Metanoia escrita por daylightsx


Capítulo 1
Capítulo 1




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/804862/chapter/1

Enquanto eu olhava as fotos e os troféus expostos na estante, milhares de coisas passavam por minha cabeça. Eu me sentia em Harry Potter, pois quase conseguia ver aquelas imagens em movimento, cada instante nítido em minha mente. Os momentos de vitória, orgulho e maior alegria da minha vida. Naquela época, eu estava realizada, feliz e junto de quem eu amava. Hoje, aquilo não passava de algumas fotografias na parede, troféus expostos junto a livros na estante e lembranças em minha mente. 

— Saudades? – perguntou Leah, minha amiga e minha atual pupila, parando junto a mim para observar a estante. Sorri. 

— Um pouco. Às vezes é meio nostálgico reviver isso tudo – falei, me virando para a sala do meu apartamento quase vazia. – Mas dessa vez vai ser diferente. 

Leah, que sabia de tudo o que tinha acontecido no passado, entendeu o que eu queria dizer. 

— Só se você quiser, meu amor – Seth, irmão gêmeo de Leah estendeu a mão para mim, me convidando para uma dança. – Nós nos inscrevemos no concurso como uma dupla… 

 Ele me girou pelo espaço, e vi Leah de braços cruzados, com cara de poucos amigos para o irmão. Comecei a rir.

— E deixamos Leah. Ela não se importaria, não é, Lee? 

— Muito engraçado, Seth – ela revirou os olhos. 

— Sinto lhe informar, Seth, mas eu não posso dançar com você. Já participei do concurso antes na categoria profissional – eu disse, batendo em seus ombros, que agora estavam mais fortes e mais largos. 

— Que pena – ele deu de ombros. – Mas uma dancinha, qualquer dia desses… 

— Seth! – Leah repreendeu. 

— Vou pensar no seu caso – eu disse, brincando. – Agora vocês dois, vamos treinar. Falta um mês para o concurso, e eu preciso de vocês mais do que bem. Preciso de vocês perfeitos!

 Quando se tratava de dança, eu era extremamente perfeccionista, e treinava incansavelmente para que o passo ou a coreografia saísse do modo como eu queria. 

— Se eu fosse você, não dava esperanças para esse aí não, viu – Leah disse, baixinho, enquanto Seth se posicionava no centro da sala, na marca no chão. 

— Ah, que isso, Lee – disse o irmão de Leah, abrindo os braços e rindo. – Mas de qualquer forma, eu sou muita areia para o caminhãozinho da Bella. 

— Ih, desde quando ele ficou assim? – eu perguntei, rindo. 

— Ah, para, eu sou lindo. Olha essa pele, esse cabelo – ele passou a mão pelo rosto. – Sou um pé de valsa, aliás. Eu sou perfeito. 

— Ah, alguma líder de torcida deve ter dado oi para ele hoje, por isso ele está assim nessa alegria – Leah disse, rindo. – Só ignora, amiga. 

Olhei para Seth e Leah rindo, pensando em como seria bom estar com eles na faculdade. Os dois tinham entrado recentemente, estavam apenas começando sua vida acadêmica, aproveitando os jogos e festas, enquanto eu… bem, estava afundada nas dívidas com as mensalidades atrasadas e o curso trancado. 

— Bem, só aproveitem – eu disse. Por mim. Quis completar, mas acabei não falando nada, e mudei de assunto quando vi a expressão de Seth e Leah mudar subitamente de alegria para preocupação. – Vamos começar? Quero que vocês repitam aquele giro que saiu meio fora do tempo da música. Depois vamos do começo, tudo bem?

Eles assentiram e se posicionaram no meio da minha sala, sinalizando que estavam prontos. 

A batida eletrizante de C’mon C’mon, do One Direction, preencheu a sala. Leah tinha sido um pouco resistente na escolha da música para a apresentação, mas quando eu e Seth dançamos para ela, a garota topou na hora. Depois disso, o irmão até a flagrou cantando canções da banda britânica no chuveiro. Eles começaram a girar pela sala, braços e pernas bem coreografados e síncronos, mas ainda em desencontro com o tempo da música. 

— De novo! – gritei por cima do som e voltei a música para o tempo certo.

Tudo foi repetido, até que eu gritasse um “repitam!” mais uma vez, e os movimentos coreografados fossem novamente feitos. Ficamos pelo menos uma hora naquele passo. 

— Gente, vamos do começo dessa vez? Acho que pode dar certo dessa vez – falei, com esperança. Eu precisava que tudo saísse com perfeição. Torcia muito por eles, pois, atualmente, eram os Clearwater que me mantinham, e necessitava que eles conseguissem uma boa colocação no concurso estadual, porque eles seriam premiados com uma bolada. 

— Tudo bem – Seth disse. – Eu só vou beber um copo de água. Vocês querem? 

— Sim, por favor – sua irmã disse, parada ao meu lado. 

— Bella? – Seth perguntou. 

— Não, obrigada – sorri, ele foi até a cozinha e meu celular tocou. O número do setor financeiro da faculdade brilhou na tela do aparelho. Bloqueei a tela, e Leah olhou para mim. 

— Meus pais já depositaram as aulas deste mês – ela botou a mão no meu ombro. – Amiga, você está precisando de alguma ajuda a mais? Nós podemos dar um jeito. 

— Não, Lee. Não precisa. Eu dou um jeito. Vocês já me ajudam muito acertando esse giro, ganhando essa etapa do concurso e indo para o nacional – sorri. 

— Vai dar tudo certo – ela falou, e eu a abracei. 

— Vai sim – eu disse, por mais que eu já não acreditasse muito naquilo. 

Seth voltou com a água, e depois eles voltaram a treinar. Não estava perfeito como eu precisava, mas eu acreditava que os irmãos estavam no caminho certo. Eles eram talentosos e esforçados, e teríamos ainda um mês para ajustar alguns problemas que tínhamos. 

— Bella, quer jantar lá em casa hoje? – Leah perguntou. 

— Vamos, Bella. Nós podemos ver alguns filmes depois – ele deu um sorriso de lado. Seth era bonito, mas não me atraía por ele – nem por mais ninguém, depois do meu último término –. Assim como Leah, ele era um irmão para mim. 

— Seth, nem vem com essa cara pro meu lado – levantei a mão, brincando. 

— Eu estou brincando, Bella. Mas o convite é super sério. Você fica sozinha demais aqui – ele olhou para a irmã, que balançou a cabeça em concordância. – Nós queremos passar mais tempo com você. Amigos são para isso. Você estuda demais, ainda treina a gente… Você precisa de um tempo com seus amigos. 

 Ele me abraçou de lado. Suspirei e olhei para Leah. Ela balançou a cabeça. Eu não gostava de me abrir muito, mas com ela era fácil. Leah era minha melhor amiga. Eu amava Seth, ele era como um irmão, mas eu sentia mais dificuldade de falar algumas coisas com ele, mesmo com abertura. Ele não sabia que eu não estudava mais. Decidi não contar naquele momento, e apenas concordei. 

— Tudo bem. Podemos jantar – sorri. – Estou com saudades das comidas maravilhosas da Sue. 

— Sabia, Bellinha! – Seth me apertou num abraço forte, empolgado. – A mamãe vai amar. Vou ligar para ela. 

 Ele me soltou e foi até a sala, pegar o celular na mochila. 

— Amiga. Você sabe que pode confiar nele – Leah disse. – Ele não vai te julgar. Sabe que as coisas não estão fáceis. 

— Eu sei. Mas às vezes é difícil para eu me abrir com alguém que não seja você – eu disse, cabisbaixa, e fui até ela pedir um abraço. Embora eu tivesse uma pose "durona", perto de Leah, eu era como um filhotinho abandonado, com medo de tudo e todos. Completamente vulnerável. 

— Ah que fofas. Vou abraçar vocês também – Seth chegou e nos abraçou. – Tá rolando alguma coisa que eu não estou sabendo? Assim, sei lá? 

— Não – eu ri, e minha barriga roncou. – Podemos ir logo? Já estou salivando pela comida da mãe de vocês. 

— Lógico! – Seth disse. – Eu já avisei, e ela disse que está nos esperando. 

— Vou juntar minhas coisas – Leah disse, enquanto pegava minha bolsa no meu quarto. Saímos da minha casa e entramos no carro da minha amiga. Cuidadosa como ela era, ele ainda mantinha o cheiro de novo. 

Ao chegar na casa dos Clearwater, fui bem recebida, como sempre. Sue e Harry eram velhos amigos dos meus pais.

— Bella! Quanto tempo. Estávamos com saudades. Você faz falta nos nossos jantares – Sue disse, enquanto me abraçava. 

— Essa aí gosta mais de você do que de mim, Bells – Seth disse, se sentando à mesa. 

— Para com isso, Seth – eu disse. 

— A Bella é como se fosse minha filha mais velha – Sue depositou um beijo no alto da minha cabeça. – Eu a vi nascer. 

— Não entregue tanto sua idade, querida – Harry chegou na sala, rindo. 

— Harry! Não me chame de velha. Só tenho uns anos a mais que Leah e Seth. Coisa pouca – eu disse, dando a volta na mesa e indo ao seu encontro. Dei nele um abraço. 

— Estava com saudades de você, menina. Você cresceu – ele deu um tapinha na minha cabeça, repetindo o gesto que sempre fazia quando me via, desde quando eu era pequena. – Mas a senhorita já está se aproximando dos trinta… 

— Harry ainda faltam cinco anos. Não me apavore – eu ri. 

— Estou brincando, querida. Os trinta são os novos vinte, então os vinte são a adolescência. Fique tranquila, você tem muito o que viver – ele disse, e me levou até a mesa, que já estava posta. O cheiro da comida de Sue era inebriante, e me lembrava da comida de minha mãe. A saudade apertou no meu peito. 

— Falando em viver, como anda a faculdade, Bella? Você está quase se formando, sim? – Harry perguntou, e senti meu corpo paralisar. Mal respirava. A mão de Leah passou pela minha por baixo da mesa, me fazendo voltar à normalidade. Ela era um lembrete de "ei, eu estou aqui, amiga!". 

— Está ótima – eu disse, apenas. Odiava mentir para meus amigos, quase familiares. Mas era necessário. Não queria que as pessoas soubessem a situação em que eu me encontrava. Eu havia perdido meu emprego subitamente, e fiquei algum tempo pagando minha faculdade com minhas economias. No fim, o dinheiro acabou, e eu não tinha coragem de pedir a meus pais para me ajudarem, principalmente porque eles nunca concordaram com minha decisão de largar tudo no passado. Agora, a chuva caía só sobre mim, e eu lutava como podia. Dava aulas de dança para me manter. Mas estava tudo um caos, pois meu aluguel estava atrasado e algumas contas também. O que eu ganhava só dava para comprar comida e custear algumas outras contas. A minha saída seria Seth e Leah ganharem o concurso. 

— Que bom. Fico feliz que você esteja seguindo seu caminho e que tudo tenha dado certo para você, Bella. Seus pais têm muito orgulho de você, querida – Harry falou, e senti um enorme nó na garganta se formar. Queria ir para o banheiro chorar, gritar que eu sou uma farsa, uma bela de uma mentira. 

— Obrigada – falei, baixo, tentando me controlar ao máximo para não começar a chorar ali mesmo. Seth olhou para mim e percebeu que algo estava errado. De súbito, ele começou a falar sobre outro assunto, e os pais se entreteram em uma conversa animada sobre os vizinhos. Murmurei mais um "obrigada" baixinho para ele, que me devolveu com um sorriso. 

No fim do jantar, Sue e Harry ficaram responsáveis por limpar a cozinha. Eu, Seth e Leah fomos para o jardim e nos sentamos na mesa, debaixo da árvore. 

— Bella… – Seth começou. – Está tudo bem? Você sabe que pode contar comigo e com a Lee. Nós somos seus amigos. Eu sei que às vezes eu faço algumas gracinhas, mas é porque eu quero te ver bem. Sei que sua rotina é puxada. 

— Obrigada. Eu sei que você faz por bem. Mas é que as coisas estão ruins. Muito ruins – eu disse. 

— Estamos com você – Leah pegou minha outra mão. Seth ainda esperava uma explicação. 

— Eu tranquei a faculdade. Não estava conseguindo pagar. Meu aluguel está atrasado, minhas contas também. Eu não tenho coragem de pedir dinheiro aos meus pais. Eu estou num buraco, sem luz no fim do túnel – contei. 

— Ah, Bella – Seth exclamou. – O que nós podemos fazer para te ajudar? 

— Nada – ri. – Vocês já me ajudam no que podem, e vão me ajudar mais ainda sendo perfeitos no concurso. 

— Nós vamos conseguir. Você também vai, amiga. Vai voltar para a faculdade, terminar seu curso – Leah disse, e sorriu para mim. Ela era a parte otimista da amizade. 

— Eu realmente acredito que vocês conseguem – Eu disse. 

Nós vamos conseguir, Bella – Seth disse. – Não seríamos nada sem você. Vai dar certo.  

 Ele se levantou e deu a volta na mesa. 

— Agora… Levanta. Nós vamos nos divertir. Como nos velhos tempos – ele disse e me puxou casa adentro. 

— Ai meu Deus. O que esse garoto vai aprontar? – Leah disse, se levantando e correndo atrás de nós. 

Descemos a escada que dava para o porão. Felizmente, na casa dos Clearwater o porão não era subutilizado. Ele mais parecia um quarto de tv ou uma sala de jogos. 

— Noite de jogos – Seth parou na porta e abriu os braços, como se nós nunca tivéssemos visto aquele lugar antes. 

Abri um sorriso. Era tudo o que eu precisava: uma noite de jogos com meus amigos. 

 

Acordei abraçada à Leah, sentindo as pesadas pernas de Seth em cima das minhas. Nós tínhamos dormido lá mesmo, no carpete do porão. Sorri com a lembrança que me veio à mente com aquela visão de nós três, juntos, dormindo no chão depois de uma noite inteira acordados. A única diferença é que dessa vez nossa noite tinha sido regada a algumas cervejas. E o resultado foi uma dor nas costas. Eu definitivamente não tinha mais idade para dormir em um chão duro. Me espreguicei e tentei sair sem acordar meus amigos. Eles precisavam descansar, pois teríamos treino de noite… Isso se eles não estiverem desmontados igual a mim. Ao sair do porão, olhei mais uma vez para eles. Eu os amava tanto, não sabia o que seria de mim sem eles, literalmente. Fechei a porta o mais silenciosamente o possível, e mandei uma mensagem no nosso grupo de mensagens me despedindo. Sue e Harry não estavam em casa, mas deixaram um bilhete e uma mesa de café da manhã posta. Peguei um muffin e uma maçã, e saí da casa. 

