A Garota que Eu Conheci na Igreja escrita por Binishiusu Sensei


Capítulo 24
Não Vou Acreditar




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Sara ouviu as palavras de Jéssica e ficou paralisada - não, é mentira, ela tá falando isso só para me fazer sofrer. Não vou acreditar, a Yumi já vai chegar pra aula.

Olhou para Jéssica e percebeu que ela mantinha o mesmo olhar sarcástico. Era uma cara forçada, então era difícil saber o que ela realmente estava pensando.

Que sensação horrível, parece que eu vou desmoronar aqui. Tá... Estou chegando no meu limite, preciso escapar desses sentimentos.

Com esse impulso, Sara tentou pensar. Olhou para Jéssica e ficou pensando, lembrando e calculando coisas. - Se eu aceitar essa provocação e me render aos meus sentimentos, ela vai me destruir aqui na frente dos colegas. Vou ignorar o que ela disse e mudar o rumo da conversa. Preciso pensar em algo e precisa ser rápido.

Enquanto pensava em tudo o que sabia sobre Jéssica, lembrou - no dia que ela humilhou a Yumi por não saber tocar piano com cifras...

Naquele dia, tinha um rapaz. O nome dela era Matheus. A Jéssica estava toda arreganhada pra cima dele. Ele era o chefe do grupo que cantou naquele dia. Eles eram de Curitiba... Será?

— Interessante, Jéssica - respondeu Sara, também forçando uma cara de sarcasmo.

— Interessante?! Claro que é interessante. O senhor Yuji tomou uma ótima decisão...

— Interessante você ter mentido na reunião - disse Sara, interrompendo Jéssica.

— Quem mentiu foi você, eu levei provas...

— Me lembro bem das suas provas. Me diz uma coisa, quando você interrompeu o seu momento para fotografar outro casal, ele achou estranho?

— Como?! - Respondeu Jéssica, parecendo desnorteada.

— Quando você estava no mato, ficando com o Matheus, com a desculpa de estarem no Bosque do Papa fazendo trabalho missionário. Nesse momento, ele achou estranho quando você interrompeu o beijo para fotografar outro casal? - disse Sara, de forma cortante.

— Eu... Hã... Aaahh... - Jéssica apenas mastigou as palavras, sendo incapaz de formular uma frase.

— Que coisa, parece que eu descobri exatamente o que você estava fazendo no bosque aquele dia. Ouso dizer que sou boa - disse Sara, com ar de superioridade.

Enquanto isso, pensava em seu íntimo - ainda bem que acertei o palpite, ela estava acabando comigo. Estou quase tendo um treco, mas se continuar assim, acho que consigo manter minha sanidade.

— Eu estar ficando com o Matheus é irrelevante. Eu sou menina e ele é menino - respondeu Jéssica, de forma defensiva.

— A gente não viu vocês nas trilhas por que vocês estavam escondidos no mato. Agora tudo faz sentido... Você é só uma hipócrita Jéssica. Você tava lá no seu momento, ninguém mexeu com você, mesmo assim, você foi atrapalhar a gente.

— Eu não sou hipócrita Sara... Nós já tínhamos entregado todo o material missionário que tínhamos antes de ficarmos... - Respondeu Jéssica, como se estivesse se justificando para si mesma.

— Ah, perfeito, isso justifica tudo - respondeu Sara de forma irônica.

— Esquece, não vou justificar isso pra você por que eu não preciso. Meu relacionamento com o Matheus é legítimo, é um relacionamento que a igreja aprova. Vocês e a Yumi é que estão erradas nessa história - respondeu Jéssica, agora, recobrando o controle da conversa.

— Acredite Jéssica, não somos nós que estamos erradas nessa história. Nosso amor é legítimo - respondeu Sara, se sentindo bem com as próprias palavras.

— Você chama isso de amor legítimo? Você é realmente uma pessoa doente, você me dá nojo - disse Jéssica com desdém.

Então, Sara sentiu raiva crescendo dentro de si e respondeu - não trate o meu relacionamento com a Yumi como uma coisa errada, Jéssica.

— Seu relacionamento com ela é completamente errado, Sara. Não sei como você consegue viver achando que isso é uma coisa normal. Isso é coisa para pessoas pervertidas - disse Jéssica, antes de emendar com outra frase.

