A Pergunta escrita por Dona Maricota


Capítulo 1
Olhando pra frente


Notas iniciais do capítulo

Eu nem acredito que estou fazendo isso depois de SEIS ANOS sem escrever fanfic kkkk eu realmente achei que fosse só uma fase. Mas cá estou eu, me reencontrando nesse velho hábito que é a escrita, espero não estar muito enferrujada.
Lembrando que os eventos da fic começam dois anos após o último capítulo do mangá.
Boa leitura!



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Com o coração acelerado, as mãos suando frio e a sensação de que a alma sairia para fora de seu corpo, Ranma Saotome sequer piscou quando os imensos portões da igreja se abriram. Diante de seus olhos marejados, teve a visão, quase que divina, da garota de branco saindo da luz que vinha do lado de fora.

Parecia mais um anjo. Ou uma deusa. Ou sei lá.

A cada passo que Akane dava para frente, mais ele conseguia ter a visão daquilo que esperou por tanto tempo, finalmente se concretizando. O tão sonhado matrimônio. Os convidados, todos sorridentes, não tiravam os olhos da noiva. Nem mesmo os que já conheciam todas as suas facetas poderiam imaginar que Akane entraria naquela igreja transbordando uma graciosidade nunca antes vista.

O longo vestido se arrastava pelo chão como uma núvem que dança no céu, ela segurava um buquê de flores do campo em uma mão, e o braço de seu pai em outra. Soun foi incapaz de conter suas lágrimas, e quanto mais se aproximavam daquele altar, mais ele chorava, acompanhava a filha mais nova como o tesouro mais precioso, que estava prestes a entregar nas mãos do noivo que escolheu a dedo para ela.

A irmã mais velha limpava uma lágrima com um lenço enquanto a irmã do meio admirava a beleza e elegância da noiva, de longe, podia jurar que Akane estava idêntica a sua falecida mãe. Os pais do noivo também não conseguiram segurar a emoção, tantas águas rolaram até que finalmente pudessem desfrutar daquele momento, ver seu filho tão crescido e viril de pé no altar preparado sob medida. Tudo estava perfeito. Como planejado.

Ranma, por sua vez, estava tendo que conter inúmeras explosões internas a medida que sua noiva se aproximava lentamente do altar. Ele pôde jurar que estava começando a suar de nervosismo, e bem, não queria passar nenhum vexame manchando aquele terno branco nada discreto.

"Segura a onda, Ranma Saotome..." pensou consigo mesmo, "É só a Akane...".

Qualquer esforço para tentar se acalmar era inútil naquele momento. Não era só a Akane, era A Akane, e em seu estado mais belo possível, a garota que estava a poucos passos de se tornar sua esposa, a pessoa com quem dividiria sua vida para todo o sempre. E sempre.

 E sempre.

Ranma tenta divagar para longe dali, mas acabou caindo em um espaço nostálgico e quase melancólico de sua mente, rebobinava em sua cabeça todos os momentos que os levaram até aquele altar, desde sua chegada agitada ao Japão, as desavenças provocadas por teimosia, as trambicagens de terceiros e todas as outras circunstâncias que os fizeram, apesar de imperfeitos, um par.

Mas sua viagem no tempo não durou muito, pois ao piscar, Akane estava bem à sua frente. Sentiu o rosto queimar diante de cada micro detalhe. Nunca antes tão feminina, tão angelical. Soun segura a mão de Akane e a estende para Ranma, tal qual um ritual de entrega que disesse "cuide bem da minha filha", o garoto, sem conseguir disfarçar seu tremilique, tomou a mão de Akane nas suas, ajudando-a a subir o último degrau. Tímidos, eles nem conseguiam se olhar nos olhos, apenas seguiram o roteiro e ficaram lado a lado de frente para o celebrante, que selaria a união das famílias Tendo e Saotome.

A música diminui o tom para dar espaço à voz do mestre matrimonial, que tosse e diz:

— Estamos aqui reunidos para consagrar o matrimônio deste jovem casal, - ele estende um braço para o noivo - Ranma Saotome - estende o outro para a noiva - e Akane Tendo.

Ranma sentiu o corpo todo tremilicar e suar frio, aquilo que foi tão especulado e repetidamente discutido, provocando inúmeras reviravoltas e desventuras, estava finalmente acontecendo diante de seus olhos. E era muito real. Mas não parecia real.

— Uma união, digamos... "antiquada" para os dias de hoje, ainda mais os jovens - brinca o mestre, arrancando algumas risadinhas das testemunhas - mas ainda com seu valor. É verdade que, sim, o arranjo dos pais foi o ponto de partida. Mas o que os trouxeram aqui hoje, diante de todos nós, testemunhas, e os olhos divinos... foi o livre arbítrio.

Ranma deixou um suspiro escapar de seus lábios.

— Foi o amor - concluiu o mestre cerimonial, sorridente, suas palavras calaram o noivo profundamente, que agora, de frente para Akane, sentia borboletas em seu estômago - então antes de prosseguirmos, eu lhes faço a seguinte pergunta...

"Ué..." pensou Ranma. Já estavam indo para o aceito? Não está rápido demais? Ou será que estava tão nervoso que sequer sentiu o tempo passar?

Pouco importa, pois Akane estava prestes a proferir as palavras mais importantes de sua vida bem diante de seus olhos.

— Akane Tendo, - começou o celebrante - você aceita este homem como seu legítimo marido, para que possam dividir suas alegrias, tristezas, e tudo o que o futuro lhe espera, até o fim de suas vidas?

Uma gota de suor escorre pelo rosto do noivo, sentia um calor subindo dos pés a cabeça, e a sensação de que podia decolar como um foguete. Akane, encantadora e com um olhar hipnotizante, prendeu a atenção de Ranma sem nenhum esforço.

A noiva olha para os convidados ali presentes, eram tantos que nem haviam assentos para todos. Olha para sua família como quem busca um apoio, e volta a olhar para Ranma.

Mas desta vez, com um olhar indiferente.

— Não.

"... Quê?"

O calor que antes tomava conta de seu corpo, agora foi substituído por um frio capaz de petrificá-lo. Akane relaxa seus braços, deixando o buquê cair, ela retrai o rosto com repulsa.

— Não posso fazer isso... Não com ele...

— A-... - o garoto deixa escapar - Akane, mas o quê-?!

Ele então percebe algo errado, o tom da sua voz tinha mudado, Akane já não era tão mais baixa que ele, e quando olha para baixo, nota um volume nos seus seios que antes não estavam ali.

"Mas... Mas quando foi que eu virei garota?!"

De repente, aquele altar que antes era decorado em tons pasteis é tomado por uma escuridão sombria, fria e agonizante.

— Eu sabia que ela não iria querer casar com ele - Ranma escuta uma voz vinda sei lá de onde, ele olha por todos os lados procurando quem estava falando - quem ia querer casar com um transformista esquisito?

— O que é isso?! - Ranma indaga, furioso.

— Eu teria vergonha de ser noiva dele - uma outra voz maldosa vinda do além ecoa em sua cabeça.

— Ele nem é homem de verdade - diz outra voz, em tom de malícia.

Era como se Ranma tivesse adquirido uma audição supersônica, capaz de alcançar todos os cochichos dos convidados ali presentes. O que deixou de ser só uma sensação, ficava cada vez mais real.

As risadas maldosas ecoavam em sua cabeça, junto com comentários ácidos que espremiam todas as suas inseguranças, fazendo-o cair de joelhos e tampar os ouvidos com força.

Queria sumir. Só queria sumir.

No meio das risadas e cochichos mais afiados que uma lâmina, ele escuta passos que se afastam mais e mais. Olha para o lado e vê Akane andando lentamente para o único ponto de luz do espaço, que era a saída.

— Ei Akane, espera! - Ranma suplica, tentando se arrastar até ela. Mas é contido por garras escuras que pareciam se multiplicar, segurando seus braços, pernas, torço, rosto.

Ranma estava sendo sugado para a escuridão, tendo cada vez menos a visão da noiva, que não atendia a nenhuma das vezes que ele gritava por seu nome. Continuava seguindo em frente, sem se importar com mais nada.

Antes de ser completamente tomado pela escuridão, uma lágrima escorre em seu rosto.

 

 

— AKANEEE!!

 

 

O garoto arfava, sentado em sua cama e olhando para a parede. O salto o fez acordar de seu pesadelo, e demorou uns bons segundos para ele sair do transe. Ranma espreme seus olhos com os dedos e joga seu cobertor para longe, sentia-se pegajoso. Percebeu não só que estava todo suado como deixara seu lençol úmido.

— Tsc!

Ranma volta a deitar a cabeça no travesseiro, aliviado por ter sido tudo um sonho, mas ao mesmo tempo seu corpo ainda estava em alerta. Ainda sentia o peito pesado por conta das palavras proferidas pelos fantasmas em seu pesadelo. E por Akane.

Tais incertezas dançavam na mente de Ranma há anos, ele só queria que elas sumissem.

Olha para o canto do quarto buscando o relógio, já era quase meio dia e logo sua mãe o chamaria para almoçar.

 

—--

 

— Akane, levanta - Kasumi deu três batidas na porta do quarto da irmã caçula - o almoço já vai sair!

A menina rodopia na cama se espreguiçando, lutando contra o sono. Diferente de uns, ela teve uma ótima noite de sono.

Akane se senta na cama, ainda meio sonolenta, e olha para o calendário em sua cômoda. 2 de abril de 1989. Seu último dia de férias. Ela geme em tristeza, enfiando a cara no travesseiro mais uma vez.

