O Conto da Fera escrita por Gatita


Capítulo 2
Parte UM


Notas iniciais do capítulo

oiêê! não consegui atualizar em duas semanas, mas em três deu tudo certo! hahaha
quero agradecer a todo mundo que deu uma chance a essa fanfic e favoritou, e mais ainda a quem usou um pouquinho do seu tempo e fez um comentário pra mim ♥ isso não tem preço!
espero que gostem desse capítulo!
boa leitura ♥

betagem por @SrtaGoehring :3



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799099/chapter/2

PARTE 1:

Basta um olhar

Que o outro não espera

 

Aos vinte e dois anos, Hinata carregava uma vasta lista de livros lidos e nenhum pretendente rejeitado, o que acabava sendo uma contradição se comparada às outras moçoilas de Konoha. Aquelas que recebiam inúmeras propostas de casamento, mas que nunca haviam terminado uma única história por si só.

Enquanto colhia algumas cenouras ao lado de Hanabi – que retirava batatas da terra –, a mais velha pensava em qual seria o próximo livro que escolheria na livraria de Hatake Kakashi, o dono da única biblioteca da cidadela, mais tarde. Já tinha até perdido as contas de quantas vezes aparecera por lá e de quantos livros pegara a mais de forma que o homem não percebesse. Ela praticamente gastava todas as suas economias em livros.

E não havia nenhum mal nisso, certo?

Certo.

— Hana, você pode tirar leite da Kaguya pra mim depois? — Hinata perguntou, secando o suor por baixo da franja com as costas das mãos a fim de não sujar-se com a terra.

— Mas de novo? — Olhou para a irmã, soprando uma mechinha de cabelo que insistia em cair em seu rosto e semicerrou os olhos. — Já tirei leite pra você ontem! — E apontou para ela com uma batata coberta de raminhos.

— É que eu preciso ir à biblioteca — respondeu, mordendo o lábio inferior. Colocou a última cenoura dentro da cesta de palha, levantou-se e bateu as mãos no avental surrado por sobre um vestido azul antigo e remendado na barra.

— Isso é injusto! — reclamou a mais nova ao jogar a batata junto às outras dentro da cesta com raiva. — Você está sempre indo à biblioteca e eu sempre tenho que fazer as suas obrigações.

— Hanabi! — falou com a voz mais firme, repreendendo-a com o olhar. Abaixou-se para pegar sua cestinha e levantou com palavras na língua: — Faça o que te peço e será recompensada depois. — E saiu sem olhar para o rosto vermelho da irmã.

A Hyuuga mais velha não iria ao centro apenas para frequentar a biblioteca, aproveitaria para comprar algumas coisas que faltavam em casa e para saber das notícias mais recentes. Afinal, o local onde moravam ficava ligeiramente afastado de tudo e nunca ficavam sabendo das últimas novidades – fossem apenas fofocas ou lances políticos.

Entrou em casa disposta a lavar rapidamente as cenouras – que seriam vendidas na feira do próximo dia – e, em seguida, retirou a sujeira do corpo com um pano molhado. Colocou um vestido de alcinhas lilás e uma blusa branca de mangas compridas por baixo, além de sapatos confortáveis para conseguir andar a longa distância até o centro de Konoha sem que acabasse com os dedos esfolados.

Despediu-se da família – um grito com Hanabi e um aceno para o pai e o primo, os quais estavam longe demais para comunicação verbal – e saiu em direção à estrada de terra. Não era tão longe, na verdade, no máximo trinta minutos a pé e Hinata conseguia fazer aquele caminho em apenas vinte minutos quando muito apressada. Entretanto, aquele não era um dia para ter pressa, visto que o clima estava ameno e finas nuvens cobriam o sol.

O som característico de Konoha se fez presente quando a Hyuuga avistou os casebres de arquitetura antiga. Havia carroças atravessando as ruas de paralelepípedo, pessoas conversando brevidades enquanto caminhavam pelas calçadas, comerciantes gritando seus preços e produtos, dentre inúmeros outros burburinhos. A cidade era linda com suas peculiaridades, mas Hinata ainda preferia viver na quietude da pequena fazenda da família.

Passou pela feira para comprar cebolas, alguns temperos, linguiça e um frango inteiro devidamente limpo – pois não tinham costume de degolar nenhuma das próprias galinhas. Iria, depois da biblioteca, a uma padaria para pegar alguns pãezinhos de banana – os preferidos de Hanabi.