— Me diz Sara, a Yumi é a mais pervertida entre vocês duas? O que é que aquela menina toda certinha faz quando está só com você? - respondeu Jéssica, mais uma vez com o olhar sarcástico.

— Não fale um "a" sobre a Yumi, Jéssica. Ela é uma pessoa incrível - respondeu Sara, que tinha aumentado consideravelmente o seu volume de voz.

— Ah, pela sua reação eu acertei. Então quer dizer que quando vocês estão sozinhas ela é uma tarada por corpos femininos - respondeu Jéssica, soando mais provocativa.

— Cala a boca Jéssica - respondeu Sara, quase gritando.

— Entendi, é ela que faz o papel do homem...

Nesse momento, Sara levou a mão até o rosto, cobriu a boca e desviou o olhar. Estava quase chorando de raiva, prestes a ter um surto.

Ela vai me fazer perder o controle - pensou. - Não sei se eu aguento mais tempo., provavelmente eu deveria sair daqui... Não, não vou sair daqui depois dela falar isso sobre a Yumi.

— Você é um lixo Jéssica, um lixo. Você fez muito mal pra mim e pra pessoa que eu amo... Tudo por causa de inveja. Você é o pior tipo de pessoa que existe - respondeu Sara, tentando conter suas lágrimas de raiva.

— Só cumpri o meu dever ao denunciar um pecado que eu vi acontecer... - Disse Jéssica, de forma evasiva.

— Mentira, se fosse só isso, você teria mostrado a foto pro pastor... Tudo aquilo, toda aquela conversa... Foi tudo uma manipulação sua. Você planejou tudo para que durasse mais tempo. Planejou para pensarmos que tínhamos uma chance de escapar. Você fez um plano para fazer a Yumi sofrer o máximo possível e com você assistindo - disse Sara, de forma enérgica, fazendo o possível para se conter.

Jéssica ficou em silêncio e contendo um pequeno sorriso. Na leitura de Sara, aquela expressão era uma admissão de que ela estava certa.

— Agora você também está tentando me fazer sofrer por que você é sádica. A Yumi não se mudou, isso é mentira, é você tentando me desestabilizar - respondeu Sara, tentando arrancar mais uma admissão de Jéssica.

— Aaahh, Sara... Você se acha muito boa, né? Pois bem, você até que é boazinha sabe... Em deduzir as coisas... Mas eu sou melhor - disse Jéssica, aparentando muita satisfação e dizer aquelas palavras.

Sara ficou quieta, esperando Jéssica terminar de falar.

— Realmente, eu não suporto o fato da Yumi ser melhor do que eu no colégio e no piano. Mas ela não é melhor do que eu em lidar com pessoas, nem você é, Sara - respondeu Jéssica, soando de forma assustadoramente sincera.

Todes estava ouvindo com muita atenção, cada vez mais interessados na conversa.

— Sabe, Sara, no ranking aqui do colégio, a Yumi é a aluna número um. Eu sou a número dois e você a três. A Yumi não está aqui...

— Para de mentir Jéssica, ela não se mudou - disse Sara, enquanto pensava - por favor, seja uma mentira.

— Como a Yumi não está aqui, agora eu sou a aluna número e você a número dois. Ou seja, eu sou a pessoa mais esperta aqui e você ainda não entendeu isso - disse Jéssica.

— O que isso tem haver com o assunto? - Respondeu Sara, num impulso.

— Tem haver que você é meio lerda e ainda não percebeu... Eu acabei com você na reunião e você não aprendeu nada com aquilo - disse Jéssica, agora, parecendo aproveitar a sensação de dizer aquelas palavras.

— Muito bem Jéssica, sua gênia, o que eu não aprendi naquela reunião? - Respondeu Sara, com muito sarcasmo na palavra "gênia".

— Você já percebeu que também sei lidar com pessoas e fazer a conversa ir na direção que eu quero... Mas não percebeu o mais importante - respondeu Jéssica, que então, propositalmente fez uma pausa para aumentar a expectativa de todes.

— Eu sempre tenho algo comigo para fazer as pessoas acreditarem em mim - disse Jéssica, enquanto colocava a mão no bolso.

Sara sentiu seu coração acelerar e doer - não, por favor, para de me torturar. Estou quase tento um colapso e ela vai pegar esse celular de novo. O que ela tem dessa vez?