Por ela, passaria seu último dia de férias dormindo até segunda ordem. Mas não rejeitaria um pedido de Kasumi. Então se levanta, abre as cortinas, se depara com uma manhã ensolarada de primavera, e põe um vestido casual, perfeito para quem vai ficar o dia todo em casa.

Akane sai do seu quarto e dá de cara com Kasumi, que ainda está no corredor.

— Sabe que horas são mocinha? - o tom de Kasumi era de repreendimento, mas ela não tirava um sorriso gentil do rosto.

— Ah Kasumi, é domingo... - a mais nova pede por trégua.

— E amanhã voltam as aulas, quero só ver você dormir cedo hoje - assumir o posto de figura materna já não era só mais um costume para a irmã mais velha, era quase um traço de sua personalidade. Mas ela muda o olhar de repente para um bem mais animado - Bom, adivinha o que acabou de acontecer?

— O quê? - Akane pergunta, curiosa.

— Nabiki recebeu uma carta no correio.

A expressão de Kasumi já tirava qualquer dúvida, depois de alguns segundos processando, Akane entendeu qual era o assunto.

— Você quer dizer que...! - Akane quase salta de emoção, e pela alegria no olhar da irmã, ela já sabia a resposta - Cadê ela??

— Lá na sala.

Num impulso, Akane sai correndo pelos corredores, desce as escadas fazendo um barulho moderadamente estrondoso no piso de bambu.

Corre pelo andar de baixo até chegar na sala de jantar, onde se depara com Nabiki sentada de frente para o seu pai, que como de costume, estava chorando emocionado, mas desta vez segurando um papel que parecia ser a tal carta.

Akane toma a atenção de Nabiki, que já sorri percebendo a euforia da irmã.

— Você passou?! - perguntou a mais nova.

— Uhum - confirma a do meio, que transparecia uma calma muito maior que qualquer outro.

— Aah! - Akane salta em direção de Nabiki, abraçando-a calorosamente, causando até certo desconforto nela, que não era muito chegada a contato físico - Parabéns! Parabéns! Parabéns! - Akane pousa alguns beijinhos sapecas na bochecha da irmã, deixando-a ainda mais inquieta - Eu sabia! Eu sabia que você ia conseguir!

— Tá bom! Tá bom! - suplica a irmã do meio, afastando a menina que a abraçava e apertava com muito entusiasmo.

— Minha primeira filha a entrar na universidade... - o sr. Tendo falava sozinho, admirando a carta de aprovação em suas mãos como um troféu, e óbvio, ele não parava de chorar - Ai... Como vocês me enchem de alegria!

O pai se escorava na mesa de tanta emoção, sem vergonha nenhuma de expôr seu lado emotivo. Kasumi entra na sala e as irmãs sorriem umas para as outras, contentes em ver o pai tão feliz.

Nabiki já tinha concluído o ensino médio há poucos meses e acabara de completar dezenove anos, aquela carta de aprovação parecia quase que um presente de aniversário atrasado. Ela prestou vestibular para um curso de direito, e considerando seu empenho e poder de persuasão quando havia dinheiro envolvido, ela definitivamente tinha vocação para a advocacia.

Os Tendo não tinham dúvidas que aquela carta chegaria, e chegou o momento.

— Quando começam as aulas? - pergunta Kasumi.

— Mês que vem - responde a irmã do meio.

— Ai que legal! - a mais nova ainda está muito entusiasmada, comemorava a vitória da irmã como se também fosse sua - Deve ser tão bom... Entrar pra uma universidade...

Akane começa a divagar em sua imaginação, tinha uma ideia um pouco simplista do que era ser universitária, mas sempre teve em sua cabeça essa idéia como um modelo de quem é intelectual e independente, quase descolado.

— Espero que minha turma não seja lotada de mauricinhos - Nabiki dá de ombros, levava tudo aquilo com muito mais naturalidade que o resto da casa.

Akane ainda estava viajando em suas fantasias, apoia seus braços sobre a mesa do centro da sala e começa a ponderar:

— Qual curso será que eu poderia prestar pro vestibular? - ela leva suas mãos ao rosto com os braços ainda apoiados na mesa - Tem tantas coisas que eu gostaria de aprender...

— Mas Akane, você não precisa - Kasumi puxa os pés da irmã mais nova de volta para a terra, de forma quase que abrupta. Senta-se com todos ao redor da mesa e põe uma mão no ombro de Akane - Você vai herdar a academia junto com o Ranma.

Aquela frase dita com um sorriso inocente foi uma alfinetada bem incômoda para Akane, ela franze o cenho em resposta, mas nem consegue formular uma frase pois seu pai instantaneamente parou de chorar e entrou na conversa.

— Exatamente! - Afirma o pai da família com muita precisão, nem parecia que estava se afogando em lágrimas há poucos segundos atrás - Não fique enchendo sua cabeça com essas bobagens, filha. Seu futuro já está muito bem encaminhado.

A filha mais nova fica ainda mais incomodada com toda aquela conversa, aquelas simples palavras ditas com a maior naturalidade ocupavam um espaço bem desagradável na cabeça dela. Anos e anos a fio, ela teve todo o seu futuro desenhado pelos outros. Toda aquela falta de autonomia era sufocante. Ainda mais para alguém como ela, que prezava a independência mais do que ninguém. O fato dela sequer poder tomar a mais básicas das decisões sozinha sem antes o consentimento de seu pai a tirava do sério.

E pior. Sempre tinha de estar atrelada a Ranma.

— Tá dizendo que se eu quisesse estudar você não iria deixar, pai? - pergunta, com a sobrancelha levantada, anunciando que estava descontente com o rumo que a conversa tomou. Kasumi percebe e vai até a cozinha buscar almoço.

— Estou dizendo que é uma perda de tempo - ele responde calmamente, enquanto bebe um gole de chá - para herdar a academia de artes marciais, você deve se entregar por completo! Você e o Ranma precisam estar totalmente focados nisso.

— É pai, mas estamos falando só de mim - ela começa a alterar um pouco o tom de voz - por que tem que trazer o Ranma pro assunto?

— Ora - ele dá de ombros - ele é seu noivo, e também herdeiro da academia. Todos os passos que vocês darão será em conjunto.

Akane acaba misturando o sentimento de raiva e de frustração, detestava ter de ouvir aquele tipo de coisa com frequência.

Se sentia diminuída. Impotente.

— Não se preocupe, Akane - Kasumi retorna e começa a colocar a mesa - Estude, complete o ensino médio, e depois vai poder focar totalmente na academia. E no Ranma.

— E no-...?! - Akane achava que não podia ficar ainda mais decepcionada com o que pensavam de sua vida - Quer dizer que pra vocês o foco da minha vida tem que ser casar com o Ranma?!

Nabiki percebe que o clima vai ficando mais e mais desconfortável, lança um olhar de reprovação para Kasumi que não estava ajudando em nada.

— Não é pra tanto, Akane - Soun a responde - Mas esse ano vocês dois fazem dezoito anos, é um momento perfeito pra-

— Okay, vamos mudar de assunto! - Nabiki interrompe, pega um prato e começa a se servir - Hoje é o meu dia, vocês precisam me paparicar!

Kasumi aproveita a brecha e concorda:

— Sim, sim! Já liguei para os Saotome virem aqui mais tarde, vamos comemorar!

Os três Tendo começam a conversar futilidades e rirem enquanto almoçam, um momento raro para essa família que sempre tiveram a refeição atrapalhada pelo caos. Mas Akane não consegue se juntar a eles, se serve silenciosamente enquanto, cabisbaixa, digere tudo o que acabara de escutar.

Mas o pior de tudo é que já estava habituada com conversas como essa, sempre reforçando a frustração que sentia ao ter seu futuro definido por homens.

 

—--

 

Ranma entra na sala e dá de cara com seu pai e sua mãe, ela serve o almoço enquanto ele bebe uma cerveja assistindo TV.

— Filho, já ia te chamar! - Nodoka sorri para Ranma, sempre uma mãe muito atenciosa, mas agora ela lançara um olhar preocupado para ele - Você está bem, querido?

— Tô, por que?

— Parece até que viu um fantasma...

Talvez não estivesse dando pra disfarçar que ainda estava atordoado com o pesadelo que teve. Ele tenta desconversar com um sorriso amarelo.

— Não é nada... - ele se senta a mesa e começa a se servir - É só a tristeza no olhar de quem tem aula amanhã.

— Entendi... Genma, abaixa o volume dessa TV! - a mulher ordena para o marido, que faz cara feia imediatamente - Venha se servir, é um almoço em família.

— Já vai, mulher - ele rosna, se arrastando pelo tatame até alcançar a mesinha baixa onde todos se serviam de joelhos.

Já faziam quase dois anos desde que os Saotome voltaram a morar todos juntos, a estadia caótica na casa dos Tendo fazia falta de vez em quando. Mas não é como se o pai, mãe e filho Saotome não tumultuassem eles mesmos, bem mais que os Tendo na verdade.

Afinal, não tinha como um garoto temperamental que ocasionalmente troca de gênero, um velho calvo de caráter duvidoso que passa boa parte do tempo como panda, e uma senhora com princípios um tanto quanto radicais, terem uma convivência totalmente pacífica. Na verdade, Ranma as vezes tinha a sensação de que na casa dos Tendo tinha um pouco mais de paz.

Nodoka põe um sorriso no rosto, anunciando que acaba de lembrar de algo importante:

— Esqueci de contar! - ela mastiga o resto de arroz que tinha na boca e volta a falar quando engole - Nabiki foi aprovada na universidade!

