Desaparecendo escrita por Dama das Estrelas


Capítulo 17
Porque quando estamos juntos algo acontece


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoal, cheguei com mais um capítulo. Em primeiro lugar agradeço por estarem lendo a fic e por terem paciência. Me desculpem. Não tenho vivido dias muito bons ultimamente. Na verdade no meio dessas angústias todas pensei por várias vezes em parar de postar qualquer coisa referente a fanfics, chateada com meu próprio desempenho e outros motivos particulares. Não quero me fazer de vítima nessa história, pelo contrário, só estou desabafando um pouco o motivo por ter atrasado um pouco mais a postagem do capítulo.

Mas é isso. Pouco a pouco vou me recuperando e cada dia é um dia a ser comemorado.

Enfim, eu não consigo ficar longe das palavras nem se eu tentasse. Cá estou eu com mais um cap para vocês. Espero que gostem, boa leitura!



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O caminho de volta ao prédio residencial só não foi mais melancólico que o olhar que Sara lançou quando chegaram ao quarto dela. Não era o local mais desejado por ambos, mas concedia a eles privacidade e era tudo o que Sara precisava no momento. Era hora da tão esperada conversa, já que não pôde falar tudo na noite anterior e no café da manhã. 

Ela se pôs no meio do quarto esperando que fosse acompanhada por Grissom, que ao visar o cômodo semelhante ao seu, notou o pequeno vaso de camélias disposto ao fundo. Nem teve tempo de reagir já que ela se manifestou nos segundos seguintes: 

— Tá bom. Você está aqui, chegou bem e... agora sabe o que aconteceu. Era isso o que você queria, não era? 

Umedecendo o lábio inferior, Grissom até pensou em dizer algo de prontidão, mas não achou as palavras corretas para sanar a suposta dúvida de Sara. 

— Eu vou considerar- 

— Eu não acredito que fizeram isso com você. Meu Deus. 

Por pura coincidência Grissom acabou falando ao mesmo que ela, desarmando-a de suas respostas. Sara visou o chão, buscando nesse meio tempo alguma outra coisa para prosseguir, mas de repente se viu perdida. 

— Talvez não apenas comigo. Quem sabe... — Ela deu de ombros, encarando-o olhos. 

Quando foi fitado por ela preferiu mudar o foco ao se ver cercado. 

— Eu não sei o que dizer. Isso... isso é inacreditável. Deus! Como... eles deixaram isso acontecer! 

— É o que estão tentando descobrir. 

— Você confia neles? — Ele perguntou com a voz um pouco erguida. — Confia nessa gente? 

— O que mais eu posso fazer? — Antes de respondê-lo, Sara chegou a franzir as sobrancelhas ao ouvir aquilo. — Com certeza não seriam os responsáveis por isso que iriam me ajudar — retrucou com certo sarcasmo não-intencional. 

— Tem algo errado nisso! — Grissom insistiu. Percebendo que se excedeu um pouco ele olhou para trás e decidiu manter a calma. — Como essa gente sabe de tudo o que aconteceu e de repente resolvem te ajudar? 

E então ela se enxergou nele. Viu toda sua raiva e indignação presentes na postura e voz de Grissom. Desta vez assumia o papel que Langston assumiu. Em outros casos riria da semelhança de ambos. 

— Eu sei. Já explodi com eles e sei muito bem como essa droga é confusa. Mas tudo o que eu posso fazer é acreditar que consigam fazer alguma coisa. — Sara argumentou, mas ainda assim ele parecia irredutível. Ele virou o rosto para o lado bruscamente como um protesto ao que ouviu.  

— Deus! Eu vi aquele vídeo! Eu... eu vi o que aconteceu com você! 

Diante de uma tela de computador, Grissom não conseguia mensurar o tamanho da dor que sentiu ao ver com seus próprios olhos o acontecimento com Sara. Perplexo, perdeu a voz no momento em que a viu cair no chão. A apreensão contida na reação dos cientistas não se comparava com a dele, demonstrada ao visar a doutora Zhang a quem lhe apresentou o vídeo. Lembrava-se bem do olhar mortal que lançou a ela e o quanto esbravejou com a cientista por tudo aquilo estar acontecendo. Tomou o sofrimento de Sara para si e não conseguia pensar em outra coisa a não ser jogar a culpa em todos eles. 

