Contos de Uma Viajante do Tempo Spinoff - 1 escrita por Sofia Casanova


Capítulo 1
Um Conto Antes do Casamento


Notas iniciais do capítulo

Necessário ler Contos de Uma Viajante do Tempo Volume 2



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/801669/chapter/1

 

Dezembro, 1 mês antes do casamento

 

Estava 12 graus na Califórnia mas sem sinal de neve. Olívia estava em seu sofá lendo revistas de noivas da Vogue Couturier Design que Lúcia havia trazido para ela além da edição especial de noivas da Mademoiselle. Olivia não gostou de nada do que viu e sua impaciência mostrava sinais.

 

— Acho que este modelo não fica bem em mim, Lúcia. Meus ombros são largos.

 

— Podíamos tentar procurar nas lojas para ter a certeza. Na revista é uma coisa e na realidade é outra. As vezes o vestido é horrível.

 

Olívia torceu o nariz inconscientemente e fez cara de desânimo.

 

— E você prometeu que ia amanhã nas lojas comigo ver seu vestido, nem adianta dar desculpas. - disse Lúcia olhando-a de canto de olho.

 

— Sim,eu vou…

 

Olivia estava com o olhar perdido e com um grande pesar dentro de si e não podia contar nada a ninguém. Ela teria que usar Lúcia para esquecer o que havia acontecido no mês passado.

 

— Sabe de uma coisa? - disse Lúcia percebendo o silêncio ensurdecedor. - Vamos dar uma viajada só eu e você?

 

Atenção dela foi capturada.

 

— Viajar? Para onde?

 

Me tornei sócia de um Hotel e Restaurante chamado El Rancho bem perto do Novo México. Minha querida, o lugar é incrível. Hotel, restaurante, country e vários famosos vão lá e tem uma parede cheeeeeeia de foto. Preciso ver como estão as coisas por lá. São 9 horas de carro e poderíamos ter um Girls Time antes de você casar. Então, o que te parece?

 

— Melhor do que escolher um vestido de noiva.

 

— Não é? Minha mãe diz que não é direito uma mulher mexer em dinheiro mas querida, eu nunca mais na minha vida vou ser pobre.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Novembro de 1956

Olívia estava cerrando as unhas antes de passar uma base fortalecedora e outra camada de base para crescimento. Este dia fora a primeira vez que ela se lembrara de Chester desde que viajara no tempo. Algo nela ainda gerava tristeza com a sua morte pois ela sentia que não havia sido uma
morte normal.

 

Deu uma volta pela cidade comprando livros novos e usados, a única coisa que a deixava feliz e mal percebera o quanto estava longe de casa. Lanchou em uma pequena tratoria e deu uma volta pela vizinhança que ela acreditava ser em outra cidade. Olhou no relógio eram 15 horas,deu uma olhada rápida no anel de noivado e sorriu ao lembrar do futuro certo que a esperava. Incrível como a vida dá umas guinadas estranhas: Achava que jamais amaria alguém de novo e hoje está noiva do homem que domou docemente seu ego e seu medo. Seus pensamentos foram interrompidos pela visão de alguém familiar que fizera seu coração gelar: Donald O’Connor, um cachorro e uma jovem.

 

Olívia estacionou o carro em frente a uma doceteria e observou de longe: sim, era ele. Uma jovem de short curto com dois corações de lantejoulas nos bolsos traseiros,com uma camiseta rosa e sandália de pé estava conversando com ele e segurando o O’Flynn pela coleira.

“Que coisa absurda! Mal casou e já tem uma amante. Que filho da puta!” - pensou ela apertando o volante.

 

Não havia sinal de Glória e ela nem sabia que ele havia voltado para cidade. Estava morando ali, agora? Ela olhou ao redor para saber se havia alguma dica de onde estava mas nada identificava o local. A moça era realmente muito bonita e ela não tinha como competir com ela: pele branca, longos cabelos encaracolados e pretos, e ao se virar vira que ela tinha olhos azuis,como se fossem duas pepitas,como Donald . Eles conversavam como se fossem velhos conhecidos.

 

Olívia respirou fundo e foi embora, em busca da rua da MGM em Bervely Hills para chegar em casa. Se sentia enganada: ele jurava de pé junto que não podia casar com ela e já tem outra e mal casou com a outra lá. Ao chegar em casa,ligou a rádio e foi direto para a cozinha, largando em cima da mesa seus pacotes de livros. Pegou sua garrafa térmica com água quente e catou um sachê qualquer de chá: estava muito indignada com sua descoberta e se tem uma coisa que ela odeia é final sem esclarecimentos A sala estava cheia de caixas de livros que ela em breve levaria para sua nova casa. Ela sentou-se no chão da sala, ao som de Ella Fitzgerald, e começou a olhar demoradamente seus novos exemplares que iriam para a caixa. Gene disse que daria um escritório só pra ela decorar com livros e plantas e estofados de sua preferência. Ele mudou toda a decoração da casa desde que sua ex fora embora. Ela vira as fotos da antiga decoração: papel de parede azul listrado e a casa toda com moveis de madeira envernizada como se a casa tivesse sido construída em 1920 por um caçador ou jardineiro. Aos olhos de Olívia, tudo era de mal gosto. Gene retirou os papéis de parede e pintou tudo de branco. Alguns móveis foram movidos para andares diferentes e novos entraram na sala e na cozinha. Os sofás brancos que ficavam de frente à lareira foram mantidos, mas a pequena estante de livros de auto- estima e o pé de Antúrio cheio de teias de aranha, foram retirados. Olívia levou os livros lixosos para vender e conseguiu 25 dólares e o Antúrio esteve sob seus cuidados.

 

— Sua antiga dona não era assiiiim sua fã, não é? - disse ela conversando com o Antúrio cuja terra estava dura,seca e provavelmente sem vê um adubo na vida. Procurou por uma espátula para cortar bolo e mexeu na planta. Buscou casca de ovos no lixo, amassou até virar pó e colocou na plantas nos buracos que conseguiram abrir. Colocou água até escorrer pelos furos do vaso e deixou na porta de casa, nos degraus, onde o sol já não batia.

 

Após um banho e lavar as roupas que usara para em breve empacotá-las na mala, ficou deitada de roupão na cama e muitas coisas vieram à sua mente. O que ela faria dali em diante? Ela veio a este tempo para destruir um grupo satânico mas as suas raízes eram maiores do que ela podia imaginar. Ela continuaria a entregar tudo que descobrisse para lançar no futuro mas será que seria o suficiente? Isso salvaria a vida dos cantores que, não estão inocentes, mas são escravos do sistema?

