A Garota que Eu Conheci na Igreja escrita por Binishiusu Sensei


Capítulo 20
Reunião com o Pastor




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/805065/chapter/20

Sara ouviu a frase do pai e sentiu um choque de adrenalina. Seu coração acelerou e por um momento, sentiu como se não fosse capaz de usar as pernas e os braços. Ficou congelada na cama, olhando para o pai, que lhe devolvia um olhar mortífero.

Ligeiro! Já falei que vamos agora - gritou Rodrigo, que depois saiu do quarto bufando a passos pesados e barulhentos.

Por mais um segundo, Sara ficou imóvel. Então, de forma estabanada, foi se vestir. Antes de tirar o pijama, fechou a porta do quarto. Encontrou um vestido preto no guarda roupa e calçou um sapatinho preto com fivela. Vestida, ofegante e tremendo, saiu do quarto. Seu pai estava na sala, esperando por ela.

No breve momento de silêncio, antes de Rodrigo se pronunciar, Sara pensou - não tem como isso ser bom. Ele está irritado demais, não vejo ele assim desde a última vez que eu apanhei quando era criança. Estou com medo.

— Vamos pro carro - vociferou Rodrigo, indo a passos largos em direção a porta da casa.

Sara hesitou por um momento - eu ainda não comi, não lavei o rosto e nem penteei o cabelo. Tô com cara de morta, ele vai me fazer ir assim? Esquece, ele não vai me dar nem mais um minuto pra eu me arrumar com dignidade, ele é assim.

Foram para o carro. Rodrigo bateu a porta com força e não colocou o cinto de segurança. Sara, que tinha entrado no carro devagar, fechou a porta com muito cuidado, como se tivesse medo do barulho caso ela fechasse com força. Quando saíram, apenas Sara estava com o cinto de segurança.

Rodrigo dirigiu mais rápido do que era permitido. Sara, que já estava nervosa com a situação, começou a sentir-se mal dentro do carro. Tinha a impressão de que iriam bater a qualquer momento e o descuido do seu pai não estava ajudando.

Quando já estavam na metade do caminho, Sara pensou - isso não é normal, por que falar com o pastor agora, na hora do culto? Eu não fiz nada que incomodasse o pastor Alexandre. Bom, a minha única “falha” recentemente foi ter gazeado a aula de ontem. Mas se o meu pai descobriu, não tem motivo para falar disso com o pastor, isso seria uma questão do colégio. Se bem que ter gazeado aula não é o meu segredo mais secreto. Mas não tem como ser isso, eu e a Yumi sempre tomamos muito cuidado. Não tem como ninguém saber sobre nós.

Certo, não tem como saberem sobre mim e a Yumi e provavelmente não vou ter que conversar com o pastor porque eu faltei na aula. Então o que será? Pela reação do meu pai está claro que eu fiz algo supostamente muito errado. Ele é estressado, mas não é normal que ele fique tão irritado assim. Meu Deus, será que descobriram? Não tem como… Aaah, não sei o que pensar. De qualquer forma, se não for sobre o meu namoro com a Yumi vai ficar tudo bem. Essa é a única coisa que ninguém pode interferir. Mesmo assim, estou nervosa.

A ida para a igreja pareceu muito mais rápida do que o normal. Rodrigo estacionou o carro e desceu junto com Sara. Quando entraram na igreja, Sara foi em direção ao local onde aconteciam os cultos. Antes que ela pudesse entrar, Rodrigo disse - Aí não, vamos para a sala de reuniões.

Sara sentiu mais um choque de nervosismo - se estamos indo para a sala de reuniões é por que essa é uma conversa que envolve a comissão da igreja. Ele está me levando para conversar sobre um assunto disciplinar. Por favor, não seja sobre a Yumi, tudo menos isso.

Hesitou mais uma vez, mas seguiu o seu pai até a sala de reuniões. Enquanto andavam, Sara começou a sentir dor no estômago. - Deve ser o nervosismo - pensou. Continuaram em direção a sala. A porta estava aberta. - Tá bom, calma. Por pior que seja, qualquer situação é melhor do que eles terem descoberto sobre mim e a Yumi. Não deve ser isso, então vou lidar com o problema, resolver e depois me sentir aliviada por não ser o que eu mais temo. Vai dar certo.