Sara foi pega de surpresa. Jamais imaginava ver Grissom reagir daquele jeito quando o assunto se tratava dela mesma. Já não via mais uma versão de si mesma e sim algo pior. Se não tomasse uma atitude rapidamente poderia lhes custar caro. 

— Grissom!  

Foi a vez de ela aumentar a voz por não suportar mais aquela atitude. O estresse falou mais alto e vê-lo daquele jeito piorou ainda mais a situação. 

— Droga, você não acha que eu também não desconfio dessa gente? — Ela ergueu os braços. — Que todo dia eu penso sobre o que eles podem ou não ter feito pra gerar essa merda toda?! 

Ela pareceu ter ganho finalmente a sua atenção. 

— Se você não se sente bem aqui então é melhor-... — Ela se calou de repente. Estava a ponto de mandá-lo embora, porém se lembrou do risco que ele também poderia estar correndo. Pedir para sair daquele Complexo seria quase como apunhalá-lo e deixá-lo para morrer. Lembrou-se também do quanto ele deve ter se desdobrado para estar ali, coisa que quis afastar dos pensamentos o quanto antes. — Esqueça. Esqueça o que eu falei. — Ela abanou a mão direita. 

— Eu... — Ele respirou fundo, tomando conhecimento do que acabara de fazer. — Me desculpe. — O semblante enfezado de outrora se apagou, dando lugar ao arrependimento. — Eu... só não consigo acreditar que isso está acontecendo com você. 

— É melhor começar a acreditar ou vai enlouquecer ainda mais. Eu digo isso por... — Ela preferiu não terminar a frase, mas sentiu que ele a entendeu muito bem. 

A poeira parecia ter baixado naquele quarto. Ânimos à flor da pele, qualquer palavra dita "em falso" racharia mais ainda a relação de ambos. 

— Como você chegou até aqui? — perguntou Sara no intuito de mudar de assunto. 

— Pedi afastamento ao xerife para tratar de um problema. Não vão me ver no laboratório por um tempo.  

Foi uma questão de segundos até que a ficha caísse, assim como o queixo de Sara, tomada pelo horror e espanto ao ouvir uma resposta daquela. O que seria uma tentativa de acalmar os ânimos, de repente, sofreu um grave revés. 

— Você não fez isso — declarou Sara, parecendo mais uma ordem. — Não, não, você não fez isso. 

— Eu já estou aqui.  

— Pelo amor de Deus! Percebe o que acabou de fazer?! — disparou, sem se preocupar se aumentou demais ou não a voz. 

— É claro que sei! 

— É claro que você não sabe! — Sara ergueu os braços. — Acabou de arruinar sua carreira! — Disparou, esperando uma resposta decente. — O que, acha que ninguém vai descobrir?! 

— Nós vamos começar outra discussão? — Grissom protestou. 

— Que merda, Grissom! — Se já não bastasse lidar com um homem incapaz de sentir remorso por suas próprias atitudes, tinha de vê-lo agir de modo imprudente. — Que droga, o que você estava pensando quando resolveu fazer essa loucura?! 

— Quer mesmo saber?  

— Não! Eu não- — Ela ergueu ambas as mãos para impedi-lo. — Eu não quero saber como você escapou do Ecklie e nem como vai fazer para se explicar, eu não quero saber de nada! — disparou num tom incisivo. Na hora não pensou o quanto pudesse machucá-lo, mas já era tarde. 

— Eu não entendo como... como você consegue falar desse jeito- 

— Por que você vai ser demitido?! — Rebateu sarcasticamente. — Meu Deus, você pode até ser preso por isso, já pensou, Grissom? — Ela o questionou, esperando uma resposta. Como não a obteve de imediato, expirou com raiva. 

— Você deixou o país sem ao menos avisar! — Já não era mais possível manter um comportamento apático após aquilo. Ele precisava defender sua posição. — Sumiu de uma hora para outra e não queria que eu me preocupasse? 

— Eu tive de fazer isso! 

— E adiantou alguma coisa, Sara? — Grissom gesticulou com ambas as mãos. — Tem gente que se preocupa com você. O pessoal estava perguntando sobre o que aconteceu com você! 

— Eu pedi por isso?! — Sara deu um passo nervoso em sua direção. — Eu pedi pra ficar assim?! — Num ato de quase desespero ela balançou as mãos na frente dele. — Podia ter inventado mil desculpas, me demitido, qualquer coisa! Mas vir pra cá? Vir até aqui desse jeito? 

