No que restou do fim de semana, Rory permaneceu no quarto, fazendo todo o máximo de repouso que combinou com sua mãe ainda no hospital, condição imposta para que não a deixasse internada.

  Achava a preocupação de Isobel muito exagerada e irritante, mas optou por obedecer principalmente porque calhou do seu péssimo humor querer evitar encontrar algumas pessoas pela casa, especificamente Arnold e Mike.

  Sendo assim, seu fim de semana foi resumido à cama, livros, ouvir músicas em seu Mp3 e algumas espiadas pela janela, principalmente ao ouvir barulhos de conversas e risadas misturadas vindas do andar inferior. E em uma dessas espiadas, notou que Jacob havia vindo visitar a tia em companhia de um homem de cadeira de rodas.

  Na segunda de manhã, Rory acordou muito antes do despertador, se aprontou para a escola e finalizou calçando um coturno e selecionando seu casaco mais grosso, pois após o sábado ensolarado a temperatura havia caído e continuava a cair. Não gostava de imaginar a possibilidade de passar frio enquanto estivesse na escola, pois a temperatura tão diferente do que ela era acostumada fazia com que a saudade de sua vida na Califórnia apertasse ainda mais. Saudade geralmente a deixava de péssimo humor e já não havia acordado tão paciente naquele dia.

  Após Rory, Isobel foi a próxima acordar na casa. Ela também estava pronta para seu primeiro plantão, também sendo mais uma a se prevenir com agasalhos. As duas ainda tomaram um café da manhã que anteriormente havia sido preparado por Meryl antes de sair para o trabalho no haras, e só então saíram de casa.

— Esse carro é da Meryl? — Rory perguntou enquanto colocava o cinto de segurança.

— Não, a Meryl usa o carro dela no dia-a-dia. Esse é do Arnold e ele me emprestou até que eu compre o meu. — respondeu Isobel, mesmo sabendo que a informação afetaria o humor da filha.

  Dito e feito. A adolescente se tornou e permaneceu emburrada durante todo o caminho até a escola, sendo essa a primeira parada antes de Isobel seguir para o hospital.

  Não foi difícil encontrar a Forks High School. Pegando informações com o sobrinho um dia antes, Isobel conseguiu chegar sem se perder. Assim como a maioria das coisas, ficava perto da rodovia. Mas não parecia uma escola, era basicamente um conjunto de prédios iguais construídos com tijolos marrons. Também havia por perto árvores e arbustos, tudo para seguir o estilo habitual de Forks.

— Que feia! — Rory pensou alto enquanto tirava o cinto.

— O que não pode ficar feia são suas notas e a disciplina, mocinha. Comporte-se. — puxou a filha para um abraço e em seguida depositou um beijo na testa dela em tom de despedida.

— Eu sempre me comporto. — puxou a mochila do banco de trás para seu colo antes de abrir a porta e escorregar para fora.

  Isobel ainda acenou uma última vez, antes de dar a partida e se afastar do local para liberar logo a entrada do estacionamento da escola.

  Suspirando uma vez, Rory endireitou sua postura, colocou o capuz como se fosse o disfarce perfeito para não ser reconhecida e então começou a caminhar para dentro do estacionamento.

  Como o esperado, um a um os olhares foram chegando até ela. Mais da metade era curiosidade, mas havia alguns seletos alunos que a encaravam com certa irritação. A Newton reconheceu alguns dos rostos que conheceu sábado, mas apesar de receber olhares chateados por ela ter causado tanta confusão em único dia, continuou caminhando como se não fosse ela a garota que estragou um raro dia ensolarado em La Push dos melhores amigos do primo.

  Decidida a escapar por hora dos olhares que furavam sua nuca ainda dolorida, Rory seguiu em direção ao primeiro prédio, onde havia uma pequena placa que dizia "secretaria".

  Para o alívio da novata, lá dentro estava bem mais quente do que ela imaginava, bem diferente da temperatura congelante lá fora. A secretaria era pequena, com uma pequena sala de espera com cadeiras dobráveis, carpete laranja, avisos e prêmios abarrotados pelas paredes, além de um grande e ruidoso relógio. Havia três mesas atrás do balcão, uma delas ocupada por uma mulher ruiva e com óculos de grau.

— Posso ajudá-la? — a mais velha perguntou assim que notou a presença da aluna.

— Sou Lorelai Newton. — Rory sentiu que a resposta era suficiente, já que obviamente seu nome já devia ser bem popular pela cidade.