Ranma instantaneamente dá um sorriso genuíno, Genma fica surpreso e um tanto emotivo.

— Nossa, que bom! - diz Ranma - Vou dar os parabéns!

— Kasumi ligou para mim hoje cedo e nos convidou para ir lá mais tarde - a mãe acrescenta - Estejam prontos antes das quatro.

— Meu velho amigo Tendo deve estar tão feliz! - Genma fica melancólico a ponto de deixar uma lágrima escorrer de seu rosto - Ah, se a sra. Tendo ainda estivesse aqui... Estaria tão orgulhosa!

Genma tinha breves lembranças da falecida esposa de Soun, tinha ela como uma figura doce, gentil e uma grande mãe de família. Era emocionante ver aquelas crianças crescendo e seguindo seu rumo.

O velho olha para o seu filho e lhe pousa a mão em seu ombro.

— Muito em breve será a sua vez de dar orgulho ao seu velho pai, Ranma! - ele aponta, ainda com lágrimas escorrendo em seu rosto.

Ranma levanta uma sobrancelha, desconfiado.

— Não é você que diz que eu não preciso de faculdade?

— Não tô falando disso, garoto! Falo do seu casamento com Akane! - e a história se repetia em outro lugar, Ranma sente isso como uma alfinetada, mas muito mais dolorida depois do pesadelo que acabara de ter, a ponto de lhe dar calafrios só de cogitar esse cenário mais uma vez - Mal posso esperar pelo dia em que verei você assumindo a academia de artes marciais estilo vale-tudo... só de imaginar me emociono!

Mais lágrimas dramáticas descem pelo rosto de Genma. Ranma revira os olhos perante toda aquela cena, tenta ignorar e volta a comer sua refeição em paz, mas óbvio, seu pai tinha que falar mais asneira.

— Mas claro, antes... - Genma começa, parando de chorar e ajustando seus óculos - Precisamos dar um jeito no seu... "probleminha".

Ranma lança um olhar amedrontador para o pai, que pouco parece se importar.

— Tá sugerindo o quê, velho?

— Ora... - Genma não consegue conter algumas risadinhas discretas, afinal apesar da humilhação, ele precisava admitir que achava a desgraça do filho um tanto cômica - Você acha que a Akane vai querer se casar com você sendo... assim?

Sem aviso, ou que ele pudesse esperar, Ranma lhe atira o copo d'água que estava em cima da mesa, transformando-o em panda. O panda começa a rosnar, como quem reclamasse na língua dos ursos. Nodoka leva a mão a testa, já desgastada com essa relação conturbada do marido e do filho.

— Eu não sei nem como a mãe ainda te quis ASSIM! - Ranma o responde à altura, e volta a entupir sua boca de comida e rosnar de boca cheia - E como se eu quisesse casar com aquela chata!

Os pais de Ranma trocam olhares decepcionados e suspiram juntos, já não aguentavam mais essa mesma conversa e as mesmas respostas batidas.

A verdade é que, durante esses dois anos de convivência, a relação de Ranma e Akane não saiu muito dos trilhos. Teve toda aquela palhaçada de montar um casamento improvisado às pressas, que no fim teve de ser adiado por conta de terceiros. Então ficou decidido que o casamento aconteceria depois que as questões pessoais fossem resolvidas, o que, óbvio, não aconteceu.

Estamos falando das duas pessoas mais teimosas de Nerima. Se brincar, do Japão. Todas as investidas e trambicagens aprontadas pelos pais para tentar estreitar os laços entre eles e fazê-los engatar o noivado pareciam em vão. E não é como se as trezentas pretendentes de Ranma e a meia dúzia de lunáticos fissurados por Akane ajudassem muito.

— Filho, vou ter de concordar com o seu pai - sua mãe se intromete, deixando-o ainda mais decepcionado, mas diferente de seu pai, não poderia reagir com ela - Precisamos pensar no seu bem e da Akane. Óbvio que tem a academia, mas me preocupo com a relação de vocês...

— Onde quer chegar? - Ranma pergunta de boca cheia, já sem paciência.

— Bom... - ela busca as melhores palavras, sem muito sucesso - Digamos que... Nenhuma mulher ia gostar de um homem... "Pela metade", entende? - o filho segura os hashis com tanta força que quase os quebra no meio - Talvez justamente por isso vocês briguem tanto - ela pondera, como se aquilo fizesse algum sentido - Precisamos juntar dinheiro para ir para a China o quanto an-

No ímpeto, Ranma pega sua tijela e se levanta abruptamente, se retirando da mesa.

— Pelo amor de Deus, eu só queria almoçar em paz! - Ranma sai batendo perna pelo corredor em direção ao seu quarto - Que inferno!!

— Filho, espera aí! - ela tenta chamá-lo de volta, mas recebe uma batida de porta em resposta. Ela suspira decepcionada mais uma vez, mas não podia reclamar, pelo menos ele parecia muito másculo enfrentando ela assim.

Ranma põe sua tigela na cômoda e se joga na cama, afoga a cara no travesseiro e tem seu urro de raiva abafado por ele, começa a resmungar sozinho enquanto bate perna no colchão. Aquele definitivamente não era seu dia.

Ranma se vira de barriga pra cima e fica encarando o teto, remoendo todas as inseguranças que foram esmagadas, primeiro por seu pesadelo, agora por seus pais.

Será que quando quebrasse a maldição isso finalmente pararia?

— Que droga...

 

—--

 

Chegado o fim de tarde, e os Saotome entram juntos na casa dos Tendo, são recebidos por Kasumi que está um pouco mais arrumada que de costume.

— Sejam bem vindos!

— Kasumi, como você está linda! - alega a sra. Saotome, enquanto todos já iam entrando em direção a sala de jantar.

— Muito obrigada! - a garota responde - Estão todos lá na sala.

Ranma é o primeiro a dar de cara com Nabiki, ele arranca um sorriso dela no momento em que ela o vê.

— E aí, futura advogada - ele brinca, se aproximando mais dela com um olhar brincalhão - Tá doida pra arrancar dinheiro dos outros, né? Pelo menos agora vai ser por uma causa nobre!

— Oh Ranma, não se preocupe - ela pousa uma mão no rosto dele e lhe lança um sorriso cínico - Tirar dinheiro de você sempre vai ser mais divertido. Inclusive, você tem uma dívida de-

— Sei, sei, sei! - ele já desconversa o assunto, abrindo espaço para seus pais parabenizarem Nabiki.

Kasumi começa a colocar uns quitutes na mesa, Soun e Genma já estão chorando abraçados enquanto Nodoka e Nabiki conversam. Ranma olha para um lado, para o outro, e não encontra a caçula.

— Ei Kasumi, cadê a Akane? - Ranma pergunta.

— Ah, ela tá na academia - comenta Kasumi, ela faz sinal para ele se aproximar pois queria cochichar algo no ouvido dele - Ela não tá de bom humor...

— Que novidade...

— Por que não vai lá e leva uns docinhos pra ela? - Kasumi prepara um pratinho e entrega pra ele.

O garoto de trança, sem contestar, pega o pratinho, coloca um doce na boca, e segue seu rumo até a academia que ficava no quintal da casa.

Lá, a garota estava praticando artes marciais para extravasar a raiva. Muita coisa acumulou dentro de si depois do almoço em família nada agradável que teve mais cedo. Golpeava aquele boneco de palha como se fosse seu próprio pai lhe dizendo coisas como "seu papel em vida é se casar com o Ranma".

Quanto mais ela pensava nisso, mais fortes ficavam seus chutes e socos, até que chegou um ponto em que o próprio boneco cedeu e a madeira que o sustentava se partiu. Akane pousa as mãos em seus joelhos, exausta, arfando pausadamente enquanto limpava sua testa de suor.

— Coitado do boneco...

Uma voz veio da entrada da academia, fazendo-a olhar instantaneamente em sua direção. Juntou as sobrancelhas e cruzou os braços sem muita paciência perante aquele olhar cínico do seu noivo.

— Que é que você quer? - ela dispara com muita arrogância, fazendo-o se retrair.

— Você é grossa, hein...

— Fala logo! Veio fazer o quê aqui?!

— Te trazer doce, quer não? - ele ergue o pratinho de doces para ela, inclusive pegando um e levando à sua boca - Se você não quer, eu quero.

— Ei, eu quero... - ela abaixa um pouco a sua guarda.

Ranma se aproxima dela e eles se sentam lado a lado no chão do dojo, petiscando o pratinho de doce juntos.

— Tá todo mundo lá na sala, por que a gente não vai?

— Não to afim - ela resmunga, dando sinais de antipatia.

— Aconteceu alguma coisa?

— Não quero falar sobre isso! - ela rosna com a boca cheia de doces.

No cantinho da bochecha dela tinha um pouco de chocolate, Ranma instintivamente leva seu dedo até o rosto da menina e tira a sujeira com delicadeza, sem nem pensar no que estava fazendo, mas aquilo fez ela ir de irritada à tímida em questão de segundos. E ela detestava o quão facilmente ele conseguia manipular as suas emoções.

Ranma se escora no chão, com um pouco de preguiça. Ele então tenta mudar de assunto, bocejando:

— Que sono...

— Dormiu pouco? - ela pergunta, com a guarda finalmente baixa.

— Dormi muito mal.

— Por quê?

— Tive um sonho estranho.

— Sonhou com o quê?

Ele pensou por alguns segundos no quê responder, não podia simplesmente dizer "ah, sonhei que a gente casava mas você me largava no altar, nada demais". Mas não conseguiu pensar numa resposta rápida.

— Não lembro.

