de quem aprontou só iam gerar burburinhos mais que desnecessários nesse momento. 

 

Antes que o Bakugou possa soltar um “Anda logo, porra!”, Ochako sai correndo em direção à entrada dos dormitórios, nem gastando tempo e energia para usar a mochila como uma tentativa de escudo contra os pingos grossos e gelados.

Ela ouve os barulhos surpresos quando adentra o edifício, mas nem se importa em identificar as vozes, apenas corre em direção ao elevador. Uma vez sozinha, Ochako se apoia contra a parede espelhada, olhos vermelhos a encaram de volta enquanto ela tenta organizar os próprios pensamentos antes de poder discuti-los com o verdadeiro dono desses olhos. É isso, eles encontraram o garotinho responsável por essa bagunça, não há nada que ele possa fazer pra desfazê-la, no entanto. E por incrível que pareça, isso é o de menos, porque o Bakugou garantiu que vai atrás da quadrilha que sequestra e tortura crianças, e mesmo que ele nem tenha perguntado, a resposta é óbvia: Ochako vai com ele. Não tem como ser diferente, ele mesmo disse aquele dia na lavanderia: “a gente vai sair junto dessa do mesmo jeito que a gente entrou!”, não tem como ser diferente, sequer questionável.

O que é questionável, porém, é o que ela sentiu ao vê-lo tão determinado em salvar aquelas crianças com a promessa vazia de que uma criança assustada vai treinar pra desenvolver sua individualidade e ajudá-los a destrocar. A firmeza dele sempre a impressionou, muito porque Ochako sempre acreditou que parte dela fosse fachada. Quando o Bakugou grita e ameaça por aí, ela consegue ouvir os pedacinhos do ego frágil dele se quebrando, e o Bakugou que ela viu hoje, usando o corpo dela para passar segurança pra aquela criança, não é nem de longe o Bakugou instável e egocêntrico que ela um dia conheceu.

Ela abre a porta da sacada e cede espaço para ele passar, tocando os dedos das duas mãos e se jogando pra dentro do quarto. Ochako já esperava, mas ainda assim assiste perplexa enquanto ele mexe sem cerimônia nas gavetas, jogando uma toalha pra ela enquanto pega uma pra ele.

— Vai tomar banho agora ou posso ir primeiro? —  ele pergunta, olhando-a sem muito interesse.

— Damas primeiro. —  ela solta, sem qualquer esperança nele achando graça, o “tsk” dele como resposta é a confirmação disso. Ochako arregala os olhos ao vê-lo mexendo na gaveta de cuecas —  B-Bakugou-kun, o que você tá fazendo?

—  O que você acha que eu tô fazendo? Pegando roupa seca, porra! —  ele abre a porta do armário e saca uma camiseta. E claro que tinha que ser a com estampa de caveira. Ela já imaginava, e isso apenas confirma: é a camiseta favorita dele. Bakugou joga a toalha por cima do ombro e anda até o banheiro.

—  Olhos fechados, hein? —  ela se arrepende imediatamente depois de ter dito isso, já esperando um “Vai tomar no cu” como resposta, e seria merecido, Ochako admite.

—  Se você não confia em mim, vamo tomar banho junto, então. —  é a resposta que ele dá com o sorriso mais indecente que ela já viu em seu próprio rosto, e antes que ela possa demonstrar todo seu ultraje, Bakugou bate a porta do banheiro com tudo, deixando-a sozinha no quarto, ensopada de água da chuva e de vergonha.



***

Katsuki quer vomitar, não só por causa da individualidade dela, mas também pela própria babaquice! Imbecil, que caralhos ele acabou de falar? Agora ela com certeza acha que ele é um taradinho maldito. A real é que desde que aquele dia na lavanderia, quando a ideia de estar apaixonado tomou forma, manter os olhos fechados enquanto toma banho tem se tornado difícil pra caralho! Ele viu meio sem querer uma ou outra coisa no provador com a senpai doida aquele dia, e o normal seria não querer saber mais nada sobre esse corpo depois daquela bizarrice que é a menstruação, mas não, a maciez de algumas partes dela em contraste com os músculos deixam-no tão curioso que ultimamente tem sido difícil dormir.

