Não te amo, é apenas uma comichão doida nos pés, mais precisamente na sola dos mesmos. Rendo-me completamente, não evito o mal, pois depois de te ver, de experimentar a visão da tua figura perfeita, imaculada e radiosa, não há mais nada a fazer, o estranho prurido alastra-se-me pelo corpo, a começar por baixo, pela sola dos pés obviamente, chega até ao peito e aí entranha-se-me no coração, deixando-o galopando de aflição. Não te amo nadinha, podes deixar de sorrir, esta comichão não significa que preciso de ti para me aliviares da maleita, preciso apenas de umas excelentes unhas bem afiadas que me arranquem da pele e do coração esta sensação sufocante.

Neste meu desespero de amor, que não existe, atenção, não te ponhas soberba a julgar o contrário, reparo que tu poderias fazer-me o jeito, as tuas unhas têm o tamanho ideal para a função e talvez, provavelmente, poderias ajudar-me a ultrapassar este meu problema cutâneo que, sem saber como, nem porquê, chega-se-me ao órgão vital que bombeia sangue pelo meu corpo que arde de alergia, vermelho e quente, sempre que te vejo e que estou ao pé de ti. Na verdade, verdadinha, não te amo, afirmo-te sem qualquer dúvida e impante das minhas certezas, mas tu mexes com as funções do meu ser ansioso. Vem cá, coça-me e deixa-me à minha vida solitária, que eu não preciso de ti, compreende a minha posição, apenas do alívio das tuas unhas e do calmante das tuas mãos, como um bálsamo em forma de fragrância, que há de entrar-me pelas narinas adentro e refrescar-me todo, até ao meu coração comichoso. Arrancar-me da loucura de não te ter, da vaidade de me saber ao comando dos acontecimentos quando tu estás presente.