— Ué... E como sabe que foi estranho?

— Sabendo.

— Hum - essa estava sendo uma das conversas mais desconexas que eles já tiveram, já estavam prestes a ficar em silêncio constrangedor mais uma vez, mas ela persistiu - Eu acho que sonhei com o Ryoga.

Aquilo conseguiu chamar a atenção de Ranma num piscar de olhos, ele agora tinha os olhos grudados nela com bastante interesse.

— E como foi?

— Ah... Acho que a gente tava no parque... e parece que ele ia me dizer alguma coisa - ela faz um real esforço pra tentar se lembrar - Mas aí a Kasumi me acordou.

— Que sem graça.

Ele arranca uma risadinha dela, e mais uma vez ficam sem assunto. Realmente estava difícil manter o ritmo, ambos tiveram dias péssimos e estavam com muitas inseguranças na cabeça, inseguranças essas que envolviam um ao outro.

— Vocês tem notícias do vovô Happosai? - Akane tenta mais uma vez puxar papo.

Happosai era um nome que quanto menos era dito, mais a paz se instaurava. E a verdade é que a cidade de Nerima, e sobretudo as famílias Tendo e Saotome, foram agraciadas por uma tal "viagem espiritual" que o velho pervertido resolveu fazer.

Depois de uma boa temporada tornando a vida de todos na cidade um inferno, em especial as mulheres, Happosai começou a vir com uns papos de se conectar com seu eu interior e a natureza para se doar ainda mais às suas técnicas de artes marciais. Obviamente ele recebeu estímulos de todos para partir o quanto antes, e já se fizeram quatro meses desde a sua ida.

— Graças a Deus não, e vocês? - Ranma responde em tom de deboche. Ela balança a cabeça negativamente - Até hoje eu não entendi o que diabos ele foi fazer na... pra onde é que ele foi mesmo?

— América do sul.

— Isso, esse fim de mundo aí.

— Tomara que demore bastante pra ele voltar...

— Tomara que ele morra - Ranma brinca, arrancando um espanto seguido de uma risada da menina.

— Ranma, que horror!

— Ah vai, você há de concordar que a vida sem ele é bem melhor - ela lança um olhar de reprovação perante sua piada fúnebre, mas ainda não consegue conter umas risadas - Tô zoando.

— Ai, ai... Que coisa, né? - Akane junta seus joelhos e apoia suas mãos neles, seu olhar fica distante - Amanhã começam as aulas, e... Não vai ter a Nabiki por lá... Nem o vovô Happosai invadindo o vestiário...

— Ou o Kuno enchendo o saco.

— É verdade! Nossa... - Akane parece ter se dado conta disso só agora, mas era óbvio, Kuno era da classe de Nabiki, e eles se formaram juntos - É... Vai ser um ano bem diferente no colégio.

— E também o último - ele acrescenta.

Ambos, apesar de concordarem que todos os envolvidos eram inoportunos, não conseguiam evitar um tom melancólico para esta conversa. Muitas coisas estavam mudando ao mesmo tempo, e não tinha mais volta.

Apesar do cotidiano deles sempre ser um caos, eles aprenderam a encontrar conforto nesse caos. A incerteza do que o futuro aguardava era muito presente em suas noites mal dormidas.

— Mal posso esperar - Ranma começa, com um sorriso debochado e um olhar distante - Uma vida sem a múmia do Happosai... Sem o Kuno querendo me matar ou me agarrar... Sem a Nabiki me extorquindo dinheiro... - ele estava tão feliz em suas fantasias que começou até a babar - Parece até um sonho...

Akane ri.

— Sou obrigada a concordar com você.

— Imagine Akane - ele se senta mais uma vez,coloca uma mão no ombro dela enquanto gesticula com a outra - a gente chega na escola amanhã... e vamos ter um dia completamente normal! Não é incrível?!

— Sonhos viram realidade - eles riem juntos mais um pouco, tendo um raro momento onde de fato aproveitam a companhia um do outro. Akane se levanta e lhe estende a mão - Vamos, devem estar esperando a gente.

Ranma segura a mão dela e se apoia, levantando.

— Só faltava mais uma coisa pra ficar perfeito - ele diz enquanto eles caminham para fora do dojo.

— O quê?

— Você ser só um pouquinho menos chata - ele a provoca gratuitamente, mostrando a língua para ela e já se afastando de uma possível surra.

— Vai começar, é?! - ele desvia de um soco dela.

— Ô Akane, o boneco tá ali - ele sai correndo, rindo, e ela vai atrás.

— Volta aqui seu imbecil!

De fato, muitas coisas estavam mudando. Mas Ranma e Akane permaneciam os mesmos.

Mas por quanto tempo?

 

—--

 

— Akane, a sua quentinha! - Kasumi chama pela irmã mais nova, que já saia correndo atrasada para o primeiro dia de aula. Óbvio que, considerando o péssimo hábito de acordar tarde que adquiriu nas férias, ela não conseguiu acordar na hora. Akane dá meia volta e pega a marmitinha preparada pela irmã - Boa aula!

— Valeu! - ela agradece e sai em disparada.

Kasumi vai até o portão de casa ver a irmã mais nova se afastar, para garantir que ela não acabaria tropeçando no caminho, levando em conta o quão desajeitada ela era. Assiste a garota sumir entre as ruas do quarteirão, e quando se prepara para entrar, olha de relance para a caixa de correio, percebendo um papel mal colocado na abertura.

Caminha até ele, o pega em suas mãos, e vira a folha buscando um remetente. Estava escrito Conselho das Artes Marciais em letras cursivas, e vinha direto da China, ela ergue a sobrancelha e analisa o papel em suas mãos.

— O que será isso aqui? - se pergunta a jovem enquanto caminha de encontro a seu pai.

 

—--

 

Akane já estava ofegante correndo pelos quarteirões, tentando tomar cuidado para não cair ou desmanchar sua quentinha feita por Kasumi. Dobrando a próxima esquina, ela avista Ranma correndo por cima dos muros, tão desesperado quanto ela.

Ela se aproxima sorrateiramente, e quando ele espia para baixo percebe que estão correndo lado a lado.

— Tá atrasada, Akane! - ele brinca.

— Olha quem fala! - ela resmunga, sem perder o ritmo.

Sem trocar mais nenhuma palavra, Ranma desce do muro e se junta a ela na calçada, ao longe viam o colégio Furinkan, meia dúzia de alunos chegando atrasados, já era quase a hora dos portões se fecharem.

Os noivos ultrapassam a entrada do colégio, mas o sexto sentido de Ranma o faz ficar em alerta, pressentindo que algo seria arremessado em sua direção. Ele estende a mão para o lado e impede que Akane siga em frente, os dois freiam juntos.

De repente, em uma velocidade absurda, uma rosa vermelha finca o chão, quase furando os dedos do pé de Ranma. Pela rota que ela seguiu, parece que foi arremessada do alto do colégio. Era algo completamente inusitado para qualquer um, mas tanto Ranma quanto Akane já reconheciam esse ritual.

— Essa não... - os noivos dizem em coro, olhando para cima em busca de quem atirou a rosa, já sabiam muito bem quem era.

Uma figura máscula e grande salta da superfície em que estava, pousando no chão de forma muito dramática, ele aponta sua katana de madeira para Ranma e faz uma pose ameaçadora.

— Ranma Saotome... - o ex aluno começa sua performance quase que teatral - Dois anos estudando nessa instituição... E você sequer é capaz de usar o uniforme adequado!

Ranma usava seus trajes casuais de sempre, de fato, ele nunca deu importância para o uniforme do colégio, mas Kuno não poderia reclamar, estava sempre usando suas vestes de kendô durante as aulas. E ele obviamente estava usando elas agora também.

— Qual é, Kuno! Você não se formou?! Tá fazendo o quê aqui?! - o garoto de trança rosna para o ex veterano, indignado com a quebra de expectativas, achava que nunca mais teria que lidar com Kuno, pelo menos não no colégio.

— Hu hu... Tais formalidades não iriam me impedir de vir humilhá-lo em público - ele ri em tom de soberba, em sua cabeça doentia acreditava piamente que Ranma estava morrendo de medo de enfrentá-lo. Ele abaixa sua espada e fita o rosto de Akane - Ou de visitar minha amada...

— Kuno pelo amor de Deus, vai arrumar o que fazer... - suplica a menina.

— Akane Tendo... por favor, não chore - uma lágrima solitária escorre pelo rosto de Kuno, que legitimamente estava emocionado - A ideia de não vê-la mais todos os dias é muito mais torturante para mim...

— Err... - ela fica desconfortável.

— Mas não se preocupe, minha amada! - ele leva uma mão até o próprio peito, e continua sua performance - Irei visitá-la sempre que puder, para que não sinta minha falta...

— Meu Deus...

— E quanto a você, Ranma Saotome! - ele aponta o dedo para Ranma, que estava muito desinteressado em tudo aquilo - Se não me mostrar onde escondeu minha deusa de rabo-de-cavalo, para que eu também possa acalentá-la, terei de arrancar ela de você a força!

— Dá pra ser depois não? - Ranma pergunta, sem paciência - Eu tô atrasado.

— Como você é covarde - Kuno torna a ficar em posição de ataque - Admita que morre de medo de me enfrentar! - o ex veterano corre em direção a Ranma, sacudindo sua katana de madeira, golpeando o ar - Prepare-se pra morrer, infeliz!!

Ranma revira os olhos e entrega sua maleta para Akane, que dá espaço para aquela luta inconveniente. O mais baixo desvia de todos os golpes de Kuno, pousa a ponta dos pés sobre sua espada e lhe dá um chute na cara, capaz de nocauteá-lo no chão.

