A biblioteca da escola pegou fogo! escrita por Fane


Capítulo 18
Balde de água fria




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Depois de conversar com Gabriel, passei a ter esperanças de que essa confusão pudesse ter um fim razoável. Então, decidi que seria interessante reunir a “equipe” para atualizá-los com as boas novas.

Então, durante àquela tarde mesmo, mandei uma mensagem para Emily e corri para a casa ao lado, ansiosa para dissertar sobre os novos planos.

Eu estava relativamente de bom humor, apesar de me sentir sobrecarregada. Eu nunca deveria ter colocado tantos problemas nas costas ao mesmo tempo, então ter a ajuda de Gabriel (alguém que com certeza tinha mais influência que eu) causava um certo alívio.

Assim que cheguei, cumprimentei seu Luiz, que estava tomando café (como sempre) e subi as escadas correndo, sentindo a adrenalina correr somente pelo fato de estar, estranhamente, otimista.

Infelizmente, por causa desse otimismo, eu não percebi que algo terrível estava para acontecer.

Como sempre, abri a porta do quarto de Dennis sem bater. Um grandíssimo erro.

Assim que entrei no quarto, quase começando a tagarelar sobre tudo o que havia acontecido, percebi que Dennis estava pelado.

Não totalmente, claro. Mas ele obviamente tinha acabado de sair do banho, estava com uma toalha enrolada na cintura e com o cabelo úmido caindo sobre o rosto, o que fazia ele parecer alguém totalmente diferente.

Mas isso não foi o pior. Depois que eu entrei e depois que Dennis se virou, assustado, ninguém mais disse nada ou se mexeu. Ficamos nos encarando, paralisados, como se qualquer movimento brusco pudesse fazer aquela situação ainda mais constrangedora.

E mesmo que ele estivesse seminu, não era isso que me preocupava. O fato mais assustador em Dennis era como o cabelo dele ficava bonito quando estava molhado. Em como as cortinas escuras emolduravam seu rosto — que, no momento, expressava pânico.

O diabinho no meu ombro voltou a aparecer depois de um longo tempo e me disse para continuar ali, e mesmo que o anjinho me dissesse para ir embora, meu corpo não obedecia. Eu estava estática, talvez todo aquele estresse estivesse me fazendo muito mal.

Só voltei a pensar direito quando senti um pano bater no meu rosto.

— Eu disse pra não entrar antes de bater! — Dennis berrou, tinha acabado de jogar uma toalha de rosto em mim, e funcionou muito bem porque eu imediatamente dei meia volta e saí do quarto.

Foi como descer de uma montanha-russa, minhas pernas bambearam enquanto eu descia a escada e eu me perguntava por que eu estava me sentindo tão agoniada.

Mal consegui me despedir de seu Luiz quando saí, fui andando pausadamente até chegar em casa, sentindo o coração bater com uma dificuldade que eu nunca tinha sentido antes.

Quando entrei no alpendre, Vó Alice falou comigo enquanto fofocava ao telefone, segurando farofa no colo, mas eu não consegui responder. Era como se as engrenagens no meu cérebro estivessem lutando para funcionar direito. Pane no sistema.

Ao pé da escada, porém, alguma coisa me atingiu com a força de um raio e eu subi as escadas correndo até chegar no meu quarto. Me joguei na cama e respirei fundo tentando esquecer o que havia acontecido nos últimos dez minutos.

A janela de Dennis ser bem em frente à minha janela não me ajudou muito.

Eu não estava com vergonha. Por mais que eu tentasse explicar a vermelhidão no meu rosto com o fato de ter visto Dennis quase nu, não era bem isso que estava acontecendo.

A culpa era toda de Emily. E de Gabriel.

O raio que me atingiu assim que eu entrei em casa foi o som macabro das vozes de Gabriel e Emily na minha cabeça me dizendo que eu estava gostando de Dennis.

E, por um momento, aquilo me confundiu.

Depois de um tempo, eu me acalmei. Foi apenas um susto pra me fazer criar vergonha na cara e aprender a bater na porta dos outros antes de invadir quartos.

Logo mandei uma mensagem para Emily, dizendo que a reunião estava cancelada e ela me respondeu imediatamente com um emoji revirando os olhos. Clássico de Emily.

Estava quase saindo do quarto para tentar me distrair brincando com os gatos ou conversando com Mel quando ouvi alguém chamar. Obviamente quase sofri um infarto.

Levei um tempo até conseguir respirar fundo e finalmente abrir a janela. Dennis estava na janela do quarto dele. Estava vestido, porém o cabelo continuava meio úmido.

Talvez fosse esse o motivo se eu achar que algo estava diferente.

— Tomou o primeiro banho da semana hoje? — falei, tentando ser engraçada pra mascarar o meu desespero interno.

— Muito engraçado. O seu vai ser só amanhã, né? — ele respondeu à altura. O que foi bom. — E aí?

— O quê?

— Fez algum progresso hoje? — perguntou, a voz era a mesma, o olhar preguiçoso era o mesmo. Somente o cabelo tinha mudado. Então por que eu sentia que tudo estava diferente?