— Claro. — ela assentiu e sorriu, depois percorreu uma pilha bagunçada de documentos em sua mesa até achar o que procurava — Seus horários estão aqui e esse aqui é um papel que preciso que me entregue assinado por todos os professores ao fim do dia. — ela se aproximou do balcão e entregou os papéis.

— Obrigada. — a novata agradeceu, mas ainda não saiu do lugar — Seria incômodo se eu te pedisse um mapa ou alguma explicação de como chegar a cada uma dessas aulas? — apesar de ter pego o papel, voltou a depositá-lo em cima do balcão.

— Mike não vem hoje? — a mulher perguntou, parecendo surpresa com aquele pedido que para a novata parecia tão simples.

— Acredito que sim. — respondeu Rory, logo depois continuou a encarar a mais velha em expectativa em ter seu pedido atendido.

— É que eu achei que ele iria ajuda-la a se situar na escola. — a funcionária enfim expos sua dúvida.

— Mike é de outra série, então não vai ter como sempre estar por perto para me guiar. Sendo assim, prefiro aprender a me virar logo de uma vez! — não mentiu, mas omitiu a parte que não estava falando com o primo desde a discussão da madrugada de domingo.

— Tudo bem. Eu vou ajuda-la então. — ela retornou até sua mesa e trouxe várias folhas até o balcão para mostrar.

  A funcionária ditou todas as aulas da novata, mostrando-as no mapa a melhor maneira de chegar a cada uma.

･彡

  Para o azar de Rory, assim que ela entrou no prédio quatro para sua primeira aula, reconheceu Mike, Jessica, Tyler e Lauren parados ao lado de fora de uma das salas de aula, provavelmente fazendo hora enquanto o professor não chegava. A novata pensou em desviar o rosto e fingir não tê-los visto, mas percebeu que seu plano não daria certo quando alguém chamou seu nome.

— Vai me ignorar pelo resto da vida? — Mike dramatizou, enquanto os amigos tentavam fingir que não prestavam atenção naquele início de conversa.

— Se eu puder evitar, sim. Com licença. — respondeu somente o que foi perguntado, nem perdendo tempo em cumprimentar os outros conhecidos que ela ainda não odiava, pois não tinha certeza se eles queriam falar com ela.

— Lorelai! — o garoto insistiu e avançou alguns passos, parando exatamente no meio do caminho da parente e demonstrando não ter intenção em liberar a passagem.

— Não vou perder tempo conversando com alguém que acha que sou mentirosa. Vai lá conversar com quem você acredita até de olhos fechados! — claramente estava falando sobre Lauren e não disfarçou.

— Está se sentindo melhor, Rory? Eu soube que você teve uma concussão, tadinha... — a indiretamente mencionada se manifestou e abriu um pequeno sorriso cínico.

  Não sabia se pelo cinismo estampado no rosto ou no tom claramente provocativo, mas aquela pergunta aparentemente comum esquentou o corpo de Rory imediatamente. E quanto ela se deu por conta, estava com o antebraço pressionando alguns centímetros abaixo do pescoço de Lauren.

— Eu sei que você está quase se formando na escola e eu só tenho dezesseis, mas saiba que não sou uma pirralha estúpida e não vou admitir que você me trate dessa forma, ainda mais com clara intenção em me colocar contra outras pessoas. Se você tem algum medo que seus amigos conheçam outras pessoas bem melhores do que você, procure a porra de um terapeuta em vez de tentar causar discórdia! — dito isso, a Newton se afastou, mas não sem antes fazer a rival bater contra a parede mais uma vez.

  Se Mike reprovou aquela atitude, pareceu ter ficado tão surpreendido que não conseguiu encontrar a própria voz para reclamar. Rory conseguiu continuar seu caminho pouco se importando em mais uma vez sentir que estava sendo observada.

･彡

— Você é Rory Newton, certo? — uma voz masculina causou um sorriso na mencionada ao não precisar pedir para que a chamassem pelo apelido.

— Sim. — se virou para procurar saber de quem se tratava, notando que era um garoto que havia acabado de ocupar o lugar vago ao seu lado.

  Percebeu de imediato que com toda certeza não havia o visto durante seu percurso até a sala de aula. Não teria como alguém tão bonito passar despercebido. Na verdade, chamá-lo de bonito parecia inapropriado, visto que ele parecia próximo a perfeição.

