Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 88
Se Despedindo da Finlândia


Notas iniciais do capítulo

Pois bem, os últimos momentos das duas famílias reunidas na Finlândia.
Tenham uma boa leitura!



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Quatro dias depois do Natal, Will, Pepper, Kim e Vic se despediram de todos, o casal de Los Angeles iria para Bali e meu irmão e Vic para as Maldivas.

Claro que, depois de uma “reunião” em família, acabou sobrando para que eu bancasse a motorista e levasse os casais para Helsinque até o aeroporto.

— Vou ter que dirigir seis horas debaixo de neve só para levar os quatro bonitos para pegar um avião? Estão achando que sou o que? – Reclamei.

— Pense bem, cunhadinha, - Will começou. – Estou te dando a oportunidade de ser a minha motorista. Um dia eu serei muito importante e posso lembrar de você no meu discurso de vencedor do Oscar.

Eu só encarei Will abismada com a cara de pau de sujeito.

— E não se esqueça. Temos horário, então seja uma motorista pontual e esteja com o carro pronto às 07:00 da manhã, na porta dessa casa, eu não quero nem pensar em esfriar o meu pezinho ao pisar em um banco de neve! – Vic gritou do segundo andar.

Tudo que pude fazer foi ficar olhando estarrecida para cima, ainda descrente com o que eu tinha acabado de escutar.

E, no outro dia, às sete da matina, com um frio de - 15ºC, eu estava do lado de fora da casa, esperando a boa vontade dos quatro de colocarem o nariz para fora.

— Mas não vai carregar nem as malas? Que serviço de motorista é esse que eu contratei? – Kim perguntou do lado de dentro.

Eu, que já não estava muito feliz de ter que viajar para o sul do país só para levá-los para o aeroporto e perder um dia de descanso, simplesmente resolvi preparar uma para meu irmão.

Enquanto meu pai mandava Kim carregar as próprias malas e as de Vic, fiz o maior número de bolinhas de neve que consegui e assim que meu irmão passou pela porta, acertei todas elas em seu rosto.

— MAS, POR QUÊ?

— Para você parar de ser chato e acelerar isso aí. Não vivo por sua conta. O porta-malas está aberto. – Acabei de falar, limpei minhas mãos e entrei no carro, onde Will e Pepper já estavam.

— Bela mira! – Will me falou.

— O tamanho da figura ajuda. – Comentei.

Kim, resmungando, entrou no carro e me lançou um olhar mortal.

— Você pediu por isso. – Expliquei.

— Alex não vai? Creio que é a primeira vez que ele te deixa sozinha desde que vocês chegaram de Los Angeles. – Vic trocou o assunto ou era bem capaz que eu e Kim começássemos a brigar.

— Ficou dormindo. Nem sei se me escutou quando eu o chamei.

Will riu.

— Mas também, Elena ontem fez dele o que bem quis. Só o fato de ela ter colocado o meu irmão para correr atrás dela durante a guerra de bola de neve, já o matou.

— Deus, Elena é realmente um Furacão! – Pepper completou. – Um docinho de menina, super fofa e educada, mas não desliga por nada desse mundo. Como vamos fazer quando ela aparecer em Los Angeles? Ela vai nos deixar malucos na praia.

— Depois eu vou pensar nisso. – Murmurei. – Uma dor de cabeça por vez.

— Nada, Kat. Melhor já ir se preparando mentalmente. Porque quando ela juntar com o Benny, não vai sobrar um vivo na costa da Califórnia.

Fiz uma careta ao pensar em Elena conhecendo o mais louco e estabanado dos amigos de Alex. A Costa Oeste ficaria pequena para tanto problema...

A conversa entre nós cinco mudou para uma futura viagem que deveríamos fazer. Pepper e Vic clamaram que tinha que ser para alguma praia, um lugar quente e bonito. Will emendou que tinha que ser onde tinha a possibilidade de surfar e Kim pediu que não tivesse paparazzi. Fiquei calada, pois a viagem de férias deles era completamente diferente da viagem que eu amava fazer para recarregar as baterias, pois eu estava no meu paraíso.

E nessa falação de destinos praianos, que agora estavam concentrados entre o Caribe ou o Pacífico Sul, cheguei à Vantaa, e deixei os quatro no aeroporto.

— Te vemos em Los Angeles agora? – Pepper perguntou pulando para se aquecer, enquanto esperávamos os homens tirarem as malas do carro.

