Destinos Improváveis escrita por Nara


Capítulo 93
Futuro - Segunda despedida




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—Foi você… não foi? – Shara perguntou, depois de um tempo em silêncio… ela estava inconformada pela forma como as coisas haviam acontecido, se não fosse pela tempestade... tudo poderia ter sido tão diferente... por que ela tinha que ter tanto pavor assim de algo tão simples e natural? Por que ela havia conseguido vencer o medo de voar e não podia vencer o medo doentio daquilo? Sim o medo da tempestade a desestabilizava, assim como a dor na sua cicatriz quando ela estava diante de algum perigo iminente… ambas as situações, jogavam contra e nunca a favor… e que ironia, afinal não havia perigo maior para se encontrar do que estar diante de Elza essa noite, perigo esse que a cicatriz não podia identificar, sim afinal Elza era família, Elza era o seu próprio sangue e portanto ela deveria ser um recurso de ajuda e proteção e não o contrário.

—Depende – a velha sorriu – mas dada a sua entonação de voz... Acredito que a resposta para a sua pergunta seja sim – ela respondeu.

—A tempestade... foi você que incutiu esse medo em mim, não foi? – ela perguntou de forma audaciosa, Shara se encolheu com o novo trovão… era como reviver cenas do passado outra vez, ela precisava de muito autocontrole para não desabar completamente ali, já que aquele momento era sobretudo propício, Shara estava sozinha, diante daquela bruxa que havia se empenhado para destruir a sua vida, por egoísmo talvez, um senso falho de justiça... certamente e tantos outros motivos que Shara desconhecia, mas Elza era poderosa... e a tempestade provava isso e provava também o quão fraca e vulnerável Shara era diante dela – a tempestade está presente nos meus sonhos e você… bem… você pode…

—Sim... – Elza a cortou – isso e tantas outras coisas... - ela respondeu.

—Por que?… isso tem sido horrível… por que me odeia tanto assim? – Shara perguntou, aquela que era uma das perguntas mais difíceis de se fazer. Shara não havia escolhido essa sina, ela nunca teve escolhas na verdade, e se tivesse tido, tudo que ela mais queria era ser uma criança normal, como qualquer outra... Mas ela não era, e agora a responsável por todo esse caos, estava ali, bem a sua frente, a encarando... e como Elza mesmo havia dito, esse era o fim... e elas estavam de volta ao lugar que havia sido o início.

—Não odeio… não exatamente, assim como também não nutro nenhum outro tipo de sentimento... – Elza disse sem qualquer emoção, ela estava se servindo de um chá – apenas precisava cumprir meu papel, que era mantê-la longe do ritual, ao mesmo tempo em que a preparava para ele... parece não ter sentido, mas acredite... tem e a última parte, é apenas pelo colar é claro… eu precisava da poção, agora... não se preocupe, está quase acabando e não vai doer nada – ela se sentou, os móveis da casa estavam desgastados devido ao tempo, era deprimente pensar que suas primeiras lembranças de vida, deveriam ser felizes e deveriam ser daquele lugar, mas não havia nada ali para se apegar, já que aquilo também havia sido Elza, ela havia feito tudo, pensando em tudo... Sua vida tinha sido escrita por ela, até seus medos não eram naturais, Shara encontrou o olhar frio de Elza… haviam tantas incertezas ainda, que obviamente ela não perguntaria, mas e depois?… o que Elza faria depois dali? Shara não estaria mais viva para saber… mas ainda assim… seu pai estaria… e ele se encontrava preso lá fora, doía saber que eles chegaram tão perto… 

—Prometa que não vai matá-lo – Shara se viu dizendo, aquilo fez seus olhos lacrimejarem... mesmo com tudo que Elza havia dito sobre ele, sobre o seu passado, sobre os pais de Harry... Em específico sobre a mãe dele, e por mais ruim que fosse, nada daquilo mudaria aquilo que ela sentia ou pensava sobre ele, ela sabia que ele tinha um passado sombrio, ela sempre soube, sempre… mas ela o conhecia agora e ele não era o monstro que as pessoas acreditavam ser, mesmo quando ele fazia questão de ser visto daquela maneira.

—Drenarei seu sangue essa noite – ela explicou, lhe dando um tutorial que não lhe interessava e ignorando o seu pedido – já que dependo dele para ter um pouco mais de vigor, usarei apenas o necessário, o restante deve ser poupado para o ritual, e é onde você se despede daqui... Portanto não deveria se preocupar com o Snape e nem com o que vai acontecer depois disso – ela disse de forma vazia. 