 

Dezembro de 1956

 

Olívia estava comendo torta de atum caprichada no tomate e na cebola com café em um restaurante qualquer no meio do nada, em Phoenix. Já era noite quando chegaram na cidade. Sem perceber, alguns homens que trabalhavam para revistas estavam discretamente tirando fotos dela e de Lúcia que seriam encontradas no Google e para vender no Ebay anos mais tarde - deram sorte de estarem jantando no mesmo lugar. Ligou para Gene para avisar que chegara bem e que partiria após o café da manhã para El Rancho.

 

No quarto, que compartilhara com Lúcia, estava sentada à janela olhando a chuva que caia e relâmpagos. O tempo quente e seco gerava raios por toda a cidade nos tempos de frio e não era incomum que alguma queimada acontecesse. O lugar conseguia ser pior que Califórnia: o rosto estava castigado pela areia, os lábios e olhos ressecados, acessos de espirro. Passou lubrificante ocular e creme Nívea no rosto, que encontrara em uma farmácia na estrada, mas a sensação de areia no rosto não a abandonou. Esperava não ter a pele descascando no dia do casamento.

 

Voltou a pensar em Gene e no dia do casamento.

 

Ele disse que queria morar na França por um tempo já que seu tempo na MGM chegara ao fim e queria fazer trabalhos independentes. Será que ela sentiria saudades dos Estados Unidos? O que ela faria lá depois que terminasse seu trabalho na dublagem de Sissi e Seu Destino? Seus pensamentos foram interrompidos com Lucia entrando no quarto.

 

— Bom, já liguei para o senhor meu marido e estou livre de dar satisfações até amanha a noite. A pior parte de casar é dar satisfação como quem faz com o pai ou a mãe. Se prepare para dar detalhes do seu dia quando casar, viu? - disse Lucia se jogando na cama.

 

— Adoro dar satisfações. - Disse Olívia ironicamente enquanto fechava as cortinas.

 

— Falando em casamento… - começou Lúcia com aquele ar conspirador. - Já que estamos aqui e ninguém para escutar…

 

Olívia fingiu que não sabia o que estava por vir e continuou a massagear o rosto, olhando-se no espelho.

 

— Hummm…

 

— É verdade que você e o Donald….

 

— A notícia já se espalhou?

 

— Então é verdade!

 

Olívia a olhou surpresa e com medo do tipo de história que andavam contando.

 

— O que exatamente é verdade?

 

— Que vocês tiveram um caso tórrido e ele te deixou por outra.

 

— É… por ai…

 

Lúcia a olhava como um cão que pede por mais pedacinho de pizza e Olívia aceitou contar tudo.

 

— E foi assim que tudo terminou. Mas ninguém sabe que eu estive no acidente do James. A Warner Bros e MGM trabalharam pesado para me tirar da jogada por motivos que desconheço. Eu particularmente nunca entendi direito porque ele nunca quis casar comigo. Eu teria esperado,sabe?

 

— Estou em choque diante de tudo o que você me relatou. E vocês dois nunca….você sabe…

— Não.

 

— Nunca,nunca?

 

— Nunca.

 

— Nem esfregando?

 

— Aff, Lúcia… - Olivia gargalhou – Não!

 

— Minha filha, você deve ser uma santa. Porque amar desse jeito e não acontecer nada…

 

— Nós costumávamos tocar piano e cantar. Ele gostava de cantar músicas do The Platters. Ele amava minha voz.

 

— Você o ama?

 

— Eu tenho mágoa do que ele fez, mas não tem volta mesmo que ele me pedisse pra voltar e casar com ele.

 

— Fico feliz em ouvir isso, principalmente porque fui eu quem uniu você e Gene e serei a madrinha do casamento. - disse Lúcia com ares de casamenteira. - Porem, revelarei a você coisas que descobri com alguns jornalistas.

 

— Sobre?

 

— Eu soube que foi o agente de Donald que o alertou sobre você. Se a esposa dele descobrisse que ele estava com você ela podia pedir o divórcio e alegar infidelidade e como na Califórnia é crime, ele perderia mais de 50% de tudo o que tem para ela por sua causa. Foi o que aconteceu quando ela pediu o divórcio a ele depois que ele te deixou e levou dinheiro pra burro. Teria sido pior se tivesse sido por sua causa.

 

— Então, quer dizer que o problema não era eu?

 

— Pelo que você me contou,ele não ia largar a bebida e com esta questão do dinheiro, eu acho que ele tentou conter os danos e deixou você. Acho que não se pode culpá-lo por ser mesquinho porque ele é quem sustenta a família mas ele ia perder muito se assumisse você ou fossem descobertos. Mas, eu acho que ele gosta de você só que ele escolheu a vida que queria levar e isso não tem nada a ver com você ser quem é mas com quem ele é.

 

— Foi bom saber a verdade. - Olívia deitou-se olhando para o teto – Pelo menos não foi minha culpa,não sou eu o problema.

 

— Eu soube que a ex-esposa dele assim que o largou já se agarrou com o ator Dan Dailey?

 

— Quem ? - Olívia virou o rosto para ela

 

— Ele atuou com o Donald em There’s no Bussiness like Show Bussiness e também atuou com a Betty Grable naquele filme que ela queria ser mãe e não conseguia.

 

— Ah, me lembro deste filme, My Blue Heaven. Muito bom por sinal, mas não me lembro dele.

 

— Ela já estava de olho nele e assim que se divorciou já foi atrás de um cara tão rico quando Donald O’Connor.

 

— Hollywood não é para amadores, fato!

 

— E o Donald saiu com a Pier Angeli minha filha. Forçou a barra, heim?!

 

— Nada a ver eles dois.

 

— Né? Todo mundo falou!

 

— Cadê ela?

 

— Casou com um cantor, horroroso. Parece que já vai se divorciar.

 

— Mentira!

 

—Tô te falando!

 

— Menina, cá entre nos! Eu ouvi na radio a Pier Angeli cantando uma musica em italiano… minha filha… Pelo amor de Deus alguém precisa parar de dizer que ela canta bem. Ela é horrivel! HO-RRÍ-VÉ-Ó. Ela cantou uma musica na TV que quem canta é o Dean Martin mas ela estragou a musica, santo Deus.

 

— Liv, ela tá fora de Hollywood. Ela até que atua bem, mas a verdade é que a iludiram. Fizeram dela uma deusa e ela nem é isso tudo. Estão dizendo até que esse namoro dela com o James Dean foi furada, que a história de amor nunca existiu mas que ele realmente gostou dela. Você vê as fotos deles dois juntos, ele olhando para ela e ela sempre olhando para as câmeras. Coitado!

 

— Você está me dizendo que foi casal arranjado?

 

— Não sei,mas não duvido. Dizem por ai que sim!

 

Depois de mais algumas horas de lavagem de roupa, dormiram ao som de muita chuva e acordaram às 6 da manhã e logo pegaram a estrada.