A casa dos Clearwater era meu refúgio, e era bom estar lá, mas, andando de volta ao meu apartamento, voltei para minha realidade. Suspirei fundo, e dei uma mordida na maçã. Pelo menos ela estava do jeito que eu gostava, fresca, crocante e vermelha. No meio do caminho, alguns pingos de chuva começaram a cair sobre mim. Não liguei. Aprendi a não reclamar de coisas simples, pois sempre as coisas podiam piorar. 

Ao entrar no meu prédio, passei na portaria e o porteiro me entregou mais um bolo de contas. Ri, pois era a única coisa que eu podia fazer naquela situação. Agradeci a ele e entrei no elevador. Ao chegar no meu apartamento, fui direto para o banho, pois a chuva tinha apertado no caminho, e eu estava literalmente pingando água. Mas não reclamei. Pelo menos eu ainda podia tomar um banho quente e me secar em toalhas limpas. 

Saí do banho e ouvi meu celular tocando alto. Pensei que pudesse ser Leah ou Seth, que acordaram e não viram minha mensagem, mas eu estava errada, pois um número desconhecido estava brilhando na tela do meu aparelho. Atendi no terceiro toque. 

— Alô? 

— Bella? – perguntou uma voz, que eu senti que conhecia, mas não me lembrava de onde. 

— Sim. Quem é? – questionei de volta, curiosa. 

— Bella, você não reconhece a voz do seu ex treinador? – o homem riu, e eu quase caí no chão, tentando sentar no sofá. 

— Aro? É você? – perguntei, ainda sem acreditar. – Não acredito! 

— Sim, querida. Em carne, osso, gingado e sotaque italiano – Aro riu. – Estava com saudades da minha estrela mais brilhante. 

— Saudades? Sei. Você não é disso – falei. – O que te faz ligar para mim em pleno sábado, depois de uns… cinco anos sem nos falarmos? 

— Eu adoro como você é prática, Bella. Realmente gosto disso  – Aro disse. – Te liguei porque tenho uma proposta para te fazer. Eu sei que as coisas não vão como você esperava, então, você tem interesse em ouvir?

Como ele sabia? Meu Deus. Mas eu não poderia esperar menos de Aro. Tudo que ele queria ele conseguia. 

— Fala. 

— Eu estou treinando uma dupla para o Royal Dance. Esse é o meu trabalho, você sabe disso, não mudou desde que você saiu. Enfim… Se você ainda acompanha esse mundo da dança, deve saber que o campeonato acontece daqui a um mês, mas eu tive um problema com minha dupla – ele suspirou, parecendo nervoso. – Acontece que a garota sofreu um acidente de carro e quebrou a perna. 

— E? O que eu tenho a ver com isso? – perguntei. 

— Preciso de você. Quero que você entre no lugar dela. 

Eu gargalhei alto. 

— Aro, isso só pode ser uma brincadeira – falei. 

— Eu não estou rindo – ele disse. – Eu realmente preciso de você Bella, caso não precisasse, não estaria perdendo meu precioso tempo em uma ligação com você, que me abandonou no meio de uma competição. 

Ótimo! Estava achando estranho ele não ter jogado aquilo na minha cara ainda. 

— Bella, pense bem – ele continuou. – Você sabe do prêmio para o vencedor dessa etapa do Royal. É uma bolada. Se vocês dois vencerem… Podem ir para o Nation. Isso não era seu sonho? 

Suspirei, e me lembrei das incessantes noites treinando, dos choros de emoção e de tristeza, das frustrações, mas também das alegrias. Lembrei-me também dele. Argh. Aquele pedido de Aro era… impossível. Eu não podia aceitar. Não dava. Aquela vida era a que eu sempre quis, mas não era para mim. 

 Como uma corda me puxando daquele buraco, a campainha tocou. Levantei-me do sofá rapidamente, e fui até a porta. Pelo olho mágico, vi o porteiro. 

— Aro, preciso desligar – comuniquei. – Mas prometo que vou pensar. 

— Sei – disse. – Como você disse que ia pensar há cinco anos atrás? 

— Tchau – desliguei e abri a porta. 

— Olá, senhorita Swan. O proprietário do apartamento deixou essa carta ontem, mas esqueci de colocar junto com as outras – disse, me entregando o envelope. 

— Ah, claro. Obrigada. – peguei a carta e fechei a porta. 

Mesmo sem abrir o envelope, parecia que meu coração já previa o que estava escrito ali. Sentei-me no sofá, procurando um pouco de conforto, mas não achei. O texto era enorme, mas minha mente foi direto para as palavras-chave. 

Ordem de despejo. 

Falta de pagamento.

Desocupar o imóvel.

Sete dias. 

Minha cabeça rodopiou, e eu não conseguia mais ver claramente nenhuma palavra. Eu já sabia que isso iria acontecer uma hora ou outra. Só não esperava que fosse agora. Respirei fundo, baixei minha cabeça e a coloquei entre os joelhos. Eu precisava fazer alguma coisa para resolver aquele problema. Olhei para meu celular ao meu lado. 

Não. Eu não podia voltar àquela vida, por mais que eu a amasse mais do que tudo no mundo. Andei de um lado para o outro dentro do apartamento. Pensei em ligar para os meus pais, mas aquilo estava fora de cogitação, pois li com mais atenção a carta de despejo e o valor dos aluguéis atrasados era altíssimo. Só uma coisa iria me dar o dinheiro que eu precisava para pagar aquela despesa, mais o último semestre atrasado da faculdade. Olhei para o telefone jogado no sofá. Disquei. Foi atendido no primeiro toque.

— Aro. Eu aceito.

— Ahhh! Eu sabia – Aro gritou agudo. – Não achei que fosse amarelar. 

— Aro… Eu só estou entrando nisso porque eu preciso muito, ok? É isso e acabou. Preciso pagar minhas contas – falei, e minha mente foi direto para Leah e Seth. Como eles iriam ficar, se eu teria que ter uma rotina treinando como eles? Minha mente agiu rápido – Aro. Preciso de um favor seu.  

— Depois de você ter aceitado minha proposta, querida? Até dois – ele disse. 

— Nós precisamos conversar, mas tem que ser pessoalmente. Aí eu posso te explicar. 

— Ótimo. Vai ser bom. Já acertamos tudo dos nossos treinos, horários e tudo mais. Te passo o endereço da minha escola de dança por mensagem, nós mudamos de locação – Aro avisou. 

— Tudo bem. Te encontro lá mais tarde. Até. 

— Arrivederci, Bella! – ele disse, animado, em italiano. Eu ri. Ele sempre falava italiano quando estava feliz. 

Desliguei o telefone, e me levantei do sofá. Joguei a ordem de despejo em cima da mesa. Não queria ver aquele pedaço de papel na minha frente. Só queria chorar. Queria colo, ouvir a voz dos meus pais. Pensei em ligar para eles novamente, apenas para conversar e contar sobre minha vida, mas desisti. Não queria que eles me culpassem por mais uma coisa que deu errado na minha vida. Não precisava de mais dedos apontando para mim. Olhei no aplicativo de mensagens, mas nem Leah nem Seth tinham visualizado minha mensagem da manhã ainda. Resolvi me enfiar debaixo do edredom e dormir, ouvindo o som da chuva batendo na minha janela. 

 

Eu e ele dançávamos uma música animada, com uma batida extremamente extasiante, colados um no outro. Eram raros os nossos momentos a sós, tranquilos para fazermos o que quisermos, e sempre escolhíamos dançar. Fazíamos o que amávamos. Dançávamos porque nós amávamos fazer aquilo, até nas nossas folgas. Ele me girou pela pista, no meio daquele monte de gente, que simplesmente agora parava para nos ver dançar. Era esquisito, mas ao mesmo tempo bom. Eu estava realmente feliz. 

— Você sabe que eu quero fazer isso pelo resto de nossas vidas, não é? – ele falou no meu ouvido, quando a música desacelerou. 

— Eu sei – eu disse, mas meus pensamentos começaram a me assombrar. 

Você precisa de algo seguro. 

E se der errado? 

Essa vida é incerta. 

Nem todos têm sucesso. 

Melhor ir para a universidade. 

Quando pensei nessa última frase, ele me soltou de repente, e tudo parou. A música, as pessoas. Era um silêncio ensurdecedor. Eu ouvia apenas meu coração batendo. Olhei para seus lindos olhos, e vi neles dor. 

— Você acabou com tudo, Bella. 

 

Acordei num rompante. Não sabia o porquê eu ainda me assustava com aquele sonho, que já se repetiu tantas vezes. Algumas notificações começaram a chegar no meu celular. Provavelmente eram de Leah, preocupada com meu sumiço. Olhei para a janela, e vi que a chuva cessara, mas o céu estava escuro, apesar de serem duas da tarde. Combinava bem com o meu humor. Peguei o telefone, respondi as mensagens enlouquecidas de Leah e Seth enquanto tentava pensar no que fazer. Precisava de um lugar para ficar. Suspirei. Tinha que resolver um problema de cada vez. Primeiro Aro. 

 

Cheguei à nova escola de dança do meu ex – agora atual – treinador e fiquei chocada com sua grandiosidade. As coisas iam muito bem para Aro. De uma escola que ocupava um andar de um prédio de salas comerciais, ele passou para um edifício inteiro, de esquina, bem no centro da cidade. 

Desde que os abandonei no meio do Royal – como Aro fazia questão de me lembrar – eu nunca mais havia entrado em uma escola de dança. Ao pisar ali, tudo voltara como um furacão. Passei por algumas salas, com alguns casais dançando, e parei em frente de uma, cujo casal em especial me chamou a atenção. Eles se pareciam tanto com nós. 

Não podia pensar muito no passado. Tinha que pensar nos meus problemas, e em como eu iria resolvê-los. Fui até a recepção, e a recepcionista, que parecia já saber quem eu era, me levou até a sala de Aro sem muitas explicações. Murmurei um “obrigada” para ela, que deu um sorriso amigável. Vi em seu crachá que seu nome era Angela. Hesitei antes de bater à porta. Angela, que ainda permanecia do meu lado, de repente perguntou: 

— Está tudo bem? 

— Sim – respondi. – Eu acho. Só estou nervosa. 

— Ah, calma. O Aro é legal. Não precisa ficar nervosa. Se ele te chamou, é porque você tem talento, e ele reconhece isso – disse, e sorriu. – Qualquer coisa eu estou lá embaixo, se precisar. 

Senti-me completamente abraçada por aquela estranha. Era incrível a sensação de não ser julgada por seus erros e não ter dedos apontados para você. Bem, eu não sabia se isso ia durar muito, mas resolvi aproveitar enquanto podia. Sorri para Angela. 

— Obrigada, Angela – eu falei. – Você é muito gentil. 

— Por nada, Isabella – respondeu. – Preciso descer. Boa sorte. 

Ela falou, e deu três batidas na porta do escritório de Aro. Ele, lá de dentro, gritou um “entra!”. Respirei fundo, e entrei na sala. Aro estava sentado, com os pés em cima da mesa meticulosamente arrumada, totalmente em contraste com a persona caótica dele. 

— Bella! – ele bateu palmas e levantou-se num pulo. – Você continua bella, não mudou nada. 

Sorri, sem graça. 

— Obrigada – disse. – Você está ótimo também. 

— Nada que um botox não resolva, não é mesmo? – ele gesticulou.

— Claro – ri. 

— Nunca te falei isso, hein – ele passou a mão pelo rosto. – Beleza natural.

— Natural – confirmei com a cabeça, e ri.

Eu simplesmente tinha apagado da memória os bons momentos com Aro, suas piadas… Só tinha sobrado dor. 

— Aro, podemos falar sobre o Royal? – perguntei, querendo ir direto ao assunto. 

— Claro, claro. Sente-se comigo – ele gesticulou, me mostrando uma cadeira em frente à sua mesa. – Antes de tudo, obrigado por ter aceitado. Não costumo agradecer, mas… Você sabe que eu gosto de você, não é, Bella? Eu nunca superei direito você ter nos deixado… Você tinha um futuro tão promissor… 

— Obrigada, Aro – eu o cortei. Não queria que ele continuasse falando, confabulando, pois assim eu iria pensar demais e me decepcionar. – Eu também gosto de você, mas, será que podemos não falar sobre o passado? Por favor. Isso já passou.  

— Tudo bem – ele ponderou. – Bem, preciso saber como está sua saúde, seu corpo, essas coisas. 

— Está tudo bem. É como se eu não tivesse parado – sorri, pois isso era uma das únicas coisas que eu me orgulhava. Eu tinha continuado a me exercitar, e um ano para cá tinha voltado a dançar, pois estava treinando meus amigos. 

— Maravilhoso! Bem, você sabe como são as coisas comigo, não é? Treinamos de segunda à sábado, todas as manhãs e às vezes à noite. Mas eu sempre posso mudar. Nós vamos pagar todas as taxas, figurino, etc então não se preocupe, só esteja lá, ok? 

— Claro – eu disse, e o passado veio me assombrar mais uma vez. 

— Acho que não tem mais nada. Você já sabe como é meu trabalho. Nada mudou – ele disse, e virou-se para mim, curioso. – Ah, você disse que queria um favor. O que era? 

Um problema de cada vez. Pensei bem. Eu não iria ter tempo de treinar Seth e Leah, e eu não podia abandoná-los. Confiava no trabalho de Aro. Era apenas uma questão dos meus amigos aceitarem, mas eu precisava falar com eles primeiro, pois eu não podia tomar essa decisão por eles, muito menos colocar minha vontade na frente da vontade deles. 

— Você se importa se eu fizer uma ligação? Coisa rápida – falei. 

— Não. Pode ir – ele sorriu, voltando a colocar os pés na mesa. 

Saí da sala com o número de Leah discando. Ela atendeu no primeiro toque. 

— Oi Bells. 

— Lee, cadê o Seth? – perguntei, meio exasperada. 

— Está no quarto dele. Não era mais fácil você ter ligado para o celular dele se quisesse falar? Às vezes eu não te entendo, sabe… é uma questão de logística… – ela ia falando, calma como sempre, e eu podia enxergá-la indo até o quarto do irmão. 

— Lee, quero falar com os dois, juntos. Coloca no viva-voz. 