  O cabelo era loiro, liso, perfeitamente alinhado em uma franja que cobria a testa. O maxilar era marcado levemente de uma forma que deixava o formato do rosto bonito, chamativo e raro. A boca era pequena, mas aumentou conforme o garoto abria um sorriso, que também parecia perfeito.

  Mas eram os olhos algo que chamavam ainda mais atenção, apesar de todo o restante do pacote. Era um tom de dourado que ela nunca havia visto antes.

— Sou Vincent Cullen. — apesar de se apresentar, o garoto não estendeu a mão como pessoas geralmente faziam em uma apresentação — Cá entre nós, eu adorei o que você fez no corredor minutos atrás! — ele sorriu divertido.

— Onde você estava, que eu não te vi em lugar algum? — arqueou uma sobrancelha ao perguntar.

— Você estava quase enforcando uma garota, tinha como memorizar todos os rostos que estavam focados em vocês? — Vincent deu de ombros e soltou uma risadinha breve.

— Eu sou observadora. E não tinha como não te ver. — com a resposta, Rory acabou se colocando em uma saia justa, visto que claramente estava se referindo indiretamente a beleza do garoto.

— Por quê? — ele soltou outra pergunta, agora contendo o sorriso enquanto esperava sua resposta.

— É a pessoa mais pálida que eu já vi em minha vida! — comentou Rory, sendo essa a única desculpa instantânea que conseguiu encontrar.

— Pálido? — ele acabou rindo durante alguns segundos, depois tratou de se recompor — Eu jurava que as garotas bronzeadas da Califórnia eram mais humildes com a aparência de gente pálida... — fingiu-se de ofendido.

— Elas devem ser, mas eu sou chata mesmo! — revelou e agora foi sua vez em começar a rir, acabando por atrair o riso do outro garoto também.

  No momento seguinte o professor de biologia, um homem de óculos, cabelo curto e encaracolado, que Vincent soprou para Rory que se chamava Bob Banner, adentrou a sala. De qualquer forma, a novata teve que se levantar e ir até a mesa do professor, para que ele assinasse o papel que havia recebido na secretaria.

  Para o alívio de Rory, sr. Banner não puxou assunto, tampouco fez uma apresentação da nova aluna para a sala inteira, apenas se apresentou para ela, desejou boas vindas de forma gentil e a dispensou de volta a sua mesa.

  A aula logo começou e o professor anunciou que todos trabalhariam com parceiros de laboratório naquela dia e antes que o barulho de duplas sendo escolhidas acontecesse, informou também que a dupla de cada um seria a pessoa da carteira ao lado. Por sorte, Rory acabou sendo dupla da única pessoa da sala que trocou algumas palavras com ela, Vincent.

— Nas lâminas que estou distribuindo há células de ponta de raiz de cebola. — sr. Banner passou distribuindo um microscópio e uma caixa de lâminas para cada dupla — Separem e etiquetem as fases da mitose. E a primeira dupla que acertar, vai ganhar a cebola de ouro! — se apressou até a mesa e exibiu para sala uma cebola pintada de dourado.

  De imediato, o silêncio da sala foi quebrado por risadas, que o professor acabou acompanhando também durante alguns segundos, mas logo avisou para que começassem e focassem na atividade.

— Você é boa em biologia? — novamente foi Vincent quem puxou assunto com sua, agora, dupla — Porque você deu azar, eu sou péssimo! — confessou e fez uma caretinha.

— Não boa suficiente para ser considerada nerd, nem ruim o suficiente para ser considerada burra. Talvez, meio a meio. — deu de ombros e riu, enquanto tratava logo de abrir o livro na página certa para servir como apoio acadêmico daquela atividade.

— Então infelizmente não vamos ganhar a magnífica cebola de ouro... — o garoto soltou um suspiro triste teatral e puxou a caixa para si, enquanto colocava o microscópio no meio da mesa para fica próximo aos dois.

— Eu vou chutando o que eu imagino que seja e você me ajuda conferir no livro se está correto. Pode ser? — Rory sugeriu e tocou no microscópio, apenas esperando a resposta antes de puxar mais para perto de si.

— Você quem manda. — foi o Cullen quem empurrou o objeto para a parceira, enquanto também abria o seu livro para se basear.

  A Newton pegou a primeira lâmina e encaixou no microscópio, para em seguida aproximar seus olhos para estudar melhor o que o objeto refletia.

— Prófase, eu acho. — ela respondeu não tão segura e encarou o garoto ao lado.