 

Por volta das 13 horas, chegaram ao Hotel. Apesar de longe da cidade, no meio de um grande deserto de areia Olivia não podia dizer que Lúcia não havia feito um grande negócio: as pessoas vinham de tão tão distante para ficar ali, não era? Alguns funcionários vieram correndo pegar as malas enquanto o gerente descia animado as escadas para se encontrar com a senhora Ridley. O Hotel era realmente cheio de fotos de celebridades diversas, com restaurante e bar à moda do antigo Texas: cheiro de peixe frito com curry invadia o ar, assim como pimenta e cerveja e carne sendo frita na churrasqueira. Diferente do que imaginara, o lugar não era quente e a cor branca das paredes e de suas cortinas dava um ar de arejado e seu quarto não era diferente: ficou de frente para o “mini Grand Canyon” que havia na frente para o Hotel, do outro lado da estrada, no quarto 100 chamado John Wayne pois todos os quartos tinham nomes de estrelas.

 

Naquela mesma noite, houve uma apresentação de Ziegfeld Follies que Lucia, que assistia pela janela do escritório no terceiro andar, não gostou muito e achou que deveriam trazer artistas de Hollywood para se apresentarem lá como faziam em Vegas. Em meio a alguns papéis de dívidas, gastos por vir e coisas que ela encontrou que cancelaria, tomava um “conhaque de péssimo gosto para um Hotel caro” e Olívia um café bem mexicano.

 

 

 

Novembro de 1956

 

Olívia havia deixado a sala do seu novo agente Mort Viner com um contrato robusto de uma linha de roupas de malhar e esportes e Vitaminas. Eles estavam querendo elevá-la à categoria de A Garota da Academia surfando na onda de Abbye Stockton, além de estarem-na fazendo de cobaia com experimento de Proteína Concentrada Kellogg’s. Podia-se dizer que, devido à Proteína Concentrada, algumas blusas já não cabiam mais com o aumento de massa muscular no braço.

 

Também era notório que Gene estava ficando um pouco com ciúmes devido a sua noiva está sendo muito notada por um Marlon Brando bêbado com quedinha por mulheres latinas e na roda de amigos e festas devido ao seu porte físico não magro e avantajado, principalmente da cintura pra baixo. Já começara a falar sobre usar saia e o Short estar apertado demais. Olívia concordava: seus vestidos já não fechavam mais os botões e a meia-calça já não entrava.

 

Andando pelas galerias das lojas com seu sapato branco novo,os pés cheios de esparadrapos, seu vestido rosa claro com bordas em rosa escuro recém-saído de uma costureira e luvas brancas,Olívia era a imagem de 1950 exceto pelos cabelos que estavam há um palmo do umbigo e sem o famoso design da época, pelos seus óculos de grau cor-de-rosa quadrados, rejeitando o Cat-Eyes Model tão em alta, aposentando seu primeiro óculos Buddy Holly da adolescência e claro por ser uma mulher de cor. Ela havia se tornado aquilo que mais temia: Elle Woods. Precisava urgentemente de um Malamute ou um Husk Siberiano e chamá-lo de Fluffly para o figurino ser completo.

 

Óbvio que com um guarda-roupa novo ela andaria até que não houvesse mais necessidade de mostrar seu vestidinho novo e seu “oclinhos” rosa. Chegando na esquina de sua casa, seca de sede mas sem perder o rebolado,literalmente, ela percebe uma menina com dois Lhasas Apsos do outro lado da rua e a reconheceu. Seus olhares se cruzam e Olívia rapidamente procurava a chave de casa, desviando o olhar. Ao fechar a porta atrás de si, tirou os sapatos, pegou um copo de água da torneira e tentou vê-la do outro lado da rua pela janela, mas já não estava lá. Tinha certeza que era a mesma que estivera com Donald mas talvez não fosse a “piveta dele”, apenas alguém ganhando a vida entre os ricos e famosos. Ao beber toda a água, colocou o copo na pia e começou a abrir o zíper do vestido quando a campainha tocou. Olhou pelo olho mágico e não viu ninguém mas havia uma sombra debaixo da porta o que indicava que havia alguém. Será que era o filho do vizinho de novo pedindo pra usar o telefone? Ao abrir a porta já com um sorriso no rosto por achar que era Bartholomeu, olhou para baixo deparou-se com a menina na sua porta. As duas ficaram se encarando por longos minutos: Olívia assustada e confusa e a menina com medo de Olívia.

 

— Posso entrar? - perguntou a garota com um leve sotaque britânico.

 

— Claro. - disse Olívia fazendo a socialmente polida porém bugada.

 

“Meu Jesus Cristo”- pensou Olívia - “ Essa menina é a cara do Donald... até o nariz.”

 

A garota entrou e se jogou no sofá pequeno próximo da janela.

 

— Gostei da sua casa. Todas as casas de 1950 são lindas. Fico feliz que tenha aberto a porta pra mim.

 

Olívia andava devagar até alcançar o sofá maior, sem tirar os olhos dela. Por um momento achou que seria morta por uma filha de nazista, esquecendo-se que antes havia notado a semelhança absurda entre a garota e Donald.

 

“Jesus, eu vou morrer. Me desculpe por achar engraçado matar nazista.”

 

— Também estou feliz de te conhecer, eu realmente precisei me preparar pra este dia. Já notou a semelhança física entre mim e ele não é ? - disse a moça usando o dedo indicado para o próprio rosto em movimento circular. Ela também notou que ela tinha os mesmos defeitos físicos nos dedos que ele e que seus dedos tremiam, provavelmente de nervoso.

 

Olívia sentiu o coração bater na garganta mas ainda assim não conseguiu conter um sorriso de quem havia sido pego na culpa.

 

— Você é a irmã mais nova dele? - disse à garota, sentindo a voz falhar.

 

—Não,sou a neta dele. - Ela endireitou-se no sofá e cruzou as pernas da forma que os homens costumam fazer . Ela tinha pernas longas apesar de ser baixa.

 

— Neta? Misericórdia, como assim?

 

— É,sou a neta dele e você é a Olivia Weiss. “A” Olívia Weiss sobre quem meu pai contou.

 

Olívia ficou branca. Sobre o que exatamente contaram ou andam falando a respeito dela. Logo, a garota se precipitou.

 

— Deixe-me começar de novo. Meu nome é América O’Connor e eu sou Viajante do Tempo como você. Eu vim te conhecer porque meu avô sempre te amou mas vocês nunca ficaram juntos e ele manteve isso em segredo.

 

Olívia encarou a menina e seus pensamentos divagaram tentando ligar os pontos. Como assim, viajante do tempo? Ela nunca conhecera ninguém antes que o fosse.

 

— Se não acredita olhe minhas roupas. - disse ela ficando de pé.

 

Blusa branca do Guns & Roses e um short jeans e sandálias Havaianas com a bandeira do Brasil.

 

— Você continua tão Viajante do Tempo que você nem notou que ando com roupas de 2018.

