Jardim Tempestuoso escrita por Maeva Warm


Capítulo 6
Capítulo 06 - Narcisos 2


Notas iniciais do capítulo

Jasmine Storm - Michele "Mia" Alves
Amélia Way - Renée Zellweger
Hector Storm - Tyler Hoechlin



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As recomendações referentes à rotina de Nathan haviam sido repetidas durante boa parte da tarde. Encarando o grande portão de ferro, bati minhas unhas no volante do carro, sem qualquer ritmo. Mama sempre reclamava que eu e minhas irmãs demoramos para visitá-la, mas nenhuma de nós conseguia explicar o sentimento que nos tomava nessa parte específica da visita: ir embora.

O ar puro, cavalos, flores, árvores, o riacho ao sudoeste… Todos esses elementos deixavam nossos corações divididos. Reclamar do drama excessivo de mama e suas infinitas ordens fazia parte do nosso próprio drama. Nossas vidas aconteciam na capital e eram as nossas escolhas, mas era inevitável a sensação de estar abandonando nosso lar quando a parte posterior do raio se erguia majestosa ao preencher os espaços das barras que formavam os dois portões. Não importa o quanto decoramos nossas casas ou marcamos jantares com parentes, o Solo sempre seria o único lugar do mundo em que a sensação de sermos uma grande família estava presente.

Desvio meu olhar do portão para o retrovisor, sorrindo um pouco por ver Jasmine levando Nathan em direção ao estábulo, confirmando as emoções contraditórias que surgiam nos poucos minutos que fiquei parada dentro do carro.

Em Seaville, meu filho era apenas uma criança que um dia herdaria um patrimônio a administrar, com pai desconhecido, mãe viciada em trabalho e várias restrições em função de uma doença hereditária. No Solo Sagrado, nome da fazenda localizada no primeiro lote de terra que nossa família comprou ao se mudar para Eastmond, Nathan era apenas uma criança muito amado por todos (o pequeno príncipe, como era chamado pelos Storm), com um grande quintal para brincar e que logo ganharia um cavalo ou uma égua como companhia.

Acelero o carro, distanciando-me da fazenda ao pensar mais uma vez na pergunta de Lótus. Talvez o Nathan Storm, filho da presidente do grupo Storm e morador de Seaville, um dia precise do pai para algo. Contudo, o pequeno príncipe Storm, filho da líder da décima terceira geração, esse sequer precisava da própria mãe. Embora fosse um pensamento melancólico, a certeza de que meu filho tinha uma família que ia muito além de mim me confortava ao ponto de ficar tranquila ao estar longe dele por mais de um dia.

Aprecio a paisagem de outras fazendas ao longo do trajeto de volta à capital, lembrando das muitas traquinagens que tanto meus irmãos quanto meus primos aprontaram, junto a mim, com os vizinhos. O portão com o "R" dos Roddburn me arranca uma pequena risada devido à recordação de quando o senhor Sullivan tentou nos ensinar a tirar o mel e Alexander tomou várias ferroadas das abelhas.

Volto minha atenção à estrada após constatar que o pequeno grupo dos mais velhos de minha geração era um tanto destemido demais e propenso a desastres, não conseguindo evitar a ideia de chamar meus primos para acamparmos na floresta durante o feriado. Eu era a única com uma criança pequena, mas tinha certeza que só teria algum tempo com meu filho novamente quando retornássemos.

A velocidade teve que ser reduzida ao me aproximar mais do centro da cidade interiorana devido aos preparativos para o feriado nacional. Muitos carros encaminhavam-se até a praça para descarregar alimentos, bebidas e itens de decoração, causando um pequeno congestionamento em um trecho da interestadual.

O silêncio me incomodava, uma vez que sempre havia alguém tentando obter alguns minutos da minha atenção. Ligo o rádio para tentar ocupar parte dos meus pensamentos com algo e volto a batucar os dedos no volante em cada parada maior do que cinco minutos.

