CATS - Filhotes em sua cabeça escrita por Lino Linadoon


Capítulo 4
Dando as notícias




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/801317/chapter/4

   Mistofolees andou ao léu, decidindo não retornar para sua toca ou ir atrás de Tugger para... Para lhe dar as notícias.

   Ele não sabia como Tugger iria reagir. Ele se lembrava das conversas sobre filhotes e sobre formar uma família e ele sabia que Tugger não rejeitava a ideia por completo, talvez um dia no futuro, mas aquilo... Aquela era uma situação completamente diferente do que ambos planejavam.

   Ele nem podia dizer que tinham realmente “planejado” aquilo. Nenhuma decisão mutua havia sido feita.

   Não, Mistofolees tinham acabado grávido porque sua magia queria que ele ficasse.

   Ele ainda não tinha certeza de como aquilo tudo funcionava, mas ele tinha que concordar que era possível. Mistofolees ainda tinha muito que aprender sobre seus poderes. Mesmo treinando desde que era um filhote, ele ainda perdia controle de sua mágica de vez em quando e ele sabia como ela podia ser influenciada por seus pensamentos e sentimentos, especialmente se eles eram persistentes; do tipo de coisa que tomava conta de sua mente.

   Mas... Filhotes?

   Mistofolees voltou seus olhos para sua barriga lisa mais uma vez. Não havia nada para ver alí. Ainda.

   Ele não sabia como se sentia quanto aquilo; já tinha se estressado tanto sobre aquilo na toca de Jenny, que agora ele se sentia cansado, talvez um pouco confuso, mas surpreendentemente mais calmo. Isso é, calmo até pensar em como teria que contar tudo para Tugger.

   Mistofolees subiu até o topo do velho fogão enferrujado. Ele tinha quase certeza de que tinha sido naquele lugar que tudo tinha começado; quando Tugger ofereceu o plano de “tentar” fazer filhotes. Mistofolees não conseguiu se impedir de corar ao pensar naquilo.

   No fim eles não tinham só tentado em vão, eles tiveram é muito sucesso.

   Mistofolees sentia que, se ele fosse uma gata, Tugger ficaria feliz por saber que os dois tinham alguns filhotes a caminho. Mas como ele era um gato, um macho, ele não tinha muita certeza de como Tugger iria reagir.

   Ele sabia que não devia pensar em seu companheiro daquele modo. Sendo alguém que conhecia Tugger melhor que qualquer outro gato no ferro-velho, ele sabia que o Maine Coon ficaria um pouco confuso e bastante surpreso, mas também seria muito compreensivo – assim como sele sempre havia sido em relação à Mistofolees e seus poderes mágicos. Talvez ele ficasse feliz com a notícia.

   A imagem do sorriso largo e brilhante de Tugger crescendo ao ouvir as noticias fez o coração de Mistofolees bater mais rápido.

   O magico empurrou aquela imagem para o lado por um momento, mudando a direção de seus pensamentos e lembrando, com surpreendente afeto, suas fantasias e seus sonhos sobre filhotes.

   Ele se lembrou da ideia de pequenos Maine Coons e gatos de smoking seguindo a ele e Tugger pelo ferro-velho. E imaginou quantos deles se pareceriam mais com um ou com o outro; qual deles seguiriam seus passos como grandes dançarinos; quantos seriam gatos mágicos como ele; teriam eles olhos similares aos de Mistofolees, um de uma cor e o outro de outra cor, ou eles ganhariam os olhos quase dourados de Tugger?

   “Misto!”

   O gato monocromático quase pulou, sendo violentamente arrancado de seus pensamentos pela voz de seu companheiro.

   “Ei, está se sentindo melhor?” Tugger subiu no fogão com um simples e poderoso pulo, se sentando ao lado de Mistofolees. Ele examinou o gato com olhos carinhosos, inclinando a cabeça para o lado e fazendo o cacho suspenso sobre sua testa se mover. “Por favor me diz que você foi falar com a Jenny. Você prometeu ir...”

   “Sim, eu falei com ela.” Mistofolees disse e se repreendeu por usar um tom de voz tão vazio.

   Tugger também notou aquilo, franzindo o cenho com preocupação.