— A Yumi se mudou ontem. Depois que o senhor Yuji matriculou ela no internato, ele mandou um áudio para o pastor. Bom... Depois do meu pai pedir, o pastor encaminhou o áudio pra ele, que depois mandou pra mim - disse Jéssica, segurando o celular na altura do rosto.

Estando prestes a ouvir o áudio, Sara pensava - por favor não, eu não vou aguentar se isso for verdade. Isso não pode ser verdade, é blefe dela pra torturar. Por favor não seja isso.

Então, Jéssica deu o clique necessário para reproduzir o áudio. Este, tinha a voz de Yuji, e dizia - "pastor, terminei minha parte para resolver o problema. A Yumi já está matriculada no internato aqui de São Paulo. Tentei fazer isso o mais rápido possível, para que ela ficasse longe da Sara logo. Ah... Não se preocupe com a questão dos feriados e férias. Ela vai passar esse tempo hospedada no internato também. Espero que daqui algum tempo ela seja curada dessa doença. Eles monitoram os estudantes vinte quatro horas por dia, não tem como ela fazer nada desse tipo outra vez. Acho que o ambiente cristão daqui vai estimulá-la a gostar de garotos de novo, como deve ser. Ah... Pastor, obrigado por não ter tornado esse caso público, obrigado mesmo. Abraço, voltarei para Araucária ainda hoje."

Ouvindo isso, Sara tremeu. Jéssica olhou pra ela e disse - entendeu agora? Sua lerda. Acabou, eu ganhei, você e a Yumi nunca tiveram chance.

Então, Sara começou a chorar. Mas não estava chorando como tinha feito antes. Estava chorando de forma ofegante e sem permitir que as lágrimas escorressem dos seus olhos. Ela sentia dor, mas também sentia raiva. Seu lado racional havia sucumbido, não era mais capaz de pensar logicamente. Quanto ao seu lado emocional, estava quebrado.

Jéssica apenas olhou e saboreou o momento, ela era de fato sádica. Mesmo não tendo nenhuma rixa direta com Sara, por não gostar de Yumi, estava satisfeita em ver Sara sofrer. Enquanto isso, como numa última fagulha de pensamento que ainda havia em sua mente antes de entrar em colapso, Sara percebeu - tenho dois sentimentos intensos me puxando para direções opostas. Um é a dor de ter sido separada da Yumi, o outro, é a raiva que estou sentindo da Jéssica. Não quero me entregar a essa dor agora, na frente dela, escolho me entregar a raiva.

— Eu te odeio Jéssica. Não tem perdão pro que você fez pra gente - disse Sara, num tom de quem não estava brincando. Disse isso olhando para baixo, sem ter contato visual com Jéssica.

— Isso, não tem perdão para o que eu fiz, por que eu fiz o certo. As erradas da história são você e a Yumi, suas pervertidas - respondeu Jéssica, parecendo sentir raiva também.

— Nós nos amamos, não desrespeite nosso amor nos chamando assim - respondeu Sara. Agora, encarando Jéssica nos olhos e dando um passo em sua direção.

— Ouviram, gente? Essa maluca beija a melhor amiga e chama isso de amor - disse Jéssica, olhando para as pessoas em volta.

— Já mandei você parar, Jéssica - respondeu Sara, no mesmo tom de antes e dando dois passos na direção de Jéssica.

— Sara, eu já perguntei e você não respondeu, quem fazia o papel do homem era a Yumi?  - disse Jéssica, ignorando a ordem de Sara.

Ao ouvir isso, Sara sentiu um embrulho no estômago é uma fisgada no pescoço - essas pessoas não entendem? É tão difícil assim de entender que nós não precisamos de um homem?

— Não vai responder, Sara? Estou começando a achar que a pessoa masculina da relação é você, sapatão.

A raiva de Sara aumentou, mas sua dor emocional também e ela continuava chorando - essa pessoa... Ela não entende nada, ninguém aqui entende nada. Meus pais, os da Yumi, o pastor e os anciãos... Todos eles se dizem cristãos, mas nos punem por nos amarmos, isso tá errado!

— Não tem o que falar Sara? Parece que eu acertei... Você está pensando em começar a ir pra igreja usando calças em vez de vestido? - Disse Jéssica, provocando e indo na direção de Sara.