— Sim. Devo voltar logo na primeira semana. – Confirmei.

— Alex fica, não é? – Vic continuou com o interrogatório.

— Ele fica, só volta em março.

Vic fez uma careta e completou.

— Muito tempo... é estranho conhecer esse lado das filmagens.

Pepper só confirmou com a cabeça, afinal, Will ainda não tinha terminado o filme dele... era quase um mês no Canadá agora.

— Vendo o copo meio cheio, poderemos, enfim, fofocar sobre eles, sem ter os irmãos Curiosidade perto de nós. – Ela brincou.

— Essa é a parte boa. Vão nos dar um pouco de liberdade. – Entrei na brincadeira e Will nos olhou torto.

— São vocês duas que não resistem ficar longe dos Pierce.

— Quer fazer uma aposta? – Pepper o provocou.

— Que tipo de aposta? – Ele retrucou.

— Do tipo que você vai perder.

— E essa aposta consiste em?

— Quem liga primeiro para o outro. – Minha cunhada falou e esticou a mão, como oferecendo para fechar o “acordo”.

— Você vai ligar, Pepper. Sempre é você a primeira pessoa a ligar.

— Não dessa vez. – Ela respondeu convicta e eles fecharam a aposta com um aperto de mãos.

 - Por favor, me falem quem vai levar essa! Porque eu fiquei curiosa aqui! – Vic falou e depois disso, começamos as despedidas.

Will e Pepper foram os primeiros, afinal Pepper podia jurar que estava congelando.

— Até Los Angeles, Kat. E muito obrigada pela viagem. Podemos voltar aqui, quando for verão! – Ela disse e entrou para o aeroporto.

Will não foi muito diferente, me agradeceu pela viagem e pediu que eu tomasse cuidado quando voltasse ao trabalho.

— Sei que você e meu irmão devem ter algum tipo de aposta sobre quem dá mais susto na família, mas duas quase mortes já foi o suficiente pelo resto da vida. Se cuidem e se precisar de qualquer coisa enquanto Alex estiver aqui na Europa, sabe que pode me chamar ou chamar a Pepper, não sabe?

—   Sei, sim, Will. E quanto a nossa disputa pessoal, não prometo nada. – Mantive o tom leve de nossa despedida.

Kim e Vic ficaram um pouco mais, até porque o voo deles decolaria mais tarde.

— KitKat, se precisar de companhia no final de semana, enquanto o Alex estiver fora, sabe que pode esticar até Chicago a qualquer hora.

— Eu sei, Kim. E vê se vocês aparecem... até porque a NHL também joga em Los Angeles.

— Vamos aproveitar que o Alex não está e fazer um tour pelas melhores baladas de LA... e postar todas as fotos nas redes sociais, só para fazer ciúme no Surfista. – Vic brincou.

— E, já que é para causar tanto assim, melhor chamar Pietra e Mel. – Completei o planejamento.

— Eu pagava para ver vocês quatro em uma balada de Los Angeles, aprontando e ainda postando as provas na internet. Vão as quatro terminar a noite em uma lanchonete, depois de terem ido assistir a qualquer filme meloso no cinema.

Fizemos uma careta para Kim, que, conhecendo o Bando de Loucas como poucos, estava certíssimo.

— Melhor deixar a diversão para a sua Despedida de Solteira. – Vic deu uma piscadinha para mim e depois entrou no aeroporto.

— Será que dessa vez sai algo mais emocionante do que uma Katerina bêbada depois de duas canecas de cerveja? – Kim me provocou.

— Melhor nem querer saber, Kim. Até porque, nem eu quero. – Disse com uma careta e me despedi dele. – Boa viagem.

— Aproveite essa despedida, pois só no veremos no ano que vem! – Claro que ele tinha que terminar com uma frase assim.

— Vai logo embora, seu Palhaço.

— Trate-me bem, ou posso despejar todos os seus vexames quando for a hora do brinde de seu casamento. E eu sei de quase todos.

Dei um tapa nele e meu irmão atravessou as portas rindo da minha cara.

Voltei para o carro, tinha uma longa viagem sozinha pela frente, e esta era a primeira vez que era deixada completamente só desde que tomei o tiro.

Passei metade do caminho cantando alto, tentando evitar os pensamentos que assombravam o fundo de minha mente, contudo, a certa altura, eles ganharam a batalha e comecei a ver a minha vida em perspectiva.