— Fiz. Vocês precisam conversar.

— Nem a pau. Pode esquecer.

— Inclusive, espera uns vinte minutos que ele tá chegando aí — menti, pegando o celular e rapidamente enviando um texto cheios de erros ortográficos para Gabriel, exigindo a presença dele na casa do avô de Dennis o mais rápido possível.

— Não... você não fez isso...

— Vocês precisam conversar.

— E isso vai ajudar em quê? — ele cruzou os braços, claramente me desafiando.

— Ele prometeu ajudar.

— Aquele mauricinho? Tá bom — debochou.

— Conversa com ele e depois me conta — resmunguei, fechando a janela até que o desespero dele falou mais alto.

— Eu não vou deixar ele entrar.

Revirei os olhos. Mas decidi não me preocupar demais com aquilo, afinal, eu já tinha feito o suficiente. Dennis precisava parar de agir como uma criancinha mimada.

— Ele acha que você é hétero.

— Quê? Por quê? Ele é burro?

Dei de ombros.

— Conversa com ele, fala sobre a situação do incêndio, ele tá disposto a ajudar, mas precisamos de provas concretas pra jogar na cara do Paiva sem dó.

— Eu prefiro pegar mais duas semanas de suspensão — resmungou.

— Então eu já posso parar de te ajudar? — perguntei, já sem humor.

Dennis não respondeu, e eu estava quase fechando a janela quando ele finalmente sorriu, olhando para o nada.

— Percebi que estamos quites agora — disse, soltando uma risadinha. — Eu te vi de toalha antes e agora foi você que me viu.

Fechei a janela. Mais cinco segundos e eu seria capaz de explodir. Ainda não consegui encontrar o que estava diferente nele.

Mas eu não tinha tempo pra isso, precisava me concentrar no que dizer ao diretor Paiva e no que apanhar como provas a favor da inocência de Dennis. Afinal, eu também estava por um fio. Minha mãe pode ter me livrado de uma suspensão, mas acho que o diretor Paiva não vai me dar uma segunda chance de graça.

O problema de tudo foi que, mesmo tentando me distrair, meu cérebro estava começando a me irritar por acreditar na ladainha de Emily e Gabriel. Eu não estava gostando de Dennis, mas, de alguma forma, eles estavam me convencendo que sim. Um absurdo!

Depois de alguns minutos, consegui me acalmar ao ver a mensagem de Gabriel no meu celular dizendo que estava disposto a conversar com Dennis. Pelo menos alguém estava colaborando.

Decidi deixar aquilo entre eles, sem me meter e sem espiar a cada cinco minutos. Saí do meu quarto e decidi passar o resto do dia brincando com Mel, certa de que eu precisaria me poupar para coisas ainda piores que estavam por vir.

 

Na sexta-feira, acordei me sentindo mais preocupada do que deveria. Talvez envolver Gabriel numa situação como essa não fosse a melhor escolha. Talvez nossos planos fracassassem pelo fato de ninguém acreditar na inocência de Dennis.

Mas, assim que saí de casa, recebi uma mensagem de Gabriel com notícias que tiraram o peso da dúvida das minhas costas.

E logo que cheguei na escola, eu tinha várias certezas.

Gabriel havia conversado com Dennis (depois de muito custo) e os dois bolaram uma estratégia para que o diretor Paiva finalmente o ouvisse, o que era bom. Disse que precisávamos nos encontrar na frente da diretoria assim que o sinal do fim da aula tocasse.

Todas aquelas informações me deixaram um pouco menos enjoada, mesmo que aquela sensação pesada e ruim ainda me incomodasse.

Além disso, eu também tive certeza de que Emily ainda não tinha falado com Giselle, já que estava cada vez mais ansiosa, com olhadelas cada vez mais demoradas e com intervalos mais curtos. Era quase impossível pra mim aguentar isso tudo se passando bem na minha frente sem dizer nada.

Mas, felizmente, consegui me segurar.

No intervalo, quase levantei e fui até a sala de Gabriel, estava ponderando a ideia quando Giselle se virou para mim e me olhou com aqueles olhos grandes.

— Vai ter alguma coisa na diretoria hoje? — ela me perguntou, confusa.

Eu quase me cuspi.

— Por quê?

— Gabriel me mandou uma mensagem...

— Ele te mandou também? — Emily se juntou a nós, surgindo do nada e fingindo naturalidade, mas era óbvio demais que ela estava se tremendo inteira.

E, para piorar, Giselle nem olhou para ela.

— Você sabe o que ele vai fazer, Mia? — ela perguntou.

E, se Gabriel informou a mais pessoas, não devia ser segredo. E, depois de refletir por alguns segundos, percebi o que ele estava tentando fazer.

— Vamos falar com o diretor Paiva sobrea situação de Dennis. Reunimos algumas provas da inocência dele e Gabriel decidiu que seria melhor que as verdadeiras últimas pessoas que estiveram na biblioteca naquela noite também estivessem lá, como testemunhas — falei, esperando que eu realmente estivesse certa.

Giselle, então olhou para Emily por uma fração de segundos. E logo olhou pra mim de novo.