—VOCÊ disse que faria… então PROMETA! – Shara explodiu, o que mais de errado poderia acontecer afinal? sendo que morrer parecia estar mesmo na sua programação.  

—Voce deveria ter vindo sozinha…

—EU NÃO TIVE ESCOLHA - ela gritou a interrompendo 

—Interresante, vejo que se afeiçoou mesmo a ele – Elza disse mantendo a compostura  – sabe… eu posso entender toda essa carência, afinal uma criança como você que cresceu sem afeto algum, pode mesmo se tornar tão vulnerável psicologicamente a ponto de se apegar as poucas migalhas que lhe são oferecidas…  francamente, Severo Snape – Elza estava sendo cruel, o que não deveria ser nenhuma novidade para ela ali… Shara baixou a cabeça, ainda assim doía ouvir… e não, não eram migalhas… ele estava ali por ela essa noite, assim como… muito antes disso ele já havia feito tanto, ele a salvou de inúmeras situações, ele a protegeu da hidra a resgatou na floresta proibida, a segurou no colo, cuidou dela, a amparou e até mesmo a colocou para dormir quando ela estava com medo… sim aquilo não estava mais em discussão, ele se importava e não eram migalhas, mas Elza… ela não entenderia – Severo Snape nunca foi alguém a quem se apegar e o fato dele ter se deitado com sua mãe no passado, não faz dele um homem bom... - Shara voltou a encará-la - Maeva era atraente, era bonita e inteligente, qualquer um se deitaria com ela… qualquer um… e se ele repetiu, era apenas por que ela deveria ser boa nisso… na cama é claro, e não me olhe assim – Shara estava horrorizada com a maneira vulgar com a qual Elza estava se referindo a sua mãe – já está grandinha para saber o que um homem espera e deseja, Snape não é diferente, muito pelo contrário… você já deve ter ouvido histórias sobre como os comensais da morte se divertem com suas vítimas, jovens mulheres…. antes de matá-las, não é mesmo? - Shara não queria ouvir… ela não queria… ele não, ele era diferente ela sabia - sim eles as estupravam - Elza disse - da pior maneira possível… Snape é tão frio, tão depravado e doente como todos os outros… com uma exceção, ele foi o braço direito de Voldemort durante sua ascensão, dentre tantos seguidores… o escolhido foi Snape e isso deveria lhe dizer alguma coisa... ele é o pior, ele é mal e ele não pode amar… – Aquela bruxa havia lhe tirado tudo, sua mãe, uma vida, uma história, o seu futuro e agora parecia querer lhe tirar uma das únicas coisas que lhe havia restado, sua admiração pelo homem que era o seu pai.

—Apenas prometa – ela sussurrou.

—Amanhã, quando estiver suficientemente longe, a magia irá se dissipar e as raízes o libertarão – Elza disse por fim – talvez dado a chuva, ele pegue algum resfriado, no demais o devolverei ileso ao meu caro e estimado Dumbledore, sei que ele conta com isso… - Elza disse, como se soubesse de algo a mais ali, talvez ela soubesse mesmo… ela tinha essa vantagem do futuro - Dumbledore é um grande bruxo, confesso, mas é meio lerdinho... nunca achei que fosse tão fácil roubar-lhe alguns fios de cabelo... – ela parecia se divertir com aqueles pensamentos – agora… sem mais delongas, coloque sobre a mesa o colar, a adaga e sua varinha – Elza orientou, Shara vasculhou os bolsos… pensando em como seria difícil se desvincular do colar, o entregando assim, ele havia sido o seu primeiro contato com a sua origem, sua verdadeira identidade e principalmente com a sua mãe, havia tanto significado naquilo, mas ela o fez, já a varinha não lhe dizia tanto e isso foi fácil, então ela buscou a adaga... Shara estremeceu, onde estava a porcaria da adaga?... não isso era impossível, não tinha simplesmente como a adaga ter caído dali, ela teria percebido... “eu sempre cumpro minhas promessas” ele havia dito antes dela partir, ela não havia entendido na hora, ela congelou... Sim ele havia pego a adaga, e agora? Elza não o pouparia assim…

—Não está comigo – Shara disse, sentindo um frio percorrer sua espinha - a adaga - ela engoliu em seco.

—Como assim não está com você? – Elza perguntou de forma hostil.

—Eu... não sei, devo... ter deixado cair – ela mentiu, mas ela estava tão apavorada naquele ponto que era difícil não lhe dar algum crédito – Elza se levantou, Shara fez o mesmo, já que aquele movimento a assustou... Elza se aproximou dela, fazendo Shara recuar e se encolher contra a parede, quando ela segurou seu pescoço, de forma violenta, cravando as unhas ali, Shara podia sentir o seu sangue escorrer, ela a estava machucando, e a deixando sem ar – não consigo respirar – Shara conseguiu dizer com a voz rouca.