Quinze segundos, esse foi o tempo da luta.

— Uau, é seu novo recorde - Akane lhe entrega a maleta e os dois seguem seu caminho para dentro do colégio.

— Que cara mais desocupado... - Ranma sequer suou, pelo menos a impertinência de Kuno servia para amaciar o seu ego.

Deixaram o ex colega ali nocauteado no chão para ser varrido junto com o lixo.

Ranma e Akane sobem as escadas juntos, trombam com alguns amigos, e se direcionam para sua nova sala, que agora ficava no último andar do prédio. Felizmente a professora ainda não havia chegado, então não precisariam se preocupar com castigo.

Os noivos escolhem assentos lado a lado no meio da sala, e Ukyo, que antes escolhera um assento mais no fundo, empurrou uma garota para se sentar ao lado de Ranma.

— Ranma, docinho! - exclama a garota de cabelos compridos e vestes masculinas, chamando a atenção dele e inevitavelmente de Akane - Olha que legal, vamos sentar juntos esse ano!

— Eu achei que a menina tava aí... - ele questiona, apontando para a menina visivelmente irritada que Ukyo empurrou.

— Ah, já me resolvi com ela! Ela senta lá atrás - Ukyo pisca para a garota, que resmunga alguma coisa, mas ninguém dá atenção, ela acaba obedecendo e se vai. A prometida de Ranma volta sua atenção para ele e muda de assunto - Alguma novidade?

— Nada - ele responde, esvaziando sua maleta - só o Kuno enchendo o saco como sempre.

— Ué, ele não se formou?

— Pois é, por incrível que pareça.

— Hum... Ranma, eu tava pensando - ela começa em um tom bastante sugestivo, já causando um frio na espinha de Akane, que escutava tudo silenciosamente - Eu estive montando novos sabores de pizza nas férias, por que você não vem comigo depois da aula pra-?

O som estrondoso de uma janela se quebrando fisga a atenção de todos os alunos. Todos são surpreendidos pela garota em cima da bicicleta, que atravessou a janela do último andar como se fosse nada.

— Ni hao! - a doce voz de Shampoo ecoa por toda a sala, ela desce da bicicleta segurando uma caixa de entregas, parecia tão contente e despretenciosa que nem aparentava se ligar da entrada triunfal que acabou de fazer. Ela vai até o assento de seu noivo, passando por Akane sem nem perceber - Ranma, Shampoo sentir saudades!

— Sham-... Shampoo, usa a porta da próxima vez! - ele exclama, ainda atônito com o que acabou de acontecer - E como é que a bicicleta...?

— Aiya! Shampoo preparar lanchinho pra Ranma! - ela abre a caixinha de entregas e retira alguns mochis feitos a mão, separados em um potinho especialmente para o seu noivo - Querer comer agora ou depois?

Ele cruza os braços, sem paciência para aquela situação que infelizmente já era rotineira.

— Tô sem fome.

— Então depois da aula Ranma vir comer com Shampoo, né? - os olhos da amazona brilhavam enquanto ela fazia uma pose inocente, queria parecer o mais adorável possível para que Ranma não recusasse seu pedido.

Akane franze o cenho e torce o nariz, cerrava o punho como quem se segurasse para não meter um tabefe no seu noivo tão requisitado.

— Ei, sem essa! - Ukyo se intromete, pairando sobre a mesa de Ranma, ficando de frente para Shampoo - Depois da aula o Ranma vai sair comigo!

— Não, não, não! Ranma sair com Shampoo!

As duas garotas começam a discutir e causar certo alvoroço, provocando o desconforto de Ranma, a inveja dos outros colegas que sempre tinham de ver Ranma sendo disputado por garotas lindas, e a fúria de Akane, que se sentia, no mínimo, humilhada perante todo aquele circo.

Akane se levanta abruptamente, o barulho da sua cadeira arrastando no chão ecoou pela sala toda, fazendo Ranma ficar com arrepios. Ele sabia que quando Akane se irritava, sempre sobraria pra ele.

— Faz o seguinte, Ranma - ela começa, se aproximando do noivo com uma aura amedrontadora que protagonizava muitos dos pesadelos dele - Já que você gosta tanto dessa atenção, sai com as duas - ela o segura pela gola da camisa, e o arremessa com sua força bruta, em direção ao buraco da janela feito por Shampoo - E MORRE!!!

— MAS EU NÃO FIZ NADAA!! - ele grita, inutilmente, pois é arremessado pelo ar para fora da sala de aula.

— Aiya! - Shampoo vai até a janela e salta na direção que Ranma foi, deixando tudo para trás - Já vai, Ranma!

— Ei, espera! - Ukyo exclama, saltando pela janela logo atrás de Shampoo - Tô indo, docinho!

As duas artistas marciais saltam do último andar como se fosse nada. Deixando uma Akane bem furiosa resmungando sozinha no seu assento, enquanto os outros colegas de classe ficam cochichando entre si como certas coisas não mudariam nunca.

Akane olha para a mesa de Ranma e vê o potinho de mochis que Shampoo trouxe, e sem pensar muito nas consequências, começou a devorá-los em vingança, extravasando sua raiva a cada mastigada violenta.

Mal sabia ela que aqueles mochis eram mais uma trambicagem da amazona...

Ranma, como já era típico, acabou caindo na piscina do colégio, bem distante da sua sala de aula. Sentiu seu corpo mudar, diminuir em algumas partes, aumentar em outras. E quando saiu daquela água gelada, sentiu toda aquela roupa colada muito desconfortável, principalmente no seio.

— Mas que menina insuportável! - ele reclama torcendo suas roupas molhadas com uma força proporcional à sua raiva - Eu não faço NADA e ela me atira pela janela! Que culpa eu tenho se todo mundo me quer?!

No fundo, bem no fundo, ele não queria admitir que tudo aquilo amaciava bastante sua autoestima. Mas bem que se a Akane fosse um pouco menos temperamental as coisas seriam mais fáceis.

Ranma mais uma vez, com seu sexto sentido aguçado, sentiu que algo estava prestes a ser arremeçado em sua direção, e salta para o lado. Mais uma rosa, dessa vez negra, finca o chão bem rente aos seus pés.

— Jesus cristo... - ele bafora em desespero, reconhecendo imediatamente de quem se tratava.

— Bruaca de rabo-de-cavalo - a garota com uniforme de outro colégio surge no meio das árvores e se aproxima de Ranma - Onde está meu amado Ranma?

— Você não devia tar em aula, Kodachi?!

— Não mude de assunto! - ordena a rosa negra, apontando o dedo para ele - Eu vim vê-lo para chamá-lo para um encontro!

— Será que é pedir demais por um dia normal? - Ranma estende as mãos pro céu, como quem implorasse para uma divindade - Só um...

— Já vi que não vai me dizer - Kodachi tira sua fita de ginástica por debaixo de sua saia, ficando em posição de ataque - Então prepare-se pra morrer!

Kodachi corre na direção de Ranma, e antes que ela pensasse em desviar, Shampoo e Ukyo surgem por trás bloqueando os golpes da rosa negra.

— Você está bem, docinho? - pergunta Ukyo, Ranma acena positivamente.

— Aiya! O que essa chata fazer aqui? - pergunta Shampoo, tanto ela quanto Ukyo ficaram de frente para Ranma como dois cães de guarda.

— Hu hu! Então vocês duas também vieram duelar pelo meu Ranma - Kodachi não sai de seu modo de ataque, aceitando Shampoo e Ukyo como suas oponentes - Vão sofrer as consequências!

Ukyo saca sua espátula gigante e Shampoo cerra os punhos, as três garotas começam a brigar entre si, exibindo de todas as suas habilidades de artes marciais, a diferença entre suas forças era bem equilibrada. Mas para Ranma pouco importava quem sairia vencedora, aproveitou que todas estavam distraídas e saiu pela colatra.

Ele sai correndo em direção à entrada da escola, sem tirar os olhos das três pretendentes para ter certeza de que elas não notariam sua ausência. Mas não olhar para frente resultou que ele esbarrasse em algo, ou melhor, alguém.

Ranma quase se desequilibra, mas finca os pés no chão e olha para frente, dando de cara com a visão do inferno.

— Garota de rabo-de-cavalo... - Kuno ainda estava rondando pelo colégio como o bom desocupado que era, e por sua sorte, deu de cara com Ranma em sua forma feminina. Kuno a toma nos braços sem aviso e começa a chorar - Como senti saudades...

— ARGH!! - Ranma amaldiçoa o próprio azar, eram nem oito horas da manhã e já teve emoção o suficiente para um dia inteiro. Tentava se soltar do abraço de Kuno sem muito sucesso.

— Não chore minha querida, eu irei visitá-la sempre... - ele olha para a sua deusa nos olhos, tentando reproduzir alguma cena digna de filme - Embora o destino cruel tenha colocado mais um empecilho para me afastar das minhas amadas... Eu felizmente sou herdeiro de uma grande fortuna e com muito tempo livre... - enquanto ele falava asneiras, se aproximava do rosto de Ranma na tentativa de lhe roubar um beijo - Se for preciso, virei visitá-las aqui no colégio todos os di-

— SAI FORAAA! - Ranma lhe dá um chute que o arremessa até o último andar, fazendo o ex veterano atravessar mais uma janela da sala deles, tal qual Shampoo.

Todos os alunos, que ainda aguardavam pela professora, voltaram a ficar dispersos e fizeram uma roda em torno do ex aluno, nocauteado mais uma vez.