— A prófase é a primeira fase da mitose, onde os cromossomos se condensam, os nucléolos e a carioteca se desfazem, dispersando seus componentes no citoplasma. — Vincent leu o texto do livro e em seguida o ergueu para mostrar a figura para a parceira.

— Realmente é prófase! — confirmou a Newton, abrindo um sorriso animado para seu primeiro chute certo, que foi retribuído de imediato — Vamos ao próximo. — a atitude de desviar o olhar partiu dela.

･彡

  Ao fim da primeira aula, Rory e Vincent saíram em companhia um do outro, enquanto o garoto jogava para cima e prontamente agarrava outra vez a cebola de ouro que eles acabaram ganhando na aula.

— Que bom que sua leitura e seu raciocínio são rápidos, só isso explica como ganhamos essa coisa, levando em consideração que eu errei todos os últimos chutes! — a Newton comentou enquanto tirava do bolso do casaco discretamente seu mapa base para chegar a próxima aula.

— Não seja modesta, os dois tem mérito com essa coisa aqui. — agora havia sido a vez de Vincent em não chamar a cebola pelo nome, seguido por uma risada.

— Nos vemos por aí então, parceiro de biologia. A trigonometria me aguarda agora! — dito isso, a garota acenou em despedida e apressou seus passos para conseguir mais tempo para encontrar a próxima sala.

— Trigonometria? — o Cullen surgiu ao lado da garota outra vez, novamente acompanhando seus passos.

— Sim, essa chatice é minha próxima aula. — resmungou Rory, deixando visível em seu rosto o quanto detestava a matéria.

— E se eu te disser que essa é a minha próxima também? — sugeriu.

— Seria ótimo ter um rosto conhecido de novo. — ela falou sinceramente e pausou os passos para encará-lo — Você quer que eu imagine uma possibilidade ou você realmente tem trigonometria agora? — perguntou.

— É real. — novamente Vincent sorriu — Agora guarde esse mapa bobo. Eu vou ser seu guia turístico pelo menos por agora! — apontou para o papel que a garota segurava discretamente.

— Com você sabe que isso é um mapa da escola? — questionou a Newton, enquanto erguia o papel e o mostrava ainda dobrado, sendo impossível a identificação daquela forma.

— Eu também já fui aluno novo um dia. — deu de ombros e desviou o olhar para encarar uma garota pálida e de cabelo castanho que havia acabado de passar por eles.

  Seguindo a mesma direção do olhar por curiosidade, Rory notou que a tal garota encarava o Cullen com certa irritação ou desconfiança sobre algo. O garoto, porém, não manteve o olhar por muito tempo e o desviou, assumindo novamente uma expressão tranquila no rosto.

  A Newton bem quis saber o motivo para aquilo, mas achou ser cedo demais para questionar algo sobre a vida de alguém que havia acabado de conhecer. Não queria ser indelicada com a única pessoa daquela escola que não a encarava como se fosse um único bicho raro em meio a tantos comuns.

･彡

  Foi somente ao final da última aula que antecede o recreio, que Rory voltou a ficar sozinha. Vincent, que mais uma vez estava na mesma aula que ela, havia ficado para trás para esclarecer uma dúvida sobre um exercício com o professor da matéria.

  Apesar disso, a novata não precisou de mapa para chegar ao refeitório, simplesmente seguiu o fluxo de pessoas que seguiam em uma mesma direção e teve certeza absoluta que chegaria ao lugar desejado.

  O refeitório não era muito grande, mas haviam mesas suficientes para todos se acomodarem. Parecia que todo mundo já tinha seu grupinho, uma panelinha e lugar que sempre sentavam, sendo essa a parte que a novata mais odiava em ser aluna nova, principalmente estando no ensino médio onde geralmente rolava exclusão, bullying e as pessoas mais desagradáveis que alguém poderia conhecer na vida.

  Apesar da panelinha, que contava com Lauren como uma dos integrantes, Jéssica tomou a atitude de estender um braço para cima e acenar para que Rory se achegasse àquela mesa. Mesmo recebendo um sorriso aparentemente verdadeiro vindo da garota, a novata negou com a cabeça e foi para uma direção oposta, apoiou sua bandeja e se jogou na cadeira da única mesa vazia que encontrou, no canto do refeitório e perto da janela.

  Não entendeu muito bem porque uma mesa privilegiada como aquele não havia competição para ocupar. Dava para ver a chuva caindo lá fora, o vento balançando as vegetações e essa paisagem era perfeita para quem precisava organizar os pensamentos após uma briga antes da primeira aula e matérias chatas uma seguida da outra.