 

Só não é pior porque o banheiro coletivo dos dormitórios não existe mais, foi reformado no fim do ano passado, e chuveiros foram instalados nos banheiros individuais de todos os quartos. Katsuki não sabe direito o porquê, mas agora que passa muito tempo com as meninas, supõe que seja por causa daquele cabeça de uva taradinho do caralho, ele deve ter tentado dar uma espiada nos chuveiros femininos, e foi preciso dar mais privacidade pras meninas. Ou não, vai saber, porque os meninos também ganharam chuveiros particulares… bom, foda-se o motivo, pelo menos assim Katsuki não precisa se preocupar com as outras meninas, a Uraraka sozinha já é informação demais pra se lidar desse jeito.

Ele sacode a cabeça, apertando os olhos mais firmemente enquanto deixa a água escorrer por esse corpo proibido ao olhar e a qualquer toque que não seja puramente pra se limpar. Porra, ele vai ficar louco se continuar assim! O cheiro do shampoo que Katsuki normalmente usa o acalma, essa familiaridade com o que é próprio dele o acalma… mas não o suficiente pra impedi-lo de imaginar se a Uraraka também tem curiosidade como ele. Tsk, provavelmente não, ela já vê tudo que tem pra ver quando mija… o que será que ela acha… do que viu?

Esquece essa merda, foca no que importa! O fiasco do dia de hoje, a lista que o moleque roubou e deu pra eles, o plano deles pra agir. Tem que ser logo, mas não dá pra ser amanhã, é uma missão igual a que eles tiveram há um mês, precisa de um pouco mais de tempo pra ser pensada, precisa… porra, precisa de mais gente, eles sozinhos não vão dar conta de cair no pau com todo mundo e salvar os pirralhos. Tsk, mas ele vai fazer o quê? Pedir ajuda só pra ter que explicar o porquê de eles estarem fazendo isso? Revelar o segredo que ele e a Uraraka tão dando as vidas pra esconder? Nem fodendo, são só eles dois até o fim, e o fim tem que esperar um pouco enquanto ele traça um plano que inevitavelmente vai colocá-los na merda com a lei, o que eles vão fazer é justiça vigilante, não tem outro jeito, mas que pelo menos seja bom o bastante pra salvarem os pivetes e não se machucarem muito. É o que dá pra fazer nessas condições.

Katsuki sai do banheiro esfregando a toalha nos cabelos. Ele tenta, mas não consegue não se olhar no espelho do armário. Hum, então é assim que ficaria se a Uraraka usasse as roupas dele… vai ser foda pra tirar essa imagem da cabeça depois.

Assim que ela sai do banheiro, ele já tá com o papel que o moleque o entregou e o laptop aberto na cama, ela se senta ao lado dele, a toalha enrolada no cabelo daquele jeito que as meninas fazem, tsk, que cena ridícula! Mas bom, ridículo é bom! Katsuki prefere rir da cara dela a ficar lembrando que não tá de sutiã já que o que ele tava usando tá encharcado e pendurado no box do banheiro pra secar.

—  Então… o que a gente tem que fazer é óbvio. —  ele limpa a garganta — Ver com o tal do Shoji se ele achou alguma coisa sobre a van, é o jeito mais rápido de descobrir qual desses endereços aqui fica o novo laboratório deles.

—  Certo, vou mandar mensagem pra ele, pode ser? —  ele assente. Faz mais sentido se fosse ela perguntando mesmo, melhor eles usarem o celular dela —  Se ele não tiver achado…?

—  Tô pesquisando, mas eu acho que os dois primeiros são mais certeza.

—  Uhum, por que são perto do porto, né? —  ela responde enquanto digita no celular —  É mais fácil montar uma rota de fuga por lá. —  ele concorda.

—  Ok, primeiro a gente precisa ter certeza qual é, só aí a gente pode montar um esquema pra invadir, a ideia óbvia é você entrar atacando com as explosões enquanto eu tiro os pivetes de lá. —  mas porra… largá-la pra lutar sozinha? Não que ela não dê conta, ela tá no corpo dele, não poderia estar em corpo melhor pra lutar, mas sozinha?

