And I love it when you watch me sleep

Se revirou na cama lentamente, desfrutando do corpo pesado pelas horas confortavelmente dormidas depois de tantos dias amargando noites vazias, obcecado pelas consequências desesperançosas de tudo o que fizera um dia, pois ainda que não tivesse muito controle sobre sua mente, tinha convicção de que fora ele, James. Estava lá, em todos os momentos, por trás dos olhos mascarados do Soldado Invernal e não via como mascarar isso e se perdoar, apesar dos outros parecerem ter mais facilidade. 

Abriu minimamente os olhos, franzindo-os para a pouca claridade. Devia ser muito tarde, mas considerando o fato de não dormir de verdade há dias, sequer se importou com o horário. Em um suspiro profundo, puxou o cobertor sobre si e se voltou à figura tranquilamente acompanhando cada movimento seu. Pela forma como parecia atenta, embora silenciosa, sabia que não deveria ter dormido por todas aquelas horas.

Sem qualquer motivo, amava quando Wanda o assistia dormir. Simplesmente. Apenas pela consciência de que ela estava ao seu lado. Era mais do que confiaria em qualquer pessoa e, muito provavelmente, mais do que a deixaria saber sobre ele. Muito consciente de suas feições amassadas, a viu estender a mão e usar os dedos calmos para contornar a linha de seu cabelo, logo atrás da orelha, analisando-o.

— Gosto do novo corte.  

Fechou os olhos, apenas apreciando o toque e o tópico muito distante de fazer com que sua cabeça voltasse a doer, desejando que fosse uma manhã normal em detrimento das recentes noites caóticas ou, mais simplesmente, que fossem um casal normal acordando para trabalhar em um emprego medíocre, mas suficiente pra vida que tinham - embora não fossem normais, tivessem esse tipo de vida pacata e muito menos fossem um casal. 

Sob o cobertor, tateou pelo colchão até encontrar a cintura fina e puxá-la para mais perto, buscando o calor do contato que sempre vinha com Wanda, que imediatamente respondeu ao toque, rodeando seus ombros e deixando que entrelaçasse as pernas às dela até que estivessem acomodados e confortáveis um no outro. Não havia qualquer fundo escarlate nos olhos esverdeados tão próximos dos seus quanto os narizes se esbarrando e as respirações confusas. 

— Fazia algum tempo. 

Os dedos cheios de anéis, agora sem o esmalte escuro, rodearam seu rosto distraidamente. Concordou com um aceno de cabeça breve, sem entrar no mérito de que houveram várias outras ocasiões como aquela em que, simplesmente, escolhera não ligar. Então, abaixou os olhos para a camiseta conhecida e larga que ela vestia, depois de trocar a roupa que chegara por algo mais confortável do guarda-roupa dele. Ele não se importava, constatou ao escorregar a mão pelos quadris até chegar à pele nua da perna confortavelmente apoiada sobre seu corpo.

— Gosto da camiseta. - Wanda sorriu baixo e ele se abaixou ao levantar a camiseta para fazê-la estremecer ao arrastar os lábios e a barba pesadamente sob o abdômen. - Pode ficar? 

— Não posso… - O murmúrio não foi muito convicto, o que o fez continuar até encontrar o sutiã branco e não resistir a escorregar a língua no vale entre os seios.

— Pode ficar pra sempre? 

A sentiu prender a respiração e apertar os fios de seu cabelo entre os dedos, mantendo-o no lugar ao sentir os dentes contra a curva dos seios, a pele perfumada o inebriando como tudo o que vinha dela. 

— Eu… Realmente ficaria, se pudesse. - Ela ofegou ao enroscar o dedo na lateral da calcinha e começar a descê-la sem pressa. - Eu juro. 

Então, aquela impressão de que Wanda escondia algo voltou a intrigá-lo e Bucky se afastou para encará-la, estacando sua mão no meio do caminho enquanto a via apertar os lábios numa linha reta e tensa. 

— O que aconteceu? 

A ruiva o encarou por um instante, como que decidindo se adentraria um campo que parecia vir tateando desde que chegara durante a madrugada. Havia algo em tudo o que Wanda dizia, que o fazia ter convicção de camadas inexploradas e, talvez, inalcançáveis sobre ela. Assim, engolindo em seco e desviando os olhos, ela deu de ombros levemente em meio ao murmúrio.

— Eu fiz algo ruim. Muito ruim. 

Wanda parecia realmente arrependida e ainda chocada consigo mesma, a julgar pela forma como evitava olhá-lo de volta. Enquanto analisava cada recanto do rosto bem desenhado da bela mulher que ela se tornou com o passar do tempo, imaginou do que se tratava especificamente, para além da melancolia que parecia carregar consigo permanentemente.

Apesar disso, notava que, ao mesmo tempo que tornara algumas de suas facetas acessíveis a ele, também guardava totalmente para si aquilo que mais importava, como se não quisesse que a conhecesse. Não de verdade, não da forma como ela parecia ter decorado cada nuance que o compunha. 