—Sua garota TOLA – ela gritou, levantando uma das mãos, Shara sentiu que estava começando a flutuar, Elza estava usando sua magia ancestral – como se atreve a ser tão descuidada – havia um brilho diferente em seu olhar, Shara estava sufocando ali no alto, quando ela a arremessou com força, fazendo Shara colidir contra a lareira de pedras, ela sentiu a dor crescente em seu braço direito assim que alcançou o chão, ela achava que havia quebrado um osso ali, ela gemeu – IDIOTA – ela disse – talvez você mereça mesmo que eu o faça sofrer... Incompetente – Shara se ergueu com alguma dificuldade, Elza estava falando do seu pai.

—Não... ele não tem culpa... por favor... – ela estava chorando agora, Shara viu quando Elza ergueu uma das mãos e apontou em direção  a rua, liberando alguma magia – NÃO – o que ela estava fazendo? – eu posso voltar... procurar... eu posso – ela implorou, mas chamou sua atenção a expressão no rosto daquela bruxa, de completamente confusão.

—Impossível – ela havia dito... o que era impossível? Shara conseguiu se sentar no chão, seu braço doia – isso é impossível – ela repetiu, virando o rosto para encara-la – levante-se – ela disse – AGORA – ela esbravejou, Shara fez... não sabendo o que esperar daquilo, Elza pegou o colar de cima da mesa e sua varinha – para a porta dos fundos – ela mandou – preciso pegar algo e vamos aparatar – o que? Por que? 

—Por que? Para onde vamos? – ela perguntou assustada com a mudança de planos.

—Você não faz perguntas aqui… agora vê se anda ou precisa ser lembrar de como usar as pernas? – Elza rosnou a cortando, algo havia acontecido, mas o que? – maldito isso é impossível, esse é meu território – Elza estava falando sozinha – meu território – e ela parecia transtornada.

Shara abriu a porta dos fundos com o braço bom que havia lhe restado... aquele jardim, ela o reconhecia da sua lembrança, estava diferente, mas ainda assim era o mesmo jardim, estava chovendo forte agora, a tempestade havia intensificado, ela congelou, sentindo as mãos de Elza a empurrarem para fora... a obrigando a sair, havia uma estufa de plantas aos fundos e Elza a estava direcionando para lá... elas entraram, o teto de vidro do lugar lhe proporciona uma visão aberta do céu, o que para Shara era na verdade um show de horrores intensificado, com todos aqueles raios cortando o céu agora bem a sua frente.

Shara notou quando Elza pegou um vaso com uma flor de cima de uma bancada, a princípio aquela era a única flor viva de todo o lugar e ela estava aberta, era uma flor noturna e era mesmo muito bonita... mas por que Elza havia vindo pegar uma flor? Certamente havia alguma importância naquilo, aquela velha bruxa era uma caixinha de surpresa, Shara fechou os olhos... 

“Era de noite e Shara se encontrava na cozinha de uma casa pequena, porém bastante aconchegante, havia alguns livros de botânica espalhados pela mesa. 

—Aurora – uma mulher jovem chamou, mulher essa que Shara logo reconheceu, aquela era Elza em sua versão mais jovem, e uma garotinha de mais ou menos a sua idade entrou no recinto, ela estava suada, um pouco suja e com as mãos atrás das costas – eu não sei o que está aprontado dessa vez, mas preciso que tire os livros de cima da mesa, o que eu disse sobre usar a mesa da cozinha para atividades... 

—SURPRESA – a menina disse animada, fazendo Elza parar, ela havia tirado um vaso das costas e havia uma flor nele, Elza se aproximou da menina.

—Uma flor – ela havia dito, admirando aquilo.

—Sim – Aurora sorriu – é uma Ipomoea alba – ela disse, Elza não parecia reconhecer pelo nome – bom para começar ela só floresce a noite e tem uma beleza singular... escolhi ela, para que possa se lembrar de quem você é mamãe e encontrar forças quando sentir medo.

—Um lembrete? – Elza perguntou curiosa, e Shara diria que ela estava emocionada.

—Sim... você disse que tinha uma missão e que ela seria muito, muito difícil não é? – a menina perguntou e Elza assentiu – você disse também que talvez tivesse que tomar decisões bastante ruins – Aurora parecia preocupada – então pensei que devido ao fato da Ipomoea ser uma flor noturna e portanto não se deixar intimidar pela escuridão, ela pudesse ser uma inspiração e o mais importante te lembrar que as vezes, é necessário enfrentar a escuridão para descobrir a luz que existe dentro de nós... e que mesmo nas profundezas de nossa alma, sempre existe algo bom, algo belo que pode florescer nas condições mais desafiadoras e difíceis.