— Se ao menos você desse alguma notícia, ligasse pra mim para dizer como as coisas estavam... 

— Como se você fosse fazer o mesmo! 

A ligeira mudança em seu semblante o desmascarou. Agora, restava saber se o choque foi pela dura resposta ou por ela não ter dito nada mais que a verdade.  

Sara lhe lançou um olhar desafiador, pois percebeu que o havia atingido em cheio. 

— Eu não duvido que você daria um jeito de sumir de repente, deixando todo mundo sem notícias até hoje. Ou vai dizer que não é verdade? 

Bastou pouco para desarmá-lo de respostas. Ela falou como se tivesse retirado as palavras da própria mente de Grissom e isto o incomodou. Rebatê-la ou sair na defensiva só reforçaria um discurso hipócrita, coisa que ele não faria com Sara. Especialmente com ela. 

— Que merda — lamentou ela, percebendo que "ganhara" a discussão. — Quem garante que mais gente não está assim também? Gente do laboratório... 

Não seria descuidada a relacioná-lo aos integrantes do Departamento, mas em seus pensamentos o rosto de Grissom era o primeiro a surgir e o único que não se apagava de sua mente. 

— Eu não consigo nem pensar na cena! — Cansada de permanecer naquela posição acabou se sentando na cama. — Não aconteceu antes porque eu não contei pra ninguém. Agora imagine só alguém desesperado, gritando por ajuda aos quatro cantos. Você sabe que notícias ruins espalham rápido. — Ela balançou a cabeça algumas vezes. — Aquele apagão foi só um ensaio. Vai ficar muito pior. 

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— Eu lembro que... que eu estava na sala de análise audiovisual assistindo aos vídeos de segurança para um caso que eu estava trabalhando. — Explicou ela ao doutor Langston e Hongfeng. — De repente tudo se apagou e... o mais estranho era que até mesmo o meu celular - que eu lembro muito bem de estar com a carga cheia - estava desligado. 

Sara, que estava sentada à mesa, virou-se para trás na direção de Grissom, que apesar de se sentir um intruso no meio deles, achou importante estar perto dela nem que fosse para se manter calado o tempo todo. Seu olhar dirigido a ele o deixou intrigado. Era uma deixa para que falasse também. 

— Todos os eletrônicos desligaram. Ao menos... todos os do laboratório. Alguns sequer conseguiram ser recuperados. — Ele deu de ombros. — Lembro-me que até hoje não deram uma explicação decente sobre o que causou a pane nesses aparelhos. 

Ao visar Sara de volta após seu comentário, Grissom desviou o olhar dela por timidez. 

— Eu vi o noticiário — Langston comentou. — Não sei como o estado inteiro não quebrou depois do caos que tomou conta de lá. — Ele suspirou por um instante. — Ainda estamos trabalhando num cálculo para estimar quantas pessoas podem estar passando pela mesma situação que a senhorita Sidle, mas sem os dados ainda sendo processados é difícil continuar. É muito complicado trabalhar no escuro. 

— E quando vai ficar pronto? — Sara o questionou. 

— Se tudo ocorrer como esperávamos, daqui a um, dois dias. 

Para uma tecnologia que eles diziam ser tão poderosa, dois dias soariam como uma eternidade. Sara não disfarçou o semblante chateado após aquele banho de água fria. 

— O que os faz acreditar que, se até agora nenhum rumor sobre casos semelhantes estarem acontecendo lá surgiu, poderia acontecer depois? 

— É o que nós queremos acreditar — afirmou o doutor Hongfeng. — Mas não podemos descartar uma possibilidade de isto acontecer. E por isso que este cálculo também vai nos auxiliar nos próximos passos caso a situação piore. 

— Mas... Sara não é a prioridade de vocês? 

Quando ouviu aquilo ela fez de tudo para disfarçar a cara de espanto sobre ele. Um clima desconfortável começava a se criar naquela sala. 

— Ela é, senhor Grissom. —  Langston tomou a palavra desta vez. — Claro que ela é. Mas o que estamos tentando elaborar é um meio de lidar com um possível agravamento desse problema e entender como ele começou. Nossos esforços para ajudá-la continuam em primeiro lugar e uma coisa não anula a outra. Pelo contrário. 

