Red Flowers escrita por Lisa Granger


Capítulo 2
Capítulo 2 - Eu não posso mais




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“Sabe Mônica, você me lembra a lua, simplesmente linda e maravilhosa, cheia de mistérios, com milhares de estrelas ao redor, todas ali por você. Você é o que une a todos nós, somos suas estrelas, sem você... Mas ao mesmo tempo, quase inatingível, por mais que todos ... não, por mais que EU me esforce, ainda não posso te compreender, não completamente. Me pergunto se um dia vou cansar de tentar”

Essa lembrança, essa lembrança específica de um dia que ela estava em seus braços, se sentindo tão protegida e amada quanto achava que um ser humano podia se sentir fez Mônica começar a chorar. As lágrimas escorreram silenciosamente pelo seu rosto, e ela deixou que escorressem. Mesmo naquela época, achou aquela frase estranha e lembrava-se de perguntar a si mesma se aquilo significava que um dia ele desistiria dela, ou se já estava desistindo. Se soubesse, mesmo que uma pequena parte, pelo que passaria por escolher estar com ele, voltar pra ele tantas e tantas vezes, perdoar e esquecer, ou melhor, fingir esquecer, será que ela teria continuado? Ou teria acabado aquele relacionamento, aquela estranha relação que eles tinham desde crianças, naquele exato momento? Não, ela não acabaria, sabia disso. Por mais que algum tempo depois ela passaria por um inferno em sua vida, não desistiria, não perderia nem um segundo que pudesse passar ao seu lado.

Mônica então riu, mas o som saiu mais como um soluço em meio as lágrimas, o que só a fez querer rir mais. “Será que estou louca?” ela se perguntava, vale a pena dizer que não pela primeira vez. Suspirando, a garota fechou os olhos, e se deixou chorar, pelo menos ali, sabia que poderia chorar sozinha e também sabia que seria uma das últimas oportunidades que teria de poder desfrutar de tal privacidade.

Ela não sabia por quanto ficou ali, em silêncio, com o rosto sendo banhado pelas lágrimas que não cessavam de escorrer, mas só foi abrir os olhos muito mais tarde quando sentiu que alguém sentava ao seu lado.

Ainda sim, levou mais alguns minutos até seus olhos se dirigirem para a figura ao seu lado, que contemplava o seu estrelado, como se para lhe dar privacidade ou escolha de lhe ignorar, se essa fosse sua vontade. Ela não tinha medo, sabia muito bem que só mais uma pessoa conhecia aquele lugar, a mesma que a havia levado ali, há muitos anos atrás. Nem mesmo Cebola conhecia aquele lugar, ou qualquer um de seus amigos, era um refúgio especial.

Ela o observou, ainda em silêncio. Ele parecia o mesmo, com os mesmos cabelos bagunçados e olhos puxados e percebeu que isso a surpreendia. Mas o que esperava? Fazia só três meses, não três anos, ninguém mudava tanto em tão pouco tempo. Mas talvez Mônica só se sentisse assim porque ela mesma havia mudado, não era, sem sombra de dúvidas, a mesma garota de pouco tempo atrás, fosse essa mudança para melhor ou pior.

Mônica apreciava o silêncio dele e nesse mesmo silêncio ficaram por longos minutos. Pouco se mexiam, quem os visse de longe poderia imaginar que eram duas estátuas, paralisados pela a eternidade. Depois de algum tempo, a garota fechou os olhos e finalmente falou:

— Como você acha que vai ser amanhã, Do Contra? – ainda de olhos fechados, esperou pela resposta.

— Pra mim? Mais um dia normal de aula. Pra você? Um inferno. Todos vão querer saber, vão perguntar, fofocar e te olhar. Mas você não precisa que eu te diga isso, tenho certeza que já sabe. – e ela realmente sabia porém tinha um ínfima esperança de que todos pudessem ter esquecido, mas é claro que isso não aconteceria. O garoto continuou. – Você deu sorte, a sua situação com o Cebola aconteceu pouco antes do fim das aulas, nas últimas semanas, então todos estavam preocupados com provas finais ou viagens, mas agora? A sua relação com ele, ou a falta dela, será o assunto principal, não tem mais distrações. Fora o fato de que você passou meses fora, mal mantendo contato até mesmo com a Magali. Digamos, Souza, que você é o assunto principal do bairro, e isso já faz uma semana.

Mônica suspirou profundamente, Do Contra havia sido brutalmente sincero, como ela sabia que seria. Ele agora estava em silêncio novamente, lhe dando espaço para pensar e foi isso que a garota fez. Tudo que havia sido dito, não era nada que já não soubesse, não era mesmo, vivia naquele mesmo bairro á dezoito anos agora e sabia muito bem como as coisas funcionavam em um bairro tão pequeno. O Limoeiro era como se fosse um organismo vivo, cada casa se ligava uma a outra, formando um grande corpo conectado, o que um sabia, todos sabiam, nada ali era guardado, não haviam segredos.

Mesmo assim, Mônica se sentia apreensiva e pensava “Quanto eles sabem?”. Cebola não contou, não poderia ter contato, toda a verdade, ela havia pedido isso a ele e o troca-letras havia concordado. Ele lhe devia isso, pelo menos isso. E no fundo, Mônica se acalmou, sabia que ele não seria capaz de contar e de machucá-la assim de novo.

Ficou perdida em seus pensamentos e só percebeu que até então estava com seus olhos firmemente fechados quando os abriu para ver uma mão estendida em sua direção, pela primeira vez naquela noite Do Contra a olhava diretamente, lhe fazendo um claro convite que após alguns Mônica aceitou.