As únicas que não se juntaram à classe foram Akane e suas amigas, que pareciam um tanto preocupadas com ela.

— Você tá passando mal, Akane? - uma delas perguntas, perante a visível cara de enjoô da colega.

— Eu acho que... - começa ela, com dificuldade até mesmo pra falar - Tô ficando tonta...

— Acho melhor você ir pra casa - sugere a colega.

Outra delas acrescenta:

— Será que não foram os mochis da Shampoo?

Akane nesse momento percebe que, sim, essa era a alternativa mais provável. O que lhe causara uma grande fúria, pois sempre acabava pagando o pato pelas tramoias das pretendentes de Ranma.

Ela não queria dar o braço a torcer, mas estava com uma dor de cabeça insuportável e ânsia de vômito, definitivamente não iria conseguir prestar atenção na aula. Amaldiçoa Ranma, Shampoo, Deus e o mundo, e se levanta, pegando suas coisas e indo em direção à porta.

Enquanto isso, Ranma vai até o seu armário e pega uma garrafa térmica com água quente. Com todos esses anos tendo que lidar com todo tipo de inoportuno durante o período escolar, ele se acostumou a sempre levar uma garrafa com água quente caso precisasse voltar à sua forma masculina. Derrama um pouco da água sobre si e seu corpo muda mais uma vez.

Olha para o lado e vê Akane descendo as escadas com uma cara péssima, mais especificamente a cara de alguém que estava prestes a colocar os bofes pra fora, o que fizera Ranma ignorar que ela o atirou pela janela há poucos minutos atrás e ir até ela preocupado.

— Ei, tá tudo bem?

— Não é da sua conta! - ela resmunga, furiosa, indo em direção à saída - Eu vou pra casa!

— Akane, você não tá bem! - alega, apontando para a menina que quase cambaleava ao andar - Quer que eu te leve?

— Me deixa em paz! Eu posso ir sozinha!

— Deixa de ser teimosa!

— Aiya, Ranma! - a voz de Shampoo surge ao longe, anunciando sua chegada. Não estava nem um pouco ferida da última batalha, na verdade parece que essa tal batalha nem aconteceu. Ela se atira no pescoço de Ranma e lhe dá um beijo na bochecha - Shampoo dar jeito naquelas chatas, agora quer comer lanchinho?

— Shampoo, não tá vendo que a Akane tá passando mal?! - ele tenta empurrá-la, sem muito êxito. Akane, que já não estava bem, ficou ainda pior diante aquela cena.

A amazona avalia Akane e percebe que, de fato, ela não parecia bem, o que imediatamente a fez lembrar que deixou os mochis na mesa de Ranma.

— Aiya! Akane não comer mochi do amor, comer?! - ela pergunta, espantada. Mas logo se arrepende por ter entregado seu plano.

— Mochi... do quê, Shampoo? - Ranma pergunta, furioso, fazendo Shampoo rir de desconforto.

— Ah... Ah ha ha, ser história engraçada... - ela começa, toda sem jeito, fazendo Ranma, e principalmente Akane, entrarem em estado de ebulição - É que... Shampoo preparar bolinho mágico pra Ranma gostar de Shampoo... Mas ser bolinho que só funcionar com garotos... - ela junta seus dedinhos, olhando de um lado para o outro com desconforto e ressentimento - Quando garota come... Dá labirintite...

Akane cerra o punho e espreme seus olhos, estava a um passo de meter um tabefe em Shampoo. Ranma, percebendo o risco, já se afastou.

— Ora, sua...!

— Ranma, querido! - a voz de Kodachi vinda do além causa arrepios em todos, nem viram de onde ela saiu, mas ela também se atira no pescoço de Ranma, fazendo-o cair no chão - Te procurei por toda parte, meu amor!

— Ai, sai de mim! Sai de mim! - ele tenta empurrá-la.

— Soltar Ranma, sua chata! - Shampoo, enciumada, puxa Kodachi pela saia, mas nada consegue tirar aquela maluca do pescoço dele.

— Vocês aí, deixem o Ranma docinho em paz! - a quarta voz, pertencente a Ukyo, se junta àquela roda e as três garotas começam a empurrar umas às outras.

Chegou um ponto em que a confusão era tanta, que fizera os quatro esquecerem que Akane estava bem diante deles, de pé e adoecida. Ver Ranma ali, escorado no chão, sendo disputado por três garotas lindas, que o puxavam de lá pra cá, enquanto ela estava sofrendo as consequências físicas dessa loucura, provocara uma fúria capaz de mover montanhas.

Akane cerra as sobrancelhas, arregala os olhos, torce o nariz e cerra o punho, fazendo a sua clássica pose de quem está no pico mais alto da sua raiva. Por um segundo, até esqueceu a dor que estava sentindo.

Ranma olhou de relance para ela enquanto as garotas brigavam, e se arrepiou por inteiro, sabendo que poderia sair com sequelas graves dali. E lhe faltavam palavras para tentar acalmar Akane, que grita:

— EU ODEIO VOCÊ RANMA! - seu urro foi capaz de alcançar toda a escola, fazendo todos ali presentes olharem pra ela, espantados - EU TE ODEIO! EU TE ODEIO!

Ela vira as costas e se retira batendo perna, seguindo seu plano original de ir para casa sozinha. Ranma está petrificado, com Ukyo segurando um de seus braços, Shampoo o outro, e Kodachi agarrada em seu pescoço. Viram Akane sumir e ainda permaneciam espantados no mesmo lugar.

E dentre todas as coisas que se passavam na cabeça dele naquele momento, o que mais dominava era "... Mas eu não fiz nada!!".

— Que garota surtada - comenta Kodachi.

Todos olham para ela, incrédulos com a ironia que era Kodachi questionar a sanidade de alguém.

 

—--

 

Depois de uma breve pausa para vomitar num beco, Akane enfim consegue chegar em sua casa. Ainda estava enfurecida e com impulsos muito violentos, mas precisava focar em subir as escadas, deitar em sua cama e pedir pelo colo de Kasumi.

"Ranma... Você me paga!!"

Ela tira seus sapatos e vai até a cozinha, e sem ser percebida, vê Kasumi passando pelo corredor com um copo d'água, parecia muito aflita, o que fisgou sua atenção imediatamente.

— Calma papai, tome uma água! - ela escuta a irmã mais velha, que acabara de entrar na sala de jantar.

— Kasumi, feche a porta! - ouve a voz do seu pai, embargada, e um pouco desesperada - Não quero que a Nabiki escute!

A mais velha o obedece e fecha a porta. Akane, que ainda estava no corredor, percebe a movimentação estranha. Algo sério estava acontecendo, e se seu pai queria ficar a sós com Kasumi, é porquê não queria que nem ela, e nem Nabiki, tivessem conhecimento. A preocupação a fez esquecer o mal estar em segundos.

Aproveitando que estava de meias, ela dá passos lentos e se aproxima silenciosamente da sala de jantar, ficando à espreita da porta, onde conseguia escutar seu pai e sua irmã perfeitamente, embora um pouco abafado.

— Me diga papai... O que está acontecendo? - suplicou a irmã mais velha, levando suas duas mãos à mão trêmula do pai.

Ele segurava a carta que chegou do correio com uma força não moderada, e a põe sobre a mesa. Suspira, buscando forças para se acalmar.

— Eu sabia que esse dia ia chegar... - ele começa, fazendo o coração das duas filhas acelerar - Eu só não achei que fosse tão cedo...

— O que está dizendo?... - Kasumi tenta fazê-lo falar logo, mas era muito difícil.

— Kasumi... Não conte às suas irmãs! Não quero que elas sofram! - ele implora, mas num tom muito mais sério - Só estou lhe contando porque você já tem idade para suportar...

 — Claro que não vou contar! Diga logo, papai!

Ele bebe mais um gole d'água, tentando pensar nas melhores palavras possíveis para introduzir aquele assunto para a filha. Ele já tinha dificuldade de controlar suas emoções naturalmente, era muito pior se tratando de algo tão importante.

— Filha... Você sabe que já estou velho, - ele começa - há anos não exerço minhas funções na academia. Eu a fundei antes mesmo de conhecer sua mãe... - mais lágrimas escorrem de seu rosto ao lembrar da falecida esposa - Mas essa academia é tudo o que nossa família tem! Por isso... Por isso faço tanta questão que uma de vocês a leve adiante...

— Uhum... - a irmã mais velha concorda. Se esforçava para entender o que seu pai queria dizer, ele estava tão nervoso que visivelmente não conseguia se expressar direito.

Akane se aproxima um pouco mais da porta, para escutar um pouco melhor. Já estava começando a suar frio pelo rumo que aquela conversa estava tomando.

— Essa carta... - ele levanta a carta sem tirar os olhos dela - É do Conselho de Artes Marciais lá da China... O Conselho é quem monitora o rumo de todos os artistas marciais do mundo. Toda academia de artes marciais fica sobre o monitoramento deles, e é deles quem recebemos auxílio financeiro, para levar a nossa escola adiante... - ele deita a carta na mesa para enxugar seus olhos marejados mais uma vez - E já faz anos que nós... da academia Tendo... Não contribuímos para o Conselho...

Akane sente todo o seu corpo se arrepiar.

— Ou seja...? - pergunta Kasumi, que é a mais ignorante do assunto.

— Ou seja... - ele quase começa a gaguejar pelo que está prestes a dizer - Nós vamos perder a academia...

"QUÊ?!"

— O quê?! - indaga a irmã mais velha - Mas isso... Isso é... Essa é a nossa casa!