—Aurora – Elza disse, sim ela estava mesmo emocionada, e agora encarava a filha… – enquanto viver, não importam as circunstâncias eu me lembrarei e a levarei comigo por onde for, por você… minha Aurora - Aurora sorriu”

—Vamos menina, não me faça perder a paciência – a voz de Elza invadiu sua mente – venha até aqui e segure meu braço – ela parecia com pressa.

—A flor... – Shara disse encarando o vaso que ela carregava, e quem sabe tentando ganhar um pouco mais de tempo ali, a única certeza no momento é que Shara não queria partir com Elza para lugar algum… um raio iluminou o céu… sim ela preferia ficar com a tempestade por pior que ela pudesse ser – foi um presente de Aurora, não foi? – Shara viu a expressão da bruxa mudar – se você se importava tanto com ela... como parecia ser, porque... – Shara parou a encarando – então por que a machucou? – ela perguntou finalmente.

—Escute aqui garota... não sei como você sabe sobre isso – ela disse de forma hostil – mas tudo que fiz e venho fazendo foi e é por ela... 

—Como? Como pode dizer isso... como pode dizer que é por ela... quando você mesma a matou – Shara repetiu aquilo que tinha ouvido seu pai dizer lá fora, ainda inconformada com tamanha brutalidade, como ela podia? - Aurora… ela era sua filha - Shara pensou que talvez mantê-la ocupada falando fosse uma boa forma de ganhar tempo, Shara precisava entender o que havia mudado ali e o porquê de repente Elza passou a ter tanta pressa – você deveria protegê-la, cuidar dela... ama-la – sim Shara podia mesmo idealizar tantas coisas sobre uma família perfeita, afinal ela havia sonhado sobre isso a vida toda, e mais do que ninguém ela sabia que parte daquilo eram apenas fantasias, que a vida real era dura e que não era bem assim, mas ela chegou perto, e isso era o bastante... Contudo Elza não, ela havia se tornado o pior tipo de família para se ter.

—Garota tola, você não sabe nada sobre o amor – Elza cuspiu – algumas escolhas exigem renuncias difíceis – ela a encarou – e isso definitivamente não é da sua conta – ela ironizou.

—Bom... até alguém como eu, carente e que se agarra às migalhas – ela disse, fazendo alusão a referência usada por Elza anteriormente – pode saber mais sobre o amor do que você – um raio cortou o céu, as árvores se moviam ferozmente lá fora, era o cenário de horror perfeito para se enfrentar uma bruxa tão poderosa como aquela... e que mesmo com toda sua glória e poder, ela recua, voltando para buscar aquele singelo presente do passado, uma lembrança, uma flor dada por sua filha na infância… “encontrar forças quando sentir medo” Aurora havia dito… espera Elza estava com medo, por isso ela estava fugindo… 

—CALE A MALDITA BOCA – Elza se alterou, fazendo Shara se assustar – saiba que nada do que disser aqui importa, não vale um galeão sequer… agora deixe de ser intrometida e venha até mim, não me obrigue a azara-la outra vez, eu posso ser muito mais cruel que isso, te garanto que não vai querer saber… – obvio que aquele tom de voz a assustava, assim como era óbvio também que ela podia ser mais cruel que isso, afinal o que esperar de alguém que tira a vida da própria filha?… Elza a assustava, sim... mas ela estava com medo, ainda assim, por que? do que?

—Você não enfrentou a escuridão não é mesmo? – Shara disse se afastando um pouquinho e usando aquilo que havia ouvido na visão, Elza parecia anestesiada ali, ela certamente se lembrava das palavras da filha – na verdade, você nunca quis enfrenta-la – Shara afirmou, e aquela verdade saiu junto com um soluço de dor, ela não podia mais segurar o choro naquele ponto – eu penso que a escuridão a corrompeu de tal maneira… você é mal, Aurora… ela estava errada sobre você, na verdade não existe nada de bom e nem de belo em sua alma que possa florescer... veja… olhe e contemple... tudo aquilo que fez... tudo que você destruiu pelo caminho, para chegar até aqui, e isso a troco de que? De uma vingança, da qual não lhe restou ninguém para celebrar, já que você matou todos os seus – Shara disse, pensando em sua própria e miserável vida ali, pensando na vida de todos que foram impactados por Elza de alguma forma, Shara pensou em Noah... em Catie... na sua mãe, em seu pai… Antony, todas as crianças do lar – Aurora... ela sentiria tanta vergonha de ver quem você se tornou – Shara fez uma pausa – assim como eu sinto em pensar que somos família – ela disse, deixando todo o medo de lado, Shara iria morrer de qualquer maneira essa noite e sendo assim, ela preferia morrer em paz por ter conseguido dizer aquilo que queria e pensava sobre Elza – não deveria se importar tanto assim com essa flor... Já que ela não significa mais nada, deveria ter se importado com sua filha, enquanto ela ainda estava viva – Shara concluiu, um raio cortou o céu… Elza parecia oscilar… em algum momento de sua vida, ela amou a filha, talvez Aurora fosse a única pessoa que ela tenha sido capaz de amar um dia.