 

Olívia não havia notado que ela estava bastante ela mesma de 2016 e se qualquer pessoa usar uma roupa de 2016, ela nem notaria a pessoa “fora do padrão anos 50”.

 

— Eu estou … - disse Olívia tentando encontrar as palavras

 

— Plasma? Perprecta? É minha vizinha quem fala assim.

 

— Perprecta. – respondeu rindo de nervoso.

 

— A questão é que eu realmente queria conhecer você, porque somos iguais e também… Cara! Meu avô tem um amor secreto por uma Viajante do Tempo. Isso é incrível!!

 

— E o que eu posso fazer por você, América? Neste tempo aqui, nós não estamos mais juntos.

 

— É,ele tá com minha avó Glória. Ele é Lindão, né? Eu entendo você se apaixonar por ele porque até eu que tenho coração de pedra teria caído. Na verdade, não quero te atrapalhar mas eu sou sua fã depois de saber sobre você dois e virei mais ainda depois que soube que você esteve na guerra.

 

— Oh, que lindinha! Obrigada. Quanto anos você tem América?

 

— 28 e você? Tá com quantos anos agora?

 

— Ãhm? Meu Deus, eu achei que você tinha 15 anos. Você é tão pequena e com essa cara de criança,você não tem nada de 28. Você está mentindo?

 

— Jamais! Nasci em 1989 e neste exato momento tenho 28 anos. E sim, eu pareço adolescente porque viajar no tempo me deixa mais jovem e também ,como diz minha mãe, eu não uso roupa de gente adulta e as pessoas acham que sou adolescente. Principalmente quando uso camiseta do Batman ou do Capitão América e ando pela rua pra que todo mundo veja meu Fandom.

 

Olívia deu uma risada pela identificação do termo.

 

— Sim, eu entendo perfeitamente em Gênero,Número e Grau sua situação. Aceita um café?

 

— Tava demorando! - ela pulou do sofá.

 

— Como vão as coisas em 2018?

 

— Uma bosta, como você já deve saber. Que ano era quando você veio pra cá?

 

— Era 2017.

 

— A única coisa boa foi que Donald Trump ganhou as eleições e a putada comunista está rasgando a bunda de raiva. Promoveram um Gritaço contra Trump: gritavam pela ruas para demonstrar insatisfação. Chega dá gosto de ver o ódio e o ranger de dentes.

 

Olívia gargalhou e quase derramou o café.

 

— Onde você morava antes de vir pra cá?

 

— Eu era bibliotecária em Charlottesville, na Vírgínia.

 

América virou a xícara e depois fez uma careta.

 

— Arghh! Erc! Cadê o açúcar?

 

— Ai, me perdoe! Eu não tomo açúcar. Mas tem um pouco na geladeira. - Olívia levantou-se e trouxe um saco de açúcar gelado e uma colher.

 

— Obrigada. - ainda fazendo careta pelo gosto amargoso do café. - E como você faz pra viajar no tempo ?

 

— Eu me concentro para o lugar que quero ir e eu sinto uma força vindo de dentro pra fora que me leva pra lá. E você?

 

— Eu abro portais.

 

— Jura?

— Sim. Veja só.

 

América desenhou um quadrado no ar e logo um portal com muita luz se abriu.

 

— Mostre-me a Estátua de Abraham Linconl em Washington,DC.

 

Logo, a imagem da praça em tempo real apareceu. Olívia que estava sentada de frente para América, levantou-se e ficou a seu lado para ver melhor a cena. Da posição anterior, ela podia ver a cena invertida.

 

— Agora mostre-me a imagem da Estátua de Abraham Linconl em Chicago, Illinois.

 

E assim aconteceu.

 

— Esta é minha favorita, ela é chamada de The Man. Uma vez viajei no tempo para conhecer o Abraham Linconl. Ele é tão lindo... - ela suspirava enquanto mexia a colher no café -dava até vontade de roubar um beijo dele mas ele é alto demais… sou apaixonada por ele. É estranho falar isso? Muito nerd, né ?

 

— Eu não acredito que você conheceu ele. Você viu o General Ulysses Grant ? Aquilo sim que era um ruivo.

 

— Não o vi naquela época, vi depois. Mas tinha muita gente feia na época que… - interrompeu a si mesma com uma colher de café na boca provando se o café estava no ponto.

 

— Será que me impediriam de ver o AB se eu estivesse com você lá? Ou quem sabe eu seria considerada uma terrorista por agarrar General Grant.

 

— Não! Se você fosse comigo, eu diria que você era uma prima francesa e rica. Ele iam te respeitar porque esse povo respeitava gente rica,mas o senhor Linconl ia te receber bem mesmo que fosse pobre. Já o senhor Grant, certamente ele ia adorar ser agarrado por uma terrorista como você mas já não posso dizer o mesmo da senhora Grant que apesar de vesga se garantia na mão com outra mulher. Mas voltando ao assunto, sempre que quero ir para algum lugar eu procuro aqui nesta janela e depois entro.

 

— E como é sua vida lá ?

 

— Com o sr. Linconl?

 

— Não, em 2018.

 

— Ah… eu moro em Londres e trabalho como dubladora de personagem de videogame e desenhos. Houve um BUM de jogos ao estilo League of Legends para celular e aumentou muito a demanda de dubladores de vários idiomas. E também escrevo Otomes.

 

— Otome?

 

— É um gênero japonês de jogo de romance. Eu escrevo histórias interativas porém com aquela pegada japonesa, sul coreana, sabe?

 

— Tipo Fanfic Interativa?

 

— Isso! Você gosta?

 

— De Fanfic Interativa? Li todas onde o Batman era meu namorado. E como era sua vida com o Sr. Linconl?

 

América suspirou de novo.

 

— Por onde começo? Eu cheguei lá quando Ullyses Grant era presidente e o Imperador do Brasil estava visitando os Estados Unidos. Ai voltei alguns anos e…

 

— Você estava vestida para a época?

 

—Mais claro,oras! Uma boa jogadora de RPG está pronta para qualquer linha do tempo. Eu fui por que eu amo aquele Livro a Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça e aquele ambiente maravilhoso de coisa puritanos, cabana, carroças...

 

— Aquele livro é..

 

—Eu sei, horroroso e a versão do Johnny Depp é muito melhor que o livro,eu sei,você sabe, toda a América sabe. Mas eu tenho gostos estranhos, me julgue. Mas aí, eu voltei alguns anos e cheguei bem no ínicio da guerra. O conheci em um baile e dias depois levei uma cesta de milho pra ele.

 

— Eu não entendi a parte do milho. Isso é alguma gíria?