Eu quase fora morta há menos de um mês. Estive mais do outro lado do que desse. Quase deixei neste planeta as pessoas que realmente se importam comigo e com quem eu me importo, porque um velho queria ser ainda mais rico.

Aprendi, de uma forma bem dolorosa, nesse último ano, que o dinheiro e o poder falam muito mais alto do que sentimentos. Aprendi, depois de uma humilhação sem tamanho, que sempre haverá alguém que brincará com nossos sentimentos. Que são capazes de ganhar a sua confiança, e talvez seu coração, tudo por status social.

No final das contas, notei que fui usada na mais vil das formas. Pessoas que me conheciam desde criança, que me viram crescer, tinham se aproveitado da minha inocência, da confiança cega que eu tinha nelas e me usado com o único propósito de conseguir ainda mais dinheiro. E pensar que uma delas era meu próprio avô, uma pessoa que eu confiava, me espelhada e amava sem limites.

Lágrimas de ódio começaram a brotar no canto de meus olhos, enquanto vários momentos da minha vida passavam pela minha mente. Momentos vividos ao lado de toda a minha família.

— Como ele pode nos enganar desse jeito? – Murmurei sozinha. - Como? Mentiu para a esposa de mais de sessenta anos de casamento. Mentiu para o único filho. Usou e manipulou a neta, e ainda abusou psicologicamente de mim, me culpando sem dó pela minha desgraça pessoal.

Meu avô era um monstro frio e sem coração, que nunca deve ter amado ninguém a não ser o poder e o dinheiro.

— Não é à toa que é tão amigo de Cavendish. Dois interesseiros, obcecados pelo poder que o dinheiro traz.

E, no fundo, o meu maior desejo era de que eu jamais me tornasse como eles. Que eu jamais colocaria o dinheiro à frente da família.

Pensar que eu estava, aos poucos, me tornando uma pessoa assim... me entreguei tanto ao trabalho, que praticamente me esqueci de viver. Esqueci o que era parar e ficar com os pés para cima, só curtindo o tempo livre ao lado da família.

Eu tive que quase morrer – de novo – para dar valor ao que eu sempre tive.

Minha família.

Família essa que tinha aumentado quando eu menos esperava. Quando eu achei que tudo ia sucumbir de vez.

Definitivamente, Alex tinha razão. No fim eu tenho que agradecer a Matti. Se não fosse por ele, eu não teria encontrado a pessoa que abriu os meus olhos para o que estava a minha volta. E se não fosse por Cavendish, eu não seria capaz de dar o devido valor à minha família. Porque, e disso eu consigo me lembrar, foi em cada um dos membros da minha família que eu pensei quando achei que estava para morrer.

— Um dia eu direi isso a eles, cara a cara. Agradecerei por esta oportunidade de vida que, se não é perfeita, é quase. – Prometi a mim em voz alta. – Oportunidade não vai faltar, pois eu sinto que os verei mais cedo do que minha mente ainda em choque poderia querer.

Depois de ter despejado todos esses pensamentos, fiquei até mais leve, eu sabia que teriam mais momentos assim, não se passa pelo que passei e fica com a consciência e mente sãs de repente. Ainda viria uma onda de pânico, medo, indignação ao meu encontro. Restava-me apenas estar preparada para o dia em que eu fosse quebrar de vez e precisar, mais uma vez, do apoio de minha família.

— Só espero que não seja nada como no início do ano. – Pedi aos céus.

Não muito tempo depois de toda essa reflexão, cheguei em casa. Estacionei o carro na garagem, sabendo muito bem que teria que limpá-lo para que nada estragasse no assoalho por conta do sal que jogam para derreter a neve nas estradas.

Meu comitê de recepção foi bem eclético. Primeiramente, vi dois dos lobos da alcateia que ajudamos na manhã de Natal. Com a loba ainda na clínica veterinária, todos estavam rondando a casa, como se esperassem ela voltar e, para o caso de isso não acontecer, culpar os humanos. Quando cheguei mais perto da casa, Loki simplesmente se materializou do meu lado, vindo não sei de onde e começou a me farejar toda.

— Não te troquei por nenhum outro cachorro, ou lobo, Lokinho! Pode parar de ser desconfiado. – Falei ao acariciar as orelhas dele.