Após longos quarenta minutos, finalmente havia saído dos limites da pequena Nueva España (a cidadezinha que havia sido formada por descendentes e imigrantes tanto da Espanha quanto de outros países colonizados por ela) e a paisagem ao meu redor começava a tomar ares mais modernizados. Lembrando do engarrafamento que peguei ainda na área de menos movimento, altero minha rota para seguir pela rodovia que levaria ao porto de Seaville que, em dias normais, era o trajeto mais longo para se chegar ao centro da capital, mas hoje deveria estar quase vazia.

Conforme supus, a larga avenida continha poucos veículos locomovendo-se, o que fez um carro estacionado chamar minha atenção. Sabia que já o havia visto em algum lugar, mas não conseguia lembrar de onde, então reduzi a velocidade e mudei a faixa em que estava para me aproximar.

Me surpreendo ao ver o homem alto sentado na calçada, com as pernas esticadas logo atrás do veículo preto e protegido pela área de segurança proporcionada pelo triângulo de sinalização. Estaciono um pouco distante, saindo do automóvel para me aproximar dele.

— Precisa de ajuda, senhor Kozlov?

Minha voz chama a atenção do russo que logo ergueu a cabeça para me olhar. Arqueio a sobrancelha ao perceber seus olhos quase negros descendo por minha figura e logo subir mais uma vez.

— Devo confessar, senhora Storm, que neste momento não consigo acreditar nos boatos maldosos de que a senhora seria um demônio. — Mantenho-me em silêncio, aguardando que ele responda minha pergunta. — Eu a classificaria como o mais delicado dos anjos.

Talvez o homem tenha notado que a conversa não teria continuidade se seguisse naquele assunto, já que levantou e bateu as mãos em sua calça social na tentativa de tirar alguma sujeira dali. Com ele de pé, consigo perceber a lateral esquerda de sua camisa social rubra mais amassada do que a direita, além de uma pequena mancha na camiseta branca que estava por baixo da vermelha.

— O motor esquentou demais e precisei parar. Estava ligando para um amigo que é mecânico quando dois rapazes me assaltaram. Então, se puder me emprestar seu telefone, ficarei muito grato.

Diminuo a distância entre nós, dando dois passos para frente, e coloco o tecido vermelho que estava menos alinhado para o lado, para verificar o que era aquela mancha. Como ele estava com todos os botões da camisa vermelha abertos, não foi difícil afastar o tecido branco de seu corpo, revelando um pequeno corte na lateral de sua barriga.

Suspiro antes de me afastar e retornar ao meu carro, pegando não somente meu celular, mas também a caixinha com itens para primeiros socorros que sempre mantinha por perto. Olho na direção do russo e aceno com a mão, o chamando para onde eu estava. Entro no carro, afastando meu assento para conseguir ficar de lado e ter espaço para a caixa que estava em meu colo.

Assim que ele senta no banco do passageiro, aciono as travas e lhe entrego o aparelho, baixando a cabeça para focar no ferimento que pretendia limpar.

— Pode fazer sua ligação sem receios. É mais seguro dentro de um carro blindado do que na rua, onde os rapazes podem retornar e machucá-lo mais.

Explico em voz baixa, despejando um pouco de soro em um pedaço de algodão para limpar o sangue. Não escuto sua conversa, especialmente após notar as primeiras palavras em um idioma diferente e concentro-me em fazer o curativo.

Como havia crescido em uma família praticamente policial, minha atenção em detalhes era diferente da maioria das pessoas, portanto analisei o tecido tanto da camiseta branca quanto da camisa vermelha para buscar algum rasgo que fosse a origem daquele corte. Estranho não encontrar nada, levantando a cabeça para questioná-lo.

— Perdoe-me se for abusar de sua boa vontade, porém posso ligar para outra pessoa? — Sua voz grave e profunda soa assim que ele percebe ter minha atenção e apenas balanço a cabeça concordando. — Hm, Víbora Imunda? Minha curiosidade foi alimentada.

— Está ligando para Amélia Way?