 

— Não, eu levei uma cesta de milho mesmo. A minha vizinha é alemã, a Dona Gertrudes aquela que fala “perprecta”, e ela planta milho, batata e inhame uma raiz brasileira que a nora dela trás de São Paulo. Ai eu pensei: vou pegar estes milhos que ela me deu e levar pro presidente. No dia do baile onde eu o conheci eu queria muito dançar com ele mas tive muita vergonha e dancei com aquele povo feio do Partido Republicano mas se é conservador a gente honra né? Ai dancei e falei de mim pra que eles falassem de mim pro Presidente e perguntei se eu podia levar uma frutinhas pra ele que colhi lá na Austrália. Eu disse que meu nome era Daenerys Targaryen.

 

Olívia a encarou por uns segundos e explodiu em gargalhadas.

 

— Vá se foder que você não fez isso!

 

— Fiz sim. Daenerys Targaryen O’Connor filha de Aerys O’Connor da Irlanda.

 

Olívia achou que ia urinar nas calças de tanto rir. Seu rosto estava vermelho e ela chorava por causa da crise.

 

— E o que o Presidente disse?

 

— Ele disse: “Muito prazer senhorita Targaryen. Seus sabugos de Milhos parecem deliciosos.”

 

— Ai Jesus, eu to passando mal. Ai meu Deus, América, o que a gente não faz por causa de Crush!

 

— Você entendeu minha situação: Meu Crush, Meu Presidente.

 

— Eu e você sofremos da doença do Gado.

 

— Doença do Gado? Gado… - disse ela tentando puxar da memória algo sobre o termo.

 

—É passar vergonha no débito ou no crédito por causa de homem bonito.

 

Dezembro de 1956

 

Faltava 1 semana pro Natal e Olívia estava fazendo os últimos ajustes do vestido de noiva que era semelhante ao de Grace Kelly, com alguns cortes na saia pra não fica tão na cara. Depois da última prova, ela e Lúcia saíram para almoçar numa churrascaria com a melhor Barbecue da cidade.

— Você já comprou suas roupas de Lua-de-Mel? - perguntou Lúcia

 

— Ainda não parei pra pensar. Que roupa precisa comprar? Eu estava pensando em ir com um vestido normal porque Gene quer viajar para a França.

 

— Não,mulher. Eu estou falando da roupa de baixo e da camisola.

 

Olívia a olhou confusa.

 

— Ué, precisa?

 

— Liv, você não vai usar uma camiseta e um short e uma calcinha rasgada não, né ?

 

Olívia riu.

 

— Não parei pra pensar nisso. E também… eu nunca comprei roupas de baixo além do básico. - disse ela disfarçando o desconforto do assunto que ela sempre sabe onde acaba.

 

— O que seria de você se não fosse eu por aqui. Depois do almoço,nós iremos comprar roupas de baixo e…

— Não! Não vai dar. Gene disse que queria que eu levasse minhas caixas de livros e roupa pra casa dele. Mas eu prometo a você que amanhã eu vou comprar.

 

— E quero ver estas tais roupas de baixo. Agora me apareça com 10 livros e uma calcinha viu, dona Olivia?!

 

Olívia respirou aliviada,pois odiava comprar calcinha e soutien e qualquer coisa intima com alguém. Não deixava nem a mãe tocar em suas calcinhas. Era verdade que Gene queria levar as coisas dela e ela estava com preguiça de fazer tal mudança hoje mas já mudou de ideia diante da situação constrangedora. Constrangedor também estava sendo as orações que Olivia andava fazendo a Deus por causa das grandes provações as quais Gene a estava submetendo. Gene deixou claro várias vezes que estava muito a fim de avançar o sinal vermelho e já até cogitou que morassem juntos de uma vez e depois casavam. Ela por vezes era assaltada com o desejo de ceder e fazer o que “todo mundo faz” porém ela “não era todo mundo” e faria o que ela acreditava ser o certo: esperar o tempo. Contou com a ajuda de sua futura sogra que já deixou claro para Gene que eram católicos e que ele não iria morar junto com ninguém.

 

Sobre a família de Gene, seu pai James havia morrido em Janeiro do ano corrente e somente sua mãe Harriet e 2 dos seus irmãos, Louise e Fred, conheceram Olívia. Louise era uma fofura e como a mais nova das mulheres ( ela era a 4º) era bastante apegada a Gene assim como Fred o mais novo dos homens (o 5º) com quem dançou em um filme chamado Deep In My Heart de 1954. Fred era muito peculiar porque parecia com Gene mas a voz e a risada eram mais grossas, altas e ninguém falava como ele na família, tornando-o único. Eles a aceitaram de braços abertos como se fosse a primeira esposa de Gene e ela sentiu grande leveza no ambiente familiar dele.

 

Hoje, Olívia levaria seus livros e uma mala com roupas que ela sabia que não usaria e algumas de suas maquiagens. Quando Gene chegou, ela o ajudou a carregar as coisas para o carro e quando entrou,começou a orar o Salmo 91 mentalmente: ela estava morrendo de saudades dele, do seu cheiro, de sua presença. Ele estivera em Nova York por 2 semanas e até o som de sua voz a deixava estranhamente feliz. Tinha que orar bastante.

 

— Encontrei Marilyn e o Arthur e ela disse que gostaria de conhecer você.

 

— A Marilyn? - Olívia o olhou surpresa

 

— Sim, ela sabe que vamos nos casar e disse que gostaria de te conhecer quando a gente fosse a New York depois da Lua-de-Mel.

 

Seria isso um sinal de Deus? Olívia colocou em seu coração que tentaria não se envolver com a vida dela depois de ter fracassado com James Dean mas parece que o destino a colocava dentro das situações.

 

— Iremos.

 

— E o que você fez enquanto estive fora?

 

— Fiz a prova do vestido, almocei com a Lúcia. Ela disse que a cunhada tem um Dálmata que vai ter filhotes e perguntou se você gostaria de um.

 

— Dálmata? Faz muito tempo que não vejo esta raça. Pode ser...você gosta de cachorro?

 

— Você gosta?

 

— Gosto.

 

—Eu gosto,também.

 

— Só gosta se eu gostar?

 

— Só pra garantir que você não vai ser obrigado a conviver com animais inconvenientes por amor de mim.

 

— Sabe que animal eu não quero em casa quando casarmos?

 

— Qual?

 

—Aquele seu shortinho jeans.

 

Olívia riu maliciosamente. O único que gostava daquele short era Donald.

 

— Vamos ver o que posso fazer com ele.

 

— Pode me entregar que eu sei o que fazer com ele. - disse Gene

 

Até Buster Keaton havia dito que se casasse com ela o seu “Short James” (ele não sabia falar Jeans) seria proibido em casa ou em qualquer lugar. E ainda falando em constrangimento, vamos adiantar para o dia seguinte quando ela tomou coragem e foi comprar lingeries para a Lua- de- Mel.

