O Conto do Cão Negro escrita por BlackLupin


Capítulo 18
Capítulo 18: O Reencontro




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Flori dirigia-se até sua casa durante o horário de almoço. Levava uns quinze minutos de caminhada e não era necessário que fizesse isso; podia muito bem almoçar na loja, porém, gostava de percorrer o trajeto de ida e volta todos os dias, pois era o momento em que tirava para pôr os pensamentos em ordem. Se tinha algum problema urgente era nessa curta caminhada que geralmente encontrava uma solução, e se tinha de bolar uma estratégia para aumentar a atividade da loja, era enquanto andava por aquela estradinha secundária que saía da rua principal que surgia uma ideia.

Naquele dia em especial, ruminava sobre o compromisso que teria a noite. Não se sentia particularmente ansiosa ou mesmo com vontade de comparecer, contudo, havia dado sua palavra e isso, para ela, era tão sério quanto um Voto Perpétuo. Ainda assim, tinha tantas preocupações e coisas mais importantes em sua vida no momento, que ela honestamente não sentia falta daquilo. Sequer se lembrava dessas coisas, porém, mais uma vez, dera sua palavra e não podia cancelar.

Flori estava tão absorta em seus próprios pensamentos, que levou um susto quando o mato alto se mexeu à sua esquerda. Ela se virou naquela direção e seu sobressalto se tornou ainda maior ao se deparar com um cachorro preto na beira da estrada.

— Snuffles? – Espantou-se.

O cachorro a encarava com a pata dianteira erguida no ar, como se tivesse congelado no ato. Flori recuou, sentindo o pânico invadi-la, entretanto, o cão continuava parado no mesmo lugar. Ao perceber que o animal não se mexia, ela inclinou a cabeça para frente, observando-o com atenção; não, não era ele. Apesar de ser um cachorro de porte grande, seu pelo estava malcuidado e ele parecia consideravelmente mais magro. Não era ele.

Ela soltou um suspiro de alívio e sorriu, repreendendo a si mesma por ser tão impressionável. “É só um cão vadio.”, tranquilizou-se. Mesmo assim, Flori decidiu apertar o passo, pois de qualquer forma um animal daquele tamanho poderia ser perigoso.

Chegou em casa mais cedo do que o comum e só diante da porta da frente é que se deu conta de que havia esquecido as chaves em cima de sua mesa. Amaldiçoando sua própria distração, Flori voltou pelo mesmo caminho quase correndo devido à pressa e o estranho cão negro foi varrido de sua mente.

 

***

Flori sentiu que havia algo estranho antes mesmo de entrar na sala. Não soube dizer o que a fizera chegar a essa conclusão, mas tinha certeza de que havia algo errado no ar devido a um arrepio que desceu por sua espinha. A sala estava escura como de costume, pois mesmo durante o dia ela mantinha as pesadas cortinas cerradas para evitar o olhar dos vizinhos enxeridos. Ela atravessou o cômodo em estado de alerta, embora ainda desconhecesse a origem dessa intuição repentina, e procurou o interruptor, percorrendo ao longo da parede com a ponta dos dedos. Ao sentir o botão da tomada ela viu algo se mexendo nas sombras, perto da porta de entrada, a poucos centímetro de onde estivera segundos atrás e os pelos de seu braço se eriçaram. Flori pressionou o interruptor e as luzes se acenderam.

Havia um sujeito de aparência tenebrosa no outro canto da sala. Suas roupas estavam esfarrapadas e manchadas em vários pontos, mas apesar do aspecto magro e maltratado, dos cabelos muito compridos e embaraçados e da barba desgrenhada que enfeitava seu rosto encovado, ela o reconheceu imediatamente.

— Sirius! - Exclamou Flori, num sussurro assustado.

O homem não disse nada e começou a caminhar lentamente em sua direção, mas vendo que ela recuava cada vez mais assustada parou ao lado da poltrona.

— Como foi que entrou aqui? – Disparou trêmula. Ela se amaldiçoou por deixar transparecer o seu medo.

