Eternidade — Um Conto da Terra-Média escrita por O Elessar


Capítulo 14
Capítulo 11: O Corruptor


Notas iniciais do capítulo

Finalmente retornei com mais um capítulo dessa história.
Estive ocupado com o estágio e outras coisas em minha vida pessoal. Além disso, tive um bloqueio criativo com relação a este capítulo. Nada parecia exatamente adequado, então... fica o aviso para o caso de estar abaixo dos demais.
Espero que gostem, de todo modo. E tentarei voltar a postar com mais frequência.



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O caminhar sob o sol consumia sua energia e abatia seus corpos.

Chegavam já à cidade de outrora. A luz era forte, mas não precisavam se esconder: mais uma vez, não havia um homem sequer nas ruas. Apesar disso, a situação não parecia boa aos Magos.

— Dias atrás, este lugar estava abarrotado de adoradores e guerreiros. Agora já não vejo sequer as lavadeiras - constatou Curumo.

Alatar se atentou ao que havia nos arredores. Atentamente, percebeu as oferendas presentes em cada porta; os crânios infantis alocados nas janelas fechadas. Desviou o olhar, cerrou o punho sobre o cajado. A ânsia de vômito subiu pela garganta. Sua mente, no entanto, operava com velocidade. Não tardou para que ligasse os pontos diante do que acontecia.

— Não te enganes, Curumo. Eles ainda estão aqui. Dessa vez, entretanto, escondidos.

— E por qual motivo estariam escondidos?

Alatar sabia a resposta, mas se manteve calado. Seguiram por algum tempo na direção da imensa torre que se erguia sobre o centro da cidade. A estrutura subia aos céus, agora, tal qual um imenso gigante: sua sombra se lançava sobre o trio, assustadora e cálida, enquanto todos eram capazes de sentir a presença que se abatia sobre o lugar.

Os Magos se entreolharam.

— Estão certos do que dizem? - perguntou Curumo, se voltando para os imensos e escuros portões de pedra.

Pallando não hesitou. Apenas se aproximou a passos lentos e, erguendo o cajado, tocou exatamente a fresta que dividia as portas. Gravuras em tons de vermelho e laranja se revelaram aos poucos - como se fossem, devagar, acendidas por chamas. O Mago sussurrou algo em resposta; veio um som alto, e então elas se abriram.

— Caçadores não confundem sua presa, Curumo - respondeu, saltando para as trevas.

 

***

 

O som de seus passos ecoava. A respiração era ofegante. O calor parecia capaz de sublimar corpos e consciências, mais cruel a cada metro.

Apertavam os olhos para que pudessem ver adiante. O vapor e as trevas atuavam como lacaios do adversário, enquanto seus cajados travavam uma silenciosa batalha para iluminar o caminho. Uma batalha perdida. Mesmo os olhos de Pallando eram incapazes de desvendar a escuridão, confusos conforme as sombras pareciam se aproximar e atacá-los como cobras; mesmo os sentidos de Alatar eram insuficientes para orientá-los. E mesmo Curumo, em todo seu orgulho, sentia o coração bater mais forte, as gotas de suor escorrendo pelas têmporas.

 

Não era como das outras vezes.

 

Entraram em formação, de costas um para o outro. Podiam sentir a proximidade do inimigo, seu caráter maldito parecendo rasgar a câmara com seu próprio eco. Era difícil saber quão grande era o lugar ou o quão longe ele estava - tudo o que sabiam é que eram salões imensos, muito maiores do que haviam imaginado, e que o adversário podia vir de qualquer lugar.

Suas pupilas saltitavam conforme os vultos bruxuleantes tomavam o chão. Incapazes de ver através da neblina, lançaram seu foco sobre estas mesmas sombras. Tomadas por um ímpeto avassalador, elas pareciam prestes a cair sobre eles a cada movimento: revelariam o maior dos servos d'O Inimigo, e ele os arrebataria de uma só vez.

A superioridade numérica dizia pouco agora. Todos sabiam disso.

E então, devagar, a neblina atenuou. Muitos pés adiante, as sombras pareciam se materializar em uma única figura. Era imensa, dona de chifres que quase tocavam o teto; o calor que emanava em ondas a cada passo castigou a pele dos Magos e chamuscou suas roupas. Seus braços arrastavam grilhões atrás de si, enquanto o flagelo em suas mãos era capaz de derreter a própria rocha.

— Que é feito do Senhor das Caçadas? Está tão imerso em seus temores que enviou seus cães em seu lugar?

A voz da criatura ecoou em suas mentes - e tão somente nelas - como uma lâmina quente. Tais seres não eram conhecidos por conservarem a fala de outrora: ao longo dos séculos, os Magos passaram a crer que algo na Escuridão havia eivado seu discernimento.

Mas não era o caso deste. Em seus olhos repousava toda a sagacidade da maior das serpentes, toda a ira do maior dos demônios.

Curumo foi o único a dar um passo adiante, encarando a criatura de frente.

— Alatar, Pallando... - Sua voz soou baixa enquanto colocava o cajado diante do corpo. - Ao meu sinal.

Num único bater de asas, o demônio desfez a neblina. A onda de calor forçou os Magos Azuis a recuar uns poucos passos enquanto revelava, enfim, a figura maldita do inimigo - seus traços humanoides grotescos e imensos envoltos por uma chama escura, os chifres servindo de coroa para seu orgulho pérfido.