— Ah. Ok. Pronto. Fala. 

— Oi, Seth. 

— Oi, Bellinha, fala comigo. 

— Seguinte, preciso falar rápido e eu preciso que vocês decidam rápido – falei, explicando também toda a situação, as minhas condições e as de Aro. 

— Meu Deus. Isso tudo aconteceu hoje? – Seth perguntou. – Sabe que sua vida dá uma novela, né? 

— Pensa rápido, menino! – Leah deu um tapa nele, que eu escutei do telefone. 

— Sei lá. Por mim tudo bem. Se a Bella confia nele, eu confio na Bella – Seth disse. 

— Tá. Por mim tudo bem também. Se vai ser bom para você, acho que vai ser para nós também. Só resta saber se o Aro vai aceitar – Lee disse. 

— É isso que eu vou ver com ele agora. Preciso desligar, depois ligo. Amo vocês – eu disse, me despedindo e entrando novamente na sala de Aro. 

— Resolveu sua vida? – Aro perguntou. 

— Nem a metade dela, se você quer saber. Mas vai me ajudar muito se você me fizer esse favor. 

— Que é? – ele floreou com as mãos. – Vamos, querida! Eu sou curioso! 

Comecei explicando toda minha situação financeira para ele, editando algumas partes – como a que eu estava sendo despejada – e como eu estava ajudando e treinando meus melhores amigos para o mesmo concurso que eu agora iria competir. 

— Acontece que, com os meus treinamentos, eu não vou conseguir treinar eles, e eu de maneira alguma posso abandoná-los nesse momento. Por isso eu pensei em você – falei, meio sem jeito. – Sei que não tenho o direito de te pedir isso, não depois de tudo, mas você é a pessoa mais qualificada que eu conheço para treiná-los. E sim, eles têm talento. Isso eu garanto. 

— Bella, Bella… – Aro balançou a cabeça. – A sua sorte é que eu tenho um coração mole e eu sou apaixonado por você, né? Tudo bem, eu treino seus amigos. Mas já passa o relatório, que eu não vou ter pena, viu. 

Eu gargalhei. 

— Aro, eu te amo. 

— Eu sei. 

— Bem, acho que é isso, né? Começamos segunda pela manhã, você tem mais alguma coisa para me falar? – perguntei, a fim de ir embora para resolver meu outro problema: o da moradia. Foi nesse momento que eu me atinei para uma coisa muito importante. – Aro, com quem eu vou dançar? Você não me disse. 

Ele engoliu em seco e forçou um sorriso amarelo. 

— Claro. Um momento – ele disse e digitou algo no celular. – Ele está subindo. 

Um calafrio percorreu minha espinha. Nem sei quanto tempo passou, mas quando Aro abriu a boca, a porta do escritório abriu. 

— Bella, não serão necessárias apresentações, vocês já se conhecem – meu técnico disse. 

Me virei para encarar o homem de cabelos acobreados parado na porta, aquele que habitava minhas melhores lembranças, mas também as piores. Aquele que habitava meus sonhos constantes, inclusive o daquele dia. 

— Edward. 

 

Foi a única coisa que eu consegui dizer. Ele continuava parado na porta. Edward não havia mudado muito. Ele estava mais forte, seu maxilar mais marcado, a barba por fazer. Seus ombros estavam mais fortes e mais largos, e seus braços mais definidos. Ele estava infinitamente mais gostoso. E com muito desprezo no olhar. Ele entrou na sala, e mal olhou para mim, sentando-se ao meu lado. 

— Nós já acertamos tudo, Edward – Aro disse. – Chamei você aqui porque acredito que vocês tem algumas coisas para conversar. 

— Eu não tenho nada para falar com ela – Edward disse, com um timbre grosso, que me assustou. Há anos eu não ouvia sua voz. 

— Edward… Sejamos racionais. Ela vai nos ajudar, certo? – o italiano ponderou. 

Edward riu, debochado. 

— Uhum. 

— Eu vou deixar vocês à sós. Acho que uma conversa, adulta, será benéfica para os dois. Nós não precisamos nos odiar por um deslize do passado, não é? – Aro disse, se levantando da cadeira e indo até a porta. Ele saiu, a fechou e a abriu de novo. – Não quebrem minha sala. 

Olhei para Edward. Ele mantinha seu olhar no céu, lá fora. Meu estômago se revirava, eu não sabia como reagir. Pensei muito sobre esse momento, em como seria se eu o reencontrasse, o que eu faria. E acabei de chegar à conclusão que eu não sabia o que fazer além de querer chorar e correr para o colo dos meus amigos. 

— Você me odeia – eu disse, baixinho, passando as mãos pelo cabelo. – Olha, isso não é fácil para mim também, tá? Não ache que eu queria voltar como se nada tivesse acontecido. Não era isso que eu queria. 

Na verdade, o que eu queria era não ter errado. 

— Mas eu estou aqui, por algum motivo o Aro achou plausível me chamar – continuei. – Ei, você não vai falar nada? 

— Eu já disse que não tenho nada para falar com você Isabella – Edward disse. – Eu preferia nem… hmpf. 

Ele se levantou, balançando a cabeça, indo até a porta. 

— Não preferia o que, Edward? Fala! – eu disse, correndo atrás dele. Fiquei muito próxima dele, mais do que eu planejada, e senti um cheiro… estranho vindo dele, parecido com maconha.  – Eu sei que você tem coisa engasgada aí. 

— Eu preferia nem olhar para a sua cara, Isabella. Não queria nem falar seu nome. Não depois de tudo o que você fez com o Aro. E comigo. Sem nenhuma explicação. Você terminou tudo, largou o campeonato no meio, desfez nossa dupla… terminou nosso namoro… para simplesmente mudar de vida porque você achava que o que nós fazíamos “não tinha futuro” – ele falou alto, gesticulando com a mão. – Mas olha, eu tive um futuro. E você? Terminou sua faculdade? Trabalha na sua área? Melhor, você é feliz, Isabella? 

Aquilo me pegou num local muito fundo. Sabia que aquela conversa iria ser forte, mas não esperava que ia me machucar tanto. Mesmo depois de anos, ele ainda sabia onde tocar nos meus pontos fracos. Cada palavra de Edward foi cirúrgica. 

— Não – eu disse, baixo. 

— Foi o que eu pensei – ele disse, rindo. 

— Mas eu não terminei porque eu não acreditava em nós. Eu terminei porque eu precisava de alguma coisa segura. Você não entenderia. 

— Não, eu não entendo, de verdade. E nem quero entender, para ser sincero – ele disse, despreocupado, tirando um cigarro de maconha do bolso. – Eu só entrei nisso porque eu tenho consideração pelo Aro, e costumo cumprir com minha palavra, diferente de você. 

— Você está fumando? – eu perguntei, perplexa, sem me importar com a ofensa, pois eu sabia que ele estava certo. Edward era a pessoa mais certinha que eu conhecia. 

— É, estou – ele deu de ombros, girando o cigarro pelos dedos. Ele abriu a porta para sair. – Apenas esteja aqui para treinar segunda, ok? É a única coisa que eu ainda espero de você. Seu profissionalismo.

E saiu. 

 

Fui direto para a casa dos Clearwater. Não queria ficar sozinha. No pouco tempo comigo mesma e meus pensamentos no metrô, comecei a chorar descontroladamente. Quando Seth abriu a porta, ele se assustou. 

— Que cara inchada é essa, Bell? O que aconteceu? 

Eu não consegui falar nada. Apenas me joguei nos braços dele e comecei a chorar como um bebê de novo. 

 

Mais calma, consegui contar tudo o que aconteceu para eles. 

— Que loucura – disse Leah. – Eu nem sei o que dizer. 

— Eu sempre falei que a vida da Bella daria uma série, um filme… uma novela mexicana – falou Seth, fazendo graça. Comecei a rir. 

— Talvez você deva escrever o roteiro e vender. Vai ficar rico – falei e dei uma cotovelada de leve nele, que passou a mão pelas minhas costas e me abraçou. 

— Amiga… – começou Leah. – O que te fez aceitar a proposta do Aro? Você sempre disse para nós que nunca iria voltar a dançar profissionalmente. 

Ah. O outro problema. 

— É complicado, Lee. 

— Somos completamente capazes de entender, mas se você não quiser falar, tudo bem. Nós entendemos – ela disse. 

— É que eu vou ser despejada – revelei, com vergonha. – Dentro de sete dias. 

— Ai, não – murmurou Seth, passando a mão pelos cabelos. 

— Bella, e você não ia falar isso para a gente? – perguntou Lee, meio revoltada. 

— Lee, entenda. Isso é um problema meu. Eu preciso resolver. Eu me enfiei nesse buraco, e preciso sair dele. 

— Isabella! – ela gritou. – Isso não faz o menor sentido. Pelo amor de Deus, nós só queremos te ajudar, mas como podemos se você esconde essas coisas de nós? 

— Eu não escondi nada, Lee – eu disse, quase chorando novamente. Detestava me mostrar fraca, mas era meu estado emocional naquele momento. – Mas era o que eu podia fazer no momento. Eu precisava resolver uma coisa de cada vez. 

— E a questão da sua casa? Você iria resolver quando estivesse debaixo da ponte? – perguntou, brava, cruzando os braços. 

— Lee – chamou Seth. – Pega leve. 

— Eu só quero ajudá-la, Seth – voltou-se para o irmão. 

— Eu sei, mas desse jeito não ajuda. 

— Ok, desculpa, Bella – falou Leah. – Poxa, eu só quero o seu bem. Você sabe que eu me preocupo com você, como eu me preocupo com o Seth. Você é tão minha irmã quanto ele. 

— Tudo bem – eu disse. – Eu só não sabia o que fazer. Estou tão sobrecarregada… Não queria que vocês ficassem responsáveis por mais um problema meu. 

— De forma alguma – falou Leah. – Nós estamos aqui para isso, somos seus amigos, sua família. 

— Obrigada – eu disse, e senti uma lágrima escorrer pelo meu rosto. Eu era extremamente grata por tê-los em minha vida. 

— Agora, sobre você ser despejada… – Seth começou a falar. 

— Não tem nem discussão. Você vem para cá – anunciou Leah. – O papai e a mamãe te amam. Eles não vão se importar. 

— Tem certeza? – perguntei. 

— Claro! Você ainda pergunta? – rebateu minha amiga. – Vamos arrumar um lugar para você dormir, e se você quiser, pode se mudar hoje mesmo. 

— Meu quarto está disponível – falou Seth.

— Seth? Que isso? – Leah riu, sem saber como reagir. 

— É sério – riu. – Se você quiser, Bella, eu empresto meu quarto, durmo no porão, na sala, tanto faz. 

— Ah, que fofo – Leah se derreteu. – Jurava que ele ia fazer uma gracinha. 

— Obrigada, Seth – eu disse. – Mas calma, vamos ver isso depois.  

— E seus pais, Bella? Você pretende falar com eles? – disse Seth. 

— Não sei, não pensei sobre isso, Seth – revelei. – Estou tentando resolver um problema de cada vez. Esse é meu novo mantra. 

— Muito bom – riu. – Bem, eu preciso terminar um trabalho da faculdade. Se quiserem fazer alguma coisa mais tarde, só me chamar. 

Seth saiu, e deixou-me com Leah. Ficamos conversando, sentadas no jardim. 

— Obrigada, Lee. Eu não sei o que seria de mim sem você. 

— Que isso. Amigos são para essas coisas – sorriu. – E essa coisa do Aro nos treinar, hein? Estou animada. 

— Vai ser ótimo para vocês dois. Ele é perfeito, Lee. Você vai amar – eu disse, empolgada, e comecei a relembrar e contar como eram meus treinos com Aro. 

— E você? Animada? 

— Em partes. Gosto do Aro, mas eu não sei se estou pronta para estar de volta – falei. – Sem contar essa coisa toda com o Edward. Ele me odeia, com razão. 

— Acho que ele só precisa de um tempo. 

— Lee, ele teve cinco anos – argumentei. 

— Mas ele estava longe de você. Agora, perto, pode ser que as coisas mudem. Ele vai enxergar que você teve motivos. Ninguém toma uma decisão assim do nada. 

— Tenho medo que ele me odeie para sempre – revelei. 

— Você ainda gosta dele? 

Balancei a cabeça. Eu nunca o esqueci, mesmo depois de todo aquele tempo. Nem toda a distância foi capaz de apagá-lo da minha mente. Se eu sentia que ele se afastava um pouco de mim, meu subconsciente o trazia novamente para perto. 

— Sim, mas eu sei que nós não temos futuro. Já aceitei isso há anos. 

— Isso é complicado. Não dá para prever o futuro – ela riu. – A menos que você tenha uma bola de cristal escondida aí. 

Ela começou a me fazer cócegas, para me fazer rir. 

— Eu gostaria. Na verdade, queria ter o poder de voltar no tempo – suspirei.

— Infelizmente, também não dá. O que dá para fazer é se preparar para o que vem por aí – disse. 

— Será possível reparar os erros do passado? – perguntei, ainda pensando na discussão mais cedo. 

— Quase sempre é – disse, e depositou um beijo na minha testa. 

 

Na segunda de manhã, acordei antes mesmo do meu despertador tocar. Minha cabeça estava cheia, eu estava preocupada. A carta de despejo jazia sobre a mesa de jantar. Eu tinha mais cinco dias. Eu, Leah e Seth já havíamos falado com Sue e Harry, que aceitaram me receber, mas mesmo assim eu não estava completamente confortável. 

O toque alto do celular me tirou dos meus pensamentos. Levantei-me da cama e fui tomar banho. Procurei me concentrar no treino. Comi algumas torradas e tomei um iogurte, saí rápido com medo de perder o metrô. Corri até a estação mais próxima, e consegui pegar o trem. 

Recebi uma mensagem de Leah e outra de Seth, desejando boa sorte. Aquele gesto aqueceu meu coração preocupado. Desci na estação próxima da escola de dança com as mãos suando. Eu me sentia uma iniciante, despreparada, sem experiência. Ao chegar, Angela me recebeu com um sorriso no rosto. 

— Bom dia, Bella! – disse, animada. – Como você está? Preparada? 

— Olá, Angela – falei. – Estou… nervosa. Parece que eu nunca fiz isso já vida. 

— Ah, vai dar tudo certo! – encorajou a garota. – Fiquei sabendo que você vai dançar com o Edward. Ele é um amor. Não precisa se preocupar, você está em boas mãos. 