—Como ousa... Você não tem esse direito… sua criatura desprezivel… miserável, sua rejeitada - Elza disse, mas ela precisava fazer melhor que isso, Shara havia ouvido tais adjetivos a vida toda, e honestamente esse não era mais o tipo de coisa que a abalava, aquilo não era sobre ela, aquilo dizia mais sobre quem Elza era… e como seu pai lhe havia dito certa vez na enfermaria, essas não são verdades ao seu respeito, Shara sorriu com a lembrança, e aquilo deixou Elza ainda mais furiosa, Shara sentiu seus pés sendo erguidos do chão mais uma vez, e em poucos segundos ela estava no alto, Shara quase podia tocar o teto de vidro daquele lugar e a sensação de contemplar o céu ainda mais de perto… naquelas circunstâncias era ainda mais apavorante, seu coração acelerou, era como estar presa do lado de fora do lar mais uma vez - eu disse que não ia doer, que seria breve… mas pensando bem… eu acho que mudei de ideia - Ela ouviu Elza dizer, Shara não fazia ideia do que ela tinha em mente ali, mas obviamente não era bom, Shara não podia lutar e não havia mais nada a se fazer, então ela desistiu se entregando de uma vez ao seu destino, ela chorou... Um estrondo alto foi ouvido, mas dessa vez não era um trovão, as portas de vidro da estufa, haviam sido abertas com força bem atrás de si, por um momento Shara achou que pudesse ser pela intensidade do vento, afinal ventava bastante lá fora… mas seu corpo enrijeceu no instante em que ela ouviu aquela voz… não podia ser real, podia?

—Solte-a, Elza! - sim era real, era mesmo a voz dele - Não permitirei que a machuque - ele ordenou com uma frieza intensa, mas como? Ele estava preso lá fora, aquelas raízes… a magia dela era irredutivel, as runas… espera… era por isso que Elza estava fugindo?…  Algo havia mesmo mudado? Ela estava com medo dele?

—Acho melhor obedecê-lo bruxa - Antony? Shara se inclinou, para vê-los, mas ela estava presa ali e aquele não era um movimento tão simples de fazê-lo… Mais perguntas começaram a se formar em sua mente, como Antony havia conseguido chegar até eles? e o que era aquilo que Antony segurava nas mãos? - Elza gargalhou, fazendo Shara estremecer… e se ela os machucasse? 

—Como quiser - ela disse… e no segundo seguinte Shara despencou, ela gritou, mas foi alcançada por um feitiço antes de se chocar contra o chão a fazendo repousar em segurança ali, ele havia agido rápido, obviamente que os olhos dele estavam sobre ela o tempo inteiro, aquela movimentação brusca fez com que ela recolhesse o braço para mais junto de si, não haviam dúvidas de que estava mesmo quebrado, a dor quase a cegou - Ah Severo Snape - Elza cuspiu - veio salvar sua filhinha? Tarde demais, como sempre - ela riu, Shara estava prestes a correr até eles, quando sentiu as mesmas raízes que prenderam seus pés lá fora, a alcançarem, subindo por suas pernas… segurando seus pés, amarrando seus pulsos, raízes que agora tinham espinhos e que perfuraram suas roupas, começando a rasgar sua pele, fazendo Shara gritar de dor… era como ser furada por diversas agulhas ao mesmo tempo… a dor a fez vacilar, mas Shara sentiu o exato momento em que a magia de Elza cessou, a dor havia parado na mesma velocidade em que havia surgido, Antony havia erguido aquilo que se parecia com um cajado e o mais estranho, que com aquele movimento uma onda de magia eclodiu… Shara nunca havia visto nada assim, a atmosfera havia ficado tão carregada de magia que todos os vidros da estufa estouraram de uma única vez, fazendo com que os cacos de vidro voassem em todas as direções, ela se abaixou, na verdade todos haviam feito o mesmo, com exceção de Antony, ele não… ele permaneceu de pé na mesma posição, havia uma nuvem de magia azul em torno dele, que o fazia parecer tão grandioso ali, por Merlin aquela magia havia vindo mesmo dele?... E desde quando ele tinha magia?... E não era uma magia qualquer, aquilo havia derrubado a magia invencível de Elza, agora Shara entendeu como seu pai havia se livrado das raízes, da mesma forma como Antony as livrou para ela… Shara encarou Antony mais uma vez, ela o havia azarado horas atrás e o feito ingerir uma poção, será que ela podia ter se enganado tanto assim sobre ele… aquilo fazia dele um bruxo muito poderoso, isso era completamente surreal.