 

Olívia sempre fora muito fechada quando o assunto era sexo, lingeries,depilação intima e etc. Não tinha nada a ver com a sua criação familiar mas com quem ela era: era da sua personalidade limitar as coisas. Certa vez no último ano do colegial, um rapaz chamado Cedric disse que se ela quisesse casaria com ela e financiaria uma casa para eles: ela tinha 16 e ele 18. Ela achava-o bonito mas nunca cogitou um relacionamento porque ela queria muito entrar na Universidade e nada poderia atrapalhar seus planos, muito menos homem bonito. Semanas mais tarde,ela estava em uma loja comprando calcinhas quando sincronizadamente Cedric passou por ela no momento em que a atendente disse: “Esta calcinha esta boa pra você ? E esse soutien? Você não tem quase peito nenhum, acho que dá” Levantou na altura do rosto de Olívia para que ficassem bem à mostra. Não bastava não ter “peito nenhum” ainda tinha que ficar com a calcinha exposta na frente de todo mundo e de Cedric: ela só queria um buraco e se enfiar nele.

 

Agora, nossa heroína tem que ir comprar lingeries de mulheres casadas, ou seja lingerie para fazer sexo o que implica dizer que todo mundo vai saber para quê ela vai comprar aquelas lingeries portanto, ela não quer ir. Mas irá.

A loja Folie era a mais famosa e mais cara para se comprar Lingerie mas era a única que era da confiança das mulheres: não rasgava fácil,era antialérgica e não marcava na roupa. Ainda no carro alugado que em breve entregaria, ela olhou bem a loja e olhou ao redor para saber se ninguém conhecido estava lá. Desligou a rádio e saiu do carro com um lenço na cabeça e um óculos escuros pra ninguém reconhecê-la. A loja estava consideravelmente vazia, apenas algumas mulheres com fitas métricas, impecavelmente maquiadas e com o cabelo no Fixador Capilar tipo 3 para garantir que nada o moverá do lugar.

 

A mulher que a atendera lhe mostrou conjuntos de lingeries, meias calças e lingeries do dia-a-dia além de vestidos que são usadas por baixo de vestidos que não permitem que a lingerie marque. Olívia passou o cheque que Gene deixara assinado e pediu a nota de compra para entregar a ele. Tudo levou duas horas e Olívia estava muito aliviada ao saber que não precisaria passar nenhum vexame ou perguntas indiscretas. Ela correu pro carro e dirigiu o mais rápido possível: vai que encontra alguém na rua e pede pra ver as Lingeries? Quando a dia vai muito bem, sempre presuma que o pior pode acontecer.

 

 

Novembro de 1956

 

 

— Então quer dizer que você fisgou o gostoso do Gene Kelly.

 

América estava sentada na cama de Olívia, usando seus batons e também vasculhando seus vestidos enquanto esta tomava banho.

 

— Eu fui fisgada na verdade. - dissera Olívia de molho na banheira e lavando suas roupas íntimas ao mesmo tempo para jogar na secadora. - Ele sabia do seu avô e deixou claro que não queria ele entre nós dois.

 

—Ele disse isso?

 

—Não falou com essas palavras, apenas quis saber a quanto tempo não nos víamos e se eu ainda me encontrava com ele e se tinha esperanças de voltar.

 

— Você acha que ele tem ciúmes?

 

— Tem.

 

— Meu avô te ligou depois que você ficou noiva?

 

— A gente se encontrou sem querer em um restaurante porque temos um amigo em comum e evitei tocar no assunto e ele estava recém-casado com sua avó.

 

— Ele nunca te superou na verdade.

 

Olívia fez silêncio. E Glória? Ela foi humilhada por causa de um “amor não concretizado?”

 

— E sua avó? Ela sabe disso?

 

— Acho que ela sabia que houve algo entre vocês mas não acho que tão profundamente. Meu avô deixou um diário e falava de você o tempo todo. Quer ler?

 

Olívia rapidamente saiu da banheira e se vestiu com seu roupão amarelo e branco.

 

—Você está com ele ai?

 

— Estou com ele no meu hotel.

 

— Você pode usar o meu carro pra ir e buscar e também preciso que você faça um favor pra mim quando voltar para 2018.

 

Olívia se ajoelhou e tirou uma mala velha debaixo da cama.

 

— Preciso que você se livre do meu computador e meu celular.

 

Olívia fez uma torta salgada de carne moída e queijo,suco de abacaxi e claro, aquele cafezinho. Ela estava muito surpresa com a dádiva de ter sido descoberta por América. Seria um presente de Deus pra ela? O que mais poderia aproveitar deste encontro porque havia muito a ser dito e ao mesmo tempo tantas coisas ela não queria saber por medo de tentar rearranjar e dar errado. E este diário? Ela queria muito saber o que ela realmente significou para ele. Será que seus filhos também seriam viajante do tempo? Depois de umas 4 horas desde o último encontro, América apareceu: não porque o hotel era longe mas ela tinha umas outras coisas a resolver e também tinha que mudar de roupa porque já estava cheirando a cachorro.

 

América trouxera sua mochila com seu computador, Iphone,tablet, agenda e um estômago vazio que foi satisfeito na torta salgada enquanto lia o diário de viagens de Olívia e Olívia, o diário de Donald.

 

—Meu pai encontrou quando foram vender as coisas dele em um Bazar e escondeu e ficou com ele. Meu avô nunca comentou sobre nada disso com ele antes ou com meus tios.

 

Um caderno grande de capa dura,preta,folhas amareladas, típicas de um caderno de escola de 1950. A avó dela tinha um daquele onde escrevia suas receitas de bolo.

 

 

 

09 de Março de 1954

 

Acho que cometi um grande erro. Minha Sunflower não está comigo e tenho que voltar para o viciante jogo das aparências onde estou muito bem e nada me falta. Eu preciso me manter no controle e me controlar mas tenho falhado cada dia. Estou miserável e Deus sabe disso.

 

Sonhei com ela, que voltava para mim e hoje é seu aniversário. Por onde anda?

 

 

 

 

22 de Abril de 1954

 

J. me falou que eu deveria sair com a Pier Angeli e nós demos umas voltas pela cidade, restaurantes e aparecemos em uma festa pós- filme. Uma boa menina mas a gente não se bica. Saudades de quando Olívia e eu nos amávamos às escondidas. Cada festa que íamos ou cada encontro era salpicado de boas lembranças, diversão real e a espera de ficar a sós. Nunca mais fui um homem vivo desde que desisti dela.

 

 

1 de Maio de 1954

 

Donna veio passar o dia comigo. Fomos ao parque. Nossa música (Sunflower e eu) tocou no mesmo parque em que batemos estas fotos que guardei com carinho.

 

Setembro de 1955

 

Sunflower esteve envolvida em um acidente e eu recebei uma ligação de que ela estava em um hospital. A MGM pediu que eu acobertasse com urgência.Ela estava tão linda e o namorado dela morreu no acidente que ela estava.Eu acabei de trazê-la para casa.

 

Novembro de 1955

 

Eu a deixei ir mas ela não saiu de dentro de mim.