Não consigo esconder a surpresa em meu tom, optando pelo silêncio ao receber a confirmação. Diferente da ligação anterior, presto atenção em cada palavra proferida por Kozlov, estranhando ainda mais o fato dele estar a caminho de uma reunião com a loira irritante quando seu carro deu problema.

Respiro fundo, começando a me irritar, ao tentar imaginar a pauta da reunião, já que a Way Enterprises era a principal concorrente do grupo Storm no ramo de segurança, além de serem os maiores fornecedores de armas no mercado negro, embora ninguém comentasse sobre isso.

Trato de arrumar a caixa e a deixo no banco de trás, deitando a cabeça no encosto do assento e observo a estrada à minha esquerda. Com o pouco movimento, consigo ver alguns restaurantes que não conhecia, já que o porto não fazia parte da minha rotina. A fachada de todos era muito similar, onde poucas mesas ficavam na parte externa e contavam com discretos seguranças patrulhando entradas e laterais. O canto de meus lábios se ergue sutilmente, formando um meio sorriso, ao reconhecer os raios amarelos bordados nas laterais da calça e nas mangas das camisas dos seguranças de três restaurantes.

Meu devaneio sobre a estética do uniforme cinza e a necessidade de torná-lo mais prático e confortável é interrompido por Dimitri que me entrega o celular.

— Mesmo sabendo ser deselegante de minha parte, estou muito curioso para saber o que há entre a senhora e a senhora Way. Parece ser um desafeto muito forte.

Viro o rosto para encarar o dele, sendo surpreendida com a proximidade. Ainda sorrindo, coloco o aparelho no porta-luvas e pondero se deveria saciar sua curiosidade ou apenas seguir meu caminho.

— Não precisa de tantas formalidades, Dimitri. Depois de hoje, acho que podemos nos tratar como amigos e não somente meros parceiros de negócios. — Levo minha mão até a lateral de seu corpo, tocando brevemente o curativo que havia feito. — Amélia Way é uma mulher irritante. Nossas famílias são inimigas desde que chegamos em Eastmond e tudo só piorou quando nos tornamos concorrentes na segurança. — Afasto minha mão de seu corpo para descansá-la em minha perna. — Não preciso dizer que ela investiu no ramo apenas para bater de frente comigo, já que a especialidade deles é tecnologia. — Não iria explicar sobre o fato de que foi apenas uma jogada para facilitar e apagar os rastros de seus negócios ilegais, afinal não era exatamente um problema meu. — Conseguiu falar com seu amigo? Se estiver indo para o centro, posso te dar uma carona. Só preciso passar em algum mercado no caminho.

— Narcisa, Narcisa… Está tentando me seduzir ou sua gentileza é genuína?

Desvio meu olhar de seus olhos para seus lábios com sua pergunta, mantendo-me quieta ao observar que seu rosto estava mais próximo.

— Um desconto nos seus leites de cabra seria bem-vindo, mas é apenas gentileza dessa vez. — Levanto meus olhos novamente, fazendo minhas íris castanhas encararem as íris quase negras tão próximas. — Se não tivesse marcado com minha irmã, talvez disponibilizasse o restante do meu dia para você. — O sorriso em meus lábios some e aproximo meu corpo para poder falar ao seu ouvido, como se contasse um segredo. — Sou uma mulher prática, Dimitri. Não gosto de joguinhos, então seja mais direto se quiser algo. Desde que não seja na empresa ou em horário de trabalho, não há motivos para uma recusa.

— Então se pedi-la em casamento agora, aceitaria?

Embora a voz grave fizesse minha pele arrepiar com o sussurro em meu ouvido, a proposta feita pelo russo me trava.

— Mais fácil enviar uma lista com todas as Storm e facilitar um encontro entre vocês. — Retorno para a posição relaxada de antes. — O homem que quiser casar comigo, primeiro terá que conquistar meu filho e obter a aprovação dele. Nosso primeiro contato pessoal deve tê-lo mostrado que sou uma mãe superprotetora, portanto chegar perto da minha cria não é das tarefas mais fáceis.