E, assim que abri a porta de casa, fui recebida por dois mísseis. Um loiro e o outro cinza. Elena e Stark se lançaram na minha direção ao mesmo tempo, o que resultou em um doloroso tombo no chão, sendo que bati justamente o lado esquerdo primeiro.

— Eu fiquei com saudades. – Foi a desculpa de Elena assim que saiu de cima de mim. – E o Stark também. – Apontou para o pitbull que abanava a cauda animadamente.

— Eu também fiquei. – Foi a minha resposta. Não brigaria com a pequena, ela ainda não entendia que costelas quebradas levam semanas para se curar.

Täti, podemos patinar lá fora hoje? Pedi para todo mundo, mas ninguém quis ir. Diz que podemos, por favor!! – Ela me pediu.

Conferi as horas e, ainda não era tão tarde assim.

— Deixe-me só trocar de roupa que vamos, tudo bem? Vá colocar uma roupa mais quente.

E minha sobrinha subiu a escada correndo, sendo seguida por Stark. Cumprimentei o restante da família que estava entretida em um jogo de pôquer e subi para me trocar, quase morrendo de susto quando abri a porta do quarto e vi Alex sentado na cama, de olhos fechados, murmurando o texto do script.

E ele estava tão concentrado, que nem me ouviu entrar. Assim, tratei de me trocar rapidamente, peguei minha câmera e sai de lá o mais silenciosamente possível.

— Isso que é concentração. – Murmurei depois que fechei a porta.

— Está assim o dia inteiro. – Minha mãe me respondeu às minhas costas e eu dei um pulo. – Desculpe. Posso ver essas costelas? Escutei o tombo que acabou de tomar e só quero conferir se nenhuma se quebrou novamente.

Segui-a até seu quarto e minha mãe me apertou para ter certeza de que nada tinha acontecido.

— Pelo exame superficial que fiz, parece que tudo está bem. Só te peço para não exagerar, filha.

— Vou patinar com Elena agora.

— Sei disso. Só não fique pegando-a muito no colo. Não quero ter que correr com você para o hospital.

— Pode deixar.

Encontrei uma muito eufórica Elena, dando pulinhos na porta da cozinha, e, para minha surpresa, Liv também.

— Achei que estivesse cochilando.

— E perder uma tarde de patinação? Durmo mais tarde! – Foi a resposta que ela me deu.

Descemos até o lago, Thor e Loki nos acompanhando, nos sentamos no banco de madeira que tem lá, trocamos nossas botas por patins e, finalmente eu poderia voltar a voar, sem sair do chão, ou melhor, do gelo.

A sensação de liberdade que eu sinto quando estou com um par de patins nos pés é indescritível. Não tem nada que chegue perto, nem mesmo acelerar uma moto.

Pelo visto, minhas sobrinhas tinham a mesma opinião, porque, depois que eu passei revistando cada pedacinho do lago onde iriamos patinar, e constatei que não havia nenhum perigo de o gelo estar muito fino ou ter algum buraco, dividimos a extensão gelada em três e cada uma se perdeu na sua própria música e coreografia.

Claro que Elena ainda não tinha uma técnica apurada, mas as poucas aulas que ela teve já a ajudava com alguns movimentos que, em uma competição, são obrigatórios, como alguns saltos e giros apoiada em um único pé

Olivia, sabendo bem mais das regras do esporte, – até porque ela fazia parte da equipe da escola. – tinha uma apresentação bem mais complexa, com saltos duplos – alguns triplos – piruetas e transições da dança ou balé para o movimento obrigatório tão suaves que parecia que ela estava realmente competindo por algo.

Já eu, aproveitei o momento e tirei várias fotos de minhas duas sobrinhas dançando sobre o gelo, cada uma à sua maneira, com sua técnica e música imaginária, mas com uma coisa em comum, a mesma paixão pelo esporte e por estar voando sobre o gelo.

Deixei Elena patinando o tanto que quis, claro que alguns escorregões e até um tombo mais forte aconteceram, todavia, nada que abalasse a confiança da garotinha que só queria saber de se divertir ao som da música do filme da Barbie. Que, depois que ela “cantou” um pedaço para mim, reconheci ser Lago dos Cisnes de Tchaikovski. Assim, para animar um pouquinho a Loirinha, acabei por achar a música no aplicativo de streaming do celular e coloquei para tocar.

— Eu vou fazer igual a Barbie no filme. – Ela garantiu feliz e saiu fazendo uma pirueta no gelo.

