E.T.A escrita por Bia


Capítulo 2
II - There's Something On Your Mind


Notas iniciais do capítulo

Música: Etta James & B. B. King - There's Something on Your Mind



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II - There's Something On Your Mind

“There's something on your mind. By the way you look at me”

 

— Oh! Por Merlin! — Hermione gemia apertando, contra o peito, um pergaminho amarrotado. Harry cruzou os braços e balançou a cabeça, boquiaberto. 

Essa garota era maluca. Maluca!

Se soubesse que um simples ensaio sobre livros amaldiçoados causaria aquela reação, teria escrito antes.

— Tenho que admitir. — disse com as faces rubras de admiração. — Você mereceu esse “excelente”. Está perfeito, Potter! Até mesmo as vírgulas… 

Fim de Novembro. E ela ainda não o chamava pelo primeiro nome.

— …Mas você não é o único com algo para exibir. — continuou, sorrindo e mexendo na mochila. Harry arqueou uma sobrancelha e segurou a língua atrás dos dentes. Exibir era uma palavra injusta. Mostrara o trabalho a pedido dela.  

Mordendo o lábio inferior, orgulhosa e satisfeita, a garota desenrolou sobre a bancada um pergaminho perfeitamente dobrado.

— Uau. — o moreno exclamou observando-o. — Um “quase excelente” em Poções. Parabéns, Hermione, essa é a nota máxima do Snape.

Riu, entusiasmada.

— Eu sei. 

— Se bem que… O mérito também deveria ser meu. Fui o professor.

O moreno sorriu ladino e Hermione revirou os olhos, mesmo sem conseguir ocultar o divertimento. 

— Claro, claro. Eu sou muito grata pela sua ajuda. O mérito do aluno é o mérito do professor.

O Potter fez uma careta.

— Concorda com isso?

— Não cem por cento. — a Granger afirmou devolvendo o ensaio dele e tornando a dobrar o dela cuidadosamente. — Entretanto, geralmente bons professores conseguem fazer com que seus alunos se desenvolvam. — sorriu provocadora. — E você não é um professor tão ruim.

Refletiu-lhe o sorriso.

— Você não é uma aluna tão ruim também.

Retraído, Harry encostou na bancada, limpou a garganta e coçou a nuca.

— E como professora? Acha que gostaria de ensinar?

Hermione olhou-o sem entender.

— O exame de História da Magia não está tão distante, não é? E eu… Bom, você disse que gostava e eu…

— Certo. — interrompeu-o com eficiência. — Ficarei feliz em ajudar no que puder.

— E provar que o mérito é do professor? 

— E do aluno! 

— Ok, ok. Ficaria muito admirada se eu tirasse uma nota maior que a sua nessa prova? — brincou ele, curvando-se em sua direção.

A castanha estreitou os olhos.

— Parece um desafio.

Sorriu torto.

— Se preferir.

Ela mordeu o lábio inferior, pensativa. Depois balançou a cabeça.

— Sim, prefiro. Acho que é um bom jeito para te motivar a estudar…

— Eu estudo.

— … História da Magia.

Encarou-a com intensidade.

— Veremos.

Dessa forma, a dinâmica entre eles mudou. Às terças, a Sala Precisa se transformava em um enorme laboratório com caldeirões no fogo e poções borbulhantes e, às quintas, virava uma singela sala com enormes mesas de madeira e poltronas confortáveis onde Harry ouvia Hermione contar batalhas e acontecimentos passados com empolgação contagiosa. Em uma dessas noites, enquanto o Potter demonstrava um feitiço particularmente complexo que deveria ser usado junto à poção, foi que a Granger comentou baixo, aparentemente sem querer:

— Você é realmente bom nisso. Explicar poções, eu digo. Consigo até desculpar o riso maldoso no primeiro ano.

Franziu as sobrancelhas, confuso.

— Quê?

Observou-a congelar e empalidecer, como se só agora notasse ter falado em voz alta.

— Ah, você sabe… — começou, visivelmente constrangida, gesticulando exageradamente. — No primeiro ano, lembra? Aquela aula do Leviosa em que tentei ajudar Ronald e aí saímos da sala e ele disse que eu era um pesadelo. Você riu. Quer dizer, não só você… Dino e Simas também, mas tudo bem. Passado. Coisa de criança.

Em silêncio, o Potter enrugou a testa esforçando-se para recordar detalhadamente o tal dia. 