—  Sim… —  ela concorda, olhando pra tela do laptop enquanto ele digita um dos endereços no Maps —  … é foda porque somos só nós dois.

Na hora, ele lembra do que ela disse no primeiro dia dessa troca, quando eles tavam se dando dicas de como agir um como o outro. “Eu só falo palavrão quando tô muito estressada…” Ela acabou de falar sem que fosse pra imitá-lo.

 

Porra! A única pessoa que sabe dessa merda e que toparia ajudar é ele, justo ele: Deku. Mas nem fodendo que Katsuki vai pedir ajuda pra aquele maldito, primeiro porque é o Deku, segundo porque a Uraraka ia descobrir que o Deku sabe, e isso ia dar numa merda tão grande que ele prefere fingir que nem pensou nisso.

—  Tsk, o Kirishima é um imbecil, mas ele seria útil pra te ajudar. —  ela tosse e acena com a cabeça.

—  Não, mas contar pra ele é… impensável. Pra… pra qualquer um, né? —  merda! A culpa de ter contado pro Deku chega a sufocá-lo.

—  É. Fora que do jeito que o Kirishima é tapado, a gente podia até contar e ele não ia acreditar! —  cara, pensando assim, seria exatamente o que aconteceria.

—  Ha… haha… você acha? —  ela parece sem-graça. Katsuki a olha com estranheza—  Ah, o Shoji-kun respondeu! “Boa noite, Uraraka-san. Estou na casa dos meus pais e não posso acessar internet no momento, procurarei as informações que você pediu amanhã depois que voltarmos da festa do Midoriya-san, é o mais rápido que posso conseguir pra você, pode ser?”

—  Poder não pode, né? Mas fazer o quê? —  ele bufa em frustração — Caralho, onde esse cara mora que não tem internet?

—  Eu ouvi dizer que ele mora em um templo… —  ela responde — Bom, então… só amanhã, o que a gente faz agora?

—  Espera. —  Katsuki lança um olhar rápido na direção da janela —  Porra, ainda tá chovendo pra caralho!

—  Tomara que amanhã não chova, se não vai estragar a festa do Deku e do Togata-senpai… —  ela diz, pensativa, já se levantando pra não ver a cara de cu que ele fez pra esse comentário —  Então… o que você vai fazer?

—  Sair voando nessa chuva só de cueca que não vai ser, né, Cara de Lua?  — ele soa puto pra disfarçar a própria vergonha — Tô te incomodando em ficar aqui, por acaso?

—  Não, claro que não! É seu quarto, no fim das contas! —  ela se explica — É só que… sei lá, a gente podia estudar, mas… estudar no sábado à noite é tão…

—  Tosco. —  ele resmunga —  Quer… sei lá, ver um filme? —  ele sugere como se tivesse lhe chamando pra uma sessão de tortura.

—  Um filme, hein? —  pra sua surpresa, ela parece considerar a ideia —  Pode ser! O que você quer ver? É seu quarto e seu laptop, afinal.

—  Sei lá, porra! —  ele dá de ombros —  E aquele filme lá que você falou quando a gente acordou na enfermaria no primeiro dia dessa merda? —  ele se lembra que o Deku também falou desse filme quando ele contou tudo pro nerd. Tsk, deve ser um lixo de filme, o que é… perfeito! Se ele passar raiva com o filme ruim, vai esquecer a situação ridícula  em que eles se encontram.

—  Ah, sério? Pode ser! É um filme bem legal! —  ela sorri e porra, só o que ele consegue pensar é como é bem melhor quando ela tá assim ao invés de toda quietinha e preocupada —  Eu choro muito a partir da metade, então… prepare-se pra ver sua própria cara toda inchada, Bakugou-kun!

—  Tsk, você não tá meio grandinha pra chorar em filme de terror? —  ele ri em desdém.

—  Hã? Mas não é filme de terror! —  ela inclina a cabeça em confusão.

—  Como não, porra? Não foi você que falou que a menina tava morta? —  e com isso, ela começa a rir igual a uma hiena, e Katsuki só pode presumir que está mais vermelho que um tomate —  Qual a graça, sua maldita?