Naquele momento todo o arrependimento por ter insistido na vinda de Grissom a atingiu em cheio. Já não bastava uma pessoa em conflito com Langston e sua equipe; duas eram demais. 

— Eu acho que por agora vocês não precisam mais de mim, não é? — Sara se viu na obrigação de interromper uma provável discussão entre Grissom e os outros dois. 

— Estaremos por aqui caso tenha mais dúvidas... — ressaltou ele.  

— Então tá bom — disse ela já se levantando. Grissom, que não entendeu o porquê de agir assim, não teve outra escolha senão fazer o mesmo. 

— Volte mais tarde para mais atualizações.  

Com um sorriso meio torto ela se despediu dos homens e deixou a sala junto de Grissom. Estavam no sexto andar do prédio central e seria necessário pegar o elevador. Se bem que ela não faria muita questão de descer as escadas para se distrair um pouco.  

Ao chegar em meados do corredor acabou optando pela primeira opção. 

Elevador cheio até a metade, era impossível iniciar qualquer tipo de conversa sem se sentir completamente desconfortável no meio de estranhos. Até porque não reconheceu nenhum daqueles rostos; dois homens e uma mulher, todos com uma aparência jovial. Estagiários ou visitantes, jovens cientistas, ela não tinha ideia. 

Já fora do prédio, Sara sentiu o ar da liberdade que o ambiente arborizado a proporcionava. Entretanto ainda se via presa à figura ao lado; esta que de alguma forma não a deixava fazer ou dizer o que realmente gostaria. Uma hora adorava tê-lo por ali, outra hora só o queria longe. 

— Seria bom se você não tentasse criar conflito com eles — comentou ela enquanto faziam seu caminho de volta para o prédio residencial. Ou ao menos, pensavam que fosse até lá. 

— O que você quer dizer com isso? 

Ela não resistiu e teve de encará-lo, parando de caminhar ainda por cima. 

— Eu tô dizendo- — Ao perceber que aumentara o tom de voz, Sara olhou em volta e se conteve. — Para deixar de querer arranjar discussões. Não sabe que é o trabalho deles entender como essa coisa tá acontecendo? Ou está deixando de agir racionalmente só porque não confia neles?  

Grissom lançou aquele olhar típico dele de quem lutava para entender ao todo o que ela queria dizer. No fundo a resposta estava lá, mas se recusava a iluminá-lo. 

— Não parou para pensar que você pode ser uma dessas pessoas? — Ela perguntou num tom repreensivo. — Não. Nunca, sequer imaginou que isso pode... sei lá, ser contagioso? Que isso também não está dentro de você? 

Ela esperou ouvir alguma resposta, mas desistiu sabendo que era inútil conseguir algo mais quando ele mostrava aquele semblante. 

Somente quando virou-se de costas para Grissom a fazer seu caminho foi quando ele respondeu: 

— Eu não... tive tempo para pensar nisso direito. 

Não iria dizer com todas as palavras que o rosto de Sara tomava seus pensamentos. Que pouco pensou nele mesmo ao se ver tomado de preocupação por ela. 

— Eu já — respondeu com um sorriso triste. 

Por várias vezes. 

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Chegou a noite; com ela um céu estrelado cercado por nuvens e uma temperatura serena, beirando os vinte graus. Todos já haviam jantado e no interior do complexo a maior parte das luzes acesas vinham não somente da iluminação geral como nos andares do prédio principal — que praticamente não se apagava — como um farol no meio do bosque. 

Convencer a si mesmo de que a atitude que tomaria em breve não passava de um mero dever como supervisor não aplacou a angústia que sentiu ao parar em sua porta. Ele hesitou, por várias e várias vezes, tomando para si um medo extraordinário de que uma palavra em falso poria ao chão toda a frágil estrutura que se baseava a relação de ambos. 

Entretanto, não poderia deixar as coisas passarem sem ao menos fazer nada. Ora, pôs em risco sua carreira, uma vida de trabalho inteira ao se deslocar para outro país por ela. Não era um passo dado qualquer, então devia ser corajoso suficiente para tomar aquela atitude. 

— Sara, sou eu — disse ao bater três vezes na porta. Ainda estava se acostumando com o novo fuso horário e nem parou para pensar se ela já não estava dormindo pelo cansaço da mudança de rotina. 