Claro Angela. Ele é um amor sim. Quando ele não te odeia porque você o abandonou no meio de um campeonato. 

— Ah. Claro – sorri, forçada. Acho que ela não percebeu. – Preciso ir. Obrigada, nos vemos depois? 

— Sim – ela disse. – Estarei aqui para o que precisar. 

Me senti um pouco menos nervosa com toda sua simpatia. Ela era uma garota legal. 

— Obrigada. 

Eu disse e entrei na sala que Aro tinha destinado à nós. 

            Posicionei-me no centro da sala totalmente espelhada: ali, eu via mais do que minha imagem. Via todos os meus medos, inseguranças, erros. Via também minhas vitórias, as coisas boas, a felicidade. Toda minha vida dançando passou pela minha cabeça, e eu não percebi o quanto eu tinha saudades daquilo que eu joguei fora por um achismo. 

            Na sala ao lado, alguém havia colocado uma música para tocar. Eu não conhecia a canção, mas ela começou tranquila. Normalmente, eu não dançava sozinha. Sempre dancei com um par, mas, naquele momento, eu precisava direcionar minha energia para alguma coisa. Meu corpo começou a se mexer, acompanhando a melodia tranquila. Ali, eu não tinha nenhum receio ou insegurança para dançar. Era eu e minhas múltiplas imagens se mexendo sincronicamente. Entre giros e pulos, a música começou a se agitar, como se fosse conduzida para um tipo de rock. Meu corpo apenas a acompanhou. Eu não tinha nenhum controle sobre o que eu estava fazendo, apenas estava. Há tempos não deixava meu corpo me guiar daquele jeito. Era libertador. Meus problemas ali não conseguiam me perturbar. Depois de anos, consegui me sentir bem. Era como se a felicidade voltasse para o meu corpo.

         Com os olhos fechados, eu praticamente levitava. Apenas a melodia me guiava. De repente, durante um giro, abri um pouco meus olhos, e pelo espelho, vi uma figura ruiva me observando pela porta. Me assustei, dando um grito e parando de dançar na hora. 

— Você me assustou – eu disse. 

Edward entrou na sala, mal olhando para mim. Eu não sabia quanto tempo ele havia ficado lá, me observando. 

— Você estava ali há muito tempo? – perguntei, curiosa. 

— Não – disse, seco. 

— Bom dia, queridos! – falou Aro, entrando na sala animado. – Vejo que vocês já se entenderam, sim? 

Olhei para Edward, que me olhou de soslaio, carrancudo. Seria daquela forma, pelo visto. 

— Vou entender isso como um sim – riu Aro. – Bella, preciso que você aprenda nossa coreografia o mais rápido o possível. Tenho alguns vídeos do Edward dançando com a Tanya, e vou mostrar a vocês. Sei que você é boa para pegar passos, vai tirar de letra. 

Apenas balancei a cabeça, concordando. Olhei para Edward, que não olhava para mim. O chão de tacos parecia mais interessante. 

Aro me passou o tablet. Dei play no vídeo, e comecei a assisti-lo. Tanya era muito boa. Ela e Edward formavam uma ótima dupla. Era uma pena que ela não pudesse competir. 

Depois de ver os vídeos algumas vezes, me senti pronta para arriscar alguns passos. Agora, Edward seria obrigado a olhar para mim. A me tocar. Ele se aproximou de mim, colocando suas mãos em minha cintura. A princípio, ignorei o cheiro de maconha vindo dele. Por dentro, todas as minhas células estavam em polvorosa, excitadas pelo seu toque. Respirei fundo, sentindo um arrepio correr pela minha espinha. Nunca imaginei que fosse o sentir tão perto de mim novamente. Nos olhei no espelho, prontos para iniciar uma dança. Seria aquele um prelúdio para um futuro diferente do nosso passado? 

Aro soltou a música, e Edward começou a me conduzir pela sala, treinando apenas dois passos. Mas a sensação era a mesma. Tudo era igual. Tudo me fazia lembrar de quando éramos felizes e estávamos bem. Por que eu estraguei tudo? 

Sem querer, me desequilibrei e tropecei nos meus próprios pés durante um giro. Eu estava pensando demais, mas tudo era um gatilho para mim. Aquela situação mal resolvida, um turbilhão de emoções no meu coração. Era difícil demais. 

— Desculpe – sussurrei, mas Edward surtou.

— Que droga. Não consegue nem se manter em pé? – gritou. 

— Edward – Aro bradou. 

— O que foi? – respondeu, nervoso. – Ela não dança há anos, pelo visto. Olha o que ela acabou de fazer. Nós temos um mês, Aro! UM MÊS! 

— Eu sei o que eu estou fazendo, Edward – rugiu Aro. 

— Mas ela não parece saber – se virou para mim. 

— Olha aqui – comecei, já sem paciência para aquele circo. – Eu sei muito bem o que eu estou fazendo. Se você, senhor perfeito, não tolera erros, é você que não sabe o que está fazendo. Nós só estamos começando. 

— Coisa que nem deveria ter… – ele interrompeu. 

— Eu não terminei! – gritei. Ari olhou para mim assustado, e Edward se calou. – Eu estou aqui pelo Aro. Aceitei isso bem antes de saber que você estava nessa. Mas você também precisa de mim, ou acha que não? Você não pode simplesmente desistir ou dançar com a Tanya de muletas. Então, pare de bancar o menino birrento, porque eu te conheço, Edward, e você não é assim. Nós temos nossos problemas, mas não os envolva no trabalho do Aro. Ele não tem nada a ver com isso.  

Soltei tudo de uma vez, em cima dele, que ficou quieto. Ele não disse uma palavra sequer, ou sílaba. Apenas sacudiu a cabeça, e se posicionou no centro da sala. 

— Vamos, então, do começo. 

 

  E foi assim durante alguns dias. Ele mal falava comigo. Sequer olhava para mim. A única coisa que eu sentia vindo dele era o odor insuportável de maconha. Inferno. 

Uma noite antes de eu ser oficialmente despejada, eu embalava minhas coisas para levar para a casa dos Clearwater com a ajuda de Leah e Seth. Entre indas e vindas do quarto, sala e cozinha, conversávamos sobre as experiências da primeira semana de treinos. 

— Eu gostei do Volturi – disse Seth, passando fita na caixa que continha alguns pratos. – Ele é bem divertido, e sem contar que é competente. Sabe o que está fazendo. 

Olhei para ele, tentando parecer brava, mas segurando o riso internamente. 

— Não foi isso o que eu quis dizer, Bellinha – ele correu para mim. – Você sabe que eu te amo, e é claro que você sabia o que estava fazendo, e é muito competente também. 

— Tudo bem, Seth – falei. – Estou acostumada a ser esnobada. 

Eu ri, mas no fundo, minha mente foi diretamente para Edward. 

— Bella! – Leah chamou atenção. – Para de palhaçada. 

— Estou brincando – falei, tentando tirar Edward da minha cabeça. – Gosto de Aro também. Não lembrava o quanto me sentia bem perto dele. Às vezes ele cobra muito, mas é tudo uma questão de costume. 

— Nós já estamos acostumados com cobranças, Isabella – Leah riu. 

— Esqueceu que nos últimos ensaios você nos fez refazer aquele maldito giro umas vinte vezes? – perguntou Seth. – Quando eu cheguei em casa, não aguentava mais levantar meus braços. 

— Ah, qual é, Seth – debochei. – Você pega mais de sessenta quilos na academia só para ficar com os bracinhos fortes para as líderes de torcida da faculdade, ou acha que eu não sei? Agora reclama de carregar sua irmã e girá-la no ar? 

Leah riu alto, batendo palmas. Seth ficou olhando para mim, com cara de tacho. 

— Ok, Bella – disse. – Você venceu, me deixou sem palavras. A única coisa boa nisso tudo é que você acha meus braços fortes. Fora isso, mais nada me deixou feliz. Nada. Vou voltar para a cozinha. 

Ele saiu, deixando eu e sua irmã rindo da cara dele. 

— Esse garoto é ridículo – ela disse, rindo. – Amiga, o que acha da gente pedir uma pizza? 

— Apoio – falei. – Eu vou pegar mais algumas coisas lá dentro, já que terminei essas caixas aqui. Você se importa de ligar? 

— Não, eu ligo – avisou Leah e pegou o celular. 

Fui para meu quarto. Lá fora, a noite estava bonita, o céu estrelado. Abri meu armário praticamente vazio. Já tinha tirado todas as minhas roupas, separado aquelas que eu não usaria mais para a doação e colocado as outras nas minhas malas. As únicas coisas que restavam no armário eram algumas caixas que ficavam bem no alto e no fundo, que estavam ali por um motivo: eu não queria vê-las. Mas agora seria impossível. Eu teria que remexer naquela ferida. 

Peguei a pequena escada que Leah tinha trago de casa para me auxiliar na mudança e a coloquei de frente para o armário. Subi e equilibrei as duas caixas que estavam alocadas ali em uma das minhas mãos e me segurei para não cair com a outra. Desci da escada, coloquei-as em cima da minha cama desfeita e me sentei para abrí-las. 

A primeira, a menor, estava menos empoeirada. Havia sido remexida há menos tempo. Tirei a tampa. Já sabia o que tinha lá dentro, então, não foi uma surpresa. Meu estetoscópio, junto do meu esfigmomanômetro, aparelho usado para aferir a pressão arterial. Embaixo, meu jaleco, escrito em um dos bolsos: Isabella Swan, Enfermagem. Nesse momento, eu já estava odiando a mim mesma por estar olhando aquilo, que só me fazia sofrer mais ainda. Suspirei, sentindo uma leve ardência na garganta. Eu estava satisfeita quando estava na faculdade, mas não genuinamente feliz. Nunca senti aquilo que as pessoas sempre falam de "nossa, era aqui que eu deveria estar". Eu só sentia isso quando eu dançava, mas reprimia esse sentimento. Dobrei novamente o jaleco, recoloquei os materiais dentro da caixa e passei para a outra, maior e mais pesada. 

Aquela outra estava bem mais empoeirada. Desde que eu havia largado a dança que eu não a abria. Já não lembrava mais o que tinha lá dentro, e não sabia se eu queria saber. Pensei um pouco. Se eu já havia conseguido voltar a dançar, coisa que eu jurava que nunca mais iria fazer, conseguiria relembrar algumas coisas do passado também. Aquilo poderia até me ajudar, quem sabe. 

Ao abrir a caixa, a primeira coisa que me deparei foi com um pequeno troféu. Aquele foi o primeiro que consegui em uma competição. Ele era pequeno, de vidro e tinha a forma de uma bailarina azul, mas  era muito significativo. Não deixava ele com os outros porque sentia que esse deveria ser protegido. Deixei ele de lado. Depois, peguei um collant, de uma das minhas primeiras apresentações de ballet clássico.  Achei também minhas primeiras sapatilhas de ponta. Sorri ao ver todas aquelas coisas, que no fundo, só me traziam lembranças boas. 

Encontrei meu diário da época do término da dupla com Edward. Não quis abri-lo, pois sabia que era sofrimento demais, e eu sabia exatamente cada palavra escrita ali, de cor e salteado. Porém, ao deixá-lo de lado para pegar mais uma coisa na caixa, uma foto caiu de dentro dele. 

Eu e Edward estávamos abraçados, sorridentes. Lembrava-me exatamente do dia em que aquela foto fora tirada. Nós havíamos saído para comemorar meu aniversário, alguns meses antes do Royal. Estávamos perdidamente apaixonados. dava para ver como olhávamos um para o outro, como agíamos, como dançávamos. Mas tudo ruiu, acabou num piscar de olhos, tudo por minha culpa. Eu havia largado um futuro brilhante, de sucesso por um medo. Eu queria muito ter continuado a dançar, mas tinha medo de não conseguir me sustentar. Eu via todos os meus colegas de turma da escola se inscrevendo nas faculdades e eu via uma oportunidade de sucesso e segura correndo pelos meus dedos. Quando resolvi me inscrever, uma universidade me aceitou e eu resolvi ir, tive que escolher entre o que era certo na minha cabeça e o que era o suposto duvidoso. Mal eu sabia que eu estava totalmente errada, e que no futuro eu seria totalmente infeliz. 

Uma lágrima correu pelo meu rosto, e nem me dei ao trabalho de secá-la. Abri o diário e quando fui colocar a foto dentro dele novamente, percebi uma dedicatória escrita atrás dela. 

Ali, estava escrito na letra perfeita de Edward com a tinta de uma Sharpie preta permanente: “Você é como minha marca pessoal de heroína. Somos nós contra todos. Eu amo você, para sempre. Edward.”

Não segurei o choro. As lágrimas caíam como uma cascata pelo meu rosto. Àquela altura, eu acreditava que somente uma crise de choro histérica iria me ajudar a ficar melhor, mas eu chorava silenciosamente, olhando a dedicatória escrita pelo homem que eu amava e que me desprezava profundamente. 

No fundo da caixa, haviam mais fotos nossas. Todas, na verdade. Guardei-as para que eu não ficasse relembrando meus momentos com ele. 

Continuei a olhar nossas fotos por algum tempo, cada uma me trazendo uma emoção diferente. Relembrei competições que ganhamos, festas que fomos, beijos que damos. Eu alternava entre o riso e o choro, mas no fim, era uma sensação boa e ruim ao mesmo tempo. 

Não sei por quanto tempo fiquei ali, imersa nas minhas lembranças, mas me assustei quando Seth veio avisar que a pizza estava chegando, e Leah havia ido buscar na portaria. 

— Ah. Eu já vou – falei, secando algumas lágrimas que ainda caíam pelo meu rosto. Olhei minha imagem no espelho, do outro lado do quarto. Meu rosto estava todo vermelho e completamente inchado. 

— Claro, tomate – Seth riu, parado na porta. – Quer conversar? 

Suspirei. 

— Estava só relembrando algumas coisas – expliquei, mostrando algumas fotos da caixa. Seth sentou ao meu lado. 

— Como vão as coisas com o Edward? – perguntou, e eu olhei para a foto novamente, a guardando dentro da caixa. 

— Complicadas – revelei. – Eu não o julgo. Eu errei. Sei disso. 

— Bella – interrompeu Seth. – Eu sinceramente acho que você não errou. Você não teve culpa de querer seguir os seus instintos e ir atrás do que você acreditava na época. São poucas pessoas que têm coragem de fazer o que você fez. 

— Sério? – perguntei. 