   “Qual é o problema...?” Ele perguntou, seu tom suave, mas havia algo forte em sua voz, que mostrava que ele não iria desistir de conseguir uma boa resposta. “A Jenny... Ela disse alguma coisa...?”

   Mistofolees hesitou, se perguntando como iria explicar aquilo para seu companheiro. Ele ergueu uma pata e começou a coçar atrás da orelha, algo que fazia quando nervoso ou ansioso, e que Tugger reconhecia.

   “Misto?” O Maine Coon disse, pousando uma pata no ombro de Mistofolees. E, embora o toque fosse tenso, de algum modo ele ajudou o gato monocromático se acalmar um pouco.

   “Sim. Ela tem uma ideia do que está me deixando enjoado...” Mistofolees se forçou a falar.

   “Okay... E? É algo sério?” Tugger perguntou.

   Mistofolees pensou em como iria responder. Era algo sério, de um modo ou de outro. Ele estava grávido e filhotes davam bastante trabalho, eles precisavam ser bem cuidados, alimentados e tantas outras coisas mais. Por sorte, Mistofolees sabia que eles teriam a ajuda do resto da tribo para lidar com aquilo, mas eles eram os pais e, como esperado, a maior parte da responsabilidade cairia sobre eles.

   “Sim, é sério.” Ele disse por fim.

   “O que?!” A voz de Tugger tremeu por um momento e Mistofolees se sentiu incapaz de continuar ao ouvir tal coisa. De repente, o gato mágico se encontrou preso em um abraço forte, seu rosto apertado contra uma montanha de pelos dourados. “Por favor, Misto, me diz que você não está... M-morrendo ou alguma coisa assim... Eu não--”

   “Não, não, eu não estou morrendo!” Mistofolees rapidamente interrompeu, empurrando Tugger para poder se endireitar e encarar seu companheiro nos olhos. Não havia porque se demorar com aquilo, Mistofolees não queria que Tugger ficasse mais nervoso do que já estava – não importa o quão exageradamente dramático ele agisse. “Tugger, eu estou grávido.”

   Uma pausa.

   Mistofolees esperou, sentindo seu próprio nervosismo crescendo mais e mais, enquanto Tugger continuava o encarando em silêncio, olhos dourados bem abertos.

   “Não, amor, sem piadas...” Tugger finalmente se pronunciou, rindo de nervoso. O aperto de suas patas nos ombros do gato monocromático se intensificou um pouco mais. “Sério, o que está acontecendo com você?”

   Mistofolees suspirou, sabendo que devia esperar tal coisa.

   “Não é uma piada, Tugger.” Ele disse do modo mais direito possível. “Eu estou grávido.”

   Tugger abriu a boca para falar, mas a fechou depois de alguns segundos de silêncio. Seus olhos se desviaram de Mistofolees para nada em particular, antes de retornar para seu companheiro, o encarando nos olhos com confusão por um momento antes de descerem, pousando na barriga desse.

   Mistofolees se sentiu desconfortável debaixo do escrutínio, se movendo levemente para esconder a barriga com os braços, suas patas bem seguras entre suas pernas cruzadas.

   “Você... Isso é sério...?” Tugger perguntou, sua voz nada mais que um sussurro.

   Os bigodes do mágico tremeram e sua cauda se moveu.

   “Sim.” Disse com as orelhas abaixadas.

   Tugger continuou em silêncio, se levantando com um movimento repentino. Mistofolees acompanhou o maior com os olhos, temendo ver o Maine Coon correndo para longe em qualquer momento. Mas tudo o que Tugger fez foi começar a andar para lá e para cá, sua cauda se movendo violentamente a cada passo.

   “As nossas conversas...” Ele balançou sua cabeça, virando olhos chocados para seu companheiro. “Você planejou isso...?”

   “Não, não planejei nada. Só aconteceu.” O gato preto e branco disse, tentando controlar seu nervosismo enquanto o outro continuava andando para lá e para cá.

   “Só aconteceu?!” Tugger repetiu, se embolando nas palavras enquanto processava a informação. “Ah-- Como?! Você é macho!”

   “Eu sei!” Mistofolees revirou os olhos, começando a se irritar com o tom de voz cada vez mais alto de Tugger. “Foi a minha magia. Ela fez todo o trabalho!”

   “Como assim ela ‘fez todo o trabalho’?” Tugger balançou a cabeça, pousando as patas na cintura enquanto se inclinava para a frente. “Como?!”