— Eu sei... Mas se o nome Tendo não tem mais prestígio no meio das artes marciais... Então não é mais interessante para o Conselho nos manter...

Akane sente suas pernas tremerem, perdendo o equilíbrio. Se senta no chão sem fazer barulho e sente um choro chegando. Ela não queria acreditar que aquilo era verdade.

Não podia ser verdade.

— Não é possível... - Kasumi começa a se revoltar, embora ainda muito contida - O que eles esperavam?! O senhor não tem mais condição de dar aulas... Não é justo!

— São as regras, filha... - Soun responde, sempre muito melancólico - A academia já está parada há mais de dez anos... E nós continuamos recebendo o auxílio para nos manter... Somos como parasitas...

— Deve haver alguma maneira, papai! - Kasumi aperta a mão dele com força e um ar de determinada - O que podemos fazer?!

— Bom... - ele segura a mão da filha - Temos poucas opções...

— Diga! Diga logo!

Ele olha a filha ansiosa nos olhos, pega a carta mais uma vez e diz:

— Essa carta nos mostra a multa que acumulamos em todo esse tempo... - ele arrasta o papel na mesa até a jovem - Se conseguirmos esse dinheiro nos próximos anos... Quitaremos a dívida.

Kasumi pega a carta com as duas mãos e lê atentamente. Quando se depara com um número que parecia ter zeros infinitos, ela quase engasga.

— Mas... Mas isso é impossível! É dinheiro demais!

— Eu sei... - ele se escora na mesa, quase inundando-a com as suas lágrimas - Nem se eu voltasse a dar aulas hoje mesmo, eu conseguiria isso há tempo...

Akane estava precisando se conter com todas as suas forças para não entrar naquela sala e tentar tomar as rédeas da situação, mas precisava esperar pacientemente até que seu pai falasse tudo o que não diria na frente dela.

Kasumi começa a alisar as costas do pai.

— Tem que ter outro jeito... Qual é a outra opção?

Ele tenta se recompor e ajusta a sua postura. Limpa o seu bigode e empurra o cabelo para atrás do ombro.

— Outra opção é... Enfrentar o Conselho, para provar o valor da técnica da nossa família, - isso deixa Akane mais interessada - mas isso é impossível! - ele completa, como um balde de água fria - O Conselho é composto pelos mais exímios lutadores de artes marciais do mundo, ninguém jamais venceu nesse tipo de circustâncias. Além de que, precisaria ser um Tendo a enfrentá-los... - ele faz uma triste pausa - Eu já estou velho... Nem você e nem Nabiki sabem lutar... E a Akane... - Akane ouve mais atentamente do que nunca - Ela não conseguiria...

O coração da menina se despedaça em mil partes. E o pior de tudo é que nem conseguia ficar com raiva num momento como aquele.

Em toda sua vida, Akane pensava ser forte. Praticava artes marciais desde os seis anos de idade, arrumava brigas com as outras crianças e vencia todas as vezes, tão nova e já era conhecida por sua força bruta. Chegando na adolescência, teve de lidar com uma série de lutas matinais com dezenas de homens que tinham o dobro do seu tamanho, uma proposta infame do ex veterano Kuno para que conquistassem a honra de convidar a menina para sair, e não houve uma única manhã em que ela foi vencida. Desde a primeira luta que teve na vida, Akane nunca perdeu. Até Ranma aparecer.

Nos últimos anos, Akane teve sua confiança esmagada pelos mais diversos monstros das artes marciais, sempre a derrotando de lavada, fazendo-a de refém, a colocando em posições vulneráveis, tirando toda e qualquer idéia de que ela era forte. E agora tinha certeza de que isso se refletia em todos os outros. Ninguém mais a achava forte. Nem mesmo ela.

Akane entrou num abismo mental de insegurança e sensação de impotência, estava ali vendo o seu mundo desmoronar diante de seus olhos, e não poderia fazer nada.

Absolutamente nada.

— Então... - Kasumi, cabisbaixa, já estava se vendo sem esperanças - Não tem jeito?...

 Soun olha para a filha.

— E é por isso... - ele começa, tomando a atenção das duas jovens - Que anos atrás eu fiz o acordo com Saotome de unirmos nossas academias.

Dali em diante, Akane sequer pisca.

— Eu só tive filhas, e o Conselho tem grande preconceito com herdeiras mulheres. Saotome também está há anos sem exercer sua escola, mas como Ranma é seu herdeiro, então o Conselho acaba fazendo vista grossa... - Akane quase engasga com a revelação de seu pai, tamanha era a sua indignação - Tudo bem que o Saotome sequer chegou a montar uma academia... Por isso o acordo ficou ainda mais interessante pra ele.

— Humm - com certo esforço, Kasumi estava começando a entender - Então quer dizer que...?

— Se a nossa academia se unir com outra de renome... O Conselho irá abater a dívida - Soun suspira.

— Então... - Kasumi começa - Se a Akane casar com o Ranma...

— Sim... Tudo estará resolvido.

A boca de Akane fica seca. Ela se petrifica no chão, sentia como se o mundo tivesse parado de girar naquele momento, e o peso de um elefante colocado em suas costas. Seus pensamentos agora eram os mais desconexos possíveis, pensando em tudo o que sua vida foi até hoje, e o que poderia se tornar dali pra frente, dependendo de qual decisão tomasse.

Kasumi pega a carta em suas mãos mais uma vez, lê cada palavra escrita, como se buscasse mais uma solução nas letras miúdas. Aos poucos, depois de uns bons minutos em silêncio, ela aceita a realidade e volta a falar:

— Acha que nós devemos falar com a Akane? - ela tenta propôr uma solução - Digo... Se nós contarmos tudo isso, talvez ela-

— De jeito nenhum, Kasumi! - resmunga o mais velho - A Akane é só uma menina, não quero que ela assuma toda essa responsabilidade para si! - Akane se arrepia ao ouvir seu pai falar dela dessa forma - Eu sei que desde o início arranjei esse casamento a contragosto dela... Mas não quero que ela saiba dos meus motivos! Se eu persisti nessa história por tanto tempo, é porque vejo o quanto ela gosta do garoto!

Akane solta um suspiro de surpresa, normalmente ela iria negar toda essa suposição em resposta, mas ali, naquele momento, isso era impensável.

Kasumi também se espanta com a sinceridade de seu pai, sempre enxergou toda aquela situação como forçada, independente das circunstâncias. A mais velha via a relação de Akane com Ranma como uma em um milhão, era evidente que eles nutriam sentimentos um pelo outro desde o momento em que se conheceram, mas qual era a possibilidade disso dar certo? Nunca pensou que seu pai, de fato, considerasse os sentimentos da mais nova tanto assim.

— Se nós contarmos pra ela, eu tenho certeza... Que ela vai se obrigar a fazer isso por nós - ele acrescenta - Seria demais pra cabeça dela. Imagine carregar esse peso sozinha... - Akane quase se emociona com as palavras do pai - Quero que ela continue achando que esse noivado é um desejo meramente caprichoso, e não a solução dos problemas da nossa família.

— Então o que fazemos, papai? - a mais velha lança um olhar triste para seu pai.

Soun olha para o quintal, apreciando o lindo dia ensolarado que estava fazendo. Ele cruza os braços e respira fundo.

— Nós esperamos... E rezamos - ele responde, sem tirar os olhos da paisagem - Para que tudo se resolva naturalmente...

Dali em diante, Akane não ouviu mais nenhuma palavra dos dois que acrescentasse para o problema. Fica um tempo no chão processando tudo o que acabara de ouvir, mas lembra de que Kasumi ou seu pai poderiam sair da sala a qualquer momento e lhe flagrar.

Junta todas as suas forças, se levanta, e vai até seu quarto.

Ela tranca a porta, se atira em sua cama, e finalmente desaba, afogando suas lágrimas no travesseiro. Chorou até seu corpo não aguentar mais e cair no sono em exaustão.

 

—--

 

Tarde da noite, e Akane está de pijama olhando para o teto sem pregar o olho. Precisou manter as aparências o dia inteiro, fingir ignorância a tudo o que estava acontecendo, a parte mais difícil foi forçar um sorriso e uma cara de despreocupada.

Mas ali, sozinha em seu quarto na calada da noite, ela podia abraçar todo o caos que dominava sua mente, pensar em mil e uma maneiras de como proceder dali em diante. Se ao menos fosse mais forte, ou se ao menos fosse um homem, tudo seria mais fácil. Era tão injusto, tão revoltante, e já não restavam mais lágrimas pra ela chorar.

Mas ela não queria chorar.

Só conseguia pensar em seu pai, e em todas as coisas que ouviu ele dizer a seu respeito. Em todos esses anos, nunca sonharia que o noivado com Ranma teria um motivo tão sério por trás, e por todo esse tempo Soun a poupou de saber para que não carregasse este peso sozinha.

E ele conhecia muito bem a filha. Akane era, acima de qualquer outra coisa, MUITO cabeça-dura. Quando colocava algo na cabeça, não havia santo que tirasse. Ela precisou de longas horas em absoluto silêncio para chegar à três conclusões.

Primeira. Sua família estava em risco, de perder o lar, o conforto e a dignidade.

Segunda. De todas as opções para resolver o problema, apenas uma era palpável.

Terceira. Isso estava unicamente em suas mãos.

Akane junta as sobrancelhas, aperta seu cobertor com força, e espreme seus lábios. Ela sente um estalo em sua mente como o badalar de um sino, e a sensação era de que seu corpo foi tomado por uma força sobrehumana. A força de quem acabara de tomar uma decisão, que levaria adiante nem que sua vida dependesse disso.