Engolindo em seco, temeu também se não estivesse acordada, mas apenas o estava ignorando. No pior dos cenários, ela estaria passando por aquilo novamente, pensamento do qual tentou afastar de prontidão. 

Então a porta foi aberta. 

— Ei. — Ela respondeu com um tímido aceno. Seus cabelos estavam presos no alto e as roupas confortáveis davam impressão de que estava na cama. 

— B-boa noite. Eu-... Não sabia que estava dormindo, me desculpe.  

Pronto. Toda sua coragem foi por água abaixo. 

— Não estava. Moby Dick estava me fazendo companhia. 

Ainda bem que a iluminação do corredor não realçava o rosto avermelhado de Grissom. 

— Posso te ajudar com alguma coisa? — Ela perguntou ao perceber que ele havia "paralisado" após sua resposta. 

— Eu... Gostaria de caminhar um pouco e espairecer a mente? E-stá uma noite agradável.  

Ele tinha que admitir que não começaram com o pé direito. Por uma força do destino não terminaram as discussões anteriores com feridas emocionais profundas. A pergunta se saiu melhor em sua mente. A prática foi um desastre. 

Não lhe bastou muito para Sara notar o quanto ele estava se esforçando para que instaurassem uma trégua para sabe-se lá para qual conflito estavam envolvidos. Ele estava fazendo muito, e ela? Pediu que Grissom viesse a Hong Kong e depois disso não tentou muita coisa. Praticamente nada. 

— Entre. — Afastando-se para trás, deu espaço para que ele viesse. De início ele se esquivou, mas o olhar dela foi incisivo; foi mais que um pedido. 

Timidamente ele passou pela porta e parou bem próximo à entrada. Sentia-se terrivelmente desconfortável ao entrar num ambiente tão particular quanto aquele. 

Sem dizer nada ela fechou a porta e caminhou sem pressa até a borda da cama, onde sentou e apoiou as mãos sobre as pernas. Um olhar ao fundo para avistar o pequeno vaso de camélias. 

— Me desculpe. Eu não... tenho sido um bom exemplo de hospitalidade ultimamente — desabafou olhando para o chão. — Não é desculpa, eu sei, mas... tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, eu não consigo acompanhar. Minha cabeça tá uma bagunça. 

Grissom permaneceu em silêncio, atentando para sua expressão corporal. Sem ironias ou sarcasmo; parecia estar disposta a se abrir com sinceridade. Já ela imaginou que suas desculpas não foram suficientes para reparar o dano que causou anteriormente e no momento se viu sem escapes. Entretanto, quando ergueu o olhar assustou-se com ele, que vinha em sua direção e se sentou ao seu lado. 

— Eu penso em vocês toda hora — desabafou ela após algum tempo em silêncio. 

— Não devia. 

Sara riu discretamente. 

— Devia direcionar seus pensamentos para si mesma e em sua recuperação — alertou ele. — Só vai te fazer mal se continuar assim. 

— Eu não consigo — Sara retrucou logo em seguida e o encarou direto nos olhos. Quando percebeu que estendeu seu tempo ali, desviou a atenção e buscou o mínimo de contato visual. — Já parou para pensar no problema que a gente tá metido? De quantas pessoas podem... podem estar na mesma situação? 

Grissom não precisou ser adivinho para perceber que suas palavras o incluíam também.  

Impaciente por uma resposta, Sara virou o rosto na direção oposta ele. 

— Não pode ficar se lamentando por pessoas que não pode salvar. 

Sara não acreditou naquela resposta até o momento que voltou a encará-lo. Parecia tão sincero com suas palavras que lhe causou calafrios. 

— Como pode falar assim? — questionou indignada. — Mesmo depois de ouvir aquilo tudo você... ainda consegue falar desse jeito? 

— Se achar que pode salvar todo mundo vai perder a todos. Inclusive você mesma. 

A única coisa que saiu de sua boca foi um riso envergonhado. Mas o semblante logo deu lugar ao sarcasmo. 

— E você, hein? Não devia se preocupar consigo mesmo? 

— Eu não vim aqui por mim em primeiro lugar. Vim por você. 

Foi naquele momento em que Sara viu que aquela conversa estava passando dos limites. O coração bateu tão rápido que temeu ser ouvida pelo homem ao lado. A temperatura naquele quarto, de repente, parecia ter aumentado de uma hora para outra, tanto que já era possível sentir o suor em suas mãos. 