Ao final da música, ela veio para perto de mim e me perguntou como ela tinha ido.

— Melhor do que a Barbie.

E essa simples frase fez a minha sobrinha mais nova abrir um enorme sorriso e me abraçar forte.

— A senhora não vai patinar, täti?

— Por enquanto estou só tomando conta de você, não é o que sempre combinamos?

— Sim! Tinha me esquecido. Só vou patinar mais uma música e depois vou ser a sua DJ!

— E que música vai querer agora?

Pelo sorrisinho dela eu sabia que era a mesma música.

E assim que acabou a “apresentação”, Elena, sabendo que eu tinha tirado as fotos enquanto dançava, me pediu a câmera emprestada para poder mostrar para todos como ela tinha patinado bem.

— Por favor, só cuidado para subir as escadas, estão congeladas e eu não quero que você se machuque. – Pedi, enquanto eu a ajudava a trocar os patins pelas botas de neve.

— Pode deixar comigo, tia. – Ela me abraçou e depois saiu saltitando pelo caminho.

— Devagar, Elena!

Ela parou com os pulinhos e foi direto para a casa, e eu sabia que ela não voltaria mais, pois, cansada como estava, iria se escorar no primeiro que deixasse e iria dormir por um bom tempo.

Assim, tendo a companhia silenciosa de Olivia que estava no seu próprio mundo particular com as músicas que ouvia, coloquei os fones, dei o play na minha música favorita para patinar e me perdi nos movimentos e nas melodias por um bom tempo e eu sei disso porque precisou que minha avó Mina viesse me chamar para jantar para que eu parasse e notasse que eu já estava sozinha no lago há um bom tempo, pois não havia sinal de Olivia, só de meus dois cachorros que continuavam sentados na margem.

— Que horas você entrou que eu não vi? – Perguntei para minha sobrinha mais velho, assim que cruzamos o caminho uma da outra.

— Vixe, täti... eu já entrei tem mais de uma hora. E não te avisei porque você estava no meio de um salto bem complicado. E, aliás, precisava humilhar com um salto de quatro voltas e meia?

Dei de ombros para o que ela falava e fui para o quarto tomar um banho e me descongelar um pouquinho.

O jantar e o restante da noite foram tranquilos, apesar de ter sido humilhada, mais uma vez, no pôquer e, quando deu uma hora aceitável para ir para a cama, me despedi de cada um ali e subi para o quarto, mais dormindo do que acordada por ter tido um dia que começou cedo até demais e só estava terminando depois da meia-noite.

Saí do banheiro depois de me trocar para ver Alex sentado na cama, observando o visor da minha câmera.

— Finalmente um tempinho a sós, hein? – Falei quando me ajoelhei atrás dele na cama e o abracei pelo pescoço. – E o que você tanto olha aí? Suas fotos no modo surfista?

— Oi para você também, Estranha. Não te vi por todo o dia e você já chega cheia de perguntas!

Dei um beijo no pescoço dele.

— Também te amo, Surfista. E eu não estou cheia de perguntas, só curiosa com o que você tanto olha nessa câmera... sabe que pode projetar a imagem do visor para a televisão, não sabe?

Em resposta, Alex só ligou a TV e sincronizou as fotos e para minha surpresa não eram as fotos dele surfando.

Eram fotos minhas, enquanto eu patinava.

— Mas como?!

— Elena subiu com a câmera e veio mostrar para todos as fotos que você tinha tirado dela. E, como a Furacãozinho estava morrendo de sono, acabou por me entregar a câmera e desmaiar aqui na nossa cama, depois de me certificar de que ela não iria cair se rolasse, cheguei na sacada, vi que você estava lá, toda concentrada, dando uma aula de patinação.

— Só por isso?

— Na verdade, quis eternizar sua coreografia do mesmo jeito que você faz quando eu surfo. – Ele comentou casualmente. – Apesar de que você é uma exímia patinadora e ainda melhor fotógrafa, mas creio que a intenção foi boa.

Fiquei vendo as fotos que ele havia tirado, me sentindo mal por ser a modelo de alguém, mas, ao mesmo tempo, me sentindo extremamente feliz que eu tinha tido a sorte de encontrar um cara que realmente me amava e estava disposto a encarar uma temperatura negativa para tirar fotos minhas, enquanto eu me desligava da realidade e me entregava somente a patinação.