Eles começaram então a longa descida que os levaria de volta a cidade e depois as suas respectivas casas. Durante todo o trajeto, nenhuma palavra foi dita e o que para alguns seria estranho, (como duas pessoas podiam estar tão próximas e não se falar?) para os dois era completamente normal.

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Com uma última olhada no espelho e um suspiro, Mônica desceu as escadas em direção a porta. Durante todo o caminho teve que desviar das diversas caixas de papelão que se espalhavam desordenadamente pela casa, a garota se perguntou, vagamente, até quando protelaria a arrumação.

O vento frio no seu rosto foi de certa forma revigorante, Mônica adorava o frio, o inverno sempre fora sua estação preferida. Caminhou em passos lentos até a padaria, olhava tudo ao seu redor mas sem realmente ver, seus pensamentos voavam longe. Mas essa calmaria foi interrompida por um súbito grito:

— Mônica!!! – e antes que pudesse ao menos se virar, alguém já havia pulado em cima da garota e a abraçava firmemente, sem pensar duas vezes, abraçou de volta – Eu senti tanto a sua falta! Por que não me contou antes que tinha voltado?

Mônica apenas sorriu para a amiga, que sorriu de volta e a abraçou ainda mais. Não podia negar que havia sentido saudade de sua melhor amiga, muita saudade. Começaram a andar em direção a escola, de mãos dadas, do mesmo modo que faziam quando crianças.

A conversa, ao contrário do que Mônica pensou, fluiu simplesmente. Magali contou sobre tudo que fez nos últimos três meses, ela falava sem parar e ela gostou disso. Não queria falar sobre si mesma e sabia que a amiga havia percebido isso, por isso não perguntou nada, embora Mônica soubesse que ela queria saber. Mas Magali a respeitava e sabia que quando quisesse falar, falaria, essa era uma das maiores qualidades da comilona, uma das quais Mônica mais gostava.

O caminho para a escola era longo, e quando finalmente chegaram nos grandes portões de ferro amarelo, ela já estava quase completamente atualizada de tudo que havia acontecido durante o tempo que estivera fora, não só sobre a vida da Magali, mas de todos.

Parou alguns segundos, não queria entrar, e ficou apenas olhando com certa distância o mar de alunos que se encontrava no pátio e jardim da escola. Porém a hesitação não durou muito, e Mônica se repreendeu intimamente. Ela não era medrosa, nunca havia sido, quanto maior o medo ou o perigo, mas corajosa ela se tornava e isso era algo que ela gostava em si mesma, e não deixaria essa característica se perder. Estava sendo dramática, ela não era a primeira pessoa a sofrer de amor, nem seria a última. Por isso, pisando firmemente, andou em direção as diversas pessoas, algumas das quais já a olhavam.

Quando finalmente se sentou em sua carteira, Mônica respirou aliviada. Havia sobrevivido as dezenas, não, milhares de perguntas que lhe haviam sido direcionadas. “Onde esteve?”, “Por que não falou com ninguém nos últimos meses?”, “Você está bem?” e por fim, a única que todos realmente queriam saber a resposta “Você e o Cebola realmente terminaram?”. Mônica havia se desviado de cada uma delas, respondendo só as que queria.

Ela tentava não se irritar com todo aquele intrometimento em sua vida pessoal, “Vocês não tem nada mais a fazer do que cuidar da vida alheia?”, embora uma parte sua estivesse extremamente feliz. Seus amigos, seus verdadeiros amigos, não haviam lhe pressionado, nem mesmo perguntado nada sobre o referido troca-letras e Mônica estava muito agradecida por isso. Até mesmo Denise, a fofoqueira suprema do bairro, havia se limitado a abraçá-la. Embora não tivesse realmente se surpreendido, Mônica era uma das poucas que conhecia Denise, a real Denise, e sabia que a amiga não era superficial e insensível como aparentava.

Mas no intimo, Mônica estava incomodada, onde ELE estava? Durante todo o seu trajeto não o havia visto, e embora isso lhe agradasse, também a perturbava.  

Olhou ao seu redor, e viu que todos já estavam se acomodando, se sentando. Olhos de todos os tipos olhavam para ela, alguns carinhosos e preocupados, outros curiosos e desdenhosos. Mônica dirigiu seu olhar para a janela, e observou o jardim, onde alunos ainda conversavam e se dirigiam lentamente as suas respectivas salas, ignorando as vozes altas ao seu redor.

Porém, quando tudo repentinamente se aquietou, o estômago de Mônica se contraiu, ela sabia que o veria se virasse o rosto, e mesmo sabendo que aquilo a machucaria, virou-se lentamente.

Lá estava ele, Cebola, interrompido no meio de um passo, havia parado na porta e a encarava intensamente, e a garota o encarou de volta. Não sabia quanto tempo ficaram assim, mas tudo ao redor deles parecia ter parado, um silêncio absoluto reinava naquela sala que usualmente era uma das mais barulhentas. Seus amigos pareciam estar com medo de até mesmo respirar e quebrar o que havia se instalado ali. Todos os encaravam, Mônica podia sentir os olhos de todos em cima deles, mas só percebeu isso com uma pequena parte de sua consciência, a outra só via, só pensava nele.

Mesmo contra sua vontade, as lembranças começaram a voltar, rasgando e machucando Mônica por dentro, como se estivesse vivendo aquela situação pela primeira vez novamente. A dor era imensa, e não pode conter o suspiro que escapou de sua boca.

“Eu não posso continuar, Mônica. Eu acho que na verdade, eu nunca te... eu nunca te amei”.


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