— Não se preocupe, papai... Eu vou dar um jeito...

 

—--

 

Ranma já está na sala de aula, surpreso, preocupado, mas também aliviado de não encontrar Akane. Tinha certeza de que no momento em que ela o visse, as chances de ser atirado pela janela eram quase certas. Mas ao mesmo tempo, será que ela estava bem?

Chegar antes dela era um mau sinal, ou chegavam juntos, ou ela chegava antes. Ele fica olhando para a mesa dela, ponderando onde ela estaria agora, e caso ela faltasse, se deveria dar uma passada na casa dela.

"Onde tá aquela chata?..."

— Ranma, docinho! - Ukyo se senta ao lado dele, toda sorridente ao encontrá-lo sem a companhia de ninguém - Tudo bem?

— Estaria melhor se certas pessoas não ficassem me agarrando e me dando problema - ele dispara, cutucando-a. Mas não conseguia ser muito duro com Ukyo, a memória afetiva da amiga de infância o fazia desmanchar a cara feia a cada sorriso que ela dava pra ele.

— Ah, não é pra tanto, vai. Além disso, eu me livrei daquela maluca por você - ela se refere a Kodachi, a quem arremessou para longe com sua espátula pouco depois de Akane ir embora. Ukyo tira algo da maleta e põe na mesa de Ranma - Toma, é meu pedido de desculpas.

Ranma olha para ela todo desconfiado, mas desembrulha o pacote e se depara com uma pizza de legumes muito bem enfeitada. Ela também se deu o trabalho de escrever na pizza com o molho algo que dizia "Me perdoa?" e em baixo haviam duas opções de assinalar, mas ambas escrito "Sim".

Ele deixa uma risadinha escapar, dando a confiança que ela precisava.

— Você não presta mesmo... - ele brinca, já petiscando o lanche.

— Você me ama que eu sei - ela balança o cabelo para atrás do ombro, confiante de que reconquistou o seu amado.

Mas toda a atenção de Ranma é tomada quando a porta da sala se abre e Akane entra, fazendo-o se arrepiar da cabeça aos pés. Todos os outros colegas ficam olhando para os dois, ansiosos para ver qual briga iria se suceder depois do episódio de ontem.

Ukyo, que também tinha certa culpa no cartório, se retraiu toda quando Akane se aproximou de Ranma, ele, por sua vez, estava com a guarda totalmente levantada, pronto para ser arremessado pela janela.

Por um momento, ele pensa que talvez seja melhor que ele comece a interação, talvez isso amacie a queda.

— O-Oi Akane! - lança, no ímpeto - E aí, vomitou muito?

... Terrível.

A vontade que tinha era de enfiar a cara na terra, talvez merecesse mesmo ser arremessado pela janela. Só aceitou seu destino fatal e esperou pelo pior, apertando os olhos no momento em que ela parou à sua frente.

— Não, já tô melhor - ela o responde, num tom de voz surpreendentemente agradável. Ele abre os olhos e dá de cara com uma Akane de muito bom humor, ela exibia bochechas rosadas e um sorriso tão doce que arrancou um suspiro do garoto - Obrigada por se preocupar.

"... Hein?". Esse foi o pensamento de toda a classe, que agora estava duplamente interessada no desenrolar dessa história.

Ranma estava com mil e uma interrogações na cabeça. Aquilo foi, definitivamente, não característico dela. Ele se debruça um pouco até a mesa dela no momento em que ela se senta.

— Você... Não vai me bater? - ele questiona, muito desconfiado, sabendo dos riscos.

Ela faz um olhar inocente, e ainda muito gentil, provocando um avermelhado nas bochechas de Ranma.

— Por que eu faria isso? - ela pergunta, fazendo Ranma levantar uma sobrancelha.

— Akane... Tem certeza que está bem? - ele leva a sua mão à testa dela sem aviso, empurrando a franja com os dedos delicadamente - Aquele mochi não tá te fazendo delirar não, né?

— Deixa de ser bobo, Ranma - ela ri, deixando-o ainda mais envergonhado.

Todos na classe ficam atônitos com a postura de Akane, em especial Ukyo, que até pensa em falar alguma coisa, mas acha melhor ficar na sua. Ranma, por sua vez, estava vermelho como um tomate.

— Bom dia, classe! - a professora Hinako adentra a sala de aula e todos se aprontam em seus lugares - Espero que tenham sido bonzinhos nessas férias, porque agora o pau vai torar!

A classe agora tinha seus olhos na professora , exceto Ranma, que não conseguia disfarçar um grande interesse nas reações da noiva.

O que estava acontecendo? Que bicho mordeu aquela menina? Ainda mais depois do grito que ela deu ontem dizendo que o odiava? Não era mesmo nenhum efeito colateral do mochi?

Todos esses questionamentos giravam na cabeça de Ranma, que vez ou outra se pegava olhando discretamente para Akane. Ela parecia tão serena, sem ressentimentos e nenhum sinal de antipatia.

Ela escrevia as anotações da professora no caderno, e vez ou outra levava o lápis até a sua boca. Ele nem percebeu quando começou a olhar pra boca rosada que ela tinha. Cada mordiscada no lábio que ela dava, ele sentia o coração palpitar. E parecia tão macio...

TUC!

Um giz de cera acerta a testa de Ranma, e nem mesmo ele, um exímio lutador com o sexto sentido aguçado, viu aquilo chegando.

— Ranma Saotome! - a professora percebe que ele não estava prestando atenção, enfurecida.

— S-Sim!! - ele se levanta abruptamente, envergonhado.

— Não é hora de paquerar, mocinho - ela reclama, fazendo todos na sala rirem, e o rosto dele queimar - Leia pra nós o verso da página seis!

Enquanto todos estão rindo, ele olha de relance para Akane, que também ri timidamente com a mão pousada em sua boca. Simplesmente encantadora.
Ele luta contra seus impulsos de continuar olhando para ela e obedece a professora, lendo o verso que lhe foi pedido. Quando terminado, a professora volta à programação normal e Ranma se senta.

Ele sente um dedo lhe cutucar o ombro e olha para a esquerda, era Akane, lhe entregando um bilhetinho discretamente sem tirar os olhos do quadro. Ele toma o bilhete em suas mãos e sente o rosto quente ao ler o que tinha escrito.

"Me encontra atrás da quadra no intervalo?"

 

—--

 

Ranma estava andando em círculos há cinco minutos no lugar marcado pela sua noiva. Sua cabeça já estava girando, pesada de tantas dúvidas que a menina colocou. Não tinha a menor ideia do que esperar, ainda mais depois de hoje.

"O que é que essa menina quer?", pensa, aflito enquanto segue rodando pra lá e pra cá, chutando terra. "Será que ela mudou de ideia e quer me dar uma surra? Ou... Ou sei lá?!".

Ele estava tão nervoso que nem percebeu quando ela chegou.

— Ranma! - ela o chama.

— O-Oi! - ele quase salta pela surpresa em a vê-la. A surpresa fica ainda maior quando ele vê o sorriso que esbanjava doçura no rosto dela.

— Demorei?

— Não, não... - ele coça a cabeça.

Akane fica cabisbaixa por um momento, e Ranma olhava de um lado pro outro, buscando coragem para conduzir aquela situação tão inusitada.

— Então... Fala aí, Akane - ele pede, com certa pressa

.— Ah, eu... - ela olha para o chão e brinca com os dedos, como quem buscasse as melhores palavras, ou coragem - Não sei como fazer isso...

Ranma arqueia a sobrancelha, confuso.

— Que é?... Ainda tá brava pelo lance de ontem? - ele pergunta, ainda tentando buscar alguma coisa que fosse característica nela - Olha, não foi culpa minha, mas se ainda quiser me bater, vai em frente.

— Hein? - ela volta a grudar os olhos nele.

— Vai, me bate - ele encosta seu próprio punho na bochecha, com um sorriso brincalhão - Eu sei que você gosta!

— Eu não quero te bater...

— Como assim, não?! - do jeito que ele estava incrédulo, parecia até implorar para que ela batesse nele - Você tava endiabrada ontem! Disse que me odiava, e...

— Ah, já passou - ela o tranquiliza, sorrindo mais uma vez - E eu não te odeio...

— Akane... É sério, que bicho te mordeu? - ele estava indignado com aquela postura da menina, nesses dois anos convivendo com Akane, ela nunca foi tão doce, meiga e compreensível. Ele se aproxima dela com as sobrancelhas juntas e os olhos semicerrados - Eu acho que você ainda tá doente.

— Eu tô bem, é sério.

— Hum... - ela continua tentando convencê-lo, mas tava bem difícil. Ranma cruza os braços e se afasta um pouco. - Bom, já que é assim... Fala aí, o que você tem pra me dizer?

Ela alisa o próprio braço com uma mão, parecia um pouco tímida, mas ao mesmo tempo determinada. Era uma faceta nunca antes vista, por ninguém.

— Eu... Queria te perguntar uma coisa...

O silêncio reina por uns instantes, os noivos sentem uma brisa no rosto, que balança a trança do garoto e a saia da menina.

— Bom... Diz aí...

Ela respira fundo e cria coragem.

— Ranma...

— Sim?

— Você... Quer sair comigo?

 

"Quê?"


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Notas finais do capítulo

Deixa aí um comentário pô, tô muito curiosa pra saber a opinião de terceiros hahaha. Sei que ficou grande, eu precisava introduzir muita coisa antes de fechar o capítulo.
Mas bem, não prometo que os próximos capítulos sejam menores KKKK.
Byee ♥



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