Quando o sino da livraria de Hatake Kakashi soou, anunciando um novo cliente, ele já sabia quem atravessaria aquela porta. Hinata apareceu em seu campo de visão com uma cesta grande em mãos, a qual continha algumas sacolas de papel com suas compras. Ela tinha um sorriso cativo no rosto que ele não pôde deixar de retribuir.

— Senhorita Hinata! — Kakashi saudou, saindo de trás do pequeno balcão em frente à entrada.

O lugar era o sonho de consumo da jovem de cabelos azulados: embora não fosse muito grande, as paredes do fundo da loja eram formadas por estantes do teto ao chão e, paralelamente, havia mais duas formando fileiras abarrotadas de livros. À frente do local, perto da vitrine, tinham alguns pufes e banquinhos acolchoados para quem quisesse ler por lá. Todos os livros de Kakashi estavam disponíveis para serem alugados ou comprados, apenas dependia do desejo de cada leitor.

A cargo de curiosidade, Hinata já havia lido noventa por cento daqueles livros, os outros dez por cento diziam respeito à seção restrita que apenas leitores homens poderiam desfrutar. Sem contar que Kakashi jamais a deixaria chegar perto daquelas publicações, portanto, a garota nem sabia da existência.

— Boa tarde, senhor Kakashi! — Ela aproximou-se dele.

O Hatake era um homem de trinta e poucos anos, dono de cabelos incrivelmente grisalhos para sua idade, detalhe que o deixava muito charmoso. Tinha um humor duvidoso e olhar cansado, apesar de ser uma pessoa calma e muito gentil. Naquele dia, vestia uma calça social marrom deveras antiga e uma blusa preta de mangas longas enfiada por dentro do cós.

— Quem é vivo sempre aparece — comentou com um sorriso ladino. Fazia algumas semanas que Hinata não aparecia ali.

— Eu andei meio ocupada  em casa — desconversou, apoiando a cesta sobre a madeira do balcão. — A Kaguya ficou ligeiramente tristinha durante um tempo e não queria dar leite… Aí, eu e minha irmã precisamos distrair a coitadinha.

— Perdão, quem? — Kakashi tinha uma expressão estranha no rosto, quase como se duvidasse da sanidade mental de Hinata.

—   Ah! — Ela riu. — Kaguya é minha vaca.

— Oh, claro. — O Hatake balançou a cabeça de um lado ao outro a fim de espantar os pensamentos esquisitos que lhe vieram à mente. — Muito bem! Qual vai ser a pedida de hoje? — ele quis saber e observou-a procurar algo dentro da cesta.

— Eu ainda não pensei, acredita? — Hinata deu uma risadinha e parou de remexer nas compras, não estava ali. — Oh… Kakashi, eu esqueci de trazer o livro que peguei da última vez. — E virou-se para ele com pesar nos olhos claríssimos.

— Nah, tudo bem. — Balançou a mão no ar. — Você é de confiança, Hinata. Pode levar o livro que quiser, conheço sua honestidade.

Hinata abriu um de seus melhores e sinceros sorrisos para o homem, postando-se a zanzar pelas estantes a procura de algum novo título que lhe chamasse a atenção. Porém, seu coração bateu tão forte pelo exemplar surrado do primeiro livro lido em toda sua vida, fora irresistível. 

— Acho que essa é a vigésima vez que você leva esse livro para casa, Hinata — ele observou, balançando a cabeça de forma divertida.

— É maior do que eu, Kakashi! Não consigo evitar — respondeu com fingida tristeza na voz.

Ela pegou o livro e deixou uma moeda de bronze com o Hatake, como pagamento por ter esquecido o outro, e deixou a pequena biblioteca com um sorriso enorme no rosto. Aquele em especial contava a história de amor entre jovens predestinados a não ficarem juntos, mas que, no fim de tudo, conseguiram burlar todas as regras para concretizar o encerramento mais belo que Hinata já lera.

Ah, a jovem não se esqueceu de pegar os pãezinhos de banana para completar a chantagem de Hanabi. Àquela hora o sol estava prestes a se pôr, deixando o céu com uma mescla maravilhosa de rosa, laranja e amarelo. Precisava se apressar, antes que ficasse perigoso para pegar o caminho de volta para casa sozinha.

Entretanto, uma multidão estranhamente armada com facões, foices e até mesmo tochas, estava centralizada na praça principal de Konoha. As pessoas que faziam parte daquilo gritavam frases ininteligíveis, mas que carregavam muito ódio em suas vozes – o que acabou despertando a curiosidade da Hyuuga.

