She Used To Love Me a Lot escrita por Minerva Lestrange


Capítulo 5
She looked lonely and I knew the cure




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ATO X

Lentamente, Draco empurrou a antiga porta de madeira, praguejando que as dobradiças rangessem um pouco, antes de pisar no último degrau da escada de pedra para entrar na Torre de Astronomia.

Como o esperado, o frio ali era quase insuportável, apesar do casaco pesado que usava. Já nevava nos terrenos de Hogwarts e quase poderia afirmar que uma tempestade cairia em poucos minutos a julgar pela precipitação cada vez mais pesada. Porém, assim que fechou a porta, como que deixando o castelo para trás, e colocou os olhos no telescópio principal logo no centro sua mente imediatamente se desligou do clima.

Fazia quase dois anos, desde a última vez que pisara ali. E não sabia porquê decidira voltar, mas lá estava Draco, rodeando lentamente o objeto antigo e de aparência pesada. A forma com que os acontecimentos daquela noite voltavam repentina e incomodamente era como mergulhar numa Penseira fria, repleta de remorso e amargura.

Por mais que não tivesse matado o Diretor, recordava perfeitamente como o Avada Kedavra de Snape atingiu diretamente o peito dele, arremessando-o por uma das enormes janelas. Fora seca e linear, a maneira como o Professor pronunciou a Maldição e, do mesmo jeito, o outro recebeu. Não foi até semanas depois que percebeu como o último não parecia surpreso e nem tentou se defender, apesar de muito mais poderoso que Snape.

Draco se perguntava se tentaria, se imaginasse que teria coragem de pronunciar a Maldição. No entanto, sua varinha era trêmula demais, a postura incerta o denunciava e a vontade apenas dúbia. Ele precisava matá-lo, por tudo o que isso representaria à sua família, seja lá o que fosse aquela abstração que o Lorde prometia, mas não conseguiria, ambos sabiam.

Apertando os lábios, se dirigiu a janela marcada tentando enxergar lá embaixo o lugar onde Dumbledore provavelmente caíra. Ouvira dizer que os estudantes se reuniram ao redor do que deveria ter sido a macabra cena e depois levantaram suas varinhas em honra ao Diretor. Tentou se lembrar há quanto tempo não levantava a própria varinha em nome de alguém e o que isso poderia significar.

‘Ao menos não levantara por um Comensal da Morte’, considerou apoiando os cotovelos no parapeito da janela, sentindo o vento frio e quase anestesiante contra o rosto, ‘nenhum deles’.

— Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha de volta para você. – Ouviu a voz baixa às suas costas e se virou para localizar Granger próxima à porta, bem agasalhada para o frio, as mãos atrás das costas e o broche de Monitora-Chefe reluzindo sobre o uniforme, dando de ombros quando Draco franziu o cenho. – É de um autor trouxa.

— Ele também disse que ‘aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não tornar-se também um monstro’. – A viu levantar as sobrancelhas, surpresa, e deu as costas à garota, se voltando a posição inicial junto à janela, mais concentrado na escuridão. – Eu não sou um estúpido, Granger.

Então, a sentiu se aproximar com cautela, se posicionando a uma distância confortável, mais próxima da parede de pedra, tentando se esconder do frio ao qual ele se expunha.

— O toque de recolher já passou há muito tempo. – Granger disse quando o silêncio se instalou. Não queria realmente conversar, mas também não tinha o que falar com ela. – Está de detenção.

Não conseguiu evitar um sorriso irônico e, quando a olhou de relance, viu que ela havia sorrido também. Detenção, por mais que fosse uma droga, soava como alguma centelha de normalidade depois de tudo. O tom dela sem se alterar com ele, talvez não o fosse. Todavia, estranhamente, Granger e ele haviam adentrado uma espécie de convivência cautelosa quando se topavam. De repente, eram mais tácitos colegas do que antagonistas declarados e não sabia a que conclusão chegar sobre isso.

— Vai monitorar minha detenção? – Ela deu de ombros e Draco respirou fundo, estreitando os olhos para o nada. – Tenho a sensação de que está tentando passar mais tempo comigo. 

Uma provocação barata demais, disse a si mesmo, apenas por que não podia deixar passar. Era Granger ali, pelo menos haveria alguma reação digna de nota.

No entanto, a grifinória não se apressou em negar, mas, ao contrário, olhava o chão de braços cruzados parecendo pensativa. Draco arqueou a sobrancelha, estranhando o comportamento, especialmente quando ela saiu das sombras da parede e se colocou no rumo da janela, fechando os olhos para sentir a forte corrente de vento frio contra o rosto.

E, enquanto ela se mantinha ali, aparentemente tranquila de olhos fechados, pode analisar o perfil bonito feito pelo rosto bem delineado, os cílios compridos, lábios grossos e um nariz desenhado com uma curva, que se empinava arrogante, quase esnobe. Ela o era em relação a alguns assuntos, especialmente estudos e inteligência.

De repente, seus dedos coçaram para segurar o queixo fino ou, simplesmente, adentrar a massa de fios castanhos caindo soltos em cachos espessos pelas costas em detrimento da touca escura que a protegia até a nuca. Ali, onde deveria estar quente. No entanto, tão rápido quanto veio a sensação se fez, se dando conta do quão fora da curva era. Um átimo de segundo de um devaneio, que nunca tivera sobre ela.

—  Eu não sei, Malfoy. – Ela murmurou, ainda possivelmente concentrada no efeito anestésico do frio. – Eu vejo como todo mundo se esforça parecer que está bem, que tudo aquilo não foi... Uma droga. Não sei se quero fingir. Você não finge.

