Assim que eles entram na pista de patinação com um globo espelhado pendurado no teto e luzes vibrantes capazes de darem um ataque epilético em qualquer um, Katsuki sente uma breve pontada de arrependimento por não ter concordado com a Orelhuda quando ela sugeriu que eles largassem mão dessa merda depois do que aconteceu com a Uraraka no metrô e só voltassem pra U.A. Que lugar mais cafona e que ideia idiota do Pikachu, um lugar com essa música alta e toda essa parafernália só vai distrair a Orelhuda, puta merda!

—  Ahhh olha, Kyouka-chan! Eles têm uma pista de dança! —  a Uraraka aponta animadamente, segurando no braço da Orelhuda, e Katsuki revira os olhos. Tsk, a empolgação dela seria irritante caso não fosse tão contrária ao jeito que ela ficou no trem. Melhor ela ficar de risadinha do que com aquela cara de antes.

—  Claro, pô! A graça é essa! —  o Pikachu diz orgulhosamente, satisfeito por ter agradado pelo menos uma pessoa desse grupo.

—  É que quando o Bakugou me falou de pista de patinação, eu pensei em, sei lá, umas pistas de corrida ou aqueles torneios de… como chama? Que tem times e aí as pessoas ficam se empurrando pra tentar ultrapassar? Roller… hã…

—  Roller derby. —  Katsuki responde, surpreso por ela conhecer um negócio desses.

—  Ah… isso! Parece legal também! Mas acho que uma pista de dança é mais tranquila, né?

—  É, você achou que a gente ia montar um time disso daí e sair desafiando outras pessoas? —  o Pikachu num misto de pavor e curiosidade.

—  Seria divertido… —  ela dá de ombros, e Katsuki não consegue discordar. Ele não ia querer participar, mas não ligaria de assistir ao povo se empurrando e correndo pra lá e pra cá —  Bom, vamos pegar os patins? Ah, Bakugou-kun, o que você acha de guardar suas coisas com as minhas? Aí a gente paga por só um armário ao invés de dois.

—  Pode ser. —  ele concorda.

—  Não quer guardar com as minhas, Ocha? —  a Orelhuda pergunta.

—  Oh… bom, é que… eu só trouxe essa bolsinha e meus tênis, o Bakugou-kun só tá com os tênis e… bom, nenhum de nós precisa de muito espaço. —  ela explica meio sem saber o que dizer, e Katsuki sabe exatamente o que a doida tá fazendo: se eles estiverem guardando suas coisas juntos, ela pode ir embora sem atrapalhar a Orelhuda. Era esse o plano, e ele tá satisfeito por ela ter pensado em algo que ele nem tinha se tocado ainda, mas o garoto fica se perguntando se ela ainda tá mesmo tão a fim de vazar daqui quando claramente ficou empolgada ao ver a pista de patinação.

—  Bora lá. —  o Pikachu dá um puxão no ombro dele e os conduz até um balcão com uma caralhada de prateleiras de pares de patins separados por modelo e por tamanho —  Olha, Kacchan, tem patins do All Might. —  ele dá uma cutucada nele e ri daquele jeito idiota.

—  Tsk, e daí? —  Katsuki o ignora e pede pro balconista pegar um par preto que é do tamanho dele. A real é que ele nem ia pegar nenhum, mas os três iam ficar gastando a orelha dele caso não pegasse, então que se foda. O garoto dá uma olhada nas duas, de frente para as prateleiras de números menores e escolhendo os patins delas. 

—  Ei, ela tá bem, mano. Pode relaxar e curtir. 

—  O quê?

— A Uraraka tá bem, você mesmo falou que elas podem se cuidar sozinhas, então fica tranquilo e só aproveita. —  ele sorri —  Vou te falar que fiquei surpreso quando a Jirou me falou que vocês dois iam vir com a gente, tava até com medo de vocês empatarem meu rolê, mas… acho que posso ficar tranquilo.

— Você não precisa de ninguém pra “empatar seu rolê”, idiota, consegue foder tudo sozinho. —  ele resmunga —  Surpreso tô eu que você ainda não fodeu com tudo, por sinal.