  Estava tão distraída em sua meditação de olhos abertos enquanto mordia um pedaço de batata fria, que nem percebeu estar sendo observada. Levou um susto e em seguida respirou profundo, já temendo uma nova briga, quando notou que era a garota do corredor ali paralisada com a bandeja em mãos bem em sua frente, a mesma garota que olhou feio para Vincent, olhar que talvez fosse para ela também.

— Quer se sentar ou não se mistura com más influências? — Rory brincou, apontando para os muitos lugares vazios em sua mesa e encarou novamente a garota, optando por ser sonsa e fingir que nunca tinha a visto.

— Tudo bem, também não tenho reputação das melhores... — a garota suspirou e sentou do outro lado da mesa, descansando sua bandeja e encarando a comida com desinteresse.

— Se me contar o que fez, conto o que eu fiz. — a novata tentou puxar assunto.

— Na verdade... todo mundo meio que sabe o que você fez. — ela encolheu os ombros e pegou um garfo, passando a cutucar sua salada.

— É, as notícias se espalham rapidamente por aqui. E aparentemente apenas as ruins. — o sorriso triste que Rory abriu por algum motivo pareceu congelar a companheira de mesa.

— Infelizmente... — se o rosto já era pálido, ficou ainda pior, até mesmo desistiu de seu garfo — Eu me afastei dos meus amigos também. — ergueu o olhar e encarou brevemente uma determinada mesa do refeitório.

  Curiosa, Rory seguiu o olhar e acabou encontrando a mesa de Jessica e os amigos. Eles tentavam disfarçar, mas lançavam olhares para a mesa das duas vez ou outra.

— Me deixe adivinhar: algum deles foi babaca com você? — se tratando de pessoas que ela teve uma pequena experiência, a Newton chutou.

— Não. No caso, a babaca fui eu! — a garota suspirou ao responder — Passei... estou passando por problemas pessoais e afastei todo mundo. Eles não tinham culpa, eu só... não consigo. — encolheu os ombros.

— E se você começar aos poucos, acha que consegue? — perguntou tentando sinceramente ajudar aquela garota, mesmo com informações tão vagas.

— Como? — em vez de resposta, a garota devolveu outra pergunta.

— Tenho certeza que vocês compartilham algumas aulas. Se aproveite disso para trocar algumas palavras, mesmo que breves e simples, como um Bom dia. — aconselhou Rory, enquanto finalizava sua porção de batatas e focava agora em uma salada para equilibrar.

— Será? — ela encarou o grupo discretamente com um olhar ainda covarde.

— Não posso responder com tanta certeza, porque não conheço ninguém direito, mas Angela me pareceu a mais simpática e compreensível do grupo. Então comece por ela. — novamente a Newton aconselhou.

— Eu posso tentar... mas não hoje. Não acordei bem para novos possíveis dramas. — suspirou.

— E eu acho que acordei bem até demais para enfrentar cada um dos meus dramas! — sorriu, principalmente ao se lembrar da confusão matinal que já não afetava mais seu humor.

— O pescoço da Lauren quem o diga... — sussurrou, deixando óbvio a intenção em não ser ouvida por mais ninguém além de sua companheira de mesa.

— Que foi? Você tem medo de fofoca ou dessa tosca? — a descrição exagerada não passou despercebido pela novata, que fez questão em olhar na direção de Lauren ao pronunciar o xingamento.

— Não é medo, eu só evito conflitos. — deu de ombros e abaixou o olhar para sua bandeja com as refeições ainda intactas — E ela não gosta de mim desde meu primeiro dia por aqui na escola, mais um motivo para não entrar no caminho dela... — acrescentou a informação.

— Tudo bem você ser paz e amor, só não abaixe a cabeça para ela, ok? — Rory voltou a ficar séria ao descobrir aquele conflito em comum entre as duas.

— A propósito, me chamo Bella. Bella Swan. — parecendo querer encerrar aquele assunto, a garota se apresentou e até tentou abrir um pequeno sorriso, que não deu muito certo.

— Swan? Eu acabei conhecendo seu pai no fim de semana. Charlie, não é? — observou e esperou pela confirmação enquanto virava rapidamente goela abaixo um copo de suco de laranja.

— Isso. Ele comentou resumidamente que deu uma passadinha no aniversário do filho de um amigo e acabou tendo que te levar às pressas ao hospital. Você está melhor? — a expressão de Bella tornou-se preocupada, apesar de ser óbvio que a mais nova estava bem se estava ali na escola.