— O que está acontecendo? — ela perguntou ao chegar mais perto. Ninguém respondeu. — O que… O que está… — Tentava formular sua pergunta mais uma vez, mas infelizmente não conseguia ser ouvida enquanto a multidão a engolia. Tomou cuidado com suas compras, temendo que levassem o pouco que podia ter com seu dinheiro suado.

— Ora, ora, Hinata! — Uma voz conhecida soou e seu braço foi puxado de forma que parasse na frente de todos.

— Ki-kiba! — Engasgou, sentindo-se deveras exposta.

Inuzuka Kiba era seu amigo de infância, tinha cabelos castanhos como chocolate e olhos negros fendidos como os de um gato, além de uma pele bonita e bronzeada. O que mais chamava a atenção de qualquer um que o olhasse eram as formas vermelhas tatuadas uma em cada bochecha, assim como os dentes caninos anormalmente afiados.

— Você chegou bem na hora! — ele disse, mostrando com o braço a aglomeração. Todos passaram a ficar em silêncio com a fala do Inuzuka.

— Como assim, Kiba? — Ela pareceu desesperada. — O que está acontecendo?

— Nós passamos muito tempo pensando em como a lenda dos Uchiha é incabível. — Ele olhou bem nos olhos de lua da jovem. — Eles com certeza simplesmente abandonaram aquele castelo, devem ter ficado enjoados de tanta mesmice que é Konoha. — Hinata crispou os lábios com aquela afirmação. Ela e Kiba eram muito amigos, mas as coisas que ele dizia… Essas sim eram incabíveis. — Então, decidimos nós mesmos averiguar o estado da propriedade Uchiha e pegar o que sobrou para nós. — E todos começaram a gritar em euforia.

— Mas o quê?! Estão loucos? Vocês não podem fazer isso! — Hinata esbravejou, afastando-se de Kiba. O local de início da lenda que tanto lhe fascinava não podia ser saqueado! E todas as lembranças importantes que existiriam lá? Aquilo fazia parte da história de Konoha!

— Não estamos loucos, Hinata. — Ele franziu as sobrancelhas. — Você não lembra o tanto de ouro e coisas valiosas que os Uchiha tinham? Aquela riqueza toda foi deixada para trás e nós precisamos mais do que eles!

A Hyuuga levou a mão livre ao peito em descrença com o que ouvia. Não podia deixar que fizessem tamanha loucura! Não quando ainda tinha esperanças de ir, por si só, visitar o terreno dos Uchiha algum dia.

— Aquele lugar é amaldiçoado e perigoso! — exclamou, buscando alguma desculpa em meio aos pensamentos conturbados pelos gritos da população raivosa.

— Ah, Hinatinha… Não vai dizer que você ainda acredita nessa historinha para criança dormir? — Kiba debochou, mostrando seus caninos brancos ao mesmo tempo em que bagunçava os cabelos lisos dela com a mão esquerda. — É muito fofo da sua parte.

— Pare com isso, Kiba! — Empurrou a mão dele para longe de si e arrumou os fios desalinhados, tomando cuidado para não derrubar suas compras da cesta. Hinata não conseguia reconhecer aquele homem a sua frente, poderia ser qualquer pessoa desgostosa, mas não era seu bom e velho amigo. Em um lapso de memória, pensou na desculpa certeira: — Vocês não podem fazer isso porque… Porque eu quero escrever um livro sobre a família Uchiha! Não existiriam mais evidências se vocês fossem saquear a propriedade como loucos!

Ela disse tudo em um fôlego só e o silêncio que se seguiu quase fez com que Hinata achasse ter dado certo. Estava enganada – e muito –, pois no instante seguinte uma avalanche de gargalhadas a atingiu em cheio. Os homens e mulheres riam e riam muito, riam tanto que largaram suas armas no chão e as tochas se apagaram. Alguns curvaram-se sobre os joelhos com as mãos em suas barrigas, até mesmo Kiba estava rindo.

— Um livro? Mas que piada! — Alguém soltou ao recuperar o fôlego.

— Escutaram isso? A Hyuugazinha quer escrever um livro! — Todos voltaram a rir. — E ainda por cima sobre os Uchihas! — E todos voltaram a rir com mais vontade ainda.

— Hina, você continua muito engraçada — Kiba disse, limpando uma lágrima de seu olho.