Sirius ergueu o braço magro e mostrou a varinha em riste.

— Não foi difícil. – Murmurou.

Sua voz soou rouca, indicando falta de uso. Flori compreendeu que ele havia usado um feitiço, provavelmente o Alohomora, mesmo assim, tomou o gesto como uma ameaça e recuou de encontro à parede. Então o cachorrão que vira do lado de fora era mesmo ele. Flori desejou que estivesse com sua própria varinha. Desde que se mudara para aquele vilarejo remoto, perdera totalmente o costume de usá-la, pois dificilmente algo de emocionante acontecia naquele lugar e agora sua única proteção encontrava-se guardada no armário de seu quarto. Mesmo que em seu estado atual fosse inútil, sentir-se-ia mais segura se estivesse com ela.

— O que está fazendo aqui? – Indagou ela, alteando a voz. Gritar as perguntas fazia com que um pouco de sua coragem retornasse.

Sirius parecia hesitante, mas resolveu dar um passo adiante e contornar a poltrona, de modo que não havia nenhum obstáculo entre ambos agora, somente uma pequena distância que poderia ser facilmente percorrida pelas pernas compridas dele.

— Eu queria vê-la. – Respondeu roucamente. – Precisava.

— Você é um fugitivo, procurado pelo país inteiro!

— Sou. – Afirmou ele com um aceno de cabeça.

— Você... você matou todos aqueles trouxas e... Pedro. – Sua acusação falhou na última palavra ao lembrar-se do antigo e querido amigo. – Entregou Tiago e Lily!

Sirius pareceu ter sido atingido por um punho invisível e dessa vez foi ele quem recuou.

— Você realmente acha que eu fiz isso? Acha? – Perguntou, olhando-a de maneira penetrante como fazia quando estavam juntos.

Por mais que tivesse consciência de que o homem a sua frente havia realizado um feito que nenhum outro bruxo jamais fora capaz – fugir de Azkaban – e que parecia comprovar sua relação com as Artes das Trevas, confirmando os boatos que surgiram na época de sua captura, e por mais que seu jeito furtivo e a invasão à sua casa não o favorecessem, Flori foi sincera em sua resposta, algo que reservara somente a Lupin no passado:

— Não, eu não acho. – Disse. – Eu sei o quanto abominava as Artes das Trevas, devido ao que experimentou com sua família e... sei também o quanto amava Tiago e Lílian. Nunca seria capaz de entregá-los a Voldemort.

Sirius soltou um soluço rouco de alívio e escondeu o rosto entre as mãos, como se aquelas palavras fossem a gota d’água que transborda o copo.

— Não faz ideia do bem que faz ouvir que alguém finalmente acredita em você. – Balbuciou.

De repente, para o total espanto de Flori, seus ombros começaram a se sacudir num choro silencioso e ela se viu totalmente desarmada. Sentindo um terrível aperto no peito, ela se precipitou na direção do homem e o abraçou com força. Ele ficou perplexo com sua reação a principio, porém, logo se recuperou e retribuiu o gesto com prazer, enterrando o rosto entre seus cabelos.

— Eu sinto tanto, Sirius! – Lamentou Flori, consolando-o, enquanto ele liberava as frustrações da última década, agarrado a ela de tal modo, que era quase como se precisasse de seu abraço para continuar vivendo.

Ele se acalmou momentos depois e ergueu a cabeça, tomando o rosto dela entre suas mãos.

— Deixe-me olhar para você, toupeirinha. – Pediu, analisando-a vorazmente. – Senti tanta falta desse rostinho... Você não mudou quase nada nesses últimos anos, parece à mesma garota que eu acompanhei na estação, quinze anos atrás. – Sirius acariciou sua bochecha com os polegares e mesmo sabendo que precisava manter a cabeça no lugar, Flori fechou os olhos, apreciando o afago. Ela tocou suas mãos e segurou-as com gentileza. – Ainda parece com a minha Flori. Eu senti tanto a sua falta...

— Eu também. – Murmurou.