Ele girou o flagelo em mãos enquanto Curumo forçava outro passo adiante.

— Agora.

 

***

 

As chamas enredam o braço de Alatar, o fazendo uivar.

A dor que sentia era profunda. As olheiras eram visíveis sob as órbitas dos olhos cerrados e exaustos, as vestes e barba chamuscadas, a pele aberta em mil ferimentos que se fechavam com certa velocidade. Os dedos tremiam sobre o cajado, a coluna se curvando para que se apoiasse. As pernas já não pareciam capazes de sustentá-lo sozinhas. Apesar disso, manteve o pulso firme enquanto pôde, ganhando preciosos segundos para seus companheiros.

A batalha já se estendia há tempo demais. Pallando e Curumo estavam em situações terrivelmente similares, enquanto o inimigo parecia mais bestial e furioso que nunca.

Nenhum deles pereceria ali - ao menos, sua natureza não permitiria que acontecesse. Um destino pior, entretanto, poderia aguardá-los. Este mesmo fantasma assombrava cada um dos quatro indivíduos presentes - embora o demônio parecesse temer menos que suas contrapartes.

 

O Mago foi puxado pelo chicote e arremessado contra a parede. Suas costas bateram com força quando foi ao chão, o cajado escapando das mãos. Seus companheiros aproveitaram o momento para flanquear o adversário, lançando contra ele toda a força que tinham.

Enquanto era atingido por chamas azuis e alvas, o balrog lançou outro ataque sobre Alatar, lacerando seu peito e causando um ferimento profundo em uma das mãos. Gritando, o herói se arrasta, fecha os dedos ensanguentados sobre o cajado e, se colocando de joelhos, o bate contra o chão.

De imediato, a sala parece girar em um eixo imaginário. Paredes se tornam teto e chão, arrastando consigo todos os demais em seu movimento traiçoeiro - só quem permanece ancorado ao chão é Alatar.

Conforme o Balrog caiu sobre as asas, os Magos se apressaram para levantar. Pallando tinha o olho esquerdo consumido por sangue numa imensa queimadura que tomava a terça parte de sua face; Curumo tinha o peito praticamente aberto, as vestes rasgadas e o cajado um tanto retorcido e chamuscado. Ambos se colocaram de pé naquele momento, entretanto, em uma tentativa de continuar seu ataque. A sala estremecia, rachaduras aparecendo nas paredes; pequenas pedras caíam do alto, denunciando a instabilidade de tudo aquilo.

O Mago Branco foi mais veloz que os demais, lançando suas chamas sobre os olhos do adversário. Simultaneamente, Pallando e Alatar puxavam lâminas de suas vestes. O ataque feroz da dupla teve como foco as asas da criatura: ela já estava ferida, e era hora de garantir que não poderia fugir.

Cortes limpos trespassaram as chamas escuras e rasgaram o inimigo. Seu urro ecoou, fazendo estremecer ainda mais as estruturas do lugar. Imerso em raiva, ele lançou ataques severos sobre o Mago Branco, o castigando com seu flagelo como não havia feito até então. Não tardou para que as chamas envolvessem o pescoço de Curumo, cujas mãos tentavam afrouxar o aperto em um esforço desesperado.

Sentindo suas forças se esvaírem, ele cerrou os olhos, observando seus companheiros cercarem o inimigo e, erguendo os cajados, o içarem ao ar com dificuldade.

As mãos de todos eles tremiam: a do Mago Branco, em torno do flagelo; a dos demais, em seus cajados. Veias saltavam em seus rostos avermelhados, os dentes tão cerrados que pareciam prestes a se partir. Gotas de sangue evaporavam ao tocar o chão.

Levou longos segundos para que Curumo conseguisse se soltar, caindo de joelhos. Atento à angústia de seus companheiros e ciente de que estavam prestes a soltar o inimigo, se ergueu rapidamente e, estendendo cajado e mão vazia à frente, baixou a cabeça e passou a exercer sua própria magia.

Iniciou aos sussurros, mas logo sua voz assumiu tom mais alto. Falava em línguas antigas, os olhos fechados denunciando sua concentração desigual. Fato é que o peso não parecia arrefecer para os demais - ao contrário, o balrog se debatia cada vez mais, seus uivos e seu bracejar frenético causando novos danos às estruturas do entorno.

E então, o Mago Branco levou a mão às vestes, puxando dali um pequeno objeto metálico.

— Que as Chamas de Udûn jamais tornem a arder.

Lançou o pequenino artefato para cima, e ele pareceu flutuar sutilmente - como um barco subindo a correnteza. Seus gestos se tornaram mais pacíficos, conforme o uivo do inimigo se tornava mais estridente, seu desespero mais intenso.

E então, de súbito, conforme mais algumas poucas pedras caíam do alto, Alatar e Pallando padeceram. Caindo de joelhos ao mesmo tempo, acabaram por soltar o inimigo - que tombou no mesmo instante, parte de seu peso ausente, o corpo quebrando o mármore rachado sob si e criando uma imensa abertura para um profundo abismo - abismo para o qual deslizou, até que sua chama se extinguisse e desaparecesse na escuridão.

O pequeno objeto de Saruman caiu com ele, seu brilho dourado sendo o último resquício das chamas que outrora tomaram aquele lugar.


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Notas finais do capítulo

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