Em meio a um suspiro, apenas tateou com cuidado a curva da cintura, notando a distração de quem apenas o permitia continuar sem muito interagir. Conhecia a sensação amarga e paralisante que vinha com a consciência de ter feito algo tão nocivo aos outros. 

— Bem-vinda ao clube. 

Os dedos dela se fecharam em sua nuca ao murmurar a verdade amargurada em sua pele e ela se desvencilhou com delicadeza, pronta para deixar a cama ao ajeitar as roupas em seu corpo, os ombros baixos numa contrariedade e desânimo que poucas vezes vira nela. Wanda costumava ser completamente fechada e silenciosa, assim como séria e melancólica, mas nunca parecia tão… Derrotada em si mesma. 

— Não é como está pensando dessa vez. - Contou num tom quebrado. - Diferente de você, eu quis fazer, apenas não me importei com as consequências. Eu… Nunca consigo estabelecer uma linha até onde posso ir… Explorar todo esse potencial em mim, sem ferir outras pessoas. É como se desse voltas e mais voltas e nunca conseguisse ser realmente livre desse destino. 

Irritada consigo mesma, ela apertou as mãos contra o rosto por um instante e se abaixou para pegar a calça começando a se vestir. Então, voltou a pensar no que ela dissera de madrugada, que deveria ter ligado antes. Talvez, se houvesse ligado antes de tudo o que ela fizera… 

— Você não é uma má pessoa, Wanda. - Antes que ela pudesse trocar de camiseta, alcançou o cós da jeans que acabara de vestir, a impedindo de ir mais longe e se sentando no lugar em que ela estava. A viu respirar fundo antes de voltar os olhos doloridos e brilhantes aos seus, pouco convencida. - Se fosse, não seria capaz de me deixar um pouco melhor. E você deixa, acredite. 

Os lábios dela tremeram e a ruiva foi incapaz de conter uma lágrima que insistiu em rolar pela bochecha antes de, lentamente, soltar a blusa que tinha em mãos e se virar novamente para Bucky em um suspiro cansado.  

Acomodando as mãos em seu pescoço de forma delicada, Wanda levantou seu queixo para que pudesse beijá-lo - os lábios intensamente selados nos seus e os cabelos formando uma cascata ruiva bagunçada ao redor de ambos. Rodeou o quadril com um dos braços, estreitando a distância entre eles quando ela apoiou a testa na sua e suspirou, acomodada no bom silêncio que sempre alimentavam, parecendo absorver o que dissera em sua própria realidade quando os dedos percorreram um caminho invisível por seus fios curtos.

— Vou precisar ficar um tempo fora do país. Você vai ficar bem? - Ela sussurrou, mantendo a conversa tão íntima quanto a que desejava todos os dias, fazendo-o engolir em seco. - Por favor… Preciso saber se ficará bem. 

Não, ele não iria, tinha certeza disso. As lembranças ainda o atormentariam, assim como os sonhos repletos de gritos e sensações confusas, doloridas e distantes. O Soldado Invernal seguiria com ele, como havia seguido na noite anterior e em todas antes daquela, pois a única capaz de colocá-lo nos eixos era ela. Como Wanda poderia não saber disso? Como não sabia que, quando não conseguia dormir, perdido em apocalipses pessoais e desesperança, era nela em quem tentava focar para não perder sua fé? Como não sabia que o fazia querer viver para além da mente sombria e não confiável que, cada vez mais, fincava raízes nele?

— Eu estarei aqui. - Declarou, incapaz de mentir sobre seus próprios fantasmas, o que não deixou de ser notado. - Quando estiver pronta para voltar. 

A ruiva meneou a cabeça em contrariedade - não sabia se consigo mesma, com ele ou pela situação eternamente trágica em que sempre acabavam envolvidos - e Bucky se deitou levando-a consigo, ainda que de má vontade. Aceitando a posição íntima sobre ele, se ajeitando melhor sobre seu corpo, a sentiu examinar em minúcia todo o seu rosto, os dedos adornados em anéis percorrendo um caminho abstrato em sua barba até alcançar seus lábios.

— Eu nunca quis tanto ficar pra sempre.

Murmurou, depositando um beijo pesado no canto de sua boca, os olhos de fundo escarlate o decorando em tristeza latente enquanto fazia o mesmo no conforto que Wanda trazia consigo, ainda que fizesse todo seu peito se contrair numa dor abstrata e sufocante. 

— Eu sei.

Afirmou, com certeza, de volta à respiração quente antes dos lábios se firmarem nos seus, no ritmo lento e profundo tão característico deles. Ao mesmo tempo, seus dedos se fechavam tanto ao redor da cintura fina quanto da garganta macia, conduzindo-a no aperto que ela amava. 

Naqueles momentos - e apenas neles -, o familiar abismo particular que eternamente o atormentava parecia mais distante do que o normal. Quanto às próximas noites, não poderia afirmar que não seria encharcado pela lua e as lembranças perturbadoras que ela trazia.

FIM