— Então comece a pensar um pouco mais em você mesmo — disse, já se levantando. — Sei que está com o pé atrás, mas devia dar uma chance a eles. Ainda mais agora que não temos garantia alguma de que você está livre disso. 

— Nem sabemos ainda se isto afetou mais pessoas. — Ele protestou, ainda permanecendo na cama. — Pedir para me examinarem só vai atrasar o trabalho deles. E além do mais... — continuou. — Eu não manifestei nenhum sintoma até agora. 

Isso não quer dizer nada, pensou Sara, sem vontade de rebatê-lo. 

— É um alívio saber isso — respondeu-lhe, porém, seu rosto não condizia com o alívio que expressava. Na verdade, estava triste por ele e por sua cega insistência em deixar a si mesmo em segundo plano. — Realmente. E espero que continue assim. 

Sem destino aparente acabou parando próximo à janela, ficando de costas para ele. 

— Você veio aqui para checar se estava tudo bem comigo. Está. 

Ela não o queria mais ali. Grissom percebeu isso sem precisar de muito esforço, novamente. Queria saber onde e quando cometeu o erro de tornar o clima insustentável entre eles. Imaginou que podia ter sido um pouco mais maleável ao aceitar suas preocupações sobre ele, mas não tinha muita certeza. Estava indo bem, decente até, mas de repente as coisas desandaram. 

Então se levantou da cama, olhar pesado, viu que não era mais bem-vindo. Talvez amanhã, quando estivesse com outro humor ele poderia tentar novamente.  

Grissom visou a porta e movimentou-se um passo em direção à saída; entretanto, arrependeu-se veemente em fazê-lo. Algo o levou a olhar para os fundos do quarto mais uma vez. Ele se viu tentado a caminhar em sua direção sem ter plano algum, só sabia que tinha de continuar. Com certeza iria se arrepender depois, mas não era este o momento. 

A passos lentos aproximou-se de Sara até parar a um metro e meio dela. Não duvidava que ela sabia de sua presença ali. 

— Eu pensei um pouco em mim, mas... Me desculpe. Estou mais preocupado com você. 

Um calafrio percorreu a pele de Sara, que temia se virar em sua direção e não conseguir mais voltar. As palavras de Grissom chegaram justamente no pior momento possível e ainda assim soaram como música aos seus ouvidos. 

O ar ficou mais quente e a impressão era de que o quarto diminuiu de tamanho. Quando Sara se virou para ele finalmente, viu a silhueta de um rosto triste iluminado pelo abajur ao lado da cama. 

Sara se virou de corpo inteiro ficando frente a frente a ele. 

— Não tenho tempo para pensar em mim — explicou. — Eu só... 

Então ele se calou de repente. Ficou nervoso ao dar-se conta de que estava diante de Sara e que talvez tenha se estendido demais. 

— Só o quê? — Ela insistiu, já sabendo que não iria ter a sua resposta. 

Num ato de nervosismo ele uniu as mãos frente à cintura. Os olhos visavam o chão, como uma criança que tinha ideia do que aprontou. "O que estava fazendo ali ainda" perguntava a si mesmo, preso em suas próprias atitudes precipitadas. Se saísse dali sem se explicar tornaria a relação entre eles ainda mais difíceis. 

— Estou preocupado com você. É a... única coisa que mais tenho pensado ultimamente. 

— Em mim? — perguntou inocentemente, arrependendo-se depois de soar tão tola. Era óbvia a resposta. Tudo o que ele fez foi lhe mostrar indícios de que pensava nela, talvez mais que nunca. Ela riu por incredulidade a si mesma e depois cruzou os braços defensivamente. Como teria coragem de mandá-lo embora? 

Suas opções eram poucas, pouquíssimas. Pensar na melhor opção era o que a matava aos poucos. Então caminhou um passo em sua direção, disposta a encerrar a conversa de uma vez por toda sem que as partes saíssem (tão) machucadas. 

— Se continuar desse jeito será você quem vai se perder. 

Ela estava tão perto... Ele podia muito bem sentir a fragrância do creme corporal — ou seria das camélias? — que entrava por suas narinas e tomava conta de seus pensamentos, desejos, tirava-o de órbita em tão pouco tempo. Nem a pouca luz era suficiente para ocultar a beleza de Sara, pelo contrário; atenuava ainda mais o contorno de seu rosto, de seu corpo. Nem mesmo a baixa iluminação era capaz de conter a beleza em seus olhos cor de avelã. Sentia-se diante de uma beldade, completamente incapaz de reagir ou de fugir de sua presença. 