Flori abriu os olhos de repente, surpresa consigo mesma, e percebeu que ele a olhava com um brilho ávido nos olhos. Ela largou suas mãos e deu um passo para trás, pigarreando e assentando nervosamente os cabelos, desconfortável por ter se exposto daquela forma.

— Eu... nós temos muito o que conversar. – Anunciou e Sirius assentiu, recuando um passo também, demonstrando que entendia seu desejo. – Não faço ideia do que passou para chegar até aqui ou mesmo como me encontrou, mas imagino que deva estar exausto e faminto. – Como se fosse para dar ênfase ao que a mulher dizia, a barriga de Sirius roncou e a expressão dela se suavizou. – Por isso, sugiro que tome um bom banho enquanto preparo algo para comermos, o que acha?

— Excelente ideia. – Aprovou Sirius, roufenho novamente.

— Pode usar o meu banheiro, fica no andar de cima. – Ela apontou para o teto e indicou a escadaria de madeira logo atrás deles, no canto esquerdo da sala. – Irei arranjar algumas toalhas para você. – Disse.

Novamente, ele se contentou em assentir e rumou na direção da escada, enquanto Flori o observava com um misto de sentimentos, sentindo-se mais e mais confusa. Ainda que soubesse que seu namorado de colégio não fosse um assassino, sabia que todos aqueles anos em Azkaban haviam mudado Sirius, mas não saberia dizer se para melhor ou para pior. A única coisa de que sabia, porém, era que a presença dele começava a afetá-la.

 

***

Flori bateu na porta do banheiro e aguardou alguns segundos até que Sirius a abrisse. Felizmente, ele ainda não havia se despido ainda, embora o chuveiro já estivesse aberto. Ela lhe entregou toalhas e uma muda de roupas limpas, bem como um pente e até um aparelho de barbear descartável, caso quisesse se livrar da barba. Ele pegou o que lhe era passado e lançou um olhar de dúvida às roupas masculinas e depois a encarou, parecendo perguntar a quem pertenciam. Era bobagem que Flori precisasse se explicar, afinal, a prisão de Sirius automaticamente desmanchara o seu noivado, porém, ela se ouviu dizendo:

— São do meu pai. – Esclareceu.

Ele não escondeu o alívio que aquela resposta lhe proporcionou e colocou as roupas e as demais coisas sobre o balcão da pia.

— E como ele está? – Perguntou.

Flori sentiu um nó na garganta.

— Ele... ele faleceu. – Contou. – Já tem um tempo. Foi um ataque cardíaco.

Sirius ficou chocado com a notícia; ela sabia que o homem costumava se dar muito bem com o ex-sogro.

— Eu sinto muito, Flori. – Lamentou tristemente. – E a sua mãe?

O nó se intensificou.

— Eu acho que ela não suportou viver sem meu pai e se foi logo depois. – Respondeu. – Os médicos disseram, na época, que foi um derrame, mas eu acho que foi tristeza. Não tinha dado nem seis meses da morte de papai quando ela... quando ela morreu. – Completou.

Sirius fez menção de confortá-la, mas sua expressão deveria estar tão transtornada naquele instante que ele mudou de ideia e, ao invés disso, resolveu apertar seu ombro de maneira consoladora.

— Isso é horrível. Gostaria de ter podido estar ao seu lado nessa ocasião. Eu... eu não sei nem o que dizer. – Lastimou.

— Isso não importa agora. – Declarou Flori, empurrando a tristeza para o fundo de seu ser. – Não é como se você pudesse ser liberado por bom comportamento também, não é mesmo? – Brincou ela, numa tentativa corajosa de amenizar o clima. – Bem, vou deixá-lo se restabelecer. Quando acabar, me procure na cozinha.

— Tudo bem. – Afirmou ele, ainda olhando-a com compaixão.

Flori desceu para a cozinha; quanto antes ocupasse sua cabeça com outra coisa, mais rápido deixaria sua angústia de lado.