Somos interrompidos pelo toque de meu celular pessoal e logo o pego no porta luvas, vendo ser uma chamada de Violet.

— ¡Hola, mi vida! ¿Como estás? — Dou risada o escutar o bufar do outro lado da linha e aguardo sua reclamação com paciência.

"— Está atrasada! Preciso urgente de Nath aqui para fazer Isy calar a maldita boca."

— Fui deixar cariño no Solo e peguei um engarrafamento na interestadual. Daqui a pouco chego. Avise a Isy que se ela não parar de importuná-la, vou proibir Lótus de dar o adubo a ela. — Minha cabeça lateja brevemente ao imaginar as brigas de minhas irmãs e que logo eu deveria ir apaziguá-las. — Não coma muitos doces. Vou levar o almoço.

"— Você já levou meu pequeño? Sua sem coração! Eu queria apertar as bochechas dele… — Reviro os olhos com o drama de Violet e logo a voz de Daisy surge na ligação. — Não ligue pra ela, Lolita. Nossa vida está de mau humor porque o cunhadinho não dormiu perto dela. Quando chegar vamos falar sobre um assunto sério e ela está de birra, então se prepare. ¡Mi corazón es tuyo!"

— ¡Por Dios! Vou comprar muito chocolate. Vida deve estar insuportável! Ok, mi amor. Logo estou chegando. ¡Mi corazón es tuyo!

Desligo a chamada após falar nossa frase de despedida, guardando o eletrônico novamente. Levo minha mão até a nuca masculina, a puxando de encontro ao meu rosto para beijar seus lábios. Encerrado o contato, explico a situação de forma simples.

— O intervalo acabou. Vai aceitar a carona ou prefere que eu entre em contato para marcamos algo depois?

— Namorado? Amante? — Tento entender o motivo de suas perguntas até que aponta para o porta-luvas. Balanço a cabeça em negação. — Vou esperar meu amigo aqui mesmo. Se estiver livre a noite, ficarei muito feliz em ter sua companhia para jantar ali.

Olho para o restaurante que seu indicador apontava, um dos que tinha seguranças de minha empresa, e aparentava ser de massas.

— Sem frutos do mar? Estarei aqui.

Respondo ainda olhando para o estabelecimento, lembrando do encontro que tive no restaurante que se localizava exatamente em frente ao cais. Sinto o toque um pouco frio em meu queixo, fazendo com que minha face ficasse de frente para o rosto quadrado. Mais uma vez os lábios masculinos tocam os meus, agora em despedida.

— Obrigado pela ajuda. Nos vemos mais tarde.

Aceno em concordância, esperando que ele saia e entre em seu próprio carro para ligar o meu, seguindo até um mercado de produtos naturais que Nathan descobriu alguns meses atrás e me fazia levá-lo até lá todos os sábados.

Embora me preocupasse com a ausência de carne em sua dieta e esperasse que essa fase logo tivesse fim, admitia que minha própria alimentação ficou mais diversificada e esses pequenos mercados tinham produtos de excelente qualidade.

Com os temperos, legumes e frutas comprados, vou atrás do chocolate que havia prometido e recebo uma mensagem de Narciso. Aperto o número da lista de discagem rápida correspondente ao contato do rapaz e ativo o viva-voz, dirigindo agora rumo à casa de Violet.

"— Senhora? Perdão por incomodá-la em seu descanso, apenas gostaria de informar que quase todos os compromissos foram concluídos."

— Você nunca me incomoda, querido. — Respondo em um tom amável, assim como fazia com meu filho. — Tire o restante do dia de folga. Aproveite e envie um e-mail informando que estou dando a semana inteira de folga para todos. O feriado começa somente na quinta, porém vocês trabalharam muito e merecem alguns dias a mais.

"— Sim, senhora. Já estou editando o comunicado. Precisa de algo mais?" — A voz tranquila de Narciso era como um calmante natural.

— Sim. Você já almoçou? Hector disse qual assunto tinha para falar comigo?