— Eu não estava brincando… — sussurrou e, por um momento, teve medo de que tivessem escutado.

— Veja bem, criança — um homem começou a dizer. — Na sua idade, já era para ter se casado e estar cuidando da sua própria casa, de seus próprios filhos. Uma mulher na sua idade não tem que se preocupar com livros, só precisa contar as histórias para as crianças dormirem. — Hinata se sentiu enojada com aquelas palavras, poderia vomitar se escutasse um pouco mais. — Daqui a pouco vai virar uma solteirona.

Ela olhou para Kiba, que tinha uma expressão triste no rosto. Pelo menos ele não concordava com o que aquele velho dizia.

— É verdade — outro concordou. — Ninguém vai te querer daqui alguns anos, ainda mais sendo uma Hyuuga. Vocês só servem para nos trazer leite!

— Sim, os Hyuuga definitivamente deveriam ter ido embora depois da morte de Hikari. Sem ela, eles não servem para nada mesmo!

Muito bem, aquele fora o ápice. Hinata não aguentava mais escutar tantas atrocidades direcionadas a sua família, ainda mais quando mencionavam a sua mãe. Hikari havia sido uma importante curandeira para a cidade, fora uma mulher incrível e gentil, não merecia que falassem daquele jeito de sua família. Nenhuma daquelas pessoas tinha direito de falar qualquer coisa sobre ela, eles não chegavam aos pés da bondade que Hikari exalou um dia. Então, após aquelas palavras duras e vergonhosas, fora impossível não evitar que as lágrimas viessem.

— Hinata… — Kiba chamou-a delicadamente, ele sabia como o assuto era delicado.

Entretanto, a Hyuuga empurrou-o para longe dela, os olhos molhados e vermelhos demais. Ela não deixaria aquilo como estava, mostraria a todos o que uma Hyuuga era capaz e escreveria o maldito livro só para garantir que jamais abrissem as bocas nojentas para falar de sua família outra vez.

— Eu vou fazer isso, porque eu sou capaz  — bradou, a voz querendo embargar pelo choro. — Acho bom você desistir disso, Kiba. Não tem futuro. — Aquelas foram suas últimas palavras ao amigo antes de correr.

Queria ficar o mais distante possível dali.

 

Fazia algum tempo que o sol havia se posto, dando lugar ao véu escuro de uma noite sem lua, apenas as estrelas cintilavam fracamente. Hiashi se encontrava sentado no degrau da entrada de casa com Byakugan ao seu lado fazendo-lhe companhia, ambos esperando pela filha mais velha. O homem começava a ficar preocupado já que ela não costumava demorar tanto para voltar quando ia ao centro da cidade fazer compras. E Hinata já estava atrasada há bons minutos.

O som conhecido do portão de madeira o despertou de seus pensamentos e o enorme cachorro saiu correndo para averiguar quem era. Hiashi levantou-se e fez o caminho de saída da propriedade, e logo um suspiro aliviado deixou seus lábios ao constatar que era Hinata que havia chegado.

— Hinata! — gritou para ela. — Minha filha, minha filha!

— Papai! — ela gritou de volta. Eles correram um para o outro, a jovem deixando a cesta no chão, e se abraçaram com força. Byakugan dançava ao redor deles, procurando uma brecha para dar as boas-vindas à dona.

— Meu deus, como fiquei preocupado! — Segurou-lhe o rosto entre as mãos calejadas de trabalhos manuais. O coração do homem desatou a acelerar ao ver lágrimas secas e algumas ainda molhando o rosto bonito de Hinata. — O que aconteceu? Por que está chorando desse jeito? Alguém fez alguma coisa com você?!

— Papai… Eu acho que fiz uma tremenda burrice — sussurrou, apertando as mãos do pai com as próprias. O vira-lata latiu mais uma vez e Hinata estendeu uma mão para acariciar a cabeça do cão. — Na volta para casa, havia uma multidão enfurecida querendo invadir a propriedade dos Uchiha para saquear tudo o que restou. — Os olhos do pai se arregalaram. — E Kiba estava liderando tudo!

— Kiba?! Aquele seu amigo? — ele exclamou, surpreso. Até mesmo Byakugan latiu em indignação.

— Sim! Eu não podia deixar que fizessem uma coisa daquelas… Então inventei que escreveria um livro sobre os Uchiha e por isso ninguém poderia manchar a imagem que restou deles — concluiu sem coragem de olhar nos olhos do pai enquanto passava a mão direita nos pelos negros de Byakugan.