 

***

Trinta minutos depois, Sirius desceu para a cozinha e parecia quase outro homem. Havia feito à barba; não a tirara completamente, pois, na opinião de Flori, seu rosto maltratado pelos anos em Azkaban pareceria ainda mais magro e talvez por isso resolvera somente aparar a parte mais grossa e embaraçada. Quanto aos cabelos, embora estivessem consideravelmente mais curtos, ainda apresentavam um comprimento maior do que o que ele usava na época em que estavam juntos e ela se perguntou como ele havia conseguido cortá-los, já que ela não lhe dera tesoura e, até onde sabia, Sirius não possuía habilidades de barbeiro, mas imaginou que ele tivesse feito uso de alguma magia, já que até mesmo seus dentes, que haviam se tornado amarelados na prisão, voltaram ao estado normal. Com as roupas de seu pai, quase se passaria por um cidadão comum e banal, não fossem as tatuagens nos braços.

Eles fizeram a refeição em um silêncio constrangido. Fazia quinze anos que não se falavam ou tinham qualquer tipo de intimidade e Flori não sabia como deveria agir numa situação dessas com alguém que costumava conhecer e partilhar uma vida. Era quase como se ambos tivessem virado completos estranhos. Ela se sentia inquieta e a todo momento se remexia desconfortável na cadeira. Já ele, devia estar a algum tempo sem se alimentar direito, pois prestava total atenção em seu prato e o repetiu duas vezes com generosas quantidades de comida, enquanto a mulher brigava com o seu.

Por fim, quando Sirius finalmente pareceu satisfeito, ele a ajudou a tirar a mesa e com a louça, e quando não havia mais nada que guardar e nem que lavar, Flori voltou para a sala e ele a seguiu. Eles sentaram no mesmo sofá, contudo, com uma educada distância. Agora ele também parecia acanhado e o silêncio se abateu sobre ambos, sem que nenhum dissesse qualquer coisa. Não suportando mais aquela situação, Flori resolveu quebrar a mudez:

— Como foi que me encontrou, afinal? – Perguntou.

— Remo. – Respondeu. – Ele me contou que vocês se correspondiam algumas vezes, há muito tempo.

— Você esteve com Remo? – Ele assentiu. – Mas como? Quero dizer, por que você o procurou? Qual é a história, Sirius? – Ela fez a pergunta que não queria calar e que martelara em sua cabeça por todos aqueles anos. – Eu sei que não traiu nossos amigos e que não era partidário de você-sabe-quem, sempre soube. Mas o que aconteceu, por que você foi preso? Quem foi que matou Pedro?

A expressão no rosto de Sirius se tornou sombria e ela se lembrou do Sinistro que vira naquela manhã e que descobrira ser ele mais tarde.

— As mortes daqueles trouxas, a traição que Tiago e Lílian sofreram, a minha incriminação... o culpado por trás disso tudo foi o seu precioso Pedrinho. – Rosnou.

— Do que está falando, Sirius? Pedro morreu! – Espantou-se ela.

— Aquele mentiroso nojento forjou a própria morte para se safar! – Gritou Sirius, descontrolado.

— Por que ele faria isso?

Sirius pôs-se a contar toda a verdade sobre a noite que culminara na morte de seus melhores amigos e todos os eventos que se sucederam, como a sua apreensão, a fuga de Azkaban e a caçada a Pettigrew em Hogwarts, que quase resultou em sua captura e em um fatídico beijo de dementador. Conforme Sirius ia contando a história, o horror de Flori ia aumentando, até que chegou o momento em que sua única reação possível foi quedar-se em uma aversão muda e ouvi-lo até o fim sem interromper.

— Eu... eu não consigo acreditar... – Gaguejou. – Pedro, o garoto bom e gentil que estudava conosco na escola, partidário de V...Voldemort? Como ele foi capaz de fazer isso com Tiago e Lily? Éramos todos amigos!

— Rabicho sempre foi um rato desprezível e covarde. – Cuspiu Sirius. – Devia ter percebido isso quando ele tentou passar por cima de mim aquela vez, saindo com você. Ele nunca foi confiável; sempre se divertia com a desgraça alheia e quando se metia em alguma confusão por conta disso, vinha correndo se esconder atrás de nós. Desgraçado!