Do infeliz comentário de Rony, lembrava-se sim. Bem como se lembrava de sentir alguém esbarrando em seu ombro e afirmar, logo depois e assustado, que Hermione escutara. Lembrava-se de alguém dizendo que a Granger estava chorando no banheiro, de Neville ter saído para consolá-la e da vontade de acompanhá-lo. Vontade varrida de sua mente assim que pôs os olhos na decoração de Dia das Bruxas no Salão Principal.

E, embora as recordações estivessem já meio acinzentadas, de uma coisa tinha absoluta certeza. Não rira, em momento algum, das palavras do ruivo.

Lentamente e sem desvios, disse:

— Hermione, acho que houve um mal entendido. Eu nunca ri do que Rony disse, até porque não concordava e não concordo. Eu respeito você, Granger. 

Olhos castanhos caíram das órbitas e Harry desejou registrar a expressão perplexa, certamente rara, no rosto de Hermione Granger.  O divertimento foi breve, entretanto. Com a garota entrando em parafuso, desorientada, o apanhador sentiu-se nervoso e um pouco julgado, o que destruiu o agradável clima anterior. Pronto para dar de ombros, o que fazia sempre que estava ansioso, e dizer qualquer besteira, perdeu a dianteira para a poção. Esquecido em fogo alto, o elixir usufruiu do descuido chocado de ambos e vazou do caldeirão para a bancada e da bancada para o chão cobrindo tudo de líquido verde musgo. 

Surpreendidos, pularam juntos para trás. A castanha apressou-se em apagar o fogo enquanto Harry limpava a sujeira com um movimento de varinha. Depois do susto e de descartarem a poção que, naturalmente, desandou, os garotos encararam-se encabulados. A Granger sugeriu que tentassem de novo um outro dia e o Potter concordou imediatamente. 

De volta ao incômodo silêncio, arrumaram cada qual seus pertences e saíram apressados. Nem bem chegaram ao habitual ponto de separação - o corredor do sexto andar - quando Harry escutou a voz dela chamá-lo, baixa e ansiosa. 

Virou-se e assistiu o lábio inferior feminino sumir parcialmente debaixo de dentes grandes e a alça da mochila ser apertada com força.

Esperou pacientemente até que ela, por fim, sorriu sem alegria e disse:

— Até quinta.

O capitão do time de quadribol acenou, confirmando com a cabeça e desceu as escadas pensativo. 

Sentiu que tinha encontrado a peça faltante de um quebra-cabeça quase completo.  Pois, até onde conseguia se lembrar, ele e Hermione tinham sido próximos no primeiro ano. O afastamento repentino dela deveria tê-lo espantado na época, mas não espantou. Pelo contrário, a dúvida do porquê não eram mais amigos e o motivo dela só chamá-lo, com certo desprezo, pelo sobrenome surgiu, de súbito, anos depois. Claro, o menino de onze anos era muito menos atento a essas situações do que o adolescente de dezesseis. De qualquer forma, não era mesmo de seu feitio perder tempo humilhando os outros e, para ser franco, de fato admirava Hermione.

Apesar de achá-la paranóica, o moreno também sabia que era inteligente, determinada e corajosa. Não se deixava intimidar por dificuldades e pelo preconceito, explícito ou velado, que existia mesmo ali, em Hogwarts. Sua enorme paixão pelo conhecimento e sua generosidade com ele também eram dignas de estima. 

Ainda aflito e inquieto, o pensamento de Harry retornou ao fatídico dia. 

Que diabos! Tinha sido condenado por algo que nem tinha feito. Não rira do que Rony dissera. Não existia motivo para ela ficar tão chateada. Não com ele, pelo menos. E, além do mais, eram amigos até então, ela poderia... 

Estancou, como se tivesse batido fortemente contra uma parede invisível. 

Sim, provavelmente isso não contava em sua defesa. Verdade que não tinha rido, mas igualmente verdade que não tinha feito nada. Se fosse o oposto, Harry sabia o quanto se sentiria traído.

Estalou a língua.

— Merda.

 

Na quinta-feira seguinte, apesar do mal estar anterior, se encontraram na sala Precisa, conforme o combinado. Faltavam quatro dias para o exame de História, último antes das férias. 

A Granger explicou as Relíquias da Morte com desenvoltura, esclarecendo como um caso possivelmente real tinha se tornado conto infantil, e Harry ficou tão arrebatado que nem sentiu sono. Como habitual, após a exposição dos fatos, datas e personagens, ela lhe entregou um pergaminho com dez questões sobre a matéria. E, dessa vez, o Potter não se sentiu tão inseguro quando o devolveu, respondido, pouco tempo depois.