— Obrigada. – Sussurrei em seu ouvido. – E as fotos ficaram excelentes.

— A modelo ajudava.

Comecei a rir.

— Não mesmo, o fotógrafo fez um bom trabalho!

— Discutiremos isso depois do meu banho. – Ele me cortou e correu para o banheiro e eu voltei a passar pelas mais de duzentas fotos que ele havia tirado, sem que percebesse, ainda incrédula que meu noivo tinha feito algo assim.

— Já escolheu a sua preferida? – Ele me perguntou já do meu lado.

— Não. E nem vou. Gostei da surpresa. – Disse simplesmente.

— Gostou, é? Acho que devo te mimar mais. Até porque é sempre você quem faz esse tipo de coisa. – Comentou e olhou para o canto do quarto onde estava o quadro com a foto dele surfando.

— Também não é assim. Eu te falei que gostava de tirar fotos. Não é minha culpa se arranjei um noivo que gosta de um esporte que me permite juntar minhas duas paixões.

— Duas? – Perguntou cético.

— Sim. Você e as fotos. Nessa ordem! – Pisquei para ele.

— Gostei de saber disso. Mas eu ainda acho que deveríamos ter uma dessas fotos transformadas em quadro. – Alex murmurou e eu fiz uma careta. Nunca fui fã de tirar fotos minhas e pensar que uma poderia ser transformada em um quadro não me agradou muito. E meu noivo, já sabendo me ler muito bem, apenas falou: - Eu ainda te convenço de que vale à pena ter essa foto na parede.

— Boa sorte com isso.

— Eu já te convenci a fazer tanta coisa, uma a mais não será tão difícil assim.

— Acho melhor eu começar a bancar a difícil aqui. Você está muito desacostumado. Vou parar de te mimar assim. – Brinquei com ele.

— Agora sou eu quem não está gostando do assunto, melhor conversarmos sobre outra coisa.... como foi a viagem de ida e volta até Helsinque? – Ele teve a cara de pau de perguntar.

Dei um tapa no ombro dele e depois Alex nos ajeitou na cama, ainda vendo as fotos, murmurando ocasionalmente que eu fazia parecer muito mais fácil a arte de patinar no gelo do que realmente era.

— Você teria sido uma excelente patinadora... – Foi a última coisa que ele disse.

— Talvez sim, talvez não... mas hoje isso já não me importa mais.

— Mas era o seu sonho! – Alex retrucou.

— Sim. E você usou o tempo verbal certo. Era. Eu ainda posso patinar, contudo, tenho muito mais hoje do que teria se tivesse que me dedicar todo o meu tempo em treinos e competições. No fim, eu acabei ganhando.

Alex me afastou um pouco de perto para poder encarar meus olhos.

— Até algumas semanas atrás, esse assunto ainda era doloroso para você, o que mudou?

Mordi meu lábio e acabei por falar a verdade.

— Hoje, no carro, enquanto eu voltava sozinha de Helsinque, acabei por colocar algumas coisas em perspectiva. E, notei que eu realmente tenho tudo o que preciso. Que a minha vida é uma perfeita imperfeição, pois o que realmente importa, não, quem realmente importa está do meu lado. Não preciso de títulos mundiais, medalhas olímpicas ou dinheiro e poder, se o mais importante é ter o amor e apoio da minha família. E isso eu tenho de sobra, esses últimos dias foram a prova.

Meu noivo não comentou nada, só me abraçou ainda mais apertado e me manteve assim, até que caímos no sono.

E eu tive, pela primeira vez em muito tempo, uma noite sem sonhos.

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E mais rápido do que eu poderia prever, a noite de ano novo chegou. Não fomos a lugar nenhum, passamos juntos, aproveitando os últimos momentos do restante da família reunida.

Durante o dia, por conta da diferença de fuso-horário, conversamos com Will e Pepper que fizeram questão de mostrar a praia onde estavam e, principalmente o fato de que a temperatura estava bem mais alta do que aqui na Finlândia. Com os avós de Alex que estavam em Michigan e com Dona Ilsa, que ficou impressionada de que a família tinha ido até a Finlândia para as festas. Kim e Vic resolveram ligar bem no momento da passagem de ano, só para mostrar os fogos.

Ainda conversei com Pietra, que tinha ido para o Caribe e Mel que estava presa na casa da avó, no Brasil, tendo que tomar conta das crianças.