E Shara não era a única perplexa ali, Elza estava mesmo horrorizada… era visível a confusão de quem buscava respostas, não podendo acreditar naquilo que havia acabado de ver,  o único a não demonstrar nenhuma surpresa era o seu pai, ela podia sentir que ele estava na verdade muito mais ocupado, a analisando com certa preocupação, do que se importando com o espetáculo, e ninguém, absolutamente ninguém parecia se importar com a chuva avassaladora que passou a preencher o ambiente agora que estava descoberto… Shara ainda queria correr até eles… mas dessa vez ela achou melhor não.

—Que tipo de coisa… é isso? - Elza perguntou apontando para o cajado… Shara também queria saber, já que a magia dele parecia mesmo vir daquilo  - Como? quem é você afinal de contas? - sim ela queria respostas.

—Hummm… eu, sou uma ave, um guia ou apenas o Antony… como preferir -  ele respondeu de forma simples - decidi não me importar mais com a forma como me chamam, e aceitar o meu próprio propósito  - Antony devolveu - isso - ele olhou despretensiosamente para o cajado - é meu catalizador de magia… sim, mesma função de uma varinha, só que mais… grandioso - ele provocou - surpresa - ele piscou para Elza - aposto que não estava esperando por algo assim… aliás belo trabalho que fez aqui… eu devo ter notado, já que deve ter gastado um tempo nisso… agora me diga, foi por isso que apagou minha memória não foi? - ele pediu sério.

—Antony de Cistina - ela disse o nome com arrogância - você uma maldita AVE inútil e sem propósito algum…. eu sempre soube… que havia algo de errado com você… é claro que havia, aí está… você mentiu esse tempo todo - ela o atacou.

—Sobre mentiras, acho que temos uma opinião um pouco diferente a respeito de quem vem mentindo aqui… agora sobre esse negócio de não ter propósito algum… sabe, tens alguma razão, afinal essa foi a forma como eu decidi viver todos esses anos, eu não me importava na verdade com o propósito, erro meu… eu posso ver isso agora… - ele sorriu - sabe não é fácil ser uma ave debaixo de uma maldição milenar, sem esperança, cheia de amargura e me escondendo da dor do meu próprio passado, passado esse que eu não posso mudar… - ele deu de ombros - mas quisera o destino me dar uma segunda chance, minha maldição foi quebrada, quebrada por Severo - Antony encarou seu pai, Shara podia ver a gratidão através do olhar dele - e digamos também que depois de algumas revelações, e de um perdão não merecido -ele olhou diretamente para ela - que eu tenha finalmente compreendido o meu papel e então aceitado o meu próprio propósito aqui… então respondendo a sua pergunta, quem eu sou?... um Mago Elza, é isso que sou… eu possuo magia ancestral… não como você, por isso sou mais forte, se é o que quer saber… suas runas já eram - ele explicou, erguendo o cajado para o céu, dissipando mais magia azul, Shara viu as runas de Elza outra vez, agora muito mais fracas.

—Eu deveria ter me livrado de você enquanto podia - Elza disse fria - Atena me disse para fazê-lo e eu achei que mante-lo longe fosse o bastante, cometi um erro… - ela o encarava, o engolindo com o olhar.

—Me permita interromper - seu pai interveio - esse não foi o único erro que cometeu - ele disse, com a habitual ironia de sempre, da qual ela já estava acostumada - Atena pelo que me recordo também havia dito para se livrar dos pais da menina… - ele revelou… Atena… Do que eles estavam falando? Para variar sempre havia algo que ela ainda não sabia - e bem… eu estou bem aqui - ele sorriu com o canto da boca… - seus próprios erros, alteraram o futuro que viu - ele explicou - nós - ele apontou para si próprio e para Antony - somos a consequência da sua falha… nada disso teria sido possível sem sua espetacular incompetência - agora era ele que estava aplaudindo, enquanto Antony sorria com frieza, eles eram uma dupla ali e ela não pode deixar de admirar aquilo… 