— Nunca estive tão ruim assim, seu pai que é exagerado. — percebendo a tensão da outra, Rory fez uma caretinha durante o comentário e riu em seguida.

— Eu sei bem disso. — pela primeira vez pareceu que o rosto da Swan ganhou algum sinal de cor e vida após conseguir rir junto com a recém conhecida.

— Não achou que eu iria te deixar sozinha, não é? — Vincent surgiu de repente e se jogou na cadeira ao lado da novata, focando toda sua atenção nela durante seu tom humorado.

— Mas eu não estou sozinha. — ressaltou Rory, encarando o colega de aulas com milhares de interrogações, entre elas a dúvida se ele era míope ou apenas estava esnobando Bella.

— Eu não te vi aí, me desculpe. — só então o Cullen se virou para a segunda garota e ainda ousou um sorriso não tão sincero.

— Ok... Bem, eu já vou indo. Nos vemos por aí, Rory. — o desânimo estava de volta por todo o corpo e rosto de Bella, que rapidamente se retirou dali antes mesmo de ser respondida.

  Novamente com a sensação de que havia algum problema entre os dois, e com sua curiosidade aumentando, a Newton encheu a boca de salada para evitar despejar suas dúvidas em cima do recém conhecido.

  Um silêncio desconfortável acabou se instalando entre eles durante alguns minutos, fazendo o recreio tornar-se muito tedioso no ponto de vista da garota.

— Ela é ex de um dos meus irmãos, o Edward. — Vincent comentou de repente, enquanto dava uma mordida em uma maçã.

— Pelo jeito o término foi difícil... — comentou, finalizando sua refeição e começando a organizar os recipientes na bandeja outra vez.

— Óbvio que foi. O foda é que meu irmão foi embora e sou eu que tenho que aguentar essa chata diariamente perguntando sobre ele! — o desabafo causou uma carranca na ouvinte — Mesmo aparentemente sendo diferente da sua, essa é minha opinião sobre a Bella... — tratou de argumentar, mesmo estando mais contido agora.

— Direito seu não gostar dela. Mas por favor, não demonstre em minha frente, odeio ver gente sendo tratada mal sem merecer e vou acabar me metendo no assunto de vocês. Ela só ama seu irmão, oras! — a Newton rebateu e permaneceu com uma expressão séria.

— Já pensou em ser terapeuta depois que terminar a escola? — parecendo disposto a finalizar o assunto, Vincent puxou uma brincadeira e cuspiu uma risada em seguida.

— Idiota! — xingou, ao mesmo tempo que tentava segurar o riso e falhava.

･彡

  Ao fim da última aula, Rory se despediu rapidamente de Vincent e se apressou para a secretaria para entregar o documento com assinatura dos professores.

  Não sabia se por tanta pressa ou por ter se esquecido por um momento que não estava mais na Califórnia, mas só reparou que havia deixado seu casaco no cabideiro da sala quando já estava tremendo durante a caminhada ao prédio que precisava ir. Pensou em retornar de imediato, mas já havia andado metade do caminho e não queria fazer o mesmo percurso tantas vezes. Então seguiu para a secretaria, mesmo batendo o queixo.

  Só voltou para buscar o casaco após falar com a secretária, que foi muito mais rápido do que ela esperava. Talvez por notar a ausência do agasalho e tremores na novata, a mulher não prolongou assunto.

  Logo Rory estava de volta ao prédio dois, agora sentindo menos frio graças ao aquecedor. Ainda assim, ela apressou seus passos a ponto de quase iniciar uma corrida. Haviam alguns alunos perambulando pelos corredores ainda, mas a novata resolveu manter seu ritmo acelerado mesmo assim para pegar logo seu pertence e correr para o estacionamento para não deixar sua carona esperando, por mais que não te faltasse vontade de se atrasar de propósito por se tratar de Mike.

— Você não pode... Simplesmente não pode! — ouviu a voz alterada de Bella dividida entre indignação e certo medo.

— E quem vai me impedir? — Vincent também elevou seu tom de voz e em seguida pareceu cuspir uma risadinha desafiadora.

— Sua família disse... — a garota tentou argumentar, mas foi interrompida.

— E onde eles estão? Não em Forks, não é mesmo? — questionou, ainda mantendo algum humor debochado na voz.

