No dia seguinte encontraram o rio que, Hernan dissera, talvez guiasse-os para fora. Mas Ascian pensava apenas uma coisa quando correu na frente dos irmãos, ajoelhando-se na margem: água.

Com as mãos em concha já a meio caminho dos lábios, ouviu uma voz calma perguntar:

— Criança, você por acaso sabe que águas são essas?

Ascian assustou-se, erguendo o rosto. De algum modo, não percebera antes a mulher bem ao seu lado, com o corpo mergulhado no rio até a cintura, os tecidos leves do vestido disforme estavam encharcados, quase transparentes. Ela apoiava-se na margem sem se importar com os braços nus na terra. Tinha um olhar curioso, mas a voz soou relativamente indiferente. Os cabelos escuros trançados com galhos e flores eram adornados com uma coroa de pequenos cogumelos vermelhos e brancos, alguns também em suas mãos como as joias de uma senhora. Pigmento ocre terroso coloria uma faixa sob seus olhos, e seus lábios, em um sorriso ligeiramente inadequado, como se estivesse sorrindo apenas por saber que pessoas fazem isso ao conhecerem outras, estavam pintados da cor da argila vermelha. Inclinou-se indicando a água nas mãos de Ascian, e ele sentiu o aroma leve e familiar de petricor exalar dela como perfume.

— Essas são as águas primordiais onde eu nasci – informou. O tom de uma curiosidade, não um alerta.

Ascian enxergou algo antes oculto: filamentos luminosos dançando na água, resquícios físicos de magia pura. Quase se permitiu enganar, pois o rio também pertencia à Floresta. Deixou a água escorrer de seus dedos, resignando-se à sede.

— Ascian! Não corra na frente… – Os irmãos chegaram logo atrás, mas Hernan calou-se ao ver a estranha figura no rio. Boatos diziam que a Floresta Profunda era o reino de uma deusa reclusa, e eles sabiam estar diante dela.

Meldrie, Senhora da Boa Terra.