— Sim – respondeu. – Claro que eu acho que você poderia ter feito isso de uma maneira melhor, ter pensado antes. Se você errou, foi apenas aí. As coisas aconteceram muito abruptamente, você sabe mais do que eu, que estava apenas como um mero espectador. Mas eu ainda acredito que você não tenha que se martirizar por ter tentado seguir o que seu coração mandava. 

Sorri ao ouvir as palavras do meu amigo. Ele me abraçou de lado, e debrucei minha cabeça em seus ombros. Algumas lágrimas caíam pelo meu rosto, e senti uma leve dor nas têmporas, por causa da choradeira. 

— Ei, agora pare de chorar – Seth secou minhas lágrimas. – Você fica parecendo uma pimenta chorando. E outra coisa, a mamãe não vai gostar nada de saber que a nova filha dela vai chegar em casa com a cara inchada. 

— Nova filha? – perguntei, rindo. 

— Claro, ela não fala de outra coisa desde quando nós falamos com ela da mudança – confirmou Seth. – Ela te ama! 

— Eu também a amo – eu disse. – Sue é como uma mãe para mim. 

Ainda abraçada a Seth, eu o agradeci. 

— Pelo quê? – ele perguntou, olhando surpreso para mim. 

— Ora, por tudo – eu falei. – Você é como um irmão para mim, sempre está comigo quando eu preciso e sem contar que sempre topou minhas ideias mais malucas. 

— Amigos são para isso, Bellinha – ele disse, apertando o abraço. 

— Ei, ei, meus lindos – Leah chegou falando e parou na porta do quarto com a caixa de pizza na mão. – Ah que fofos. Mas a pizza chegou. E está esfriando. Vamos? 

Seth se desvencilhou de mim mais rápido que um tornado e pegou a caixa de pizza da mão da irmã e foi para a sala. 

— Está tudo bem, amiga? – Lee perguntou. 

— Tudo sim – falei, saindo de cima da cama e jogando as outras fotos espalhadas dentro da caixa. – Mas às vezes revisitar o passado é difícil. 

— Eu sei – ela disse. – Mas vai ficar tudo bem, você vai ver. Você vem comer? 

— Sim, só vou terminar de fechar a caixa e passar um pano nela – falei, e Leah acenou com a cabeça e saiu para a sala. 

Fechei a caixa, passei um pano para tirar a poeira dela e a coloquei junto da outra no chão. Eram as últimas coisas minhas no quarto de valor sentimental, além da minha bolsa, que estava em cima da cama. Quando ia sair para comer, em um ímpeto, ainda com o diário e a foto minha e de Edward na cabeça, decidi reabrir a caixa e pegar o caderno. O joguei dentro da minha bolsa e a fechei. Naquele momento, aquilo me transmitiu uma sensação de paz, como se aquilo devesse ficar perto de mim, por mais que eu não quisesse mexer em seu conteúdo. Finalmente, apaguei as luzes e fui comer com meus amigos.

Foram precisas apenas duas viagens para que todas as minhas coisas fossem totalmente transportadas para a casa dos Clearwater. Harry emprestou sua caminhonete, então ficou tudo mais fácil. Finalizamos a mudança no meio da madrugada. 

 

Naquela noite eu estava dormindo com Leah, pois ainda não tínhamos decidido onde eu iria ficar. Eu era bem resistente à ideia de Seth sair do seu quarto para cedê-lo à mim. Enquanto minha amiga já estava provavelmente sonhando, eu não conseguia pregar os olhos, pensando em Edward, na minha vida e nas coisas que deram errado. Coisas do tipo “E se eu não tivesse o abandonado? Como eu estaria agora? Será que eu estaria morando de favor?” ficavam passando pela minha mente, além de imagens dos nossos treinos. Quando nós estávamos juntos, dançando, tudo parecia como antes. Até nos separarmos, e ele voltar a me tratar com desprezo. O único momento que ele me olha nos olhos é quando estamos dançando. 

Fiquei martelando aquilo na cabeça, e vi o sol nascer pela janela de Leah. Meu corpo estava completamente cansado, mas minha mente não parava por um mero segundo sequer. Consegui cochilar por aproximadamente uma hora e meia, antes do despertador de Leah tocar. 

— Meu Deus que barulho infernal. Alguém joga isso lá do outro lado da rua – resmungou Leah do meu lado. 

Abri meus olhos, sem me mexer. O sol já estava um pouco mais alto no céu. Peguei meu celular, olhei o horário e vi que ainda tinha um tempo antes de me encontrar com o dono do meu antigo apartamento. 

— Bom dia, Lee – falei. 

— Bom dia – ela disse, jogando o travesseiro por cima do rosto. 

— Levanta – chamei, a balançando. – Você vai perder aula, e não quero levar mais essa culpa. 

— Tá – resmungou, tirando o travesseiro do rosto e jogando as cobertas pelo chão. – Pode tomar banho primeiro. Você tem que sair antes. Minha aula hoje é só às dez. 

— Ok – falei e entrei no banheiro do quarto dela. 

 

Depois do banho, não me senti mais revigorada, muito pelo contrário. Me senti destruída. O cansaço era gigantesco, e as olheiras no meu rosto estavam horrendas. O pior de tudo é que eu não fazia ideia de onde estavam minhas maquiagens, por causa da mudança. Só tinha separado minhas roupas de treino e algumas casuais em uma mala pequena, junto com alguns itens de higiene, mas as maquiagens foram parar em outra mala que provavelmente estavam embaixo de caixas ou na garagem. Olhei para as maquiagens de Leah, mas nenhum de seus produtos de pele serviriam para mim. Que legal, além de destruída financeiramente, fisicamente também. 

Desci para tomar um café rápido, e conversei algumas amenidades com Sue. Harry já havia saído para trabalhar, e a mulher iria logo em seguida. Seth também já fora, pois tinha prova no primeiro horário. 

— Sue, preciso ir – anunciei. – Deixe um beijo para Leah, diga que depois eu ligo para ela. 

— Tudo bem, querida – ela disse. – Boa sorte.

— Obrigada, Sue – respondi e saí. 

 

Fui até meu antigo apartamento. Encontrá-lo vazio foi um pouco deprimente, mas sabia que teria que superar aquilo. Deixei bem claro que estava tentando pagar a multa contratual, e o proprietário foi até gentil comigo, coisa que eu não esperava. Pelo menos uma coisa boa. Ao sair do meu antigo endereço, peguei o metrô e corri até a escola de dança. Eu já estava um pouco atrasada, e quando cheguei, senti o olhar julgador de Edward sobre mim. O clima entre nós ainda estava um pouco ruim, mas nós já dizíamos pelo menos um "oi, tudo bem?" um para o outro. 

— Já estava mandando a polícia atrás de você – Aro disse, brincando. 

— Desculpem, não vai se repetir – eu disse, jogando minha mochila no chão. 

Edward mal tinha olhado para mim, mas quando me aproximei dele, para ficar em posição para começar o primeiro passo que Aro havia sinalizado para começarmos, ele se assustou um pouco com meu rosto meio-roxo-meio-inchado-meio-sonolento. 

— Está tudo bem? – ele perguntou, baixo. Eu quase não entendi o que ele disse. Na verdade, não tinha processado que aquela pergunta havia sido feita para mim. 

— Ah, é… Sim – assenti, mas ele logo viu que eu não estava falando a verdade. Eu estava morta de cansaço e sono. A xícara de café na casa dos Clearwater não fora suficiente para me dar um pouco de energia. 

A música começou a tocar, e forcei meu corpo a começar a se mexer. Eu estava mais lenta, e Edward percebeu aquilo, e eu não sabia o motivo, mas ele diminuiu seu ritmo também, para me acompanhar. 

Mesmo cansada, consegui ir firme e forte até o final do treino, mantendo um ritmo mais leve. E por incrível que pareça, nós dois não erramos nenhum passo, e eu já tinha pegado a coreografia inteira em uma semana. Agora, estávamos só ajustando alguns detalhes finais. 

No fim do treino, eu já estava quase morta de cansaço, e a única coisa que conseguia pensar era em uma cama, macia e quentinha. 

— Hoje vocês estavam bem lentinhos, hein – Aro resmungou. – Não erramos nada, mas quero animação. Vocês não podem chegar do jeito que estavam hoje no Royal. Dio Mio! 

— Não vamos, Aro – prometi. 

— Acho bom – ele respondeu. – Por isso quero vocês aqui depois do almoço. Hoje meu treino com os gêmeos é pela noite, então acho que mais uma rodada de dança vai ser boa para esquentar o sangue de vocês. 

Quase caí desmaiada no chão quando ele disse aquelas palavras. Suspirei, colocando as mãos no joelho. Não queria demonstrar meu cansaço, mas eu não iria aguentar dançar a tarde inteira. 

— Aro… – eu ia dizendo, mas Edward me interrompeu. 

— Aro, me desculpe, mas hoje não vai ser possível – ele disse, olhando de soslaio para mim, que olhava para ele, cansada. – Eu vou precisar ir ao banco, resolver algumas coisas do meu apartamento, meu gerente está me ligando feito um maluco. 

— Ah, que lástima – Aro disse. – Bem, se é assim… Nos vemos amanhã, então. Espero que vocês se animem mais, queridinhos, arrivederci! 

Aro disse e saiu da sala, se despedindo de nós. 

Olhei para Edward, que olhou para mim de volta. Aquilo era raro quando não estávamos dançando. 

— Obrigada – balbuciei. 

Ele balançou a cabeça, e foi até a porta da sala. Prestes a sair, ele voltou. 

— Se cuida, Isabella – disse e saiu porta a fora, sem me dar tempo de analisar sua expressão ou de perguntar o porquê ele estaria me dizendo aquilo. Na verdade, acredito que estava bem claro. Ele estava preocupado com nosso desempenho no Royal, mas mesmo assim aquelas palavras ficaram grudadas na minha mente o resto do meu dia, como se importassem mais do que realmente importaram. 

 

Cheguei à casa dos Clearwater e fui direto para o quarto de Leah. Era difícil para mim ainda falar "minha casa, meu quarto", por mais que eu me sentisse realmente em casa. Não havia ninguém em casa, e até pensei em almoçar, mas estava tão destruída que mal conseguia pensar. Caí na cama ainda desarrumada e dormi. 

 

Eu sempre dancei. E sempre saia para dançar. Essa era minha vida, nos primeiros anos da minha adolescência. Eu havia começado a sair, mas sempre acompanhada de Leah e Seth, para minhas primeiras festas. Foi numa dessas  que eu o conheci. 

De longe, ele dançava com uma garota ruiva de cabelos cheios e cacheados, muito bonita. Eu não conseguia parar de olhar para ele de onde eu estava, e inclusive havia comentado com Leah, perguntando se ela o conhecia. Ela havia dito que não, mas Seth se intrometeu e disse que o garoto era primo do dono da festa, e que estudava em uma escola próxima da nossa. 

Em um determinado momento, seu olhar cruzou o meu. A garota ruiva se fora, e eu fui falar com ele, que havia me dito que seu nome era Edward. Nós tínhamos a mesma idade, e começamos a dançar. A conexão foi instantânea. 

— Você dança bem – ele disse, no meu ouvido, por cima da música. 

— Obrigada. Eu amo dançar, danço desde pequena. Mas eu estava vendo você dançar com aquela garota… você sabia o que estava fazendo – disse para Edward. 

— Eu sabia, mas ela não quis mais – ele riu. – Pelo menos achei você, Bella. Acho que fazemos um bom par, não? 

— Eu concordo – eu falei, ainda agarrada a ele, dançando lentamente no ritmo da música. 

Depois disso, nunca mais nos separamos. Esse foi nosso começo, numa festa, dançando, até o fim.

 

 Acordei agarrada ao travesseiro. Eu podia jurar que estava agarrada a Edward naquele momento. Era tudo tão real… Mas infelizmente não era. Meu estômago roncou, forte, e a primeira coisa que lembrei-me foi da última coisa que Edward havia me dito hoje: para eu me cuidar. Senti um leve aperto no coração, mas não pelo lado ruim, e sim pelo bom. Era como se no fundo, ele ainda se importasse comigo. 

Olhei pela janela, e o céu começava a escurecer. Peguei meu celular e chequei a hora, deduzindo que Harry e Sue estavam para chegar a qualquer momento. Eu ainda estava extremamente cansada, mas queria fazer algo para agradá-los, por isso decidi fazer o jantar. 

Tomei um banho rápido, e fui direto para a cozinha. Eu não era tão boa cozinheira quanto Sue, mas eu sabia me virar. Peguei o peixe que estava já descongelado na geladeira e o temperei, coloquei-o no forno e fiz uma salada. Cozinhei algumas batatas, e coloquei-as para dourar na air-fryer. Cerca de uma hora depois, o jantar da família Clearwater estava posto, e eu ainda exausta. Decidi avisá-los que eles podiam jantar sem mim, pois eu iria para a cama cedo. Comi um pouco do peixe e das batatas, me higienizei e caí na cama novamente, só me dando conta do quanto eu dormi quando o despertador de Leah tocou na manhã seguinte. 

 

Toda dia eu fazia o mesmo caminho. Saía de casa, pegava o metrô e ia para a escola de dança de Aro. Às vezes eu me atrasava, mas outras eu conseguia chegar bem mais cedo, e quando eu não dançava sozinha, ficava conversando com Angela. 

— Como você está, Bella? O campeonato está chegando – disse a garota, debruçada na recepção. 

— Bem, acho. Estou um pouco ansiosa – revelei. – Mas acho que vai correr tudo bem. 

— Vai sim, Bella – ela disse. – Aro fala super bem de você, e o Edward também. 

Olhei para ela surpresa. 

— O que você disse? – perguntei. 

— Que o Aro e o Edward falam bem de você para todo mundo – ela confirmou, rindo. 

— O Edward fala de mim? – perguntei, novamente. 

— Sim – disse. – Ele não é de falar muito, mas estávamos conversando sobre o campeonato há alguns dias, e ele disse que você é uma excelente bailarina, muito profissional. Isso não é falar bem? 

— É – soltei, ainda pensando sobre a informação. – Sempre achei que ele não gostasse muito de mim. 

Eu falei, meio sem pensar. Angela não sabia da história mesmo, então não ia dar em nada. 

— Bem, sobre isso eu não sei nada, mas ele é muito gentil com todo mundo – ela disse. – Às vezes ele só está estranhando essa troca repentina. Ele e a Tanya eram muito ligados. 

— Ligados? – perguntei, sabendo que deveria me manter quieta. 

— É, mas não desse jeito – ela riu. – Eles só eram bons amigos. 