— Eu juro, não vou ter filhos nunca! – Ela clamou antes de desligar para ir correndo atrás da filha do primo dela.

O restante do último dia do ano foi gasto do lado de fora, meus sobrinhos aproveitando os últimos momentos de liberdade que o recesso oferecia, sob a supervisão atenta de meus sogros, que ainda não tinham se acostumado com o fato de que Liv e Lena não só sabiam pilotar uma moto de motocross, como faziam isso com maestria, e eu e Alex na garagem, enquanto eu dava os últimos ajustes na minha moto que seria enviada para os EUA, Alex zanzava pelo lugar, até que encontrou algo que chamou a sua atenção.

— Foi nisso que você aprendeu a dirigir?

— Respeite o Ladinha! – Gritei de onde estava.

Meu noivo não me respondeu, mas logo escutei o barulho de uma porta se fechando. Corri até o box onde o carro estava e vi que Alex estava lá dentro.

— A vida é sua.

— Seu pai não deve ser tão ciumento assim com esse carro. Se ele colocou na sua mão para que você aprendesse a dirigir.

— Só cuidado com o Ladinha do meu pai. É de estimação. – Comentei.

E Alex parecia genuinamente curioso com o carrinho.

— Nunca tinha visto um desses? – Questionei chegando perto da janela aberta.

— Não. Nem visto de perto. Mas, o mais interessante é a história que esse carrinho tem. Por acaso, seu pai já colocou Elena atrás disso?

— Oficial ou Extraoficialmente?

— Extra.

— O que você acha? Se a Baixinha já está fazendo manobras com uma moto.

— E sua mãe não fala nada? Nem Tanya?

Mordi o lábio e só soltei:

— Não. Porque elas bem sabem... os Nieminen são os Ùltimos dos Selvagens por essas bandas. Fale que não podemos pilotar um carro. Nós vamos lá e fazemos. Nos desafie a fazer algo... não só fazemos, como fazemos melhor... isso sem contar em outras aventuras nada bentas que já tivemos nessas terras. Algumas árvores são a prova viva e ferida de alguns de nossos acidentes.

— Não vi muito disso nos últimos dias.

— Sabe como é... a primeira impressão é a que fica. Não queria assustar os seus pais.

— Não quero estragar o seu mundo perfeito, mas eles já estão assustados. É só ver como eles estão tomando conta de Elena e Olivia lá fora.

— Bem... então vamos dizer assim... começamos com pequenos passos... um dia eles vão ver o pacote completo.

— Preciso de uma cadeira cativa na emergência do hospital mais próximo? – Ele me perguntou, meio que fazendo piada de uma conversa nossa, quando ele se machucou no trabalho.

— Não. Temos médicas na família é para isso. E se ela não estiverem por perto, eu posso dar os primeiros socorros! – Pisquei para ele.

— É... ainda bem que você resolveu ir devagar. Desse jeito nem eu aguentaria.

Dei uma risada.

— E aí, quer dar uma volta neste supercarro ou só vai ficar olhando?

Alex olhou para o painel do carro e, com uma carinha um tanto debochada, só soltou:

— Não sei mexer nesta máquina super tecnológica, melhor deixar para Elena.

— São bem poucos os que sabem tirar isso do lugar, mas para a sua sorte, o pobre está no Departamento Médico... deve ter consumido a bateria toda. – Apontei para a bancada.

Alex saiu de dentro do carro e começou a rir.

— O que é tão engraçado? – Perguntei genuinamente curiosa.

— Só tentando te imaginar dentro desse carro. Não consigo. Ainda mais sabendo quais carros você dirige.

— Tudo começa de algum lugar, Alex. Meu início no automobilismo foi aqui. – Dei um tapinha no capô do carro. – E posso te falar uma coisa?

— Diga.

— Eu realmente amo esse carrinho e a história que ele conta.

— E que ainda vai contar. – Alex fez coro. – Elena está usando-o agora. Um dia serão nossos... seis filhos. – Me abraçou e depois que apagamos a luz do box, saímos da garagem, para ficarmos observando meus sobrinhos na pista.

— Vou me dar o direito de não falar nada. – Foi tudo o que disse.


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Notas finais do capítulo

Bem, é isso!
Espero que tenham gostado!
Muito obrigada a você que leu até aqui!
Semana que vem tem mais.
Até lá!
xoxo



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