Rodrigo entrou na sala e Sara veio logo em seguida. Ela olhou ao redor e quase tropeçou, tinha perdido a força nas pernas por um instante. O pastor, dois outros anciãos, o senhor Yuji e a Yumi estavam ali, sentados em círculo. Ao contemplar a cena, mais uma vez Sara começou a dizer para si mesma - por favor, não seja isso, por favor.

Seus olhos se cruzaram com os de Yumi. Ela viu medo no olhar da namorada. Parecia que ela estava sofrendo. No momento desse olhar, Sara começou a se sentir tomada pelo desespero. - Não, de jeito nenhum, não pode ser isso. Por favor não seja isso. - Pensou, enquanto sentia o suco gástrico machucando o seu estômago por causa do nervosismo.

Depois de olhar para Yumi, olhou para o pastor. Ele estava com uma expressão severa, que mostrava que a conversa não seria amigável. Nisso, Rodrigo fechou a porta e disse - estamos aqui pastor, como o senhor pediu. - Havia dito isso tentando parecer polido, mas era evidente que ele estava se corroendo de raiva e que não era capaz de esconder.

— Certo. Por favor, sentem-se antes de começarmos.

Rodrigo e Sara se sentaram, então o pastor continuou - estamos aqui hoje para julgar um caso aqui da igreja. O caso se trata da suposta relação lésbica de Sara, filha do Rodrigo, com Yumi, filha do Yuji. Ao ouvir essa frase, Sara involuntariamente tencionou a musculatura do pescoço e sentiu uma fisgada. - Não acredito, é a pior situação possível. Como isso aconteceu?

— Primeiro, quero começar deixando uma coisa bem clara. De acordo com a Bíblia, a relação de pessoas do mesmo sexo é uma abominação. Deus fez o homem para se casar com a mulher, não há nenhuma outra configuração correta além dessa.

— Segundo, eu vou fazer perguntas sobre isso para você duas, Sara e Yumi. Respondam todas as perguntas sem mentir. Mentir é pecado, então como cristãs, vocês devem ser totalmente honestas comigo.

Houve silêncio absoluto assim que o pastor terminou de falar. Ninguém arriscou respondê-lo. Então, ele olhou para Yumi e disse - garota, me diga, você é o que da Sara?

Yumi aparentou precisar fazer um esforço para responder. Além do nervosismo da situação, ela estava tendo um dos seus ataques de timidez. Estava tremendo e com a respiração irregular. Fez que iria começar a falar. Não conseguiu. Se preparou mais uma vez. Então disse - eu sou a melhor amiga da Sara.

— Desde quando vocês são melhores amigas? - indagou o pastor.

— Desde quando nos conhecemos, faz 8 anos - respondeu Yumi, soando insegura.

— Certo. Alguma vez você e a Sara tiveram algum contato físico além do que é normal?

Yumi parou de respirar por um momento. Então, respondeu como se estivesse falando uma frase ensaiada para um seminário do colégio - nunca tivemos alguma forma de contato físico que não fosse aceitável.

— Você garante isso? - indagou o pastor, parecendo sério.

— Garanto pastor - respondeu Yumi, ainda tremendo de nervosismo.

Então o pastor olhou para Sara e perguntou - e você Sara?

Antes de responder, Sara viu que um dos anciãos tirou o celular do bolso e começou a digitar uma mensagem. Ela se desconcentrou por um momento, mas logo respondeu - eu também garanto pastor. Nós somos melhores amigas, nada mais do que isso.

Ao responder, Sara sentiu que todo o seu corpo estava tenso. Ela não conseguia relaxar a musculatura. Há pouco, tinha sentido dor no pescoço, agora, também estava sentindo dor nos ombros. Além disso, a dor no estômago ainda não tinha passado. - Não tenho gastrite nervosa me causando dores no estômago desde criança. Pelo menos se eu tivesse comido alguma coisa antes de sair…

Ao sentir todas essas dores, Sara não estava conseguindo manter uma boa postura. Ela estava toda torta na cadeira e tremendo. Por isso, sua resposta não convenceu o pastor, que em seguida indagou - nenhuma das duas parece estar sendo sincera. De novo, mentir é pecado, se vocês não estão agindo como amigas normais, falem agora.