— Entendi – falei, olhando para o céu lá fora, vendo a tempestade que se formava. – Acho que eu vou deixar minhas coisas lá dentro. Nos vemos mais tarde? 

— Claro! – exclamou Angela, que logo começou a se ocupar com um trabalho da recepção.

 Fui direto para a sala, joguei minhas coisas em um canto e fui para a janela olhar o movimento lá fora. Algumas gotas pesadas de chuva começaram a cair, e o céu estava escuro, como a noite, embora fosse nove da manhã. 

 Edward ainda habitava meu pensamento. Por que ele falava sobre mim? Era apenas quando perguntavam ou era por vontade própria? Ele realmente acreditava no que dizia ou só o fazia para mascarar o rancor que sentia por mim? Eu odiava não saber. 

A chuva começou a fazer um barulho alto, quando senti seu toque no meu ombro. 

— Isabella – chamou Edward. 

— Ah. Desculpe, não ouvi você chegando – expliquei, e ele apenas balançou a cabeça, como se não houvesse problema. Ele parecia tranquilo, mas seus olhos estavam um pouco vermelhos, e eu podia apostar que ele tinha fumado, pois o cheiro de maconha era inconfundível. 

— Aro ligou agora pouco. Ele teve um problema em casa e não pode vir hoje – explicou. – Mas ele disse que nós sabemos o que fazer. 

Ele riu, de leve. Ele riu. E falou uma frase com mais de dez palavras. Comigo. 

Por dentro, senti um frio do estômago, uma sensação estranha, de felicidade, êxtase. Era como se ele se aproximasse de mim, mesmo que pouco, rapidamente. Mas logo me desprendi a isso, e me foquei no que precisava: o treino. 

— Ok, então, vamos fazer o que precisamos – eu disse, com um sorriso de leve no rosto, numa expressão amigável. Queria que ele soubesse que eu estava ali como uma pessoa confiável, e não como a Isabella que o abandonou. 

Me posicionei no centro da sala, e ele veio por trás de mim. Nos olhando no espelho, éramos como os jovens adolescentes que dançavam nas festas e nas competições apenas por diversão, e não por trabalho ou por dinheiro. Os olhos verdes de Edward encontraram os meus pelo espelho, e incrivelmente, ele não os desviou, pelo menos por cinco segundos. Os cinco segundos antes da música começar. 

Ele me guiava pela sala, seguindo a canção. Dançar com Edward era como estar no céu, voando em meio às nuvens. Era leve. Sem Aro ali gritando no nosso ouvido, podíamos ficarmos mais livres. Não tínhamos o peso de tentar acertar sempre. Se errávamos, apenas recomeçávamos. 

Não conversamos muito. Trocamos algumas míseras palavras, apenas direcionadas à coreografia, mas quando terminamos o treino e tiramos a música que tocava alta, nos atemos à realidade. O mundo estava caindo lá fora, e Angela estava parada na porta da sala, esperando para falar conosco. 

— Edward, Bella – chamou. – Pelos meus horários, sei que o ensaio de vocês acabou, mas não tem como vocês saírem daqui. 

— Como assim, Angela? – perguntou Edward. 

Olhei para ele com um olhar tipo "hã, você tem merda na cabeça?!" 

— A defesa civil está divulgando na TV e nas redes sociais, pedindo às pessoas que fiquem em casa ou em lugares seguros, até a chuva passar – Angela sacou o celular do bolso, e mostrou uma postagem do Instagram. – Nós não podemos deixar vocês saírem daqui. 

Dei de ombros. Não tinha nenhum problema em passar mais um tempo ali, mas me preocupei com os Clearwater. 

— Por mim tudo bem – falei, pegando meu celular e digitando uma mensagem para Leah. 

— Bem, se eu não tenho escolha… – disse Edward, olhando para mim. – Obrigado, Angela. 

— Não há de quê – disse a garota. – Se vocês precisarem de algo, estamos na recepção, e se quiserem almoçar conosco, também estão convidados. 

 Ela disse e saiu, deixando eu e Edward sozinhos na sala espelhada. Ele, com cara de poucos amigos, e eu apenas querendo saber onde meus amigos estavam. 

— Isabella – chamou Edward, depois de um tempo em silêncio. 

— Hã? – respondi, ainda digitando mensagens para Leah, que me dava notícias da família. Aparentemente, todos estavam em casa e bem. 

— Você… quer treinar mais, ou ir comer? – perguntou Edward, num suspiro. 

— Se você não se importar, eu queria almoçar – falei, e fui direto para a porta da sala, sem esperar que ele me respondesse. – Treinamos mais tarde, ok? 

— Claro, vamos comer – disse Edward, que me acompanhou até a saída da sala. Em nenhum momento eu imaginava aquilo. Para quem não suportava minha presença, como deveria ser almoçar comigo? Ri sozinha com meus pensamentos, e torci para que ele não tivesse percebido. 

No refeitório, não encontramos ninguém, mas o pequeno buffet estava abastecido. Pegamos nossos pratos em silêncio e nos servimos. Começamos a comer, ainda em silêncio, mas ele olhava para mim como quisesse dizer algo. Resolvi puxar um assunto que não fosse tão polêmico para nós dois. 

— Edward, você acha que temos algo a melhorar na coreografia? – perguntei. Falar de trabalho sempre funcionava. 

— Não – respondeu, depois de pensar um pouco. – Acho que ela está boa do jeito que está. 

— Hm – resmunguei. – Tudo bem. 

— Se bem que aquela girada para a esquerda depois da passada de perna não fica muito boa – pensou alto depois de muito tempo, com a mão no queixo. – Acho que se fosse para a direita, você conseguiria mais fluidez. Você é destra, sempre se apoiou melhor na perna direita do que na esquerda. 

Quando ele disse aquelas palavras, meu coração palpitou forte. Era uma coisa simples, mas que continha um significado forte para mim. Infelizmente, eu ainda me agarrava àquelas coisas pequenas. Ele ainda se lembra em qual perna eu me apoio melhor. 

— Concordo – eu disse, tentando esconder o sorriso e manter as borboletas no meu estômago controladas. Afinal, aquilo não era nada, e ele ainda me odiava. – Acho que nós podemos treinar uma vez, e se der certo, falamos com Aro. 

— Claro, por mim tudo bem – disse, terminando de beber o suco de laranja. 

— Ah, outra coisa. Acho que nós deveríamos treinar melhor aquela parte em que você me segura no ar – sugeri. 

— Você está com medo de cair? – perguntou, rindo de leve. 

— Não, não, é que… – eu disse, meio desconcertada. – Treinar esses malabarismos é sempre bom né? 

— É sim – concordou, e levantou da mesa, com o prato na mão. – Mas você tem medo de cair. 

Levantei junto, e coloquei meu prato no balcão junto ao dele.

— Um pouco, talvez – revelei. 

— Sabia – ele disse, sério, olhando para mim de soslaio. – Não iria deixar você cair, Isabella. 

— Eu sei – revelei. – Mas os medos são irracionais. Eles existem mesmo sabendo que não há a remota possibilidade de algo ruim acontecer. 

— Você pensa demais – ele disse, entrando na sala espelhada novamente. 

Edward foi em direção à sua mochila, e pegou algo que parecia um cigarro. 

— Se importa? – perguntou, indicando o cigarro. 

— Não, desde que você abra a janela – eu disse. 

— Ok – ele deu de ombros e se encostou nas janelas de vidro completamente molhadas do lado de fora. Me sentei no chão, do outro lado da sala. 

Queria saber mais dele. Sentia que Edward ainda estava fechado comigo, e com razão, mas não tanto. Hoje havia sido diferente, pois já tínhamos trocado algumas palavras, mais do que em quase um mês de convivência. Queria perguntar como ficou sua vida depois que eu o deixei, como estão seus pais… e o principal: porque diabos ele usa maconha. Aquelas de cunho mais pessoal, resolvi que deixaria para perguntar caso nossa relação melhorasse, mas a última eu não podia mais deixar passar. 

— Edward? – chamei, como quem não quer nada. 

— Sim? – respondeu, se virando e apagando o cigarro fedorento. Ele foi até a mochila e o guardou. 

— Desculpe perguntar, mas… por que você usa isso? – perguntei, e ele riu. 

— Isso o que? Maconha?

— Aham – confirmei, e ele suspirou. 

— Olha, Isabella… – começou Edward. – É uma longa história, mas comecei a usar quando tudo acabou. Queria uma coisa pra me deixar tranquilo, e a maconha me deixa. Nada de mais. 

Ah, meu Deus. Mais uma para a minha conta. 

— Ah, não. – eu disse. – Você sabe que isso não faz bem, né? Isso vai acabar com os seus neurônios.

— Ah deixa disso – ele riu. – É natural. Essa coisa de acabar com os neurônios… você aprendeu na faculdade? 

Ouch. Tocou na ferida. 

— Não. Devo ter lido em algum lugar – eu disse, apenas. 

Ficamos em silêncio por uns minutos, e depois disso me levantei e saí da sala. Precisava de um pouco de ar. Estava sentindo um misto de coisas: primeiro, um bocado de culpa por ser quase a "causadora" do vício dele; e segundo pois ele tocou num assunto que eu estava lutando para deixar fora da minha cabeça. 

Fiquei um tempo no corredor, olhando a chuva forte cair. Eu não esperava que Edward viesse atrás de mim, e ele não veio. O momento em que eu contei para ele que não iria mais dançar passou pela minha cabeça. 

 

Eu tinha recebido minha carta de admissão há pelo menos seis semanas. Ela estava dentro do meu diário, dentro da minha bolsa, como um peso de uma tonelada. Eu estava me arrastando demais para contar a Edward e Aro que eu teria que os abandonar, mas eu tinha um motivo. Eu não sabia como fazer aquilo. 

Estava almoçando no quarto do hotel  quando meu telefone tocou. Era pelo menos a décima vez que o setor de matrículas da universidade me ligava. 

— Boa tarde, falo com Isabella Swan? – perguntou a mulher do outro lado da linha. 

— Sim – respondi. – O que deseja? 

— Queremos saber se você ainda tem interesse em efetivar sua matrícula no curso de enfermagem – falou. – Estamos tentando contato há semanas, mas não tivemos retorno. O prazo acaba nesta sexta-feira.

Sexta feira. O dia da final do Royal. Eu tinha só dois dias até lá. 

— Alguém pode ir fazer essa matrícula por mim? – perguntei, na esperança de não precisar abandoná-los agora. 

— Sinto muito, mas é apenas a senhorita. Precisamos colher vários documentos, assinaturas, fotos e impressões digitais. Impossível ser feito por outra pessoa – explicou a mulher. 

— Tudo bem – eu disse, e Edward entrou no quarto, com dois sorvetes na mão. – Preciso desligar. Me dê um tempo para chegar até aí. 

— Claro – disse a mulher, simpática. – Esperamos por você. Até mais. 

Agora não dava mais para voltar. Eu teria que contar, e sair. Arrumar minhas malas e ir atrás da minha garantia de que eu seria alguém na vida.  

— Quem era? – perguntou Edward, assim que desliguei o telefone. 

— Edward… Precisamos conversar – eu disse, nervosa. Não tinha a mínima ideia de como contar aquilo para ele, mas tinha que começar de algum jeito. 

— Aconteceu alguma coisa? – perguntou, preocupado. – É algo com a competição, você está se sentindo mal? Posso chamar o Aro… 

— Não – eu disse. – É outra coisa. 

Respirei fundo. Não tinha para onde correr. Decidi contar tudo de uma vez, numa tacada só. Às vezes era melhor tirar o band-aid de uma vez, e não aos poucos. 

— Edward… Só me escuta, ok? – comecei. Ele, preocupado, se sentou na minha frente e franziu o cenho. – Você sabe que eu amo dançar, que isso é uma das coisas mais importantes para mim. 

Ele acenou com a cabeça, em sinal positivo. Continuei. 

— Mas você sabe também que isso não nos dá nenhuma garantia. Uma hora pode estar indo tudo bem, e em outra tudo ruir. Eu não posso viver nessa incerteza. Preciso de algo que me dê segurança, e eu fui atrás disso – falei, e retirei a carta de admissão da universidade de dentro da minha bolsa, que estava em cima da mesa. Entreguei-a a ele, que a leu. 

— Você se inscreveu em uma universidade e não me contou? – perguntou. 

— Sim. 

— Ok, Bella – disse, e devolveu a carta. – Não entendo muito bem seu sentimento, porque não é algo que acontece comigo, mas tento me colocar no seu lugar. Agora, sobre a faculdade, você vai? Como vai funcionar? Nós podemos ajustar nossos horários, conversamos com Aro… 

— Edward, não vai existir nós, pelo menos não como uma dupla – revelei. 

— Como assim, Bella? – perguntou, aturdido. 

— A mulher com quem eu falava no telefone… ela me disse que eu preciso ir fazer a matrícula até sexta, se eu não quiser perder minha vaga – contei. – E eu vou. 

— Bella, sexta é a final do Royal – argumentou Edward, levantando, exaltado. – Você não pode ir depois? Ou mandar alguém? 

— Não, Edward. Não posso – falei, me levantando também. Já tinha tomado minha decisão, e já estava até fria quanto a isso. Não iria voltar atrás. – Eu estou desistindo do Royal. 

— Bella, você não pode fazer uma coisa dessas – gritou. – Você pensou em mim? No Aro? Aliás, ele já sabe disso? 

— Não, ele não sabe. Ainda – revelei. – Pretendo contar depois da nossa conversa. 

— Isabella, o que nós vamos fazer? O que nós vamos ser daqui para frente? – perguntou Edward, com lágrimas nos olhos. 

— É melhor que não sejamos mais nada, Edward – falei, com uma imensa dor no coração. Para aquilo eu definitivamente eu não estava preparada, mas ele não iria me deixar ir se eu não terminasse tudo, rompesse todos os nossos laços. Seria mais fácil se ele tivesse um motivo para me detestar. 

— Você tem certeza disso? – questionou, baixinho, com seus lindos olhos verdes completamente vermelhos e a voz embargada. 

Eu nem conseguia mais olhar para ele. 

— Sim. 

Ele saiu do quarto, e depois disso, eu nunca mais o vi. 



Senti uma lágrima escorrer pelo meu rosto. Por que diabos eu fiz aquilo? Por que me deixei levar pelas emoções e impressões erradas? Por que não acreditei em mim mesma e não lutei pelo que eu amava? Estava tudo escrito naquele maldito diário, enfiado na minha bolsa, dentro daquela sala espelhada. Com Edward. 