 

20/21 de novembro de 1959

 

Eu a vi de novo e a desprezei em meu coração. O Marido dela estava comigo e também minha esposa.

 

 

 

Olívia viu vários trechos escritos sobre ela, saudades, fotos deles juntos e anotações de pessoas com quem ele não deveria ter contrato assinado. Nenhuma linha sobre Glória, até que chegou o ano de 1961 e um grande texto.

 

 

 

Meu querido filho.

 

Você nasceu,finalmente.

 

Eu não sei se vou ser para você melhor do que fui pra sua irmã e nem sei se mudei para melhor,mas espero que um dia você encontre este diário porque tenho certeza que, por eu ser péssimo com palavras, nunca sentaremos e falaremos sobre mulheres. Eu cometi um erro no passado casando-me por emoção e por isso me divorciei. Não a tratei como deveria e me deixei levar por vícios e muito trabalho.

 

Minha vida foi só trabalho e nunca passei um dia se quer com ninguém de minha família sem estar rodeado de trabalho, até que conheci alguém que me fez fugir do trabalho só para estar com ela e não foi sua mãe.

 

Anos antes de conhecer sua mãe, conheci alguém que chamarei de Sunflower pois estas eram suas flores favoritas. Sunflower não queria nada meu: nem fama, nem dinheiro, nem prestígio. Ela só queria meu coração e eu só dei metade dele,a mesma metade que dei para minha primeira esposa. Ela nunca quis nada meu,apenas meu coração. Eu estava na flor da juventude e assim também ela: nós nos encontrávamos às escondidas porque meu status deveria ser impecável em Hollywood mas muitas vezes eu queria que o mundo se explodisse assim como minha reputação. Eu virei um adolescente em suas mãos e me vi em um dilema onde eu poderia perder tudo,inclusive minha fortuna tão suada se descobrissem que eu estava com ela. Parece até filme de romance onde a mocinha pobre não pode se casar como rico que está prometido a outra,não é ? Mas foi real e eu simplesmente a afastei de mim por medo.

 

Eu me sentia uma fraude a cada dia após tê-la rejeitado.

 

Quando me divorciei após 10 anos de casamento, a tristeza me consumiu mais uma vez até que eu a vi de novo. Fui correndo atrás dela e nem me passou pela cabeça pedir perdão por ter sido um covarde e imbecil. Sempre me perguntei se eu teria condições de ter mudado para melhor só para fazê-la feliz. Eu sofria de alcoolismo e eu dizia a ela que não pararia de beber por ela nem por ninguém. Eu a feri muito com palavras por causa de meu ego masculino e Deus sabe que desejaria ter voltado no tempo para ter dito que iria tentar. Eu sei que se eu não mudasse, eu não a faria feliz por que eu era o problema.

 

Eu tive que deixá-la ir de novo porque eu não estava pronto pra mudar mas hoje vejo que eu nem se quer quis tentar. Ela nunca falou nada contra mim, nada enquanto eu a feria e fazia dela minha tábua de jogar dardos.

 

Eu quera te aconselhar a nunca ser rude com uma mulher, especialmente aquela que você ama. Aliás, não seja rude nem com seus amigos: se eles dizem que existe algo errado com você,seja humilde o suficiente para tentar ver se não existe verdade em suas palavras. Se você tiver a infelicidade de ter algum vício,como eu tive, procure ajuda e não destrua sua família por nada.

 

Nos mais, a vida é dura então seja sempre honesto o máximo possível e viva uma vida longe da fama. Trabalhe com qualquer coisa menos com fama.

 

Me perdoe de agora se eu não for o pai que você precisa.

 

 

 

As páginas seguintes eram conselhos sobre emprego, estudos e como não criar os filhos. Algumas página dos anos 70 e 80 estavam rasgadas e ela imaginou que o filho deva ter arrancado.

 

— América, o que aconteceu em 20 de novembro de 1959?

 

— Gene Kelly fechou contrato para ter um show dele na Televisão, The Gene Kelly Show e não sei o que aconteceu nos bastidores mas você apareceu em um quadro dançando com ele e com meu avô. Foi sua primeira estréia como senhora Kelly e vocês três estavam juntos e eu achei incrível. Eu assisti o show mais de 100 vezes. Nasci 40 anos depois dessa estréia magnífica.

 

— Foi tão bom assim?

 

— Foi no meu aniversário que vocês três estrearam na televisão. Nasci em 21 de Novembro de 1989 e eu particularmente não acredito em coincidências, sabe! Não vou entrar em detalhes mas tenho 3 fotos da apresentação que eu acho lindas.

 

América abriu uma pasta amarela e entregou três fotos grandes. Uma colorida e duas pretas e brancas. A primeira foto de rosto dos 3 cantado,ela estava de azul e ainda jovem. A segunda foto era os 3 dançando e seu vestido era branco e a ultima foto era um close dela nos braços de Gene Kelly.

 

— O que estava acontecendo aqui entre mim e Gene? - Ela virou a foto para América

 

— Vocês estavam dançando Shall We Dance do filme O Rei e Eu da Debora Kerr e Yul Brynner.

 

— O que as pessoas disseram?

 

— Que vocês eram lindos juntos e que Gene encontrou a mulher certa pra ele. Eu particularmente acho que Gene é o homem certo pra você.

 

Olívia estava muito espantada com aquela revelação, mais do que com qualquer outra. Ela havia falado para Gene que não pretendia seguir carreira e que nem dançaria ou faria peças de teatro, que não gostaria de aparecer na televisão e no entanto,ali estava ela e estava formidável. Gene Kelly a fizera muito bem, mesmo.

 

— Mas essa nem foi a treta maior. - disse América colocando café no mesmo copo que estivera o suco de abacaxi.

 

— Nossa, e teve treta?

 

— Dean Martin te chamou pra cantar You’re Nobody Until Somebody Loves You e Things ao vivo no programa dele naquele ano e ele,você sabe né, bebe muito, tem mão boba e é muito mulherengo além de charmoso. Bom, ele te beijou ao vivo e não sei o Gene Kelly mas a mulher dele quebrou o pau naquela mesma noite que deu polícia e tudo. Mas não foi culpa sua não,apesar dele sempre te beijar perto da sua boca, ele tinha amantes. Depois ele ainda chamou o Gene pro show dele.

 

Ambas riram.

 

—É minha filha, Dean Martin é italiano raiz: cumprimenta as esposas alheias com um beijo e chama o marido pra jogar cartas.

 

— Voce leu a carta que ele me mandou em 1955? - perguntou Olívia entregando as fotos para América junto do Diário dele.

 

— Li e estou certa que meu avô não iria te fazer feliz nunca. Vocês são muito diferentes Olívia e ele não é esse fofo que sempre mostrou apesar de ser realmente um homem muito bonito. Meu pai tem muita mágoa dele por ele ter sido distante,fechado e viver trabalhado. Sem contar que ele caiu de novo no álcool e minha vó foi embora de casa. Meu pai dizia que ele dava vexame e que foram anos muito difíceis para eles.