Sara olhou para Yumi. Conhecendo ela melhor do que ninguém, percebeu - eu estou um caco agora, mas ela está se sentindo pior. Ela é tímida, esse momento está sendo horrível pra ela… Preciso tomar a frente aqui, preciso convencer o pastor de que somos apenas amigas. A Yumi não leva jeito para falar com as pessoas, sou eu quem preciso resolver esse problema, por nós duas.

O pastor está colocando a gente contra a parede. Ele vai continuar fazendo perguntas, cada vez mais incisivas. Ele vai colocar mais e mais pressão. Vai ficar cada vez mais difícil mentir de forma convincente. Estamos numa corda bamba. Quanto mais tempo ele interrogar a gente pior fica.

Preciso mudar o rumo da conversa agora, antes que seja tarde. Vou inverter a situação, só assim teremos alguma chance de sairmos disso sem sermos descobertas. - Então, Sara se ajeitou na cadeira, respirou fundo e apesar das dores, se aprumou na melhor postura que era capaz.

— Com licença pastor. Perdão por ser incisiva desta forma, mas me parece que é o que a situação requer. Sem explicação nenhuma, eu e minha amiga fomos trazidas aqui, fomos acusadas injustamente e então, quando negamos a acusação, somos acusadas de estarmos mentindo. O que está acontecendo exatamente? Perguntou Sara, tentando não parecer nervosa e falando pausadamente para ser compreendida.

— Pastor, tenho a mesma indagação da amiga da minha filha. O senhor me ligou cedo no sábado de manhã e sem explicação nenhuma disse que minha filha estava namorando uma garota… Pelo telefonema eu pensei que fosse um fato, mas o senhor está pressionando a minha filha para falar, como se o senhor mesmo não tivesse certeza. Imagino que o senhor deve ter dito a mesma coisa para Rodrigo, então preciso concordar com a pergunta dela. O que está acontecendo exatamente? - disse Yuji, da forma política que sempre falava com pessoas da igreja.

— Como assim?! - Exclamou Rodrigo - Do jeito que o senhor falou no telefone parecia que era um fato, essas duas fizeram algo de errado ou não?

Ótimo, - pensou Sara - isso vai desestabilizar o pastor. É melhor que o meu pai e o da Yumi fiquem em dúvida da afirmação dele, isso vai nos ajudar a sair dessa. - No momento seguinte, o pastor respondeu de forma menos confiante do que quando estava interrogando as garotas:

— Recebi uma acusação de uma pessoa confiável. Por isso considerei como quase certo - disse, tentando recobrar o ar severo de antes.

— Me desculpe por te contrariar pastor, mas o senhor me conhece, sabe quem eu sou e como eu lido com as coisas… - Disse Yuji, tentando parecer razoável - É fácil deduzir como eu criei minha filha. Ensinei todos os nossos valores pra ela. Ela é uma boa garota, não faz sentido o senhor ouvir uma acusação dessas e acreditar sem pensar duas vezes.

— Isso! - Exclamou Rodrigo, que agora parecia zangado com o pastor - Também ensinei tudo certo pra Sara.

Houve um breve momento de silêncio. - Muito bom, acho que a maré vai virar a nosso favor, agora meu pai ficou ofendido. Mas mesmo assim, quem é a pessoa que nos acusou? Quem é a pessoa em que o pastor confiaria cegamente a ponto de afirmar que a acusação era verdadeira, mesmo antes de nos interrogar?

— Se acalmem por favor, não disse que vocês não educaram suas filhas corretamente. Estou dizendo que é quase certo que elas não praticaram os seus ensinamentos. Isso diz respeito ao que elas fizeram, não a vocês - disse o pastor, tentando soar conciliador.