"— Ainda não, senhora. Irei assim que enviar o e-mail aos diretores. — Consigo identificar o estalar de sua língua no céu da boca, uma mania que ele compartilhava com a irmã mais nova. — Meu irmão apenas queria vê-la. Ao que parece, ele retornou de uma missão e talvez não consiga ir para o Solo no feriado. Ele foi promovido e iria compartilhar a novidade."

Meu sorriso aumenta ao ouvir a notícia e mordo o lábio ao perceber que não poderia jantar com Hector hoje, já que havia combinado com Dimitri.

— Se encontrar ele ainda hoje, avise que estou convidando vocês para almoçar em minha casa amanhã. Caso não consiga, me mande uma mensagem e ligo para ele à noite.

"— Sim, senhora. — O silêncio toma conta da chamada, o que era estranho já que Narciso nunca se conteve ao conversar comigo. — Senhora, obrigado."

— Você me agradeceria mais se não fosse tão formal quando um de nós não está trabalhando. — Comento apenas para não deixá-lo constrangido, sabendo que ele me agradecia por todo o cuidado e apoio que lhe dedico desde que sua mãe faleceu. — Agora vá almoçar e descanse. ¡Mi corazón es tuyo!

"— Certo. Até mais, sen… Lola."

O raro sorriso largo em meus lábios se mantém até chegar na casa de minha irmã. Antes que conseguisse tocar a campainha, minha visão é bloqueada por longos fios castanhos e ondulados, ao mesmo tempo em que braços finos apertam meu corpo.

— Isy… Respirar…

Digo com dificuldade e logo sou liberta do abraço de urso de minha irmã do meio. Mal me recupero e sua mão logo se entrelaça a minha e me puxa para o interior da casa.

— Vida, Lola chegou!

Seu grito me faz encolher um pouco, mas não o suficiente para ficar na sua altura. Entrego-lhe a sacola com as compras e caminho pela caixa que minha irmã gêmea insiste em chamar de casa. Não são necessários muitos passos para chegar ao quarto principal, onde Violet recolhia roupas sujas.

— Se com essa casinha de bonecas, você precisa da nossa ajuda para limpar, agora entendo o motivo de não querer uma casa maior…

Alfineto-a e entro no local, recolhendo a roupa de cama para ajudá-la em sua tarefa. Franzo o cenho com a quantidade de poeira na mesinha de cabeceira, depositando os lençóis no cesto que ela segurava antes de ir até o mini escritório e pegar uma máscara descartável na gaveta da mesa, mantidas ali por minha causa e de Nathan.

Após cobrir meu nariz e boca, recolho o lixo do escritório antes de ir até a área de serviço que fica nos fundos para pegar material de limpeza.

Não leva mais do que uma hora para concluirmos toda a faxina, então nos dirigimos até a cozinha para que Daisy e eu possamos fazer nosso almoço, já que Violet era um desastre com as panelas.

— O irmão do Fred me indicou uma psicóloga. Consegui marcar uma hora depois do feriado. — Violet comenta após mais uma provocação de Daisy.

— Então pretendem assumir o lance de vocês de vez? — Seguro a risada quando Violet joga um copo de medida em Daisy. — O quê? Só cego não vê que tem algo entre vocês! Eu apoio, ok? Não precisa ficar com vergonha.

— Chega, Isy! — Interrompo ao ver que Violet estava ficando mais irritada. — Vamos apoiar o fato que nossa irmã resolveu superar o trauma. Apenas isso. — Passo para ela a cebola que estava picando. — Além disso, temos nosso acordo, lembra? Nada de nos apaixonar por ninguém. Relacionamento somente se formos obrigadas. Acredito que V e Frederick sejam apenas bons amigos e ele se preocupe com ela por causa do que aconteceu.

Recebo um beijo na bochecha da parte de Violet e um revirar de olhos da parte de Daisy.