Sequei minhas lágrimas e corri até a sala. Pela porta, o vi sentado no chão, de costas para mim, olhando para a janela. Meu coração bateu descompassado, e minha emoção falou mais alto do que a razão, fazendo com que eu imaginasse que Edward pudesse ter lido meu diário. Eu sabia que era impossível, pois primeiro, ele não invadiria minha privacidade daquela forma, e segundo, não havia como ele saber que o diário estava dentro da minha bolsa, fechada do outro lado da sala. 

Me aproximei dele, e vi que ele estava apenas olhando a chuva cair. Respirei fundo, e ele se virou para mim. 

— Achei que não fosse voltar mais – disse. 

— Precisava de um ar – revelei, me sentando ao lado dele e abraçando minhas pernas. – Estava lembrando de algumas coisas. 

— Eu também – falou. – Coisas que eu preferia esquecer, mas que às vezes eu gostaria de entender. 

Ele disse, e se levantou rápido. Olhei para ele, sem saber o que dizer. Eu não sabia se nós estávamos falando das mesmas coisas. 

— Acho que nós podemos voltar a treinar, sim? – perguntou, mudando de assunto, mexendo no cabelo ruivo meio desconfortável. 

Me levantei meio desconcertada. 

— Tudo bem – concordei e me posicionei no meu lugar de sempre. 

— Vamos fazer agora com as mudanças que conversamos no almoço, pode ser? – perguntou Edward. 

— Claro – falei, e olhei para ele. Minha língua coçou para perguntar. Queria tirar dele, saber, contar, queria mostrar. Queria que ele entendesse meu lado. Queria que ele me perdoasse. 

O treino terminou sem mais nenhuma emoção. Passamos mais algumas horas ajustando novos passos, que nos demos a liberdade de encaixar e adaptar à coreografia que Edward dançava com Tanya. 

— Acho que do jeito que está agora ficou ótimo – disse Edward, guardando seus pertences, depois que fomos avisados que já podíamos sair da escola. 

— Eu também – concordei, com a cabeça ainda na sua frase de mais cedo. 

— Vou falar com o Aro sobre as mudanças – avisou. – Se ele achar ruim, vai cair na minha conta. 

— Se nós ganharmos o Royal, ele não vai achar – brinquei. 

Ele olhou para mim com um meio sorriso. Eu ainda conhecia suas expressões. 

— O que? – perguntei. 

— Nada – falou e balançou a cabeça. – Até amanhã, Isabella. 

— Até amanhã – falei, mas ele já tinha saído pela porta. 

 

Cheguei em casa e encontrei Leah e Seth sentados vendo tv. Eu não os via há quase dois dias, e estava com saudades dos meus amigos. 

— Estou sentindo falta de vocês – disse, me jogando no meio deles. 

— Nós também, Bellinha – Seth falou, e me deu um beijo na testa. 

— Como foi hoje, amiga? – perguntou Leah, curiosa. Eu havia mandado uma mensagem para ela dizendo que havia muitas coisas para contar. 

— Correu tudo bem – contei. – Mas foi diferente. Eu e o Edward conversamos. 

— Sobre aquilo? — ela perguntou, assustada. 

— Não – falei. – Mas eu não sei, parece que ele está um pouco menos fechado. E ele disse uma coisa estranha. Falou que haviam algumas coisas que ele gostaria de esquecer, mas ao mesmo tempo de entender. Será que ele está falando de mim, de nós? 

— Pode ser – Leah disse, dando de ombros. 

— Acho que o coração do Ed está amaciando – soltou Seth, e eu e Leah olhamos para ele surpresas. – Ele está vendo que você não é a pessoa ruim que ele achava que era. 

— Ed? – perguntamos em uníssono.

— Ah, sabe como é – começou. – O cara é legal. 

— Desde quando você o conhece? – perguntei, rindo. 

— Nós conversamos um dia na escola de dança – explicou. – Eu estava esperando a Leah chegar da faculdade, e ele começou a falar comigo. Ele é bacana. 

— É, eu sei que é – soltei, num suspiro. 

— Irmãozinho – chamou Leah. – Aproveita que você virou amigo do Ed e fala bem da Bella. 

Comecei a rir. 

— Eu não poderia falar mal nem se eu quisesse – disse Seth, me puxando para um abraço apertado. 

 

No dia seguinte, fui para mais um dia de treino. Incrivelmente, a chuva do dia anterior passara e o céu estava claro, sem nenhuma nuvem. Cheguei na escola de dança e a primeira pessoa que vi foi Edward, conversando com Angela na recepção. Eles estavam sorrindo, animados. Senti uma pontinha de ciúmes, mesmo sabendo que aquele não era o meu direito. Angela era uma garota legal, Edward era bonito e simpático. Ele merecia ser feliz, mas mesmo assim me senti incomodada. 

Planejei passar por eles e apenas dar um oi, mas Angela logo que me viu entrando, logo se virou para mim. 

— Olha ela aí! – falou para Edward, que se virou para mim também. Eles estavam falando de mim? – Bella, estávamos te esperando. Aro quer falar com você. 

Aí meu Deus. Um fio de pânico passou por mim. Eu devo ter feito uma cara muito feia, pois Edward logo disse:

— Acho que é sobre a apresentação no fim de semana. 

Olhei para ele, que estava me olhando sereno. Não consegui falar nada. Edward acenou com a cabeça, me encorajando, e eu subi até a sala de Aro. 

— Bella! – exclamou Aro, tirando seus pés de cima da mesa. – Estava esperando por você. 

— Angela e Edward me disseram – falei, nervosa. – Está tudo bem? 

— Sim, sim – concordou, se levantou e foi até mim. – Agora eu te pergunto mia bella, está tudo bem? 

— Sim – respondi.

Eu acho. 

— Tem certeza? – questionou. 

— Sim – reafirmei. – Só estou nervosa com o Royal chegando. 

— Entendo – falou Aro, dando três batidinhas nas minhas costas. – Eu também me sinto assim. Mas gostaria de falar com você justamente sobre isso. 

Esperei que ele começasse. 

— Bem, estamos a dois dias do Royal, você obviamente sabe disso – riu. – E… eu sei que você pediu para não falarmos mais no passado, mas da última vez que estávamos a dois dias do campeonato você nos deixou. 

Engoli em seco, e tudo voltou à minha mente. 

— Eu confio profundamente em você, Bella – falou Aro, pegando minha mão. – Sei que você teve seus motivos para nos deixar naquela ocasião. 

Assenti, sentindo algumas lágrimas teimosas invadirem meus olhos. 

— Eu só preciso saber se você está conosco nessa – ele disse, por fim. – Você não vai nos deixar de novo? 

Entendia a preocupação de Aro. Era completamente normal que ele tivesse um "pé atrás" comigo. 

— Não, Aro – falei, reunindo toda a certeza do meu coração. Eu não pretendia deixá-los. Por enquanto, até que eu colocasse minha vida em ordem, iria seguir o combinado. — Você pode ter certeza. 

— Ótimo – disse, e sorriu. – Hoje eu tenho algumas reuniões, então você e Edward vão ficar sozinhos de novo, me perdoem. Tudo bem para você? 

— Sim, sim – falei, mais aliviada. – Nós estamos nos dando um pouco melhor. 

— Fico feliz em saber disso – ele disse. – Sabe Bella, sempre torci sempre muito por vocês. Eu fiquei tão devastado quanto o Edward quando vocês terminaram. 

— É. Eu também fiquei – revelei. – Eu não queria terminar, mas foi necessário. Ele não me deixaria ir. Eu só me pergunto se eu fiz a coisa certa… 

O telefone de Aro começou a tocar, de modo que ele não prestou atenção na última parte da frase que eu tinha dito. O deixei sozinho na sala e desci para treinar. Encontrei Edward sozinho, sentado no jardim ao lado da sala, fumando. 

— Como foi? – perguntou, soltando a fumaça.

— Tudo bem, ele só queria saber sobre os treinos. Se tudo está indo bem – omiti algumas partes da conversa. 

— Ah, sim. Está indo tudo bem? – perguntou. 

— Claro – concordei. – Você ainda não desistiu de mim. E não aconteceu nenhum acidente… então sim, está tudo bem. 

Ele começou a rir. A primeira risada, desde quando nós voltamos a nos ver. Era a mesma risada linda de sempre. 

— Eu não ia desistir de você, Isabella – ele disse, apagando o cigarro, e se levantando. – Temos uma missão, certo? 

— Sim. Vamos – eu disse, sorrindo, e fomos para nosso último treino antes do campeonato. 

 

Eu e Edward estávamos perfeitamente sincronizados. Não erramos nada, nenhum mísero passo. Nós estávamos perfeitamente preparados. 

— Foi ótimo – disse, ofegante. – Essas mudanças foram essenciais. Estamos mais fluidos com elas. 

— Também notei isso – concordei. 

— Sabe o que eu lembrei hoje? – ele perguntou subitamente, juntando suas coisas. 

— O que? 

— Dos nossos primeiros campeonatos. Era bom – ele disse, com melancolia na voz. – Às vezes, sinto falta disso. Sinto por não termos dado continuidade. Éramos bons. Nunca entendi direito, mas… enfim. Não vou entender agora. 

Eu nem sabia o que dizer. Fiquei parada olhando para ele, no meio da sala espelhada. 

— Bem, acho que preciso ir – ele anunciou, colocando sua mochila no ombro. – Você fica? 

Naquele momento, lembrei-me do meu diário. Aquele, de cinco anos atrás, intacto, guardado dentro da minha bolsa. 

— Edward – chamei. – Se você quer entender, ou tentar, pelo menos, nem que seja uma parte, um centésimo… 

Abri a bolsa e procurei o pequeno caderno dentro dela, e o entreguei logo em seguida. Ele ficou parado, com uma expressão que não estava entendendo nada. Expliquei o que se tratava. 

— É o meu diário da época – falei, colocando minha bolsa no ombro. – Tudo o que eu senti está aí. Você vai entender o porquê agi daquela forma, eu espero, pelo menos. Até o dia do campeonato. 

Eu disse, e saí o mais rápido da escola de dança, para não ter que dar mais explicações. Queria que ele lidasse com aquilo sozinho. Eu já tinha passado tempo demais com meus pensamentos. 

 

Pela manhã do dia do campeonato, Harry nos levou para a escola de dança. Seth e Leah estavam calmos, e eu também aparentava tranquilidade por fora, mas por dentro eu estava desmoronando. Não pelo concurso em si, mas por saber que todos os meus pensamentos estavam com Edward, e que eu o veria em breve. Meu coração batia forte no meu peito. 

Eu havia contado tudo para Leah, que havia me apoiado, e mantinha o apoio naquele momento, envolvendo sua mão na minha enquanto estávamos no caminho. 

Quando chegamos à escola de Aro, encontrei Angela em meio a vários dançarinos sendo organizados para irem para o hotel, uma das exigências da competição: um tipo de "concentração". 

— Oi Bella – ela disse, alegre, quando me viu. – Suas coisas já estão todas certas. Só chegar no hotel e dar seu nome. Você divide quarto com sua dupla, caso você não saiba, mas o Edward ligou mais cedo e disse que vai direto para a concentração. 

Ah. Eu não sei o que era pior. Demorar a vê-lo e prolongar o sofrimento ou encontrá-lo de uma vez e enfrentá-lo. 

— Ok – disse, sem força na voz. 

— Vai dar tudo certo – ela disse, solidária. – Vou assistir vocês e torcer muito. 

Ela me abraçou e me entregou a folha de inscrição. Peguei e fui para o ônibus, junto com Leah e Seth. 

 

Ao chegarmos no hotel, tive que me separar dos meus amigos. Agora, eu só os veria na hora da apresentação deles. 

— Ei, Clearwater – falei, chamando a atenção dos meus amigos. – Só vou ver vocês de longe. 

— É o que parece – Seth disse. 

— Vai dar tudo certo, vocês têm um talento enorme – eu disse. – Esse campeonato é de vocês, eu sinto isso. Vocês trabalharam muito para chegar aqui. 

— Nós, né, Bella? – corrigiu Lee. 

— Nós, sim, mas principalmente vocês – sorri. – Vou estar me preparando lá atrás, mas vou torcer muito por vocês. 

— E nós por você. Se tem alguém que merece esse prêmio aqui é você, Bell – Seth disse, e me abraçou. Leah entrou junto no abraço. 

— Eu amo vocês – eu disse. 

— Nós também te amamos – Leah completou, e fomos nos preparar para nossas apresentações. 

 

Sozinha, naquele quarto de hotel, fui transportada novamente para cinco anos atrás. Quando eu larguei tudo. Pensei em Edward. Onde ele estava? Será que era ele que iria me abandonar daquela vez? Iria me pagar com a mesma moeda e me fazer sofrer tudo o que eu fiz? Só de pensar nisso, meus olhos já se inundaram. Me sentei na cama, e abracei os joelhos, esperando. As lágrimas caiam pelo meu rosto. Eu me arrependia profundamente de tê-lo deixado. Vi o quanto eu errei em não seguir meu coração e em não acreditar em mim mesma, não acreditar em nós dois. A faculdade era boa, mas não me fazia brilhar os olhos como quando eu estava dançando. Ali eu sentia que estava no lugar certo, na hora certa. 

 Naquele um mês, vivi novamente o que eu amava, o que realmente me fazia querer viver. Eu me sentia grata só de tê-lo perto de mim, mesmo com todos os desentendimentos, mas agora… Eu nem sabia se ele iria aparecer. 

Eu não sabia exatamente quanto tempo se passara, mas resolvi tomar um banho. Já era perto das onze, e estava planejando pedir um almoço quando ouvi a porta abrir num rompante e Edward entrar no quarto como um furacão, completamente desorientado, com meu diário nas mãos e a mochila nas costas. Seus cabelos meio ruivos estavam despenteados, e sua roupa meio amassada. 

— Você pretendia me contar essas coisas quando, Isabella? – perguntou. 

— Eu… eu… – tentei falar, mas nada saía. 

— Por favor! Me fala – ele disse, com lágrimas nos olhos. – Isabella, você me deixou acreditar por anos que o que fazíamos não era interessante para você, que você não gostava de dançar. Eu passei a acreditar que você não me amava, que estava comigo por conveniência, Bella. 

Bella. Ele me chamou de Bella. Como antes. Não Isabella, num tom áspero, formal. Mas Bella, como se ele fosse o Edward. O MEU EDWARD. 