— Mas você está a colocando em risco, isso é errad... — outra vez o desespero parecia presente na voz da Swan, que mais uma vez não concluiu seu raciocínio.

— Pare de se meter em minha vida, Bella! Acho que você ainda não caiu na realidade, mas não faz mais parte dela! — agora o tom de voz do garoto se amenizou de repente.

  Só então Rory percebeu que não havia sido tão discreta ao tentar espiar os dois e Vincent acabou a vendo por ali, passando a mudar imediatamente sua postura.

— Rory! — ele sorriu enquanto começava a se aproximar — Você esqueceu isso. — ergueu e deixou a vista o casaco da mencionada.

— É, eu voltei só para buscar. Obrigada. — a novata agradeceu e tentou disfarçar o fato de que havia assistido o desentendimento — Bom, eu vou indo. Bom descanso para vocês! — acenou, sorriu e então se apressou para sair dali.

  Novamente teve que sair de uma situação onde sua terrível curiosidade a torturava, mas novamente optou por não correr o risco de sair como invasiva com as duas pessoas mais agradáveis que conheceu em seu primeiro dia escolar.

  Andou tão apressada, que em pouco tempo chegou ao estacionamento apesar de estar quase colocando seu pulmão para fora pela boca, em partes pelo cansaço e em partes por certo nervosismo ao presenciar uma óbvia discussão entre ex-cunhados.

  Mas o nervosismo maior era pelo fato de que sentiu que acabaria ficando em meio ao fogo cruzado, já que não pretendia tomar lado algum e continuaria conversando com os dois enquanto eles quisessem manter contato com ela.

  A tensão em seus ombros se desfez parcialmente ao vasculhar o estacionamento a procura de Mike e não encontra-lo, e em vez disso Meryl a esperando e agora acenando ao lado de fora de seu carro.

  Sem conseguir evitar um sorriso, Rory apressou-se na direção da conhecida enquanto uma interrogação se formava em seu rosto. Não entendeu muito bem o que ela fazia ali em vez de trabalhando no haras, mas a desconfiança de que seria sua carona naquele dia fez a novata manter o sorriso.

— O que está fazendo aqui, Meryl? — resolveu perguntar assim que chegou mais perto.

— Eu serei sua carona hoje. — a mais velha informou e já abriu a porta do motorista para entrar — Hoje tenho alguns compromissos sobre o aniversário da cidade daqui a alguns dias, então vou te deixar no haras e depois partir para a reserva para me reunir com minhas ajudantes. — acrescentou e fechou a porta ao entrar.

— Qual sua função no evento? — Rory prolongou o assunto enquanto ocupava o banco do passageiro e passava sua mochila para o banco de trás.

— Um bolo de aniversário gigante, então vou ter que me planejar muito bem para não decepcionar! — ela sorriu divertida ao dar a resposta e em seguida deu a partida no carro — Minhas amigas vão fazer outros tipos de docinhos, mas no geral a cidade toda vai contribuir de alguma forma, várias pessoas estão responsáveis por barracas com outros tipos de alimentos como comidas salgadas, além de bebidas. O bom é que temos poucos habitantes, como você deve presumir, então não é tão trabalhoso assim. — guiou o carro para fora do estacionamento e logo estavam na rua.

— Se você quiser, pode ir direto para a reserva. Eu não me importo em te esperar. — avisou e deu de ombros uma vez.

— Não está cansada da aula, querida? — Meryl dividiu a atenção de seus olhos entre a rua e a mais nova.

— Uma cadeira é suficiente e então meu cansaço aguenta esperar. — ela sorriu ao responder.

— Tem certeza? — aproveitou para confirmar a informação enquanto estavam paradas em um semáforo.

— Sim, vovó. — a Newton puxou uma brincadeira e riu.

— Palhacinha você, não é? — estreitou os olhos brevemente para fingir um semblante sério, mas em seguida acabou acompanhando a adolescente na risada.

･彡

  Durante o caminho, que demorou alguns quilômetros, Rory notou que definitivamente não precisaria tratar Meryl na defensiva. Sentiu que poderia gostar dela, apesar do péssimo gosto para marido.

  Pelo menos até então ela não tentou fazer ponte por Arnold, forçando uma situação que ela não entendia e não deveria se meter.

  Era provável que Isobel havia alertado a ela que o assunto era incômodo e que deveria evitar quando estivesse em companhia de Rory, mas ainda assim a adolescente gostou da consideração. Qualquer outra pessoa tentaria ajudar o marido a sair de uma situação que era desagradável para ele, mas Meryl, até então, parecia preferir ser neutra.