—  É só que… eu acho que… não sei se você vai curtir, Bakugou-kun, não parece ser seu tipo de filme e… eu meio que contei o maior spoiler da história, então…

—  Tsk, vai se foder, Uraraka! Spoiler, porra? —  ela continua rindo, bestona! — Vamo ver essa merda sim, você não sabe porra nenhuma sobre o meu tipo mesmo. —  ele sorri vitoriosamente quando ela para de rir e arregala os olhos, corando, obviamente se lembrando daquela conversa na escadaria. Toma essa, Cara de Anjinho! —  Anda, desce lá na cozinha e pega alguma coisa pra gente comer, eu vou caçar o filme.



***

Ochako chega à cozinha segurando a risada, ainda lembrando da cara do Bakugou quando ele falou que era filme de terror. É tão curioso como ele é engraçado sem querer, tipo o Iida, a diferença é que o segundo continua sem entender a graça mesmo depois que ela explica pra ele, enquanto que o Bakugou percebe porque é engraçado e fica bravo por entender, é tão… tão fofo.

As únicas luzes acesas são as da sala de estar, onde Ochako consegue ver o perfil da Yaomomo e da Jirou, as duas parecem tão focadas na conversa delas que nem lhe dirigem o olhar. Ela abre o armário e pega um saquinho de pipoca, colocando no micro-ondas e ajustando os comandos.

—  … não estou dizendo que o você disse foi errado, só acho que foi um tanto quanto… duro, especialmente sobre a Ashido-san… —  ela escuta a Yaomomo falar em seu costumeiro tom complacente — … os sentimentos dela quanto ao Kirishima-san podem não estar totalmente superados…

—  Eu sei, eu só tava querendo explicar que o primeiro amor nem sempre  é essa coisa mágica que a Hagakure falou só porque o dela deu certo pra ela, mas não foi um ataque pessoal à Mina ou mesmo a você, Momo.

—  Ah, eu sei, não se preocupe. Como eu disse, Kyouka, eu não acho que você esteja errada, meu primeiro amor não me correspondeu, mas hoje vejo que foi o melhor, se não eu não estaria com a Kendo. E… sabe, é tão diferente com ela do que era com o Todoroki-san.

—  Melhor, né?

—  Eu não diria melhor, é só… diferente. Eu tenho um carinho e respeito enormes  pelo Todoroki-san, e não ter dado certo em um relacionamento romântico foi excelente para o desenvolvimento da nossa amizade. Porque quando eu gostava dele, ficar perto dele me deixava… nervosa, insegura, eu me policiava constantemente sobre o que falar e como agir, eu… gostava de estar perto dele, mas não gostava de como eu era perto dele… agora com a Kendo é tão diferente, eu me sinto… livre, à vontade pra mostrar meu verdadeiro eu, eu gosto de quem sou perto dela, entende? Enfim… meu ponto é, não sei se é o mesmo para a Ashido-san ou até para a Uraraka-san se ela estiver realmente interessada no Bakugou-san. —  É o quê? Como que ela virou parte desse assunto do nada? — ...só tenha cuidado em como você fraseia suas opiniões, Kyouka, por melhores que sejam suas intenções, a maneira como você as diz pode te afastar de pessoas que são queridas para você.

—  É, acho que sim, vou pedir desculpa pra Mina amanh- perdeu alguma coisa aqui, Bakugou? —  hein? Ahhh! Só quando ela percebe estar sob os olhares fuzilantes das duas meninas que Ochako se liga: a pipoca já tá pronta, e ela tá escutando conversa dos outros.

—  Tsk! —  ela pega uma tigela e despeja a pipoca rapidamente, sem olhar na direção delas e correndo pra fora dali.

Ao entrar no elevador novamente, ela percebe o quanto está tensa, as mãos dela pinicam e Ochako precisa esfregá-las nos shorts dele. Graças ao treino intensivo que eles vêm fazendo juntos, ela sabe que não vai detonar uma explosão assim do nada, o corpo dele já tem muito controle sobre isso e ela aprendeu a não se desesperar mesmo quando sua muito, o que só acontece quando fica nervosa. E aí é que tá: por que ela tá nervosa? Ou melhor, por que ouvir aquela conversa a deixou tão nervosa? Por que elas tavam falando sobre primeiro amor e… “a Uraraka está interessada no Bakugou”? De onde elas tiraram isso?