   “Eu não sei.” Mistofolees deu de ombros, grunhindo com o suspiro exasperado de seu companheiro. “Você sabe que mágica é difícil de entender!” Ele suspirou. “Eu estive pensando sobre filhotes ultimamente, bastante. E acho que a mensagem que ela tirou disso era que eu devia ter, bem...”

   “Então sua mágica do nada decidiu que você teria um filhote? Tipo, dentro de você?!” A voz de Tugger estava ficando cada vez mais alta e Mistofolees olhou em volta, nervoso, esperando que nenhum gato curioso aparecesse para ouvir aquela discussão.

   “Eu diria que foi você que deu corda para essa ideia! Falando sobre tentar ter filhotes...!” Mistofolees retrucou, som tom, mas talvez um pouco mais rude do que desejava.

   Tugger foi pego de surpresa pelo argumento.

   “O que? Então é minha culta?!” Ele ergueu os braços para o céu, exasperado.

   “Não é culpa de ninguém, Tugger!” Mistofolees sibilou, irritado. “Você sabe que às vezes eu não consigo controlar minha magia!”

   “Você não consegue controlar quando--” O tom de ofensa na voz de Tugger sumiu quase imediatamente, e ele se voltou para o gato de smoking com as sobrancelhas unidas, parecia confuso. “Misto... Você queria ter filhotes comigo?”

   Mistofolees sentiu seu rosto esquentar em baixo do pelo pálido e ele ergueu uma pata para coçar atrás da orelha.

   “Eu não diria isso. Não exatamente.” Ele foi honesto. “Mas estive pensando sobre isso. Com os filhotes da Victoria por perto e as conversas que a gente teve...” E parou, olhando em volta, examinando o topo enferrujado do velho fogão. Ele desviou os olhos para seu companheiro. “Você se lembra...? Bem aqui...?”

   Tugger tomou um momento para processar aquilo.

   “Ah... É...” Ele assentiu, olhando em volta com as mãos na cintura. Ele olhou Mistofolees de soslaio, como se estivesse com vergonha de se virar para ele. “Você acha que foi aqui que...?”

   “Sim.” O mágico assentiu de volta.

   Tugger continuou em silêncio depois da confirmação, desviando os olhos, mas ainda se mantendo de pé, lançando uma sombra sobre seu pequeno companheiro.

   Para Mistofolees, Tugger sempre fora um livro aberto, alguém surpreendentemente fácil de ler, não importava o quanto ele tentasse manter seus sentimentos presos em sua mente. Mas, naquele momento, Mistofolees estava tendo dificuldade para ler seu companheiro. Talvez sua cabeça não estivesse funcionando direito no momento, com tantos pensamentos e sentimentos diferentes inundando seus sentidos. Ele conseguia ver que Tugger estava nervoso, graças ao modo como esse puxava os pelos de sua juba, enquanto sua cauda longe e felpuda se movia rapidamente para os lados.

   Mas isso era tudo o que o Maine Coon transpassava no momento.

   E seu silêncio estava começando a assustar Misofolees.

   “Tugger...?” Ele disse, baixinho.

   Tugger se voltou para ele, quase assustado, como se tivesse se esquecido de que não estava sozinho.

   “Desculpe, eu só...” Ele suspirou, parando de puxar os pêlos de sua juba e passando uma pata pelos pelos em sua cabeça. Mistofolees notou como ele tentava não fazer contato visual. “Eu preciso de um momento...”

   “Tudo bem... Eu também...” O gato mágico suspirou, sentindo como se seu estômago estivesse se revirando novamente – ele até se preocupou, pensando que iria acabar vomitando novamente. Ele esticou uma pata até Tugger, tocando a perna desse de um modo similar à como as fãs do Maine Coon faziam. “Mas, por favor, volte pra mim.”

   Tugger piscou uma ou duas vezes, surpreso tanto com o pedido quanto com o toque tímido. Ele se ajoelhou ao lado de Mistofolees, lambendo sua testa docemente e deixando que suas patas se demorassem nos ombros negros do menor, antes de se levantar mais uma vez.

   “A gente se encontra na toca.” Disse, assentindo em direção de seu companheiro, fazendo o cacho sobre sua testa se mover. Ele então deu as costas para o menor e pulou do topo do fogão, se afastando com passos lentos.