— ¡Por todos los santos! — Daisy despeja o macarrão na panela com irritação, o que faz algumas gotas de água quente respingarem em nós duas por estarmos mais perto. — Você realmente acredita que ele quase perdeu a mão ao quebrar uma porta de vidro, queimou as costas com ferros quentes e quebrou quatro costelas apenas por ser amigo da V? Lola, o resto do esquadrão dele morreu e nossa irmã sobreviveu com um tiro de raspão e o tornozelo torcido graças a ele. Violet pode não estar apaixonada, mas ele está! Arrisco dizer que sempre esteve.

— ¡Santa madre de Dios! Parem! — Deixo de encarar Daisy com irritação e olho para Violet, que segurava a cabeça com ambas as mãos e tinha o rosto abaixado e coberto pelos cachos castanhos. — Lewis é apenas meu amigo, Isy. Ele é exagerado nos cuidados dele por não ter conseguido chegar a tempo de salvar mais alguém. Não fantasie! Deixe essas bobagens para os pirralhos que você ensina! — Erguendo a cabeça para apoiar o queixo em uma das mãos, era quase possível ver o fogo nos olhos castanhos de Violet. A ponta de seu nariz, levemente arrebitado, estava um pouco avermelhada, indicando que sua raiva era muito grande. — Vou precisar de carona, Lola. Quero levar meu esquadrão pra passar o feriado no Solo. E por que diabos demorou tanto?

— Vou ligar para o Arthur para preparar o ônibus. Assim já adiantamos a ida de alguns dos nossos primos. — Retorno ao tom sério e desinteressado que sempre utilizava ao falar sobre trabalho. Sorrio de lado ao responder seu questionamento. — Já disse que fiquei presa em um engarrafamento na volta. Talvez eu tenha sido uma pessoa caridosa e ajudado um amigo depois disso.

Com o almoço quase pronto, expliquei o problema que tive com a saúde de Nathan, pedindo a ambas que respeitassem o horário do pequeno dormir, já que uma boa noite de sono era fundamental para sua saúde. Daisy nos contou sobre o projeto da horta na escola, iniciado após alguns alunos apresentarem dificuldade no aprendizado, sono durante as aulas e possíveis alergias alimentares. Foi a vez de Violet incomodá-la sobre a amizade dela e do professor de Química, que também estava responsável pelo projeto junto com ela e a professora de Biologia.

— Reunião com aquela cobra? E você vai encontrá-lo sabendo disso? — Daisy me questionou após eu contar a situação em que encontrei Dimitri e o desenrolar de nossa conversa. Aceno com a cabeça confirmando e ela revira os olhos. — Não confio nele. Isso pode muito bem ser uma armadilha da maldita Way para te machucar!

— Nem todos os Way são ruins. — O silêncio toma conta da casa assim que essas palavras saem da boca de Violet. Daisy e eu a encaramos como se um terceiro olho tivesse surgido em sua testa. — O quê? Tem um Way na minha equipe e dois na do Lewis. Tive contato com os três e eles parecem ser legais e honestos. Acho que a única que não presta é a naja mesmo.

— Você sabia que foi uma Way que incentivou nosso pequeno príncipe a virar vegetariano? — As palavras de Daisy chamam minha atenção e me surpreendem mais do que o comentário de Violet. — Nath é colega de classe de Kath, a filha da Amélia, e ela fez um trabalho sobre sofrimento animal na última feira cultural.

Suspiro irritada com o rumo que aquilo estava tomando e me concentro em finalizar minha refeição.

— Eu vou. Na pior das hipóteses, vou ter um encontro ruim. — Ao ter o silêncio presente mais uma vez, encaro minhas irmãs para assegurá-las de que não havia perigo. — Sei me defender; tenho permissão para usar armas; sempre levo uma no carro; o restaurante é um dos nossos clientes, portanto os seguranças são da nossa empresa e vou acionar dois para me seguirem a distância. Satisfeitas?

— Ficaríamos mais se você não se envolvesse com quem é próximo daquela vaca, mas me contento com isso.

Sorrio para Daisy e observo Violet pensativa. Estranho o fato, mas antes que eu questione o que estava acontecendo, ela impõe uma exigência. Me senti como uma adolescente novamente, contudo entendia o que ela devia estar sentindo.