Draco evitou um suspiro irritado. Eles não eram iguais, não passaram pelas mesmas coisas, nem viviam consequências semelhantes. Granger tinha diversos amigos com quem poderia se abrir sobre como recomeçar a vida sobre um cemitério de corpos ao lado de pessoas que também perderam muito era uma droga. Porém, por algum motivo, lá estava a grifinória, compartilhando vulnerabilidade com o inimigo.  

— Não preciso fingir. Eu perdi a Guerra, Granger.

Ela franziu o cenho na direção para ele, os fios se acumulando em seu rosto com o movimento, processando seu ponto de vista até suspirar e se afastar da janela, sentando-se num dos bancos compridos próximos ao telescópio, os cotovelos nos joelhos e os dedos enluvados hesitantes.

— E como é? – Granger voltou a encará-lo. – Não ser o que esperam que seja? Finalmente, não ser a figura que todos esperam encontrar quando dizem seu nome?

Dessa vez, ele sorriu irônico, o olhar se perdendo novamente no telescópico, na lembrança, considerando o que ela considerava, inevitavelmente tentando se compreender sob o ponto de vista dela, que ainda esperava uma resposta possivelmente inexistente.

O peso do nome, da posição e de seus feitos, bons ou ruins, nunca deixaria de existir. Draco sempre seria o Comensal da Morte, Hermione Granger sempre seria a Heroína de Guerra e ambos lidariam com isso como poderiam, fingindo ou não.  

Meneando a cabeça enquanto brincava com a textura granulada da pedra grossa do parapeito, constatou como as questões e a espera de Granger se tornavam tão opressoras e incômodas quanto todo o resto da Torre de Astronomia. Então, se afastou da abertura e passou por ela em direção a saída.

— Quem disse que não sou?

ATO XI

— O que aconteceu?

Insistiu, quando Hermione apenas concordou com um inclinar simples de cabeça.

— Bem... A vida. Os anos passaram, nós mudamos. – Os dedos dela tocaram o lugar onde a aliança deveria estar. Suas expressões não eram pensativas nem cautelosas, apenas tranquilas. Talvez fosse um costume, um reflexo como o que perdera após a morte de Astoria. – Ron estava apaixonado por outra pessoa e eu...

Draco se inclinou interessada, mas a mulher apenas encarou a xícara de Café Irlandês já no fim e começou a fazer o pedido para outra rodada.

— Você...?

Hermione suspirou, dessa vez estreitando os olhos para ele sem cerimônias. Sabia o que Draco fazia, onde a instigação dele os levaria, ainda que não houvesse planejado ao abrir aquela porta minutos antes.

— Estava concentrada em outras coisas. – Os dedos, sempre incertos tanto quanto ansiosos, descobrira, brincaram com um fio da linha da própria blusa enquanto franzia o cenho como que para si mesma. – Sempre estive.

Ela forçou um sorriso agridoce e terminou a bebida.

Entretanto, os olhos castanhos sempre diziam absolutamente tudo. Desde que eram crianças, podia ver a raiva e o ressentimento infantil; depois, apenas desprezo mal disfarçado e, então, finalmente indiferença. De alguma maneira, entre o quinto e o sexto ano, a garota decidira simplesmente ignorá-lo: Draco não valia a pena.

Então, a certa altura, os olhos sempre expressivos, decidiram fazer uma concessão. Se lembrava perfeitamente da primeira vez que eles brilharam de um jeito diferente para ele e como aquilo o impactou imediatamente, fazendo com que quisesse imediatamente correr ao mesmo tempo em que queria explorar o que a grifinória o fazia sentir apenas com aquele olhar.

No entanto, ali, no Silver Spoon Café, o brilho era mais parecido com o que o assombrava, mais decepcionado e conformado com os caminhos tão facilmente tomados do que qualquer outra coisa, afinal ‘eles não podiam mesmo ir além do esperado’, dissera a ela, dissera a si mesmo, por todos aqueles anos.

Sentiu aquele aperto conhecido repuxando do estômago ao peito e se apoiou na mesa, se inclinando na direção dela para manter a conversa apenas entre eles. Sempre seria apenas entre eles.

— Sabe... Sempre pensei em como tudo poderia ser diferente. – O sorriso agridoce ainda estava ali, ainda que Hermione percorresse todo o seu rosto com os olhos, examinando de perto cada detalhe perdido no tempo, exatamente como fazia com ela. – Gostaria de ter um vira-tempo.

— O que faria com um vira-tempo? – Ela perguntou no mesmo tom.

— Eu tentaria fazer as coisas do jeito certo. Não a deixaria para trás... Como deixei.

Draco desejou descansar a testa contra a dela, apenas sentindo o perfume que nunca deixara sua memória, e alcançar o rosto macio com os dedos, mas não se atreveu. Então, mesmo que a visse engolir em seco em hesitação, Hermione moldou seu rosto com uma das mãos, o toque mais quente do que se lembrava, mas tão bem vindo quanto. O sorriso agridoce ainda estava ali, em meio aos olhos surpreendentemente marejados.

— Draco... – A viu murmurar baixinho, a voz madura e linear num tom ameno enquanto o dedo percorria o caminho invisível de sua mandíbula. – Sei que escolheria partir quantas vezes pudesse. Você precisava ir.

Queria começar em outro lugar, queria deixar tudo para trás – as pessoas, os olhares, suas escolhas e as consequências -, ainda que implicasse deixá-la. Não saberia o peso disso até muito mais tarde, quando notou que, não importasse quanto tempo passasse, o que sentia não desvaneceria.

Dessa vez, Draco sorriu agridoce.


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Notas finais do capítulo

alô alô!
Me deixe saber o que estão achando dos caminhos de She Used To Love Me A Lot ♥

até breve!



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