—  Falta sal. —  é a primeira coisa que o Bakugou comenta quando ela volta para o quarto dele, enchendo a boca com pipoca —  Senta aí logo pra eu dar play nessa bagaça.

—  S-sim, eu… hã —  Ochako pisca, a visão dela fica ligeiramente borrada, estranho, às vezes isso acontece quando  a noite vai chegando — Hã, Bakugou-kun, você… acho que você precisa ir ao oftalmologista quando voltar pro seu corpo. Não é a primeira vez que eu percebo, mas tem noites que sua visão fica meio borrada e… —  ele se levanta da cama. Hã? Por que ele tá a ignorando agora? Ochako o observa ir até a escrivaninha, fazendo-a pular de susto quando dá um chute na última gaveta, fazendo-a desemperrar..

—  Tó, coloca isso aqui! —  ele ordena, estendendo um… par de óculos? —  Eu tenho um pouco de cegueira noturna, não dá quase nada, mas tem noite que fica meio embaçado.

—  Aí você usa óculos… —  ela observa, pegando-os da mão dele e colocando no rosto, a visão turva fica límpida quando ela pisca.

—  Se você contar pra alguém, eu te mato! —  ele ameaça meio preguiçosamente. E ela não tem ideia porque o Bakugou teria vergonha em usar óculos… ok, ela até tem uma ideia, e pra mostrar sua compreensão, Ochako só acena com a cabeça.

Ela se olha no espelho rapidamente, só por curiosidade em vê-lo de óculos, a armação grossa e escura acentua os ângulos do rosto dele e… por que ela não consegue desviar o olhar? Por que ele fica tão… lindo? Ochako limpa as mãos nos shorts novamente.

—  Posso… posso dar play? —  ela limpa a garganta e se ajusta em seu assento na cama, afastando-se um pouco quando ele se senta ao lado dela. Ochako sente que, se não o fizer, ele vai ouvir o quanto o coração dela tá disparado.

Quando o filme acaba, mesmo usando óculos, a visão dela está turva devido às lágrimas. Engraçado que essa não é a primeira vez que vê esse filme, mas a história ainda a atinge com o mesmo impacto… Ochako limpa o rosto, lembrando-se que a primeira vez que ela viu foi na casa (no palácio) da Yaomomo com as outras meninas da sala, no fim, até a Kyouka tava chorando —  segundo ela porque a trilha sonora era muito boa. A segunda vez que ela assistiu foi com o Deku na área de convivência em um fim-de-semana, ela tinha combinado de assistir com ele e o Iida, só que o presidente teve que ir pra casa dos pais de última hora, então ficaram só ela e o Deku. Ochako se lembra como se esforçou pra não chorar pra que ele não visse a cara dela ficar parecida com uma cebola roxa com tanta choradeira. No fim, ela mal conseguiu prestar atenção no filme, sorrindo e sentindo as borboletas no estômago dançarem ao ver que, diferente dela, ele não conteve sequer uma lágrima.

“...ficar perto dele me deixava nervosa, insegura… eu gostava de estar perto dele, mas não gostava de como eu era perto dele…” As palavras da Yaomomo ressonam em sua mente.

—  Porra, é isso? —  Ochako se vira pra encarar o Bakugou. Se não fosse loucura, ela diria que os olhos dele, os dela, na verdade, parecem marejados —  Que moleque burro do caralho! Por que não escreveu o nome dele na mão dela?

—  C-como assim? Se ele escrevesse, a cena final não ia ter o mesmo impacto, Bakugou-kun! Fora que… escrever “eu te amo” foi muito mais romântico e importante pra motivá-la! —  ela ruboriza.

—  Quis fazer graça e se fodeu, isso sim! Se ele tivesse escrito o nome dele, ela ia saber e depois era só pesquisar, idiota! —  ele resmunga — Fora o puta furo de roteiro! Eles tavam com o celular um do outro, como nem pararam pra ver a data e ver que tavam em anos diferentes?

—  Ué, porque… — Ochako percebe que nunca tinha parado pra pensar nisso — Ué, eles… aí, não sei.