— Ficarei satisfeita quando ligar para o Edgar e avisar sobre seu passeio. Mais dois guarda-costas, com certeza, me deixariam feliz.

— ¡Por Dios! — Jogo o pano de prato que segurava na direção de Violet, ficando irritada com a proporção que aquilo estava tomando. — Não confio na Way; sei os riscos que corro por ser a sua cara, Vida; tenho ciência das minhas responsabilidades tanto na empresa quanto na nossa família, porém isso está ficando ridículo! — Pela primeira vez me exalto em meio a nossa conversa, tratando de tentar normalizar minha respiração imediatamente. — Nem quando tínhamos quinze anos havia tantas condições. Kozlov não é o primeiro cliente que temos em comum com os Way. Por mais que odeie admitir, a tecnologia deles é a melhor e, combinada com nossos funcionários, é o combo perfeito de segurança. Por causa disso, e somente por isso, não cancelei contratos importantes. — Sigo até a geladeira para pegar a jarra com suco, despejando o líquido em um copo e bebendo um gole antes de continuar. — Além do mais, cariño não está por perto, então vai ser somente um jantar e cedo estarei em casa.

Daisy apenas suspira e volta sua atenção para as panelas, retirando o macarrão do fogo para montar uma lasanha. Violet permanecia em silêncio, talvez absorvendo minhas palavras, e aparentava estar aérea demais. Possivelmente não fosse tecer mais nenhum comentário, então retornei para ajudar Daisy no almoço, verificando o ponto de cozimento do pernil.

— Vocês não acham isso suspeito? — A voz de minha irmã gêmea paralisa minhas ações e da morena mais nova, que olhamos para ela esperando que continuasse a falar. — Alunos da escola que a Isy trabalha e o pequeño estuda começam a passar mal; a filha da Way que odeia a Lola vira amiguinha do pequeño e o incentiva a virar vegetariano; alguém dá a ideia de fazer uma horta na escola e ocupam ainda mais a Isy, ao ponto de esquecer de carregar o celular e Tony reclamou dela estar com o aparelho desligado toda noite; eu estava treinando uma nova equipe nas últimas semanas, então nem eu ou Isy fomos o motivo do mal estar do pequeño. — Violet vai enumerando os fatos e começo a entender o que ela queria dizer com cada situação apresentada. — O cara responsável pela morte de quase todo meu esquadrão foge da cadeia e encontra a Lola, com a desculpa de nos confundir; um cliente que só teve contato pessoalmente com a Lótus durante cinco anos, agora resolveu saber como a presidente da empresa parceira se parece e flerta com ela; antes do feriado, um trio de Storm e um trio de Way vão passar pelo teste da polícia e há risco de vida. — Minha irmã leva as mãos aos longos cachos castanhos e suspira. — São muitas coincidências e minha profissão não permite que eu acredite que coincidências existem. Resta saber quem de nós é o alvo.

Embora as palavras de Violet façam muito sentido, Daisy insiste em tentar rebatê-la e provar que ela estava paranoica e precisava da terapia com urgência. Permaneço em silêncio, pegando a louça nos armários e colocando-as na frente de Violet, em uma ordem silenciosa de que arrume a mesa e pare de discutir.

Meu humor não estava bom, portanto comi em silêncio. Enviei uma mensagem para Dimitri, desmarcando nosso jantar usando uma desculpa qualquer, após decidir que era melhor jantar com Hector.

Ele era o único que poderia me ajudar a encontrar alguma pista do que aconteceu comigo no período que não passava de borrões na minha memória. Seu novo cargo como capitão ajudaria a descobrir a paternidade de Nathan sem fazer qualquer alarde. Tanto as palavras de Lótus quanto as de Violet ecoavam em sincronia por meus pensamentos e, de todas as hipóteses, a única que me preocupava e amedrontava era que um estranho qualquer surgisse para levar Nathan de mim. E essa não era uma opção.


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