Flori ainda não conseguia acreditar; ela e Pedro sempre foram bons amigos. Em todos aqueles anos, ele nunca sequer demonstrara interesse nas Artes das Trevas ou mesmo em Voldemort. Era um rapaz doce e divertido, que adorava colecionar figurinhas dos Sapos de Chocolate e discutir suas partidas de quadribol favoritas. O que acontecera com ele para se transformar em alguém tão cruel e egoísta?

— Você ficou preso todos esses anos por causa dele, por um crime que não cometeu, sentenciado por toda a vida a cumprir pena em Azkaban... Como não enlouqueceu? – Indagou ela, sem conter a admiração.

— Como eu disse, a obsessão que eu tinha em ir atrás dele e me vingar foi o que me manteve são. – Respondeu. – E também... eu tinha esperanças de que a verdade fosse descoberta de alguma forma e que eu fosse solto. Pensava no que iria fazer caso isso acontecesse e nas pessoas que encontraria. – Ele a encarou por alguns segundos e então desviou o olhar. – Mas é claro que não tive essa sorte.

— E pensar que concederam uma Ordem de Merlin a ele! – Bradou Flori, batendo com o punho no braço do sofá. – Isso é totalmente injusto!

Sirius pareceu divertido com a raiva dela e deu um sorriso de canto.

— Estou acostumado às injustiças do Ministério, confie em mim. No entanto, me contento com o fato de que você acredita em mim e Harry também. – Acrescentou. – Honestamente, era a reação dele que eu mais temia. Eu tinha certeza de que o garoto pensava que eu havia sido o responsável pela morte dos pais e, de certa forma, eu fui. Se tivesse aceitado o pedido de Tiago e aceitado ser o Fiel do segredo, ele e Lily não teriam...

— Pare com isso! – Flori o repreendeu. – Pare de se torturar, Sirius! Você só fez o que achou melhor, quem de nós poderia imaginar que Pettigrew era o espião? Justo ele!

Ele suspirou pesadamente.

— Sei disso. É o que sempre digo a mim mesmo, mas há dias em que a culpa é quase insuportável.

Deixando todos os receios de lado, Flori aproximou-se dele no sofá e o abraçou de lado.

— Não fique se martirizando, afinal, até mesmo Harry já o perdoou, não? – Lembrou. Sirius aquiesceu, parecendo um pouco mais animado. – Como ele é? – Perguntou.

O primeiro sorriso sincero surgiu no rosto abatido do homem, demonstrando que já sentia um enorme carinho pelo afilhado.

— Ele é espirituoso e inteligente como Lílian e forte e corajoso como Tiago. Tem até o mesmo desprezo pelas regras que Pontas. – Riu-se. – E é idêntico ao pai na aparência, com exceção dos olhos, que são como os da mãe.

Flori tentou imaginar o garoto e sentiu uma dolorosa saudade dos amigos.

— E quanto a você, Flori? – Perguntou Sirius de repente. – Estou há horas falando sobre mim sem parar. Como tem sido a sua vida nessa última década?

Como ele havia sido tão honesto com ela, a mulher não viu razões em não o sê-lo com ele também.

— Bem, eu estava no Egito quando ouvi a notícia sobre a sua prisão e sobre as mortes. E quando soube disso eu tive um tipo de colapso nervoso... até hoje não sei ao certo o que houve comigo, foi como se não tivesse mais controle sobre o meu corpo; eu não conseguia me mexer, não conseguia falar, mesmo respirar parecia impossível. – Contou. – Eu me recusei a acreditar que eles haviam morrido e que você havia sido o culpado. E logo depois houve a notícia da morte de Marlene e então Dorcas... – Ela se interrompeu por um instante, tentando controlar a ardência em seus olhos e a tremura em sua voz. – Todas essas coisas combinadas foram demais para mim e de repente eu já não conseguia mais realizar magia.

— O quê? – Assustou-se Sirius, que ouvia comovido sua narrativa.