—Impossivel Snape… você não é capaz de amar… você não deveria… você é um monstro assim como eu… - ela disse para ele 

—Talvez… eu possa - ele a provocou… Shara encarava aquilo, mal conseguindo processar tanta informação… ele estava dizendo para Elza, que o futuro havia mesmo mudado e que ela havia falhado, ele a responsabilizou por isso… mas o principal ele havia dito… que ele a amava para que todos ouvissem? E reforçado que esse amor havia sido o responsável por ter mudado os acontecimentos? Shara sentiu lágrimas quentes descerem pelo seu rosto, sim agora Elza entendia, que ele se importava, Shara já sabia… nunca foram migalhas… ambos ergueram suas varinhas… Elza atacou primeiro, mas ele era rápido e havia se defendido, não existiam mais barreiras, Antony as havia destruído e ambos podiam usar sua magia… o jogo havia virado, havia uma esperança para eles então… havia um novo futuro… seu coração se aqueceu como nunca antes, se esquecendo até mesmo da tempestade, e embora eles estivessem duelando agora, Shara notou que ele havia se livrado das vestes de comensal… tudo havia mudado… seu pai, Antony… e o futuro, Shara sorriu… ela tinha uma família, eles eram a família dela.

—Amor - Elza ironizou, enquanto se protegia uma última vez, seu pai a havia encurralado e estava prestes a dessarma-la - sabe professor, sendo assim será um prazer ainda maior ve-lo sofrer essa noite… - o sorriso dele sumiu, mas por que? Se era ele que estava vencendo, Shara não entendeu, afinal tudo aconteceu muito rápido a partir dali… Elza havia se virado em sua direção, e os seus olhos se encontraram, segundos talvez nem isso… - AVADA… - ela havia dito… e sabe quando dizem que antes de morrer a vida passa diante dos seus olhos como um filme? sim, é  verdade…. Não que houvesse tempo para isso, não havia… mas ainda assim ela reviveu seus melhores momentos até ali, do seu pai a chamando de garotinha estupida enquanto a amparava na floresta proibida, da sua voz o chamando e o tirando do coma, da moeda que ele havia dado para ela de aniversário, da história sobre os três irmãos que ele contou, dos biscoitos de canela… de quando ela recebeu a carta e o colar entregue por Antony no meio da rua em Londres… do dia em que eles dançaram juntos na ala hospitalar, de voar no carro do pai de Rony, da sensação de liberdade que ela sentiu, Shara se viu segurando a mão de Catie no sótão do lar enquanto olhavam as estrelas e sorriam… de Catie a balançando no parque, Shara reviveu a sensação do beijo com Draco no natal, de voar com ele no campo de quadribol, usando a vassoura que havia sido da sua mãe, do gosto de sorvete de Flocos, das patinhas fofas de seu gato sobre o seu rosto, Beta fazendo tranças no seu cabelo enquanto tomava sua lição… de Gina sorrindo enquanto falava dos garotos, Harry, Rony e Hermione na cabana do Hagrid… Carla tentando melhorar suas roupas… do cheiro dos livros da biblioteca, do cheiro dos ingredientes de poções, da foto que a professora Minerva havia lhe dado da sua mãe… do quarto novo e da cama mais macia que ela já havia dormido, foi então que Shara percebeu que ela tinha muito mais do que ela mesma ousou sonhar um dia, Elza não tinha nada, Shara tinha tudo, ela sorriu, sentindo a tranquilidade do momento - KEDRAVA - Elza concluiu, Shara fechou os olhos esperando… ansiando pela praia, pelo mar… mas o que ela queria mesmo era encontrar com sua mãe, abraça-la… dizer que ainda assim havia válido a pena, mas o silêncio a incomodou, onde estava a brisa? as ondas? nada havia acontecido, então um barulho chamou sua atenção, do impacto de um corpo colidindo no chão, e o grito grave de Antony, a trouxe para a realidade outra vez, ela sabia o que aquilo significava… afinal um mal presságio era sempre um mal presságio… ela abriu os olhos… se deparando com a concretização do seu maior medo, caído ali no chão, seu pai estava morto.