Aquela troca de olhares durou tempo demais, era perigoso. Mas já era tarde para escapar de suas amarras porque, quando deu por si ele ergueu a mão e alcançou seu rosto, deslizando o polegar da altura da testa até o canto dos seus lábios. Parou naquela posição por três segundos e se afastou corando de vergonha. 

— T-tinha uma... uma mecha de cabelo... 

Não havia nada. Provavelmente ela percebera e só esperava a cena acabar para se manifestar como era devido. Já ele estava em apuros.

Entretanto, antes que se afastasse de vez, Sara o segurou pelo pulso. Não sabia o que estava fazendo, na verdade, só queria manter aquele momento um pouco mais. 

— Eu sei o que está tentando fazer — disse com naturalidade. Como se no momento não o tocava sem o menor interesse de deixá-lo ir. 

Suas intenções foram desmascaradas. Tarde demais. 

— Desculpe. Eu só... — Grissom tentou buscar uma explicação decente o bastante para amenizar o que fez, pois sabia que não era possível se livrar daquela situação sem consequências. Enquanto tentava se explicar ainda, deu mais um passo em sua direção inconscientemente. 

Suas respirações se misturavam como o vapor. 

— Eu não consigo... — Ele estava tão próximo que apenas o sussurro era suficiente para ser ouvido. Estava imerso demais para voltar atrás e aquela força só o puxava para mais perto. Mais perto. 

— Gil. — Sara não parava de olhar para aqueles lábios e nem percebia que era observada a todo instante. Em seu íntimo pensou em afastá-lo e mandá-lo de volta, mas por outro lado, não criava resistências. Quis pagar para ver até onde iria. 

Então seus lábios se tocaram e tudo perdeu o sentido. 

Tímido e delicado, embora não pudesse ser chamado de beijo, a incerteza de suas bocas que se encontraram pela primeira vez. A dúvida e o medo ainda os assombrava. Todavia, uma seria uma atitude impensável em outras ocasiões. 

— Gil... — falou ofegante pela adrenalina, receio de perder o controle. — Eu acho... 

Num último resquício de autocontrole tentou resisti-lo mais uma vez, mas suas palavras foram apenas um combustível, uma porta de entrada para que ele tomasse seu lábio inferior com a boca. Ele tocou em sua nuca para trazê-la a si, sua língua pedia passagem para prová-la ainda mais. Foi a última barreira para ela, que se deixou levar pelo transe e a fez beijá-lo de volta. 

Segurar seu rosto em suas mãos enquanto beijava os lábios daquele homem foi libertador. Ela sabia que no instante seguinte, quando se separassem, iria se arrepender do que fez, porém nada iria apagar aquele momento. Nunca o desejava tanto, por mais que tivesse seus motivos para não continuar. 

Foi uma das piores decisões que tomou ter cedido ao seu carinho; porque sentia que, de alguma forma, não teria tempo suficiente para cultivar o que talvez fosse amor. Ou uma onda de paixão. 

Quando percebeu que estava perdendo o fôlego ela foi afastando o rosto com pesar. Grissom, que não entendeu suas intenções, imaginou que estava apenas tomando mais ar e beijou-a novamente, porém não durou tanto tempo quanto esperava. 

— Gil — disse ela, ainda segurando seu rosto. Quando sentiu seus lábios tocarem os dela mais uma vez, por pouco não se rendeu a ele. — Gil. — Foi mais incisiva desta vez, afastando suas mãos do rosto dele. 

— O que houve? — perguntou preocupado. — E-eu fiz... algo errado? — Em poucos segundos sua mente se tornou um campo de batalha; ficou transtornado e com medo de que tenha ido longe demais. 

— Não. — Ela negou com a cabeça, sem coragem de encará-lo diretamente. — Fui eu. 


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Notas finais do capítulo

É muito bom escrever GSR, vocês não sabem o prazer que eu tenho em escrever cenas assim, juro. Será que as coisas melhoram daqui pra frente ou é só ladeira abaixo?

Muito obrigada a todos que leram. Um beijo e até o próximo capítulo.



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