Suas vozes só tornaram a soar quando Hermione pousou a pena e suspirou.

— E então? — perguntou ansioso.

A garota sorriu perversa e admirada.

Quase excelente.

Depois da primeira impressão de incredulidade, Harry riu.

— Merlin! Deve ser contagioso! — apoiou o queixo na mão. — Nosso desafio ainda está valendo?

— Claro! Não sou covarde.

Olhos verdes brilharam.

Segunda-feira, Harry e Rony chegaram na sala um minuto antes do início da prova. O professor Binns já tinha colocado as questões da lousa e, sonolento, entrelaçava as regras para o exame com o desejo de boas festas.

— Não pode feliz natal na prova.

Harry quis lançar um sorriso de desafio para Hermione, mas ela já estava escrevendo rapidamente com a cabeça afundada sobre a mesa.

 

— Hora da verdade.

Mal tinham colocado os pés dentro da sala Precisa quando ela o encurralou sorridente. 

O resultado da prova saira na quarta e Harry estaria mentindo se dissesse que não tinha passado o dia impaciente.

Deu de ombros, erguendo o pergaminho com lentidão.

— Nada de mais.

Hermione lançou-lhe um olhar desconfiado antes de mirar o documento. O repentino sorriso que ela abriu derreteu o peito de Harry.

— Merlin! Um excelente! Parabéns! 

— Eu tive uma boa professora.

— Boa? — Hermione retrucou devolvendo-lhe a prova e erguendo a própria. — Segundo Binns eu “excedo as expectativas”. 

Harry revirou os olhos, mas não deixou de rir.

— Parece que venceu nosso desafio.

— Sem novidades.

Abriu a boca para retrucar, brincando, quando seus olhos paralisaram nos dela, sérios e graves. 

Mais forte, imediata e intrusa, a tensão se instalou. 

Balançando sobre os pés, o garoto umedeceu os lábios para falar sobre aprendizado, amadurecimento e perdão. Coisas sobre as quais tinha refletido muito desde que soubera o motivo do distanciamento entre eles. Na sua mente, o discurso saira com perfeição e eloquência. Pena que não foi dessa forma que ficou em voz alta.

— Escuta, Hermione, as férias começam amanhã e eu quero agradecer a ajuda que você me deu em História. Consegui melhorar minhas notas e aprendi muito também. — desviou o olhar por um instante antes de tornar a encará-la, decidido. — E… Sobre aquilo do primeiro ano… Eu não queria que atrapalhasse nossa convivência atual… Aquilo foi…

— … Passado? — a voz de Hermione soou suave e ponderada, quase como se ela também temesse o assunto. 

Era o único lugar em que o apanhador gostaria que ficasse.

— Justamente o que eu ia dizer. — sorriu.

Mais aliviado e confiante, ergueu a mão direita para ela.

— Então, agora é Harry.

— O que? — a garota fez uma careta confusa e deu um passo para trás. 

— Eu sou Harry.

— Ah! — fez compreendendo. Tornou a se aproximar e ergueu a própria mão. — Hermione.

— Eu já te chamo assim.

— Sem permissão.

— Precisamos dela?

Riram e o moreno juraria fervorosamente que, quando seus dedos se tocaram, uma corrente elétrica atravessara ambos os corpos. Talvez tenha sido esse o motivo dela ter recolhido a mão repentinamente e se afastado de novo.

— Tenho uma coisa para você. Meio um presente de natal, meio uma forma de agradecimento.

Ela correu até a mala esquecida em cima de uma poltrona e abriu-a com pressa, puxando de lá um enorme embrulho vermelho. Aproximou-se e empurrou o volume na direção do garoto:

—  Espero que goste. 

Harry abriu o embrulho sem cerimônias. O papel de presente vermelho caiu no chão como um fio indo de seus pés aos pés de Hermione. Nem um pouco surpreso quando encontrou um livro, mas, da mesma forma, deslumbrado com o título, Quadribol através dos séculos, ele sorriu.

— Claro que gostei. Muito obrigado, Hermione.

A Granger corou. 

O Potter olhou para o livro e de volta suas bochechas vermelhas. Era o melhor presente de Natal que poderia ter recebido.

Claro, o livro era ótimo também.


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