— Me desculpe – soltei. Foi a única coisa que eu consegui falar, pois comecei a chorar copiosamente. Entre uma respirada e outra, tentava falar. – Eu… É claro que… eu te amava… muito… Mas eu acreditava em coisas que não acredito mais. Eu fui… influenciada pela visão dos outros… e não reconheci que devia seguir o meu sonho. 

Depois de anos, ele me abraçou. Forte. 

— Eu entendi – falou, com a voz embargada. – Foi difícil, eu estava… resistente a ler. Por isso eu demorei tanto a aparecer aqui. Só depois de ler eu consegui entender tudo o que você me disse quando me deixou. Doeu demais, mas eu entendi, e eu entendo seus motivos. Eles foram válidos. Você precisava seguir seu coração. 

— Me desculpe – eu disse. – Não queria ter feito você sofrer. Eu me arrependo disso. Você não tem noção do quanto eu me machuquei por isso. Essa ferida nunca se curou, Edward, mas não tem como voltar atrás. 

— A única coisa que podemos fazer é lidar com as coisas daqui para frente – ele disse, soltando um pouco o abraço, e olhando para mim. 

— Você ainda quer tentar? – perguntei, perplexa.

— Bella – ele começou a rir. – É claro. Caso você não tenha percebido, eu não te superei ainda. Nós podemos tentar recomeçar, se você quiser, sem brigas dessa vez.  

— É tudo o que eu quero, Edward – soltei. 

— Pois é o que vamos fazer. Hoje é o nosso recomeço – ele disse, pegando meu rosto com suas duas mãos e me dando um beijo. O beijo dele era exatamente como eu me lembrava, suave, lento e paciente. A única coisa diferente ali era o leve gosto de cigarro. Comecei a rir, ao perceber isso. 

— O que foi? – ele perguntou. 

— Eu estava pensando que poucas coisas mudaram entre nós, mas a mais chocante foi que você virou maconheiro – comecei a gargalhar. 

— A culpa foi toda sua – ele riu. 

— Minha? – perguntei. 

— Ninguém mandou me deixar – ele deu de ombros. 

— Tudo bem. Fico com essa culpa para mim – sorri, ainda agarrada a ele. 

— Ah, ótimo. Tinha que culpar alguém mesmo – ele riu, me puxando para mais um beijo. 

 

Passamos o almoço todo conversando. Isso era uma das coisas que eu mais sentia falta, conversar com Edward. Ele sabia me ouvir e falar o que eu precisava ouvir no momento certo. Ambos estávamos felizes. Eu o via sorrir, como antigamente. Ele me contou sobre sua família, seus cachorros e o que tinha feito depois que nos separamos e como conheceu Tanya. Comentou também que teve alguns casos, mas que nunca conseguiu se manter num relacionamento com ninguém. Eu contei sobre minha experiência na faculdade, sobre como tinha sido despejada há pouco, e sobre como os Clearwater eram como anjos em minha vida. 

— E os seus pais? – perguntou Edward. – Como ele lidaram com tudo aquilo? 

— Ah, bem, foi difícil – contei. – Eles não me apoiaram. Não me apoiam até hoje. Na verdade, nós não nos falamos mais, mas a culpa é minha. Eu fui a causadora de tudo isso, e eles não mereciam que eu fosse um fardo na vida deles. 

— Bella – chamou, passando a mão nos meus cabelos. – Você não é um fardo. Eles te amam. Tenho certeza. E eles sabem que você está bem, pais sentem essas coisas, né? 

— Eles sabem sim – eu ri. – Os Clearwater são amigos deles, esqueceu? Harry e Sue sempre os mantém informados sobre mim. Não mais que o necessário, claro. Mas eles não tem a mínima noção do que está acontecendo na minha vida. 

Senti uma lágrima caindo pela minha bochecha. Eu sentia falta dos meus pais, de ouvir a voz rouca do meu pai todos os dias de manhã, ou de sentir o cheiro de panquecas recém feitas por minha mãe. 

— Vai ficar tudo bem – falou Edward, tentando me reconfortar. 

O telefone do quarto tocou de repente, me assustando. Comecei a rir, e sequei minhas lágrimas que ainda caiam enquanto fui atender. Era apenas um aviso para começarmos a nos preparar, pois viriam nos buscar dentro de duas horas. 

 

Depois de prontos, eu e Edward ficamos juntos, no lobby do hotel esperando com outros dançarinos o ônibus que iria nos levar para o teatro. De longe, vi Seth e Leah saindo com o grupo deles. Meu coração se encheu de orgulho ao vê-los ali, tão seguros de si. 

O trajeto até o teatro foi rápido. Fomos organizados e levados para o backstage. A categoria dos meus amigos iria ser a primeira a se apresentar, e tentei fugir com Edward para assistir à apresentação dos irmãos. 

 

Os Clearwater foram os últimos da categoria. Aro estava uma pilha de nervos. Todos os outros casais da escola haviam tirado notas que não os garantiriam boas colocações. Ele estava colocando toda a esperança dele nos irmãos. 

Depois que comecei a ensaiar com Edward, nunca mais tinha visto meus amigos dançarem. Fiquei feliz quando vi que Aro tinha mantido grande parte da minha coreografia, e todas as coisas que me preocupavam quando eu os treinava agora eram meras lembranças. Eles tinham sido perfeitos. Suspirei de alívio, e meus olhos se encheram de lágrimas. 

— Orgulhosa? – perguntou Edward, abraçando meus ombros.

— Sim, você nem imagina – falei, secando minhas lágrimas para não borrar a maquiagem. – Eu nunca tinha treinado ninguém, e ver eles aqui… Eu estou muito feliz. As coisas deram certo. 

— É claro que deram, Bella – disse Edward, sorrindo e me puxando para perto. – Aro só aperfeiçoou o que já estava bom. Eu vi o primeiro ensaio deles. Você é talentosa, sabia? Acho que o italiano tem uma boa concorrência. 

— Ah, não. Acho que essas emoções eu vou deixar para o Aro – falei, rindo com a ideia, mas feliz por ouvir aquilo de Edward. 

Voltamos nossa atenção para o placar, que contabilizava os pontos dos Clearwater. De longe, eu via Aro quase arrancando seus cabelos, andando de um lado para o outro. Seth e Leah estavam tranquilos, de mãos dadas. 

Não prestei atenção quando o placar mostrou as notas, e só me virei quando Edward me cutucou e ouvi os gritos da plateia presente. 

— Meu Deus! – exclamei, olhando o painel sem acreditar. – Edward, Edward eles ganharam! Edward! 

Gritei e pulei no colo de Edward, que me girou no ar, também feliz pela vitória dos irmãos. 

— Queria ir lá, mas depois falamos com eles – falei, mas já começavam a chamar os concorrentes da categoria profissional: a nossa. Meu coração começou a bater forte. – Melhor irmos nos preparar. 

 

Minhas mãos estavam geladas. Eu suava frio. Andava de um lado para o outro na sala que outrora estava cheia e que aos poucos estava se esvaziando. Por fim, só sobraram eu e Edward, que ficou a todo momento ao meu lado. Ele nunca parecia ter saído, na verdade. 

 – Calma, Bella – ele veio até mim, me levando ao sofá. – Você tem que se acalmar. 

— Não consigo, estou muito nervosa – falei, desesperada. – Parece que meu coração vai sair pela boca. Você tem noção que eu não faço isso há mais de cinco anos? Eu não sei mais o que é estar na frente de um júri e de um público, Ed. 

— Eu sei, mas vou te ajudar – ele disse, calmo. Pegou minha mão, e a colocou em seu coração, colocando a dele no meu. – Vamos, respire comigo. Siga o meu coração, ele vai acalmar o seu, respire, inspire. 

Eu o acompanhava, e sentia que melhorava à medida que me concentrava nele. Edward realmente não tinha mudado nada. Ele estava ali, por inteiro, exatamente como antes. 

— Você sabe o que fazer – ele continuou a falar. – Respire. Vou estar lá com você, nós já fizemos isso várias vezes, ok? Vai ser como nos nossos treinos. Talento você tem de sobra. 

— Ok, vai dar tudo certo – repeti. – Eu sei o que fazer. 

— Isso aí – ele falou, me puxou para um abraço, e me deu um beijo no alto da minha cabeça. 

— Obrigada.

— Não há de quê – ele sorriu e me levantou bem na hora que fomos chamados para a apresentação. 

Respirei fundo quando vi aquele teatro cheio de gente olhando para nós. Os jurados nos encaravam, e, por mais que estavam com uma expressão amistosa, por dentro, eu achava que eles iriam me devorar. Calma, Bella. 

Edward apertou minha mão de leve, lembrando-me que ele estava ali do meu lado. Sorri para ele e olhei para Aro, que mandou um beijo no ar para mim. 

Posicionei-me junto com Edward, e quando os três sinais sonoros rápidos soaram, marcando o início da apresentação, pareceu que tudo mudou. As mãos suadas não importavam mais, o coração palpitando forte já não me incomodava, muito menos o frio na barriga. A música começou, e Edward e eu começamos a dançar, exatamente como tínhamos ensaiado por dias a fio. 

Eu era levada por ele e pela batida da canção. Não ligava para o júri que nos julgava, para todas as pessoas que nos olhavam, para os concorrentes que certamente desejavam que errássemos um passo ou para o dinheiro que estava em jogo ali. Claro, aquilo foi a principal coisa que tinha me levado para todo aquele mundo novamente, mas eu percebi que era muito maior do que isso. Havia muito amor envolvido. 

Edward me girava e jogava para cima, como na famosa cena de Dirty Dancing, na qual Baby corre e Johnny a pega e a levanta no ar. Eu sentia como se eu realmente pudesse voar. Era uma sensação única.  Nada descreveria aquilo. Cada vez que eu me agarrava ao seu pescoço ou passava minhas pernas em sua cintura meu coração batia descompassado. Eu não sabia como tinha passado tanto tempo sem ele. Acho que qualquer pessoa que nos visse veria o que eu sentia por ele emanando por mim. Era muito palpável. 

No fim, terminamos a dança um colado ao outro. Ele olhava em meus olhos, e seus lindos olhos verdes diziam coisas que sua boca não conseguia dizer. Ele sorriu, e eu finalmente saí do meu transe, do mundo "Bella e Edward dançando" quando romperam os milhares de aplausos. Sorri, meio sem graça para a plateia, agradecendo como podia. 

Eu e Edward descemos do palco e nos juntamos a Aro. Ele provavelmente deve ter dito alguma coisa a nós, mas eu não processei nada. Estava ainda em choque por ter voltado a dançar profissionalmente depois de ter abandonado tudo. 

Edward mantinha seu braço em minha cintura, num abraço forte. Eu segurava sua camisa, de punhos fechados. Nossa nota estava sendo contabilizada. Aro andava de um lado para o outro. Estava demorando demais. Mais do que o necessário. Os jurados conversavam uns com os outros, anotavam algumas coisas, chamavam o apresentador. Nós três olhávamos para o telão, reunindo toda nossa esperança. Embora eu fizesse aquilo porque amava, ainda precisava do dinheiro. O tempo passava, e aquilo parecia uma eternidade. Pelas minhas contas, precisávamos de 15.678, exatamente um décimo a mais do que a primeira dupla que dançou, e que se mantinha no primeiro lugar desde então. 

Quando a pontuação apareceu, eu não acreditei no que meus olhos estavam vendo. Eu e Edward tínhamos conquistado 15.700 pontos. Muitos décimos a mais do que o necessário. Eu mal podia acreditar! A primeira coisa que fiz foi pular no colo de Edward e o beijar. Eu não queria me separar dele nunca mais. Em nenhum sentido. Aro, só depois de pular como uma criança e de quase arrancar seus cabelos, percebeu o que estava acontecendo. 

— Ei! Desde quando vocês dois se acertaram? – perguntou, perplexo. – Vocês se odiavam! 

— Ah, Aro… – começou Edward, olhando para mim. 

— Longa história – completei, sorrindo. 

 

DIAS DEPOIS 

 

Corri muito para chegar às escola de dança no horário certo. Quando cheguei, vi Edward, Aro, Leah e Seth sentados em uma mesa no jardim, jogando conversa fora, como se nada estivesse acontecendo. 

— Ei, vocês – chamei. – O que estão fazendo aqui? Não deveríamos estar assinando nosso contrato? 

— Calma, amor – falou Edward, e meu coração já se derreteu um pouco. – Senta aí, descansa. Resolvemos sentar, conversar um pouco, esperar enquanto os documentos chegam. 

— Os documentos ainda não chegaram? – perguntei, perplexa. O Nation, campeonato nacional, que eu e Edward tínhamos conseguido vaga depois que ganhamos o Royal era daqui há alguns meses, e precisaríamos assinar alguns contratos para efetivar a nossa inscrição. Tínhamos lutado demais para chegar até aqui, então eu queria que tudo desse certo. 

— Não, mas já disseram que estão mandando – Aro explicou. – Fique calma. 

— E vocês? – perguntei para Leah e Seth. – O que estão fazendo aqui? 

— Boas novas – Leah sorriu, e Seth também.

— Aro resolveu que vai continuar nos treinando – contou Seth. 

— Ano que vem estaremos na categoria profissional, se tudo der certo – Leah completou. 

— Ah meu Deus! – exclamei. – Eu não acredito! Isso é maravilhoso! Eu nem tenho palavras! Estou muito feliz por vocês. Aro, você não vai se arrepender. 

— Claro que não – disse ele. – Esses dois aqui são duas jóias. Não posso perdê-los. 

— Agora, a pergunta que não quer calar – disse Seth. – Como foi na faculdade, Bells? 

— Foi ótimo – comecei. – Quitei todos os meses que estavam com o pagamento pendente. Eles disseram que eu posso voltar a estudar quando eu quiser. 

— E você vai voltar? – perguntou Edward, olhando para mim. Vi uma centelha de preocupação em seus olhos. 

— Eu entrei com um pedido de desistência formal – contei. – Meu lugar é aqui, ao lado de vocês. 

Depois de passar por tudo aquilo, eu vi que não me arrependia de nada. Passaria por tudo de novo, mas, sem dúvidas, se eu pudesse dar um recado para a Bella do passado… Eu apenas diria para acreditar em si mesma. 

 

 FIM


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Hey! Obrigada a você que leu até aqui, espero que tenha gostado. Se quiser, comente e recomende essa história, para que mais pessoas conheçam. Isso ajuda muito. ♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Metanoia" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.