  Após algum tempo na estrada, as árvores que antes ladeavam os dois e davam a sensação de estarem dentro da floresta, haviam começado a diminuir sua quantidade e a tornar o caminho mais aberto. Em pouco tempo foi possível ver as casas da reserva, algumas pessoas andando de um lado para o outro em algum afazer diurno, crianças correndo e brincando por todo o espaço mesmo com a temperatura tão baixa.

  Apesar de acenar para os muitos conhecidos, Meryl ainda não parou o carro e o guiou um pouco mais adiante por uma estradinha. Ela seguiu por mais alguns segundos e então o estacionou em frente a uma casa onde os tons se tornavam discretos graças ao contraste com as árvores. Rústicos. Havia uma pequena varanda que antecedia a entrada da casa, uma porta larga e que no momento estava totalmente aberta.

— Rory, preciso te pedir uma coisa, pois mesmo te conhecendo a pouco tempo sei que você é pouco discreta às vezes. — mesmo parecendo um pedido sério, Meryl abriu um pequeno sorriso para livrar qualquer sinal de sermão.

— Eu vou me comportar. Sou indiscreta, mas tenho educação. — Rory achou graça na tensão da mais velha, principalmente por sua personalidade como de uma adolescente qualquer assustá-la de alguma forma.

— Não tem nada a ver com educação, eu só preciso que você seja discreta mesmo. — a Black suspirou, como se quisesse algum tempo antes de continuar — Uma de minhas amigas tem uma... marca no rosto. Ela parece não se incomodar, mas sei que é incômodo sim, então ia te pedir para evitar encará-la fixamente como sei que você faria se eu não te pedisse antes. Por favor. — explicou.

— É alguma pinta grande e peluda? Está tudo bem, eu já tive uma hamster antes. — mesmo o tom sendo sério, a Newton optou por brincar e rir da própria graça para tentar quebrar o gelo — Brincadeira. Relaxa, Meryl, eu vou fazer o que me pediu. Eu prometo! — avisou.

— Tudo bem, engraçadinha. — a adulta sorriu e só então saiu do carro.

  Rory fez o mesmo e em seguida seguiu Meryl para a casa de portas abertas, parecendo tão íntima que nem anunciou sua chegada ou coisa do gênero antes de ir entrando direto.

  Era uma casa mediana, então não demorou muito para ouvirem vozes e as encontrar reunidas na cozinha, uma sentada na mesa e a outra de costas na pia fazendo alguma coisa.

— Meryl chegou! — a mulher sentada à mesa, que parecia ter a mesma faixa etária da Black, anunciou — E trouxe companhia. Suponho que essa seja a neta d... — não conseguiu concluir ao ser interrompida.

— Rory. Essa é a Rory. — Meryl falou rapidamente, um tom urgente com se ainda tivesse medo de algum mal-estar.

— Sue Clearwater. — se apresentou, levantou de sua cadeira e se aproximou para cumprimentar melhor — Seja bem vinda! — sorriu enquanto apertavam as mãos.

  A mencionada encarou brevemente a mais velha e não encontrou sinal chamativo algum em seu rosto, nem uma mínima pinta ou imperfeição que seja. Suspeitou então da outra ainda de costas para elas.

— Obrigada. — Rory optou por ser breve para relaxar um pouco a tensão de sua parente, apesar de sorrir de forma simpática.

— Então você é a tão comentada Rory Newton? — a mulher que estava de costas na pia falou após largar o que estava fazendo e só então se virou para cumprimentar.

  Por mais que tivesse sido avisada, Rory se demorou alguns segundos encarando fixamente o rosto da mulher. Apesar de notavelmente linda, não era esse detalhe que prendia um olhar curioso, mas sim o fato de que o lado direito do rosto dela estava marcado da linha do cabelo até o queixo com três linha finas que lembravam claramente arranhões causados por garras, apesar delas já terem cicatrizado. Uma das linhas havia puxado para baixo um canto do seu olho e a outra havia virado o canto direito de sua boca como numa careta permanente.

  Encarando-a uma última vez antes de procurar um outro foco, Rory entendeu o motivo de Meryl ter pedido que ela fosse discreta e não encarasse tanto. Era uma terrível cicatriz que marcaria para sempre o rosto de uma mulher ainda tão jovem.

  E isso era muito triste, tanto de olhar quanto provavelmente de se ter também.