   Mistofolees o observou, até Tugger desaparecer entre as montanhas de lixo, e finalmente soltou o ar que estava segurando sem notar.

   Era melhor assim. As vezes Tugger precisava de momentos à sós com seus pensamentos, Mistofolees sabia bem daquilo, e ele sempre dava espaço para seu companheiro – assim como Tugger lhe dava espaço quando preciso.

   Mas o gato magico não conseguia deixar de se sentir cada vez mais nervoso. Mistofolees confiava em Tugger e sabia que ele ia voltar, ele sempre voltava; mas dessa vez ele não conseguia se impedir de temer que as coisas fossem diferentes.

   Mistofolees desceu do fogo, se dirigindo de volta para a toca. No caminho ele viu Victoria, Plato e os filhotes; sua irmã sorria enquanto tinha uma conversa silenciosa com sua gatinha branca, movendo os braços e as mãos no único modo que era possível se comunicar com a pequena.

   Victoria notou seu irmão e acenou para esse, seu sorriso diminuindo com o que quer que tinha visto. Mistofolees se recompôs o melhor que podia, acenando de volta antes de apressar seus passos em direção da velha cômoda em que ficava sua toca.

   Ele entrou pelo buraco na gaveta mais baixa e suspirou. Ele se arrastou até o centro da toca, se esticando antes de sentar sobre os panos verdes e amarelos que serviam de cama tanto para ele, quanto para Tugger. O lugar parecia vazio demais sem Tugger ali, o cheiro do maior ainda tomava conta do lugar, fazendo o gato monocromático sentir como se não pertencesse àquele lugar – pelo menos, não sozinho.

   Mistofolees desviou os olhos para sua barriga.

   A toca não ficaria vazia por muito tempo...

   “Misto?” Mistofolees se virou para a entrada, vendo sua irmã hesitar antes de entrar, a pequena Miangellica praticamente se camuflando contra o pelo branco de sua mãe, enquanto seus grandes olhos azuis estavam focados no rio. “Ei, está tudo bem?”

   “Está sim...” Ele assentiu.

   “Plato me disse que você estava... Estranho... Hoje mais cedo...” Victoria disse, dando passos lentos e cuidadosos para dentro da toca, sem querer ser intrusiva.

   Mistofolees suspirou, ele devia saber que Plato mencionaria aquilo para sua irmã. Ele se perguntou o que se passava na mente do gato malhado, se sentindo desconfortável com a lembrança de como Plato e Cassandra o cheiraram com curiosidade e confusão.

   “Ele não tem com que se preocupar.” Mistofolees foi direto, sorrindo para a gata branca.

   Victoria o encarou, soltando Miangellica que estava começando a ficar agitada.

   “Eu não acredito nisso.”

   Mistofolees assentiu. Sua irmã o conhecia melhor que ninguém naquele ferro-velho, possivelmente até melhor que Tugger, então ele sabia que mentir para ela não daria em nada. Ele ergueu uma pata e coçou a orelha.

   “Quer falar sobre isso?” Victoria perguntou tentativamente, se sentando na borda dos cobertores, dando espaço para seu irmão.

   “Não. Pelo menos não agora...” Mistofolees deu de ombros. Ele sabia que Victoria iria entender sua situação e, sendo uma mãe, alguém que já tinha passado por tudo aquilo ao criar três filhotes dentro de sua própria barriga, ela teria muito a dizer. Mas por enquanto ele queria esperar.

   Esperar o retorno de Tugger.

   “Tudo bem...” Victoria assentiu, observando enquanto seu filhote engatinhava até seu irmão, Mistofolees seguiu seu olhar. “Quer companhia?”

   Miangellica sorriu para seu tio, dando leves tapinhas na perna desse e erguendo as patas para ele de um modo que significava, sem palavras, que ela queria colo. E enquanto observava aquilo, Mistofolees não conseguiu deixar de se lembrar de suas fantasias e dos filhotes que agora cresciam e se desenvolviam dentro dele.

   “Claro...” Ele sorriu para sua sobrinha, a pegando no colo.

   Era melhor ele começar treinar, não é?

   Com... Ou sem Tugger.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "CATS - Filhotes em sua cabeça" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.