— Você tem mesmo um coração enorme, filha — Hiashi disse, ele tinha um sorriso pequeno nos lábios. Ela sorriu de volta, mas com o olhar triste.

— Eles riram de mim… Eles riram muito de mim, papai. — Ela aninhou o rosto à mão dele, aproveitando o carinho para confortá-la. — E disseram coisas horríveis sobre a nossa família. Disseram que somos inúteis… Até… Até mencionaram a mamãe. — E o suspiro surpreso do pai anunciou que ele acreditava em suas palavras. — Eu não posso deixar isso em branco, papai! Não posso deixar que aquelas pessoas… Aquelas pessoas imundas digam coisas horríveis sobre nós e não fazer nada sobre isso!

Hiashi ficou em silêncio e, por um instante, Hinata imaginou que ele também riria dela, entretanto, ainda era o seu pai. Ele tinha as sobrancelhas franzidas, seu rosto estava sério e precisava transmitir confiança à filha ao dizer:

— Eu sei que não, Hinata, querida… Você parte depois de amanhã.

 

 Para assustar

E até perturbar

 

Muito bem...

Você deve estar se perguntando: como assim “você parte depois de amanhã?” Partir para onde, exatamente?

Hyuuga Hinata criara um plano para impedir que os aldeões destruíssem os últimos vestígios dos Uchihas e consistia em escrever um livro sobre a tão famosa lenda que os rodeava. E como ela faria isso? Bom, certamente precisaria invadir a propriedade a fim de chegar ao castelo e, por fim, descobrir o que aconteceu…

A pergunta que não tinha resposta, ainda, era:

— Mas como eu vou chegar ‘no castelo, papai? — Hinata perguntou na manhã seguinte.

A euforia com o seu retorno após tantas horas longe de casa havia passado e, naquele instante, Hanabi e Neji andavam de um lado ao outro pela cozinha enquanto despejavam frases preocupadas. Hinata estava sentada em uma das quatro cadeiras da pequena mesa retangular de madeira e Hiashi sentava-se a sua frente.

— Nós não temos um cavalo — continuou a dizer, batucando levemente os dedos sobre as coxas. — E certamente não posso subir na Kaguya e esperar que ela corra.

— Tá doida?! — Hanabi exclamou e parou de rodar pelo chão da cozinha. — A bichinha não consegue nem dar leite direito, quanto mais aguentar essa sua bunda enorme! — E terminou de dizer com as mãos nas cintura.

— Muito obrigada pela parte que me toca. — A mais velha revirou os olhos para a irmã. — E veja esses modos! Não se fala desse jeito sobre o corpo dos outros…

— Mimimi! — remendou a mais nova. — De repente você chega louca em casa querendo invadir a propriedade dos Uchihas com a intenção de escrever um livro! Acha mesmo que eu estou a fim de me preocupar com o corpo dos outros? Eu não quero perder a minha irmã! — esbravejou. Estava a ponto de bater os pés no chão e espernear.

— Hanabi tem razão, prima. — Neji pontuou. Ele também tinha conseguido parar de andar e ficou parado ao lado da pequena. Cruzou o braço esquerdo sobre o peito de forma que sua mão acomodasse o bíceps tensionado e o outro estivesse perpendicular para que a mão direita alcançasse o queixo, pensativamente. — É extremamente perigoso. E nem quero dizer do fato de, talvez, a lenda ser verdadeira. Preocupo-me, na verdade, com os humanos que podem querer te seguir enquanto estiver sozinha…

— Não há problemas, Neji! — Hinata tratou de tranquilizá-lo. — Posso partir pela manhã e ainda chegarei ao local de dia… Nós crescemos sabendo o caminho para lá, não lembram? — E lançou um olhar para o pai, que havia contado todas os contos para eles quando eram crianças. — E eu ainda preciso vingar o que disseram sobre nós.

— Principalmente isso! — Hiashi se pronunciou pela primeira vez aquela manhã. — Bom, em relação a como você vai para lá… — Pareceu pensativo por alguns segundos. — Eu acho que posso arranjar um cavalo.

Hinata abriu um sorriso com a expectativa de realizar uma de suas mais profundas tentações. Claro que ela tinha plena noção de que poderia chegar na mansão Uchiha e acabar dando de cara com uma construção abandonada… Entretanto, só a ínfima possibilