Desaparecendo escrita por Dama das Estrelas


Capítulo 1
Memento Mori


Notas iniciais do capítulo

E aí, gente, tudo bem?

Tô de volta com mais uma fanfic aqui da qual eu havia prometido anteriormente. Era um desejo meu escrevê-la e desde o ano passado eu tinha essa ideia, mas que ficou hibernando até que em meados do ano eu resolvi trabalhar com ela.

Sempre foi um desejo meu escrever CSI/Ficção científica, então daqui pra frente espero que perdoem meus erros ou equívocos caso aconteçam, e peço encarecidamente que relevem e utilizem a licença poética ao entrarem no mundo desta fic. Obrigada e boa leitura!



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Andrew Summers era um calouro de bem com a vida. Dezenove anos, aproveitava a sexta à noite para curtir com os amigos o começo de uma nova era. Las Vegas era prato cheio para quem quisesse desfrutar de todo tipo de entretenimento; junte isso com jovens emanando testosterona e adrenalina e lá se vai a noite. 

Ele dançou, flertou com algumas garotas, bebeu bastante e fez coisas de que não se lembraria na manhã seguinte. Tanta coisa que acabou sendo expulso da boate sem nem ao menos saber (ou se lembrar) do motivo que causou sua saída forçada. 

Tornando-se um incômodo para seus amigos, decidiram tentar outro tipo de diversão sem ele desta vez. Viram que a presença de Andrew poderia colocá-los em encrenca e acharam que o melhor para todos seria chamar a noite para o amigo arruaceiro.  

Solicitaram um táxi para Andrew e o levaram até uma esquina com pouca movimentação. Eles chegaram a passar uns dois minutos com ele, mas logo foram embora. Um pouco desorientado e sem noção do tempo Andrew, esperou, esperou e esperou. Parecia que a carona não chegaria, se é que realmente chegaria. Imaginando que fosse mais um trote de seus colegas, desistiu de esperar e resolveu fazer seu próprio caminho para casa, valendo-se apenas de sua intuição. 

E de repente as luzes se apagaram e algazarra subsequente começou como passe de mágica. Muitos gritos abafados e comemorações ao evento que parecia despertar o pior do ser humano. Prejuízo para uns, lucro para outros. 

Tudo ao seu redor se escureceu. As luzes dos postes, dos interiores dos apartamentos e estabelecimentos. Andrew achou que tinha desmaiado, mas logo deduziu que alguma coisa aconteceu. Um apagão, talvez. Aos trancos e barrancos pegou o celular no bolso para usar sua lanterna, mas o aparelho estava desligado e ele não se lembrava se deixou-o descarregar. Tentou religá-lo por várias vezes e não adiantou.  

Nada estava dando certo para ele depois daquelas rodadas consecutivas de shots. 

A ponto de quase desmaiar pela embriaguez, desistiu de ir para casa andando e se recostou numa parede desgastada pelo tempo, deslizando até o chão na tentativa de se recompor. Talvez fosse melhor aguardar pelo táxi ou por uma alma que se compadecesse dele, imaginando que fosse um mendigo e lhe resgatasse de volta para casa. 

A carona de Andrew chegou depois, quando um carro vindo em alta velocidade e com os faróis apagados subiu a calçada e atingiu o jovem, prensando-o à parede. Andrew nem viu o que o atingiu em cheio. Morreu na hora. 

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Doze de março de 2XXX. Dez da noite. Metade do estado de Nevada se apagou. Não choveu na maior parte do estado e nos locais aonde a chuva caiu mal passou de uma garoa. Se já não fosse grave um problema como aquele surgir sem precedentes, as milhares luzes que compunham os estabelecimentos extravagantes, residências e outros locais de Las Vegas se apagaram; o que causaria um prejuízo financeiro grave e isto era inadmissível. A cidade no deserto voltou como era nos tempos antigos, iluminada apenas pela luz da lua e das estrelas; fria e perturbadora. Cassinos, hotéis, bares, bordéis, boates. Nenhum escapou. Apagaram como o sopro em uma vela. 

No Departamento de Criminalística, um caos. De alguma forma os geradores entraram em pane, trazendo o risco de danificarem os aparelhos mais frágeis (e caros) e, consequentemente, destruir ou contaminar evidências dos casos. Foi um pesadelo para Grissom, presente no laboratório quando o apagão aconteceu. Jantou por lá mesmo para adiantar o trabalho e começar seu turno mais cedo. Se soubesse o que iria enfrentar por ali teria ao menos ficado em casa para que alguém tomasse as rédeas da situação primeiro. Odiava que seus planos fossem atrapalhados por questões além de seu controle. Gostava de agir metodicamente. 

Sara — que havia chegado umas duas horas antes do apagão — se encontrava numa das salas de análise audiovisual assistindo uma série de gravações internas de um hotel aonde um crime ocorreu no dia anterior. Atuava no caso sozinha, pendendo para executar uma das piores partes na sua opinião: pregar seus olhos em imagens sem cor nem som. Bastava um pequeno estímulo para cair no sono. A cafeína da bebida morna em seu copo já não fazia mais efeito. 

Quando o apagão aconteceu levara um susto. A adrenalina gerada em suas veias fez valer mais do que todos os outros copos de café. Sussurrando algumas palavras para se recompor, ela arrastou sua cadeira para trás e ergueu as mãos em rendição, imaginando primeiramente que não teria sido um descuido seu com os equipamentos. Não levou muito tempo para a ficha cair e a perita logo reparou que se tratava de uma falta de energia. 

— Não pagaram a conta, é? — Ela sorriu deliberadamente. 

Pegando seu celular para checar se havia alguma informação, franziu a sobrancelha ao notar que se encontrava desligado. Lembrava-se de sair de casa com a carga cheia.  

— Droga. 

A primeira tentativa falhou. A segunda, sem resposta alguma novamente. 

— Ah, não. Não vai me deixar na mão agora, vai? — Ela pressionou o aparelho. Pediu fervorosamente para que os circuitos não tivessem queimado ou coisa parecida. Esperou alguns minutos e, após mais duas tentativas, o celular religou.  

Seus ombros relaxaram e ela suspirou de alívio. Não sabia dizer se a falta de energia resultou de alguma forma na pane de seu celular, apenas que resolveria isto após saber o que fazer adiante. Pensou em seguir para a sala de descanso, mas mudou de ideia no último instante e resolveu passar na sala de Grissom tendo a certeza de que ele também já estava no Laboratório.  

Sua missão se tornou uma prova de fogo ao pisar os pés fora da sala, quando se deparou com uma enxurrada de pessoas indo para lá e para cá, falando de modo exaltado como se estivessem no meio de uma liquidação de black friday. Os corredores estavam um caos. Depender apenas das luzes amarelas de emergência para se deslocar tornava o cenário mais assustador. 

Naquele quase amontoado de gente Sara se sentiu um peixe fora d'água, perdendo-se em seu próprio rumo. Ela olhou à sua volta, pessoas apertando o passo, loucas para resolverem seus problemas como num passe de mágica, um formigueiro em crise. Por um momento se sentiu longe daquele espaço físico, como se fosse levada para um outro ambiente e que apenas um espectro de sua presença se encontrava por lá. 

Vacilou ao dar os primeiros passos e acabou esbarrando em um homem do qual não conseguiu identificar ao certo, imaginando apenas que era uma figura familiar. Ela conseguiu ouvir uma voz bem distante a lhe pedir desculpas, mas seria inútil responder já que estava longe. Não podendo simplesmente voltar para sua sala sem energia, decidiu enfrentar a correnteza. 

Apesar de sentir o impacto da falta de energia e sabendo que o trabalho deu caso iria atrasar, gerando mais e mais horas extras, Sara se sentia alheia aos outros. Sentiu que seu corpo a obrigou a entrar num modo automático, poupando-a de mais estresse acumulado. Chegou a ser engraçado pensar assim. O mundo ao redor entrando em colapso enquanto ela tentava apenas seguir viva. 

— Isso aqui tá um inferno — comentou baixo antes de se aproximar da sala de Grissom. Ela observou o interior da sala pelo vidro da porta, encontrando apenas um feixe de luz vindo de sua mesa. Na maior parte das vezes aquele espaço ficava escuro, o que gerou certa dúvida em Sara em saber se Grissom realmente percebeu a falta de luz. 

A lamparina de led disposta na mesa dele foi a resposta para sua pergunta.  

Sara bateu em sua porta e ficou observando o lado de dentro para ver se chamou sua atenção, mas notou que ele sequer se moveu. Meio curvado, encarava o que fosse o aparelho celular, variando entre ele e o telefone disposto na mesa. Parecia nervoso. 

Apesar de ter outras — e melhores — opções em mente, Sara decidiu seguir adiante e entrou na sala. Já imaginava uma resposta não muito agradável, mas também já pensava numa resposta à altura. 

Quanto mais chegava perto, mais a luz da lamparina revelava um homem vivendo em sua própria ilha, dono de um castelo impenetrável.  No momento em que percebeu a presença de alguém, já que não escutou a porta sendo aberta, o supervisor ergueu a cabeça para identificar quem estava prestes a "invadir" seu espaço. Suas sobrancelhas, franzidas, arquearam de surpresa quando Grissom se deparou com ela.  

— Sara? O-o que você... está... 

— Ainda viva. — Ela acenou, mostrando um meio sorriso. 

— Deus... — Ele suspirou de cansaço. 

— A prefeitura deixou de pagar alguma conta que eu não sei? 

— Milhões de dólares investidos nesse departamento para isto aqui. — Grissom ergueu o celular mostrando a tela escura. — Nem a linha telefônica está funcionando direito! Meu Deus! 

— Deve ter sido uma pane geral. Alguma torre elétrica que explodiu, eu não sei. — Ela deu de ombros enquanto ele persistia em negar com a cabeça. 

— Falta de energia acomete apenas os equipamentos ligados à tomada. Agora isto...? — Faltou pouco para ele lançar o celular na mesa. 

— Já viu o caos que tá lá fora? Não quero ser pessimista, mas... — Achando que Grissom não tinha ideia do que estivesse ocorrendo e temendo que sofresse um baque maior, Sara achou melhor deixá-lo a par da situação. 

De uma hora para outra ele deixou o telefone, o celular em cima da mesa e se levantou. Sem avisar, seguiu até a porta onde observou o lado de fora. Parecia um cenário de suspense. O movimento constante de pessoas estava lhe dando nos nervos. 

— Ah! Como isso foi acontecer?! — questionou ao falar sozinho. Estava mais acostumado a lidar com um volume alto de casos que apagar incêndios como a falta de luz.  

Admirava-a saber que Grissom mal sabia do que acontecia adiante aquela porta. E a admirava mais ainda vê-lo tão alterado. 

— Acredito que vão resolver o problema logo. — Sara explicou, tentando aplacar seu aparente desespero. 

— É um desastre — disse dando de ombros, aquém de ser capaz de resolver o caos que se instalara. 

— Gil? Ei, tá aí, Gil? 

Ambos olharam para a mesa do supervisor. Grissom encarou a subordinada uma última vez antes de se dirigir até lá apressadamente. Pegou um rádio comunicador e agradeceu por dentro ao saber que ao menos aquela velharia funcionava. Com falhas, mas funcionava. 

— Brass, eu tô aqui. Pelo amor de Deus o que está acontecendo? 

— Você me pergunta isso? Tá o inferno na terra por aqui! Apagou tudo, não tá percebendo?  

— Deus... — O supervisor levou a mão à testa.  

— Espero que tenha pessoal disponível agora. Chame os do turno do dia porque você deve precisar. — Houve uma pequena pausa na transmissão e muito chiado. — Deve, não. Vai. É rezar pra gente... dessa noite... vivo. 

A transmissão estava ficando pior e logo seria impossível compreender as palavras do capitão. 

— Obrigado pelas palavras confortantes — disse em voz alta. — Mas agora preciso apagar os incêndios daqui primeiro. Me mantenha informado, nem que precise usar sinal de fumaça! — declarou de modo irônico. Enquanto falava, Grissom guardou o celular no bolso da calça e a lamparina led, ameaçando se preparar para sair. 

Ela ficou quieta enquanto o via perambular pela sala sem destino ou tentando procurar seu caminho. Esperou que dissesse alguma coisa antes de ir, ao mesmo tempo em que temia não ouvir nada, vislumbrando apenas a figura de um homem prestes a deixar a sala. 

— Preciso de você — Grissom disse ao retornar sua atenção a ela, pegando-a de surpresa. 

As palavras — diretas demais — despertaram-na de repente. O pouco de tempo que lhe foi disposta foi suficiente para se recompor, ao menos. 

— Diga. — Sara respondeu como se já estivesse pronta para fazer qualquer coisa. Ela engoliu em seco logo em seguida. 

— Temos muito trabalho a fazer. — Em vez de sair, Grissom voltou para trás da mesa e começou a procurar algo em suas gavetas. Não levou menos de vinte segundos quando encontrou o que procurava: uma lanterna simples. Ele a pegou entregou em suas mãos.  

Com um sorriso de agradecimento, Sara o acompanhou para fora da sala. 

— Sabe dos outros? — perguntou ele. 

— Estou tentando falar com eles e sem resposta. Por enquanto somos só nós aqui. 

— Ótimo... 

Andar por aqueles corredores quase escuros acompanhada por alguém tornava a tarefa menos angustiante. Logo se esqueceria dos cantos tenebrosos de um laboratório de criminalística atingido por um apagão ao executar as várias tarefas que ela e Grissom se encarregaram de fazer.  

Checar os geradores para saber se ficaram com defeito e religá-los o quanto antes, os freezers, caso fosse necessário realocar certas evidências e por último, mas não menos importante, trancar a sala de balística. A última coisa que gostariam era de algum lunático ou aproveitador conseguir acesso às centenas de armas dispostas numa sala na escuridão quase total. 

A primeira notícia veio logo de cara: os geradores não davam resposta aparente. Pareciam ter queimado, acumulando mais uma das sucessivas dores de cabeça no supervisor de turno da noite. Ele chamou pelos técnicos, que informaram sobre o atraso na chegada. A luz não voltaria tão cedo, isto já era certo. Tendo de mudar os planos, a ordem da vez era usar todo o aparato disponível e lidar com as evidências à moda antiga antes que se enfiassem num poço sem fundo. 

— Está pior do que pensei — comentou o supervisor. Suspirando de um cansaço precoce, Grissom levou a mão às têmporas na tentativa de se recompor. Nada estava dando certo e a tendência era piorar. 

— Não é o fim do mundo. É trabalhar com o que temos. Há menos de um século eles não tinham parte do que temos e conseguiam dar seu jeito — brincou. 

— Temos que correr. Ainda temos muito a fazer aqui e quero estancar todos os vazamentos possíveis. — Grissom falou, aparentando não ter prestado muita atenção em suas últimas palavras. 

— Gil. — O capitão Brass o chamou pelo rádio quando a dupla se preparava para ir embora. — Tem uma ocorrência pra você. Atropelamento e fuga próximos da esquina da Quarta com a Avenida Carson. Te passo os detalhes logo mais. 

— Ok. — Ao desligar o rádio, Grissom visou Sara e ficou de frente para ela. — Arrume seu kit e me encontre no estacionamento daqui a quinze minutos. Atropelamento e fuga. 

— Você também vai vir? — perguntou por curiosidade. 

— Obviamente. — Ele voltou a caminhar, porém estranhou quando Sara continuou parada. 

— Não quero cortar o seu barato, mas eles precisam de você por aqui. Mais do que em campo. 

Apesar de gostar da companhia de Grissom, até mesmo ela não podia permitir que seguisse com a ideia. Seria mandar esforço desnecessário numa situação da qual menos era mais. 

— Estamos numa Las Vegas em plena escuridão e o local da ocorrência é conhecido pela alta taxa de criminalidade. Isto significa que- 

— Você não quer me deixar sozinha, sei. — Sara se adiantou, respondendo-o com um ar de leveza. 

Atingido pela resposta direta ele se limitou mudar a direção do olhar para não aparentar que foi pego desprevenido. No fundo, tudo o que realmente gostaria de fazer era não deixá-la trabalhar naqueles cantos por conta própria justamente naquele dia. 

— Vai ter um oficial por perto. Não foi sempre assim? — A perita deu de ombros. 

Grissom semicerrou os olhos na tentativa de entendê-la. Talvez fosse a primeira vez que ouviu uma resposta como essa e ele se encontrava completamente desarmado. 

— Quero dizer... O pessoal precisa mais de você aqui do que... eu... — Ela disfarçou, desviando o olhar para o outro lado. Se não pusesse um ponto final naquela discussão acabaria dizendo algo indevido. — Eu vou ficar bem, acredite. Não carrego uma arma à toa. 

A falta de insistência refletida em sua postura indicava que ele jogou a toalha. Ele tinha autoridade para dar a palavra final e indicar outro perito para ir com ela ou até mesmo tirá-la daquele caso se bem quisesse. Mas não era esta a sua vontade, sua verdadeira vontade. Acima de tudo ele prezava pelo seu bem-estar, gostando ele ou não. Mesmo que isso lhe custasse ceder algo de vez em quando. 

— Grissom? — Ela chamou por ele, notando que se fechara para seu mundo. — Devem estar me esperando. Melhor eu ir. 

? Oh... ok. — O supervisor continuava meio avoado. — Não se esqueça do rádio. Vai ser nosso... melhor meio de comunicação por enquanto. 

— Certo. — Curvando os rostos num meio sorriso, ela acenou de modo tímido para ele e fez seu caminho até a saída. Ele, por sua vez, continuou por ali: parado, observando-a sair. 

— Me mantenha atualizado — recomendou, mas não sabia dizer se ela conseguiu escutar seu conselho. 

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Era a hora em que Sara precisaria se esquecer do caso anterior por um tempo e se fixar num caso "mais fresco". Tinha de admitir que a incomodava um pouco ter que mudar seu foco, já que suas investigações sobre o crime no hotel estavam avançadas. Todavia, tinha de se conformar afinal era um dia atípico, dos mais atípicos que poderia surgir em Las Vegas. Quando decidiu se mudar para Nevada a pedido de Grissom, ela já imaginava se deparar com situações absurdas. Um apagão total na cidade era apenas mais uma. 

Para que sua noite ficasse ainda pior, teve de enfrentar um engarrafamento de mais ou menos dez minutos a poucas quadras do local do crime. Portas trancadas, janelas fechadas e o temor de alguma confusão surgir do nada. Chegou até a verificar o estado da sua pistola e garantir que havia trazido munição suficiente para um eventual conflito. Já ouviu dizer pelo canal de rádio sobre focos de saques em estabelecimentos da região. Um apagão como aquele era a oportunidade perfeita para extrair o pior do ser humano. A última coisa agora seria fazer parte de outra ocorrência. 

Cada buzinada próxima ao seu carro era um pequeno susto, temendo que do nada pudesse ser alvo de um motorista exaltado ou veículo desgovernado. Sara até ligou em uma estação de rádio aleatória para se acalmar, mas os minutos foram tensos. Escuridão quase total; apenas luzes de faróis, telas de celulares ao redor, das lanternas dos guardas de trânsito sobrecarregados e dos policiais que patrulhavam já pilhados as ruas turbulentas. Por um momento, Sara se sentiu no meio de uma revolução prestes a explodir, arrependendo-se ainda de ter recusado a companhia de Grissom. 

Passado o tempo em que conseguiu com êxito deixar o engarrafamento e seguir até o local indicado, sentiu-se aliviada ao se deparar com uma viatura e dois oficiais guardando a cena do crime. Não estaria sozinha, afinal. Era bom se sentir próxima de uma companhia. Armada, inclusive. 

Ela cumprimentou os oficiais, que lhe deram as primeiras informações da cena do crime e sobre o caos no qual as ruas se encontravam. Estavam atentos; olhares desconfiados por todos os cantos, nunca se podia saber se um lunático apareceria de repente ou um algum acidente de trânsito surgiria. Recomendaram ainda que se apressasse no que fosse possível para dar o fora dali o quanto antes. O detetive responsável, Vega, estava próximo ao perímetro falando com possíveis testemunhas. Falaria com ele depois. 

Pegando sua câmera para fazer os primeiros registros, Sara fez uma primeira análise da bagunça. Logo, logo, o legista iria chegar, assim como a ajuda para retirar o corpo dali. Motorista — homem ou mulher — fugiram da cena do crime. Provavelmente era carteira vencida, embriaguez ou fuga. Ninguém em sã consciência — ou condição financeira mediana — deixaria para trás um carro como aquele. 

Alugado? Emprestado? Eram especulações iniciais, que Grissom odiava, inclusive, mas que a ajudavam a entrar na linha de investigação. Talvez tivesse perdido o controle do volante e nem viu o que atingiu, temeu por sua vida e fugiu a pé. Muitas linhas de investigação que não iriam avançar se continuasse parada ali, dedo em riste no botão de disparo da câmera. 

— Nem viu o que atingiu você, não é? — A perita comentou em voz baixa ao encarar o corpo ainda preso entre o muro e o veículo, que por sinal era um Range Rover preto, altíssimo valor. 

Ao iniciar a série de fotografias, a mente de Sara tentou levá-la para o último minuto (ou segundos) de vida daquela vítima, que aparentava ser um homem. À primeira vista era impossível diferenciar o gênero. 

Ela realmente desejou que a vítima tivesse morrido na hora. Longe de ser um desejo mórbido, mas olhando a cena uma onda de empatia lhe cercou. Impossível não pensar ou torcer para que a vítima não tivesse sofrido por muito tempo. 

Mal sabia que num futuro não muito distante iria desejar que alguém pensasse o mesmo dela. 


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