—NÃO - Shara também gritou, correndo até ele e se jogando contra o seu corpo agora imóvel no chão, ela não se importava com mais nada, seu braço quebrado, se Elza a acertaria, no que Antony faria… nada, ela perdeu o chão, a estabilidade… na verdade ela havia acabado de perder tudo, sim ele havia feito, ele havia se sacrificado em seu lugar, ela estava tão imersa em suas lembranças que sequer havia notado quando ele correu em sua direção, sendo acertado pelo feitiço no seu lugar… Elza deu alguns passos para trás, nem ela esperava por aquele desfecho… Antony sem pensar apontou o cajado para ela… Shara não impediria e Elza também não revidou… então Antony fez… Elza começou a congelar na frente deles… ele a havia transformado em uma estátua de gelo, Shara não se importava, não mais… as lágrimas embaçaram sua visão… ela gritou - VOCÊ PROMETEU - Shara bateu nele com força - PROMETEU QUE NÃO IA MORRER - ela estava soluçando, ela sentiu os braços de Antony sobre si - ELE PROMETEU - ela gritou para ele - ELE MENTIU - Antony a amparou com força contra si - ELE DISSE QUE SEMPRE CUMPRIA SUAS PROMESSAS… ELE MENTIU - ela se soltou dos braços de Antony, abraçando seu pai no chão mais uma vez - pai…. - ela chamou, mas ele não podia ouvi-la… 

—Eu sinto muito - Antony também estava chorando.

—Era pra eu ter morrido essa noite e não ele…. - ela soluçou - EU… EU… EU - ela reforçou - ELE PROMETEU - ela repetiu.

—Ele também prometeu que te protegeria Shara, mesmo que isso custasse sua vida - Antony falou - ele não mentiu, o peso de uma promessa certamente é maior do que de outra, ele escolheu cumprir a promessa de maior valor - Shara se jogou contra os braços de Antony… eles haviam conseguido mudar o futuro, sim… a um custo, mas aquilo tinha lhe custado tudo. Ela chorou.

“... mesmo nas profundezas de nossa alma, sempre existe algo bom, algo belo que pode florescer nas condições mais desafiadoras e difíceis” 


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Notas finais do capítulo

Eu sei, eu sei… não me matem

Doeu tanto em mim como sei que deve estar doendo em vocês, mas vamos lá, esse capítulo me custou muitas horas de revisão, tem diálogos difíceis, carregados e queria entregar algo a altura de todo o resto dessa fic, afinal teríamos aqui o desfecho/resposta de um dos momentos/perguntas mais aguardados até aqui… e então, será que Elza vai conseguir cumprir o objetivo? Afinal ela gastou literalmente a vida elaborando tudo isso, e ela é de longe a grande vilã dessa história…

E a resposta é... não ela não conseguiu, o amor é o único sentimento capaz de mudar qualquer circunstância (disse Dumbledore em um capítulo aleatório por aí) ele tem razão, Elza falhou… talvez por ela não ser capaz de amar, ela tenha achado que Snape também não seria… mas ele é, e ele provou o quanto ele é, dando a vida dele pela vida da sua filha, e ele foi um bom aluno na escola de Maeva né, por que foi o que ela fez, na esperança de que poderia voltar… e a verdade de quem ele se tornou, chocou Elza... Já que ela fez o caminho inverso, ela matou a filha para alcançar o seu objetivo.

Quando digo que temos diálogos difíceis… pensem dizer a uma criança como Shara, com todo o histórico que ela tem, que é compreensível que ela aceite migalhas… reflitam na crueldade dessas palavras, mas Shara surpreende mais uma vez, e nesse capítulo não são palavras que a abalam, uma protagonista de raiz… e caso não tenham notado esse é o primeiro capítulo desde quando ela sabe que ele é o pai dela, que TODAS as referências dela em relação ao Snape são o chamando de pai… nada mais de professor Snape.

Uma frase difícil também, e que pode ser algo pequeno mas eu chorei, foi quando Elza diz “veio salvar sua filhinha? Tarde demais, como sempre”.... Tarde demais uma referência ao que aconteceu com Lily no passado, e essa é uma das razões pelas quais resolvi que o sacrifício seria dele, por que não… dessa vez ele não chegou tarde demais… ele merecia essa redenção. E percebam... Ele tirou as vestes de comensal, e isso é uma virada de chaves muito grande.

Achei muito legal a forma como Antony revela que é um mago para Elza, os vidros da estufa quebrando, dava aí uma cena de cinema das boas né… cheia dos efeitos especiais haha

E chorei com a transição da Shara cheia de esperanças, por um futuro melhor, uma nova história… X … é aqui que eu eu me despeço, com a noção de que iria morrer, trazendo as lembranças a tona (do pequeno filme da vida dela) se dando conta de que ela alcançou aquilo que queria, emocionada e cheia de esperanças para encontrar a mãe… X … o que ele fez? Eu perdi tudo, ele morreu e isso me custou tudo.

Enfim…. O próximo capítulo será muito emocionante! Apenas

Vou amar saber o que acharam



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