—  Ficou sem argumento, é?—  ele abre um sorriso debochado, e ela faz biquinho — Ei, pode parar com essa porra desse bico aí! Na minha cara não!

 

— Mas você também faz bico com a minha cara!

 

— Mas nessa cara é bonitinho, na minha é só ridíc- — ele para de falar ao de dar conta do que disse. E depois de um breve e constrangedor silêncio na qual ela tenta não corar, Bakugou aponta — Parou de chover.

—  Hã? Ah… é. —  ele se levanta da cama —  Você… você já vai?

—  Já são o quê? Onze horas? O povo já deve ter ido dormir, acho que dá pra passar pelo corredor de boa.

—  Ah, sim… ou… a gente podia assistir a outro filme, não sei… —  ele a olha atentamente — ...se você quiser. Pode ser alguma coisa que você já assistiu, aí você me dá spoiler e a gente fica quite.

—  Hum. —  Ochako não sabe se ele tá pensando na proposta ou suspeitando dela —  Chega pra lá, então.

Não é surpresa nenhuma que o Bakugou gosta de filmes de ação cheios de explosões, seria até estranho se ele não gostasse. O que é surpresa é que mesmo vendo um filme extremamente agitado, os dois parecem não conseguir manter os olhos abertos por muito tempo. O dia foi desgastante emocionalmente, o quarto dele é quentinho e confortável, o colchão e os travesseiros são absurdamente macios e a cama tem esse cheiro de caramelo queimado que nos primeiros dias a deixava enjoada, mas agora… é um cheiro que ela não consegue se imaginar ficar sem antes de dormir.

Ele apaga primeiro, deitando-se na cama e roncando baixinho minutos depois, Ochako precisa se lembrar de acordá-lo daqui a uma meia hora pra ele ir pro quarto dela, mas depois ela vê isso. Fechando o laptop e colocando os óculos sobre a mesinha de cabeceira, ela se deita ao seu lado, tensão se espalha por seu corpo quando ele rola pro outro lado, levando a mão para abraçá-la como se ela fosse um daqueles travesseiros compridos.

—  B-Bakugou-kun? —  ela sussurra, a única resposta dele é um murmúrio ininteligível e um ronco, ajeitando a cabeça contra o peitoral dela.

Engraçado, estar abraçada assim a ele a faz sentir como se estivesse no próprio corpo, é bem… confortável e relaxante, ficar com os olhos abertos mostra-se uma missão impossível.

“... eu me sinto livre, à vontade pra mostrar meu verdadeiro eu, eu gosto de quem sou perto dela, entende?”

Ela entende bem até demais, porque se por algum motivo arbitrário e inusitado, ela terminasse dividindo uma cama com o Deku em algum momento de sua vida, Ochako não conseguiria pregar o olho, apenas pensando em como seria humilhante roncar, soltar um pum e acordar com mau hálito do lado dele.

Mas com o Bakugou, Ochako cai no sono antes que perceba.


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Notas finais do capítulo

Oioi! Chegamos com meu capítulo favorito dessa fic, eu sou completamente MALUCA pelo ato de dormir junto, tipo literalmente dormir junto, não tô falando de sexo (que, por motivos óbvios, não vai ter nessa história)

Mudei um pouco os diálogos sobre o filme Your Name (sim, é desse filme que eles tão falando), pensei em colocar um aviso de spoiler, mas né? Filme de 7 anos, meio que todo mundo já sabe do grande plot twist, então sem aviso de spoiler, nem adianta reclamar.
Também acrescentei uma coisinha sobre o porquê de eles terem chuveiro nos banheiros dos quartos. Quando eles se mudam pros dormitórios, o Aizawa explica que os quartos têm banheiros, mas depois fala dos chuveiros divididos por gênero. Pelo que pesquisei, no Japão é comum ter um banheiro tipo lavabo (que é o dos quartos) e um pra tomar banho mesmo, nos apartamentos construídos mais recentmente não é assim, até por uma questão de espaço mesmo, mas achei melhor achar uma explicação pra eles não terem que tomar banho em um espaço coletivo no prédio dos dormitórios.

É isso, obrigada por ler! Espero que esteja curtindo!



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