— Mesmo assim, pastor, isso é estranho - respondeu Yuji. - Afinal, quem é a pessoa que está acusando a minha filha? O que ela te disse exatamente durante a acusação?

— Infelizmente ainda não posso responder nenhuma das duas perguntas - respondeu o pastor, num tom neutro.

Estranho, se ele tem certeza de que a acusação é verdadeira, não estaria nos pressionando para contar. Até entendo manter em segredo quem é a pessoa que nos denunciou, mas não dizer a acusação? Aí tem coisa… Acho que ele não tem certeza da acusação. Certo, vou manter isso em mente e tentar colocar a acusação em descrédito - pensou Sara, que então disse:

— Pastor, um homem de Deus precisa ser justo em todas as situações, correto? Mas me parece que a sua acusação não tem fundamento e é incoerente. Primeiro, o senhor disse que era quase certo que eu tenho uma relação lésbica com minha amiga. Depois, você nos pressionou e perguntou se isso era verdade. Dissemos que não. Mas o senhor, sem motivo algum, se recusa a acreditar. Então, nossos pais intercederam por nós e explicam que fomos ensinadas nos valores da igreja - Sara parou de falar para recuperar o fôlego e engolir a saliva, depois, continuou.

— Não sei quem está fazendo essa acusação absurda e nem o porquê dessa pessoa acreditar que eu e Yumi somos lésbicas, mas nós quatro estamos aqui, diante do senhor, garantindo que isso não faz sentido. Por favor, seja justo. Essa acusação não tem peso quando é contraposta com a garantia de nós quatro. Além do mais, o senhor mesmo não parece estar certo da acusação. - Sara terminou de falar e manteve o contato visual com o pastor, numa tentativa de pressioná-lo.

Acho que consegui. Se eu usar a minha palavra e a da Yumi como argumento, nossa defesa fica fraca e ele vai continuar nos pressionando. Mas se eu der a impressão de que ele vai estar indo contra nossos pais, que são anciãos, ele será mais cuidadoso. Espero que agora ele desista - pensou Sara, tentando ser otimista.

— Seu argumento… É coerente. Admito, não tenho certeza da acusação, mas precisava pressioná-las - respondeu o pastor, que parecia estar fazendo esforço para aceitar a derrota que sofreu de uma adolescente.

— Pastor, a menos que o senhor revele quem é a pessoa que está acusando minha filha, acredito que essa conversa está encerrada - disse Yuji, aproveitando a brecha criada por Sara.

O pastor pensou por um momento. Parecia estar confuso, então olhou para um dos anciãos e disse - Cláudio, eu te avisei que iria acontecer algo parecido com isso. Fiz exatamente o que você me pediu, mesmo achando a sua abordagem estranha. Fiz as coisas do seu jeito porque confio em você e no seu julgamento. Mas agora todos nós precisamos de uma explicação.

Todos os olhares se dirigiram para o ancião, que havia enviado uma mensagem no celular momentos antes. Então ele disse - compreendo pastor, me desculpe por isso… É que me pareceu adequado saber se as garotas iriam confessar ou mentir. Isso é importante para determinar o rigor da disciplina das duas que as duas irão sofrer. Tudo bem se eu chamar a acusadora?

— Por favor, chame, você me colocou numa posição estranha. Quero saber quem é essa pessoa que te deu a informação e esclarecer tudo. Como pastor, eu preciso ser justo - disse Alexandre, tentando recobrar o seu prestígio com as pessoas ali presentes.

— Muito bem então, eu já avisei ela para vir até a porta… - Filha, por favor entre - disse Cládio, quase num berro.

Todos olharam a porta. Então, apareceu a acusadora.

— Feliz Sábado pastor - disse ela, com um sorrisinho debochado no rosto.

— Ah… Então é você. - Respondeu o pastor - feliz sábado Jéssica.

///

Obrigado mais uma vez por estar acompanhando a história. O capítulo da próxima sexta-feira irá continuar esse diálogo. Torçam pela Sara e a Yumi, a coisa ficou feia. Por favor, não esqueçam de favoritar o capítulo. Forte abraço e até a semana que vem.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Garota que Eu Conheci na Igreja" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.