Agora, as duas estavam há um passo de distância. Todes estavam olhando, em completo silêncio. Sara estava chorando sem conter as lágrimas e Jéssica estava assistindo.

— Não vai responder? Você é tão frágil assim com provocações? Então acho que você não tem o papel masculino na relação...

Sara, que estava olhando para baixo, encarou Jéssica mais uma vez. Sentia uma dor profunda, mas também sentia vontade de destruir o ser humano que estava diante dela.

— Você se interessar pela garota que é minha rival é até compreensível... - Disse Jéssica, se aproximando ainda mais de Sara para que pudesse falar no seu ouvido.

— Sabe, sendo totalmente sincera... Eu não me importo com mulheres ficando com mulheres, pra mim tanto faz, façam o que vocês quiserem. Só usei isso por que era a única forma de prejudicar Yumi.

Ao ouvir isso, Sara sentiu nojo e sua raiva ficou mais latente. Mesmo assim, não se distanciou de Jéssica, continuou ouvindo.

— De verdade, se você gosta de garotas, faz sentindo você se apaixonar pela Yumi. Ela é linda, inteligente e talentosa, está quase no meu nível. Mas o que será que ela viu em você?

Dessa vez, Sara foi atingida por um terceiro sentimento. Se sentiu, inválida e inútil. - Não sei o que ela viu em mim... Ela é melhor do que eu. Sem ela eu sou o quê?

— Faça um favor pra você, esqueça a Yumi, ela está melhor sem você atrapalhando a vida dela - disse Jéssica, num sussurro.

Sara sentiu a dor e a raiva aflorarem mais uma vez. Agora, estava sobrecarregada de emoções, supersensível, mas não sabia o que fazer.

— Lembra o que eu falei antes? - Disse Jéssica, ainda sussurrando. - Essa parte do castigo é mais pra você do que pra ela. O internato é incrível, a Yumi vai gostar. Vai ficar envolvida, conhecer gente nova e te esquecer. Quando isso acontecer, será que ela vai te trocar por um menino ou uma menina?

Ao ouvir isso, de uma só vez, todos os sentimentos que Sara estava sentindo se direcionaram para sua raiva de Jéssica. Então, sem pensar e num movimento rápido, se atirou para cima de Jéssica.

Grudou com as duas mãos no cabelo loiro da garota. Com toda força, a empurrou para trás, fazendo com que ela se desequilibrasse e cais-se de costas no chão. Sara caiu por cima dela, ainda grudada em seus cabelos. Houve um alvoroço entre a turma. As garotas ficaram chocadas. Os garotos ficaram ansiosos pela briga de garotas.

Jéssica tinha ficado sem ação, não estava esperando ser atacada e derrubada. Sara, não estava pensando, estava apenas atacando, conforme seus sentimentos exigiam naquele momento. Ela soltou dos cabelos de Jéssica. Então, a acertou com tapas, socos e arranhões. Estava frenética, descarregando tudo o que estava sentindo de negativo.

Depois de um breve momento, Jéssica tentou se defender. Tentou atacar Sara, mas não foi capaz. Então, depois um minuto nessa situação, um dos monitores do colégio, chamado por uma das amigas de Jéssica, tentou separar a briga.

Sara se debateu, para não ser pega, e bateu em Jéssica até o último instante em que não era impedida. Por fim, o monitor, que era um homem alto, foi capaz de imobilizar os braços de Sara e distancia-la um pouco de Jéssica. Neste momento, num último surto de raiva, Sara proferiu o único golpe que ainda era capaz. Com toda força, deu chute em Jéssica que acertou na sua boca e seu nariz.

Depois desse golpe, o monitor a puxou para mais alguns metros de Jéssica. Então, Sara parou de se debater e se rendeu . Foi então que pode olhar para Jéssica. A garota ainda estava caída no chão, chorando e com a boca e o nariz sangrando. Ao ver isso, Sara se compadeceu e disse em pensamento - o que eu fiz?

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Gente, muito obrigado por me acompanharem por mais essa semana. Fico sempre muito feliz com as leituras e os comentários.

Sobre este capítulo e o último, adotei o uso da palavra "todes" na narração em terceira. Fiz ume amigue não binárie recentemente, então estou incorporando a linguagem neutra. Daqui em diante, obrigado a todes por lerem


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