—  Bom, eu conheço a Jirou. Se ela tivesse odiando, já tinha me mandado à merda e ido embora. —  ele dá uma olhada pra elas —  Mas ela tá meio travada, né? 

—  Você fica passando cantada de cinco em cinco minutos, caralho, vai deixar a menina pensando que você é tarado igual o… —  igual o fodido do metrô, é o que ele quer falar, mas se contém. 

—  Você acha que eu devo maneirar, então? Porque assim, não chegar junto também não leva a lugar nenhum. A Uraraka também não tá lá muito na sua.

Katsuki empurra o par de patins que o idiota escolheu no peito dele assim que o balconista os entrega. A audácia desse imbecil! Ao invés de se preocupar com a menina que ele chamou pra um encontro e com quem não sabe conversar sem passar vergonha a cada cinco frases, fica aí querendo dar palpite na vida dos outros! Tsk, e quem disse que Katsuki tá interessado em deixar a Uraraka “na dele”? Eles só tão aqui pra ajudar esse otário, ele só quer que a Cara de Lua não fique remoendo a merda que aconteceu no metrô, esse idiota só tá falando o que não sabe, como sempre!

—  Cuida do seu que eu cuido do meu. —  ele rosna.

—  Oh… ohhhhh você tá…? Ô cara, não tô tentando te desanimar, não. É que você… é que a Ura é… não precisa ficar tão tímido, só de ela ter topado vir significa que ela não te acha um babaca completo, já é um começo.

Quanto mais o imbecil fala, mais a vontade de dar um tapa na nuca dele cresce, que merda esse idiota tá insinuando? Ele nem sabe o real motivo dos dois estarem aqui e fica sugerindo que Katsuki não saberia o que fazer caso estivesse em um encontro com a Uraraka, pau no cu dele!

—  Se você tem tanta certeza de que sabe o que tá fazendo, então vai em frente. —  é o que ele diz, afastando-se do Pikachu e indo na direção das meninas. 

Elas já estão sentadas nas banquetas de frente pra pista, tirando seus tênis e colocando os patins. A Orelhuda escolheu um par roxo com detalhes cor de rosa, uma aberração de se olhar, já a Uraraka tá com um par cinza com uns buracos escuros, quando ele olha melhor, percebe que são patins temáticos da heroína Thirteen. Hum… agora ele meio que queria ter checado se tinham o par do All Might no tamanho dele… não, que idiotice, de onde veio essa merda?

—  Dá aí suas coisas. Eu guardo. —  ele estende a mão pra ela entregar sua bolsa e a sacola com os tênis.

—  Ah… obrigada. Aqui. —  ela entrega e sorri pra ele, e Katsuki nem se incomoda em olhar pro Pikachu, só sabe que ele deve estar com aquela cara de bobão. Bem feito, burrice dele achar que Katsuki precisaria se sujeitar a ficar de gracinha pra agradar uma menina. Não que ele queira, mas o ponto é que nem precisa.

—  Beleza então, vamos lá. —  a Orelhuda se levanta decididamente, apenas para vacilar e dar uma tombada pro lado por causa dos patins. O Pikachu se mostra surpreendentemente ágil e se coloca ao lado dela, mas a menina se equilibra sozinha ao abrir os braços, ainda com as costas um pouco curvadas pra não cair de novo.

—  Certeza que você ainda sabe andar de patins? —  ele pergunta e abre um sorriso que, se fosse pra ele, teria um soco nos dentes como resposta.

  —  Bom, deve ser tipo andar de bicicleta… dizem que você nunca se esquece.

—  E você sabe andar de bicicleta?

—  Não.

O Pikachu ri, e a Orelhuda responde com uma risada nervosa, mas ela não parece irritada com ele. Tsk, é outra idiota por ficar caindo na lábia desse paspalho, mas isso aí é problema dela, é pra ter certeza que os dois vão se entender desse jeito que ele e a Uraraka tão aqui, não é?

—  Bora lá, então. —  o Pikachu a segura e a guia até a pista, e a Orelhuda se permite ser conduzida, dando um olhar apreensivo na direção da Uraraka, que sorri e ergue os punhos como se estivesse torcendo por ela.