— Existe esse bloqueio em mim e mesmo depois de todos esses anos e de eu ter aprendido a aceitar tudo isso e seguir com minha vida e com a ideia de que nunca mais verei essas pessoas, ainda tenho dificuldade até com os feitiços mais simples. – Confessou. – Ainda não consigo. É como se a fonte tivesse se secado.

— Eu sinto muito. – Lamentou o homem, com verdadeira tristeza, sabendo a capacidade da ex-namorada, ele conseguia entender muito bem o quão difícil àqueles tempos deviam ter sido.

— Eu já me acostumei, afinal, fui trouxa por boa parte de minha vida. – Sorriu ela.

— O que aconteceu depois que descobriu...? – Ele não teve coragem de completar.

— Bem, como dá para imaginar, os duendes não ficaram satisfeitos com a minha súbita falta de produtividade e me mandaram embora.

— Desgraçados! – Exclamou Sirius, enfurecido. – Duendes são canalhas aproveitadores que só querem saber de ouro e tesouros!

— Só que eles tinham uma certa razão; meu emprego dependia unicamente da minha habilidade em magia e uma vez que eu não podia mais fazer feitiços, ou melhor, desfazer, eu não era mais útil. – Concluiu.

— Mesmo assim... – Insistiu. – A forma como eles a trataram não foi certa.

— De fato. – Cedeu. – Depois disso, voltei para a casa de meus pais e passei a trabalhar na loja de penhores deles. Me mudei para cá quando morreram e trouxe a loja comigo.

— Eu queria lhe perguntar... Por que resolveu se mudar para a parte tropical do país?

— Você me conhece, eu adoro praia. – Caçoou Flori, arrancando um sorriso dele. – A verdade é que minha cidade natal se tornou um lugar muito doloroso para se viver, com as lembranças constantes de meus pais e de... – Ela se deteve a tempo, mas algo lhe dizia que Sirius sabia que estivera prestes a falar dele.

— Bem... mudar de ares de vez em quando não faz mal a ninguém. – Reconheceu. Ela concordou. – E você por acaso... você se casou nesse meio tempo? – Perguntou num tom neutro. Ela desconfiava de que ele queria ter feito tal pergunta há muito tempo.

— Não. – Respondeu. – Eu... – Flori se perguntou se deveria continuar e, vendo o modo ansioso como o homem a observava, decidiu prosseguir. – Não estive com mais ninguém desde você. Eu nunca tive interesse, para falar a verdade.

— Eu notei que você ainda tem o anel que lhe dei. – Ele apontou para a corrente em seu pescoço.

Flori tirou o colar de dentro das vestes e segurou o anel na palma da mão, observando-o com melancolia.

— Eu não consegui me desfazer dele. Apesar de tudo, sempre tive boas lembranças de nós dois.

— Fico feliz em ouvir isso, porque... bem, não houve um dia em que não pensei em você, Flori. – Confessou.

Flori guardou a corrente sob a blusa e se levantou de repente; aquela conversa seguia rumos dos quais não ainda se sentia pronta para enfrentar. Ela olhou para a janela e se deu conta de que anoitecia e que havia se esquecido completamente de que voltara para casa em sua pausa do almoço e de que deveria ter retornado para a loja logo em seguida. A conversa entre ela e Sirius foi tão longa que tomou a tarde inteira! “Bem, não adianta chorar pelos ovos de dragão quebrados.”, pensou consigo. Ela se virou para o homem.

— Qual vai ser o seu próximo passo agora que algumas pessoas já sabem da verdade? – Perguntou.

Ele a imitou e ficou de pé também.

— Preciso encontrar um lugar para me manter escondido por enquanto. Ainda não sei onde, mas...

— Olha – começou ela, sem conseguir se conter -, você é bem-vindo aqui, sabe disso, não é? Pode morar um tempo comigo. Se quiser. – Acrescentou depressa.

— Você... você tem certeza disso? – Perguntou Sirius, como se mal ousasse acreditar.

— Não posso deixar que vá embora enquanto há uma caçada nacional pela sua cabeça. Eu jamais me perdoaria se fosse capturado. Porém... talvez seja melhor deixar claro que não haverá nada além disso entre nós, tudo bem para você?

