Capitulo 1 – o walkman

Sabe quando as coisas estão ruins, mas você sente que elas sempre encontram um jeito de piorar? Foi exatamente isso que eu senti aquela tarde, enquanto ajudamos os byers a empacotar as últimas caixas e nos despedimos com direito a muitos abraços melosos e lágrimas muito mal contidas da minha parte, admito.

E antes que você me pergunte, eu odeio chorar em público. Demostrar minhas fraquezas, seja pra quem for, não está no meu vocabulário. E essa pode ir pra conta do Billy, demonstrar fraqueza na frente dele estava completamente fora de cogitação, pois era exatamente o gás que ele precisava pra impulsionar suas loucuras de vez. Ele era como uma bomba, sempre preste a explodir a qualquer sinal de faísca. Não muito diferente de Neil, é claro!

—Onde você estava Maxine? – perguntou meu padrasto assim que entrei pela porta de casa, depois que Billy se foi ele resolveu que cuidar da minha era meio que sua prioridade número um, isso depois de discutir com a minha mãe, é claro.

Ele estava sentado no sofá com uma lata de cerveja na mão, enquanto assistia o noticiário, minha mãe estava sentada ao seu lado, e me lançou um olhar suplicante, no qual eu sabia que ela me implorava pra não ser malcriada e apenas ignora-lo. Suspirei cansada e apenas balancei a cabeça antes de responder um simples.

— Treinando algumas manobras no meu skate. – minha mãe deu um leve sorriso aliviada, eu geralmente falaria pra ele não me encher e entraria no meu quarto, mas eu não queria outra briga como a que eles tiveram na noite passada.

— Não me surpreende já que é a única coisa inútil que você sabe fazer, não é? – ele fala debochado antes de mudar o canal da tv, minha mãe me olha desconfortável indicando com os olhos a direção do meu quarto.

—Eu acho mais produtivo do que ficar sentada, assistindo ao documentário a tarde toda. – certo. Talvez eu não devesse ter falado isso, visto que Neil se levantou com um pulo do sofá, e minha mãe fez o mesmo ficando entre nós dois.

— Querido, ela não disse por mal, ela só está cansada... – disse minha mãe colocando uma mão no ombro direito dele para acalma-lo, - Max vai pro seu quarto! Agora! – ela disse com urgência, e ao ver a cor escarlate da cara de Neil, eu não ousei questionar dessa vez.

Marchei pelo corredor em direção ao meu quarto, quando os gritos finalmente começaram. Mas ao invés de entrar para esquerda até meu quarto, como eu sempre fazia, entrei na porta a Direita, o quarto de Billy. Eu estaria mentindo se disse a vocês que o quarto dele estava intocado, na verdade a maioria das coisas estavam guardadas dentro de caixas que minha mãe provavelmente destinaria para doação.

Bati a porta atrás de mim pra tenta abafar a gritaria, mas não surtiu muito efeito. Os gritos só pioravam e minha cabeça começava a rodar, eu odiava com todas as minhas forças aquela situação, ao menos, quando Billy estava em casa, Neil direcionava suas energias contra ele, não que isso fosse legal, mas eu sabia que na manhã seguinte, não seria a minha mãe que acordaria com o olho roxo. Eu me sentia totalmente covarde, sabia que tinha que fazer alguma coisa, mas tinha medo que tudo ficasse ainda pior.

As lágrimas já ofuscavam a minha visão quando pude notar uma caixa que ainda estava aberta, perto do criado ao lado da cama, havia um walkman dentro dela, já tinha visto Billy usando, uma ou duas vezes, geralmente ele preferia colocar uma música alta e escrota no rádio da sala ou no do próprio carro enquanto malhava como um doente ou dirigia como um doido pela cidade.

Rapidamente peguei o objeto e coloquei os fones no ouvido antes de voltar para o meu quarto e pegar algumas fitas que eu já tinha e eram compatíveis. Os gritos continuavam, mas assim que inseri uma nova fita e dei o play, a música alta começou ajudando a relaxar meus músculos, que nem eu tinha sentido que estavam tão enrijecidos até aquele momento, mas ela não impediu que eu deitasse a cabeça do travesseiro e deixasse as lagrimas rolarem.

Não sabia quanto tempo mais aguentaria aquela situação, só queria sumir daquele lugar e nunca mais voltar (entenda como quiser). Sentia meu peito apertado pronto pra explodir. Milhões de possibilidades já passaram pela minha cabeça, a mais provável delas era fugir e ir atrás do meu pai em Los Angeles, sempre tive um ótimo relacionamento com ele, nossas noites sempre acabavam em jogos de cartas e pizza.

Mas depois de tanto tempo, duvido que ele queira mudar toda sua rotina conturbada pra me acolher de vez na sua casa, já que nos falávamos raramente e ele não parecia interessado em mudar nada, e além disso, não sei se consigo abandonar de vez meus amigos, e o Lucas. Nos últimos dias, eles têm sido a verdadeira razão pra que eu tenha vontade de me levantar da cama em alguma hora do dia, seja pra qual for a besteira que eles inventem de fazer, tirando jogar d&d, é claro, eu tenho meus limites. Um novo ano está prestes a começar e isso significa que agora iremos fazer parte do ensino médio, não sei se isso me conforta por ter outra coisa na qual pensar ou me atormenta, me trazendo mais uma preocupação.

Olhei mais uma vez em direção ao walkman do Billy, aquela era a única lembrança que eu me permitiria ter dele, quero dizer, é o mínimo que ele me deve, não é? Depois de tudo que me fez?

Suspiro e aperto os olhos com força tentando reprimir aquele sentimento de paz e conforto por ele finalmente ter partido da minha vida, aquilo não era uma coisa boa pra se sentir, afinal, mesmo o odiando, ele era da família e teve uma morte trágica tentado salvar a El, mas mesmo que me esforce ao máximo eu não consigo parar de sentir esse alivio, e isso me assusta, e muito. Que tipo de pessoa sente alivio na morte do próprio irmão, por mais odioso que ele venha ser? Eu me senti o pior e mais sujo dos monstros naquele momento.