—  Não enrolem muito, vocês d-aaah! —   ela diz, sendo arrastada.

—  Já vamos! —  Uraraka dá tchau pra ela e então se vira pra ele, apoiando as mãos nos joelhos.

—  E você não foi ainda por quê?

—  Ué? Tô te esperando, claro.

—  Não precisa, só vai lá logo.

—  Bom, eu não vou atrapalhar os dois… e andar sozinha é meio sem graça.

—  Tá. Então só vai entrando que eu já vou. —  ele se senta ao lado dela na banqueta, olhando pros dois idiotas deslizando vagarosamente pelas beiradas da pista, e então Katsuki se surpreende ao ver que a Uraraka está encarando-o atentamente —  Que foi? Tem alguma coisa na minha cara?

—  Hum… eu só tô pensando… quando o Kaminari-kun perguntou se todo mundo sabia patinar, você não respondeu…

—  Você também não. —  ele retruca. Só a Orelhuda respondeu porque basicamente só a resposta dela importava.

—  Bom… —  ela se levanta e dá um breve giro sem grandes dificuldades, mas o jeito como ela fica parada com total equilíbrio é o que prova o que ela tá tentando provar —  Você ainda nem colocou seus patins… —   Uraraka se abaixa para encará-lo mais de perto, o movimento é tão preciso que quase o faz esquecer que ela está usando patins —  Bakugou-kun, você sabe andar de patins?

Tsk, que merda!

Assim que o Pikachu informou que o encontro seria na pista de patinação, Katsuki nem deu muita moral. Ele achou idiota, claro, foi uma ideia do Pikachu, mas não falou nada, até porque o encontro é do cara, ele deveria saber o que tava fazendo. Além do mais, isso foi depois do Kirishima ter apontado inocentemente que Katsuki e Uraraka deveriam se perder dos outros dois, então se fosse assim, ele talvez nem precisaria  se dar ao trabalho de ficar por muito tempo, o plano mudou um pouco depois que ele decidiu que a Uraraka não poderia perder a viagem que fez pra chegar aqui depois daquela merda, mas tudo bem. A julgar pela forma como a Orelhuda e o Pikachu se afastaram rapidinho assim que puseram os patins nos pés, tava tudo correndo bem até demais, e se a Uraraka quer dar umas voltas nesse treco, ele pode ficar por perto, mas não precisaria necessariamente patinar. Ou tentar.

Porque Katsuki não sabe.

—  Que isso te interessa, Cara de Lua? Vai logo!

—  Você não… você não sabe! —   ela aponta com espanto, ele só bufa, sabendo que tentar mentir vai fazer com que essa maldita exija que ele prove que sabe —   Bakugou-kun… por que você topou vir pra cá se não sabe patinar?

—  O encontro não é meu, sua idiota! Que diferença faz?

—  Bom, sim, mas… ainda assim, você não deveria… —  ela continua olhando-o, mas parece estar vendo além dele —  Isso é minha culpa…

—  Hã?

—  Eu coloquei a gente nessa situação, e você… podia ter se livrado disso aqui quando a Kyouka-chan sugeriu que a gente voltasse, mas eu insisti… porque eu não queria estragar tudo ainda mais, mas… me desculpa mesmo, Bakugou-kun. —  ela se curva, e ele não tem ideia no que deu nessa menina. Katsuki arregala os olhos e quase pula do banco em surpresa.

—  Quê? Que merda é essa, Uraraka? Levanta essa cabeça, as pessoas tão olhando! —  ele a pega pelos ombros —  Para com isso, caralho. Essa merda foi sua culpa sim, mas agora a gente tá aqui tentando consertar. Ah, e também… e daí que você não quis voltar? Você tava certa, não tem porque um escroto daqueles acabar com seu dia! Então nem vem com essa, inferno. Tem mais é que se divertir mesmo, então vai lá.

—  Mas e você? Vai ficar só olhando? Você até pegou um par de patins… —  ela diz baixinho, aparentemente muito surpresa pela reação dele.