— Ah, entendi. Ótimo, podem contar comigo — ela disse, se levantando e saindo da sala graciosamente.

Me deixando com Emily, bem carrancuda, do meu lado.

— Você viu? Ela nem tá olhando pra mim! — se sentou ao meu lado, coisa que nunca faria caso não estivesse tendo um ataque de pelanca.

— Dá um tempo pra ela — murmurei, sem saber o que dizer para ajudá-la de verdade.

— Quando vai ser essa rebelião na sala do diretor? Eu quero ir também, pra mostrar que eu sou prestativa — ela falou e eu precisei me virar para olhar na cara dela.

— O Gabriel não te mandou mensagem nenhuma, né?

— Não — ela sorriu, fingindo culpa.

Respirei fundo. Não estava em posição de recusar ajuda.

Quando o sinal da última aula tocou, eu e Giselle seguimos até a diretoria. Gabriel já estava lá, junto de Lucas, Vanessa e, surpreendentemente, Emily, conversando sobre algo que parecia extremamente importante.

— Beleza, a gente vai entrar agora — disse, quando chegamos mais perto. — Não vai dar tempo de explicar tudo, mas Dennis já concordou com o plano, então só concordem e, não irritem o diretor, por favor.

Ele olhou diretamente para mim. Até parece. Se Paiva dirigisse uma palavra sequer com um tom errado, eu seria capaz de começar um barraco ali mesmo.

Gabriel tomou a frente e Giselle o seguiu, finalmente entrando na salinha. Me agarrei a Emily por puro nervosismo, enquanto seguíamos Lucas e Vanessa que iam na nossa frente.

E, assim que demos de cara com o diretor Paiva, Gabriel tomou a frente de tudo.

— Olá, diretor, obrigado por nos receber — começou mudando totalmente o tom e o modo de falar. Eu precisava admitir, o cara era esperto demais.

— Pois não — diretor Paiva disse, se ajeitando na cadeira.

— Como eu já havia dito, nós do grêmio estudantil, temos provas o suficiente para acreditar que Dennis e Amélia não foram as últimas pessoas na biblioteca na noite da quermesse. Eu me lembro bem se ter trancado a porta coma chave principal e de tê-la devolvido ao senhor, antes mesmo das luzes serem apagadas.

Paiva nem se mexeu, observando Gabriel por cima dos óculos quadrados que deixavam a cara dele ainda mais bizarra. O homem sabia ser imponente.

— Não é o que as câmeras mostram — ele respondeu.

— Quanto a isso, nossa teoria é que a gravação pode ter sido comprometida — Gabriel continuou. — E, como o senhor já sabe, o ferrolho de uma das janelas da biblioteca está frouxo já faz um tempo. Ela pode ter sido aberta por fora, alguém pode ter causado o incêndio por acidente.

O diretor pigarreou, claramente desconfortável. Ele parecia estar mais incomodado que o normal com aquele papo todo.

— Eu ainda não entendi o propósito dessa reunião — ele disse, fingindo uma calma que não condizia com aquele olhar maligno. — Não estou aqui para ouvir teorias...

— Dennis é inocente — falei, soltando o braço de Emily e me pondo na frente de Gabriel para que Paiva olhasse bem nos meus olhos. Não funcionou, mas continuei falando. — Temos provas de que ele não estava nem perto da escola antes, durante ou depois do incêndio.

— Que provas? Tudo o que vocês disseram aqui não passa de teorias infundadas. Eu sei que, como amigos, vocês sentem a necessidade de proteger Dennis Flores, mas nada disso me ajuda a encontrar um culpado.

— Então o senhor quer dizer que não se importa com quem está sendo punido, mesmo que injustamente, contando que alguém leve a culpa?

Ele se calou, com a mesma carranca horrível. Gabriel estava quase puxando minha orelha para calar minha boca, então ele tomou a frente mais uma vez.

— Senhor, o que estamos tentando dizer-

— Chega, Gabriel. Eu nunca imaginei que você gostasse de baderna — interrompeu. — Podem ir.

Gabriel pareceu paralisar. Para ele, era natural conseguir tudo o que queria na escola com seu título de aluno modelo, portanto ouvir uma rejeição daquelas o deixou fora de órbita por um tempo.

Mas eu estava cansada. Estava prestes a começar um barraco quando Emily segurou meu braço e decidiu intervir.

— Que tal um debate? — ela falou, bem calma.

— Um debate? — Paiva perguntou, claramente odiando a ideia.

— Sim. Se o senhor nos permitir apresentar as provas e fatos do que realmente aconteceu na frente de uma quantidade especifica de alunos que também estavam na escola durante a quermesse, talvez encontremos o verdadeiro culpado.

Silêncio, a tensão aumentou de uma forma que eu prendi a respiração sem nem ao menos perceber.

— Vocês têm até segunda-feira. É isso e mais nada. Porém, se Dennis realmente for o culpado, todos vocês serão punidos como cumplices — Paiva falou, enfim. Imediatamente senti um calafrio passando pelo corpo. — Estou falando de expulsão.


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