— É claro. Você é quem manda. – Ele sorriu. – Confesso que me sinto aliviado ao saber que não precisarei continuar como cão por algum tempo. Não é tão ruim, mas prefiro não comer ratos se puder evitar.

Ela riu.

— Muito bem então. Ah! É... eu tenho um quarto de hóspedes, mas como nunca recebi nenhuma visita, enchi ele com tralhas e velharias que não couberam na minha loja, então... espero que não se importe em dormir num sofá.

— De maneira alguma. Seu sofá parece um leito digno da realeza, comparado às celas de Azkaban.

Seu riso aumentou e ela foi buscar alguns lençóis e cobertores para deixá-los a mão quando fosse à hora de dormir.

 

***

Mais tarde naquela noite, Flori se revirava na cama. Não conseguia pregar o olho, pois a todo o momento seus pensamentos desviavam-se para o homem lá embaixo. Agora que estava sozinha não parava de dizer a si mesma que não era ali que gostaria de estar. Flori odiava dar o braço a torcer, ainda mais para si mesma, mas o fato era que ainda sentia algo por ele.

Ela ficara longe da companhia de pessoas do sexo oposto e nunca sentira falta daquilo em sua vida. Até aquela noite. Ela não podia deixar de se perguntar se não estaria agindo como uma tola, afinal, era evidente que Sirius ainda a amava, assim como ela sentia o mesmo por ele, e se isto era uma verdade absoluta, então por que fazê-lo esperar? Por que fazê-lo dormir em seu sofá duro e encaroçado quando havia espaço mais do que suficiente ao seu lado? De que serviria seu orgulho quando chegasse a hora dele partir? Oh, sim, porque ela sabia que Sirius não ficaria escondido por muito tempo; não era do feitio dele.

Ela se levantou de repente, decidida, e abriu a porta. Flori levou um susto ao deparar-se com a figura ansiosa de Sirius do outro lado com a mão esquerda erguida, como se estivesse a ponto de bater. Ele pareceu petrificado; provavelmente não esperava encontrá-la antes mesmo de bater na porta.

— Sirius?

Aquilo pareceu fazê-lo voltar ao normal. Ele a agarrou de supetão e aplicou-lhe um beijo inesperado e enérgico. A partir de então, Flori esqueceu-se de todas as suas incertezas e pulou para os braços dele e, enquanto Sirius a segurava com firmeza, ela arrancava sua camisa de maneira brusca.  Um riso de expectativa escapou por entre seus lábios e, pegando-a no colo, levou-a para dentro do quarto e atirou-a na cama com força. Ele subiu no colchão e, segurando em cada lado do decote de sua camisola, puxou-a com violência, deixando sua roupa em frangalhos.

A mulher arquejou com o movimento repentino e o observou com avidez, enquanto ele desvencilhava-se urgentemente do resto de suas vestes. Flori sentiu uma excitação crescente pelo modo apressado do homem; lembrou-lhe da época em que Sirius esgueirava-se até seu quarto enquanto seus pais dormiam e ambos precisavam terminar ligeiro, temendo serem pegos a qualquer instante. Ao ver-se livre daqueles empecilhos, Sirius arrastou-se pela cama e, segurando em cada uma de suas pernas, arrebatou-a em sua direção num movimento inesperado, dando início a uma união apressada e impetuosa, que pareceu fazer o quarto todo tremer.

Contudo, o modo como seus quadris estavam ligados não parecia ser proximidade suficiente para ele, então, não diminuindo a cadência por um instante sequer, Sirius deitou-se sobre ela e decidiu brindá-la com mordidas por todo o corpo. Flori agarrava-se a ele com força; não tinha controle sobre sua própria voz e, para piorar, sentia-se próxima do fim.  Tomando uma decisão, e com um movimento súbito, ela o girou, deixando-o de costas para o colchão. Sirius ficou agradavelmente surpreso e aguardou ansioso enquanto a mulher se posicionava e passava a comandar como bem gostaria.

 

 


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