—  Peguei pra vocês não ficarem me enchendo. —  ele desvia o olhar —  Vai lá andar, eu vou ficar por perto.

—  Não, mas… eu não vou te deixar sozinho… —  ela procura pelos dois na pista rapidamente e se volta pra ele —  A Kyouka-chan tava meio enferrujada, mas olha, ela já tá pegando o jeito.

—  Bom pra ela, melhor do que ficar com o idiota agarrando ela. —  ele dá de ombros.

—  Sim, e você… você é tão bom em tudo, Bakugou-kun.

—  Q-quê? —  mesmo sabendo que é verdade, o jeito como ela fala faz o rosto dele esquentar.

—  Se você tentar, tenho certeza que aprende super rapidinho.

—  Tsk, esquece. Você não precisa ter dó e ficar em volta de mim me ensinando como se eu fosse uma criança.

—  Hum? E quem disse que eu vou? Eu posso te ensinar, mas… não vou pegar leve só porque você é iniciante. —  ela abre um sorriso zombeteiro —  Agora, se você acha que não dá conta…

—  Vai se foder. —  ele volta a se sentar, tirando seus tênis rapidamente e colocando-os dentro da sacola com raiva. Embora ele tenha dito que ia guardar, Katsuki entrega pra ela —  Guarda lá, eu já vou conseguir ficar em pé sem ajuda quando você voltar.

—  Quero só ver… —  ela ri e balança a cabeça, mas não parece ser em descrença. 

Uraraka não tem dúvida de que ele consegue. Katsuki muito menos.

***

O jeito como ele mantém a cara fechada como se isso fosse ajudá-lo a manter o equilíbrio é hilário, mas Ochako apenas comprime os lábios e acena com a cabeça.

—  Nada mal, você já tá em pé.

—  Vai à merda. —  isso a faz rir —  Qual a graça, porra?

—  Você tá se concentrando demais, isso não vai dar certo quando você se mover. —  Ochako põe as mãos nos quadris e fica mais séria pra ele não achar que ele tá rindo da cara dele —  Não se preocupa tanto com o peso nos seus pés, o segredo é os joelhos, pode flexionar um pouquinho e… —  ele dobra os joelhos e começa a se mover pra frente —  Isso aí! 

É inesperado como alguém que se lança tão ferozmente para quase tudo está se contendo agora para não cair. Ela não estava errada, o Bakugou aprende rápido e surpreendentemente ouviu as instruções dela, mas não deixa de ser curioso o quanto ele está sendo cauteloso, Ochako supõe que é porque é um espaço público meio apertado e ele não pode berrar e sair soltando explosões loucamente pra pegar impulso, —  agora parando pra pensar, isso com certeza o ajudaria a encontrar seu centro de gravidade melhor —  ou talvez tenha mais alguma coisa. 

Não havia a menor necessidade dele insistir tanto para que ela patinasse, ainda mais se eles estão tecnicamente juntos. Se ele não sabe andar de patins nem faz a menor questão de se divertir, não tinha porque querer que ela se divertisse. O Kaminari e a Kyouka parecem estar se virando muito bem, então não há necessidade de eles se esforçarem pra criar um clima agradável pros dois, e ainda assim, o Bakugou está fazendo muito mais do que é esperado e exigido dele hoje. E ok, Ochako disse que não ia pegar leve com ele, mas isso foi só pra provocar, ela não se sente no direito de exigir nada dele.

Não quando ele claramente quer que ela se divirta por causa do que aconteceu mais cedo. O Bakugou é… inacreditável, ele não queria estar aqui, só veio pra dar cobertura pra algo que é culpa dela, vive dizendo que não tá nem aí pros outros, mas dá pra ver que está preocupado com o Kirishima e a Mina, assim como com o Kaminari e a Kyouka, e… ela. Ele não quer que o que aconteceu no metrô estrague o dia tanto quanto ela mesma, e não dá pra entender porque o garoto faz tanta questão de fingir que não se importa quando claramente se importa muito com todo mundo. O Bakugou é inacreditável, mas também um amigo maravilhoso.

O mínimo que ela pode fazer é tentar chegar nesse nível e se divertir enquanto se esforça para que ele se divirta também.