 

— Eu imaginei que ele continuaria nessa vida e com outros vícios também que eram muito abafados na época.

 

América guardou as suas pesquisas com um certo pesar pois ela era muito próxima do pai e ficava dividida entre ter raiva do avô e ao mesmo tempo sentir pena.

 

— Eu conversei com ele sobre bebida. - disse ela sem tirar o olhos da sua mochila – eu trabalhei pro Donald levando o cachorro dele pra passear e falei como minha vida era triste já que meu pai era alcoólatra e falei tudo o que meu pai viveu como se eu estivesse vivendo. Eu senti que ele ficou desconfortável e apenas disse: “Nós homens ficamos burros com o passar do tempo, minha filha. Tenha paciência com seu pai.”

 

— Donald tem uma mania horrível de passar pano pra coisa errada. - Olíva revirou os olhos e levantou-se do sofá e andou até a cozinha. - Não esqueça de sumir com esse computador daqui.

 

— Posso ficar com ele?

 

— Pode. Não vou poder usar mesmo.

 

Olívia serviu-se de café e sentou-se na mesa e seus olhos ficaram presos em uma pasta com o nome Chester Bennington.

 

— Você está investigando a morte dele?

 

— Você sabe de alguma coisa?

 

— Apenas desconfio que ele foi morto.

 

— Ele foi morto! - América respirou fundo – E eu o amava muito.

 

Olívia ficou sem entender aquela afirmação.

 

— Você quer dizer que era fã?

 

— Não, eu o amava. Eu trabalhava na animação dos vídeos do Linkin Park e eu tinha tanto prazer em estar com ele. Às escondidas, como você e Donald. Ele não se matou, ele ia denunciar uma grande rede de pedofilia e ele foi morto dois meses depois de Chris Cornell, seu melhor amigo.

 

América sentou na cadeira da mesa e olhou firmemente para Olívia.

 

— Eu sei que você deve estra escrevendo um livro sobre a pedofilia e prostituição em Hollywood e que você pediu para que fosse publicado depois da sua morte, não é assim?

 

—Sim!

 

— O seu livro vai causar grande desconforto mas todos vão soprar seu nome de novo quando vier à tona uma história chamada Adrenochrome.

 

América abriu a pasta com o nome de Chester e tirou um papel com um artigo científico.

 

— A têndencia de Hollywood é ficar Forever Young e pra isso eles fazem o que chamamos de A Colheita de Sangue. Ele usam sangue de criança para ficarem jovens e isso nem é tudo, eles usam para se drogar também mas eles extraem as substâncias do sangue das crianças e ficam bem chapados. Tudo isso é uma rede de pedofilia e tem muito artista e apresentador de Hollywood que está envolvido até a alma. Tudo isso o Chester e Chris iam entregar e ambos foram assassinados da mesma forma. Eu tive acesso ao Laudo da Pericia do Chester e vi muita coisa errada como por exemplo: Um legista chegou na casa dele e outro legista fez a autópsia e no Laudo diz que ele chegou sem as roupas e já estava limpo na mesa do legista.

 

— Manipulado.

 

— Exato.

 

— E como vocês se conheceram?

 

— Bom...- América estava arrumando a pasta e tentando escolher bem as palavras. - eu tinha 15 anos quando o conheci e ele estava divorciado. Meu primo trabalhava pra ele fazendo arranjos e um dia me levou pro estúdio pra ajudar a montar os equipamentos dele

— E você ficaram?

 

— Por ai.

 

— Mas ele tinha quantos anos nessa época?

 

— Mais de 25 anos. E também, parece que ele tinha uma outra e por isso o casamento havia acabado mas ele sempre ligava pra mim mesmo assim. Depois ele casou no mesmo ano com outra e eu segui a vida. Eu o amava de verdade e isso não tinha nada a ver com ser fã porque eu nem sabia nada de Rock, eu gostava de Spice Girls. Quando eu completei 20 anos eu comecei a trabalhar com artes gráficas e videogames em Londres e ele ligou pra mim quando foi para Londres e me chamou para sair. Eu aceitei na hora e ele me deu um emprego pra trabalhar pra banda junto do Mike Shinoda e de uma turma de japoneses que fazia as animações. Nós dois juntos eramos incríveis e ele me levou pra conhecer a Talinda e os filhos dele uma vez, quando estive na Califórnia. Ele deveria ter ligado pra mim quando se viu em problemas.

 

— Ele não faria isso porque você morreria com ele.

 

— Ele morreu sozinho e todos disseram que foi a depressão. Eu não consegui encarar o enterro dele,aquele show de artistas cantando no enterro . Acho tudo ridículo e fingido.

 

— E escroto.

 

— Tem uns artistas que foram abusados sexualmente nos anos 80 e estão cuspindo tudo. Estou por debaixo dos panos ajudando eles então por favor,continue escrevendo sobre o quão podre é Hollywood.

 

Ela tocou a mão de América e apertou carinhosamente.

 

— Eu sinto muito você ter perdido o Chester desta forma.

 

— E eu sinto muito por você ter perdido o James Dean.

 

América passou 7 dias visitando Olívia e num destes dias ela conheceu Gene. Ela estava com o computador ligado digitando algo quando ele chegou e ela estava muito feliz de conhecê-lo e ele estava curioso quando aquela máquina de escrever interessante chamada Notebook. Olívia dissera que ela era a filha da vizinha que ficou trancada fora de casa e estava passando um tempo até a mãe chegar.

 

 

Natal

 

Já havia se passado algumas semanas da ida de América pra sua vida normal e Olívia estava se recuperando do choque de informações e revelações. Gene começou a insistir que ela se mudasse para a casa dele antes do Ano Novo para que em Janeiro eles pudessem casar e viajar para a Lua-De-Mel direto da casa deles. Olívia impôs a condição de dormirem em quartos separados e ele aceitou à contra-gosto. Ela passou o Natal com a família dele, onde conhecera os outros irmãos e os futuros sobrinhos.

 

 

03 de Janeiro de 1957

 

Olívia e Gene finalmente trocaram alianças pela manhã em uma igreja Católica local que aceitou fazer vista grossa para o fato de que Olívia era protestante e filha de Judeu. Eles concordaram que não dariam festa alguma mas que logo após o casamento viajariam para a França por que Gene estava “Ansioso para ver como as coisas estavam por lá”.

 

Nossa heroína teve um final feliz que tanto buscoue encontrou seu propósito que seria cuidar da família que estava por vir. Mas isso é só uma parte das muitas águas que vão rolar por debaixo desta ponte.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espera que o Volume 3 está chegando.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Contos de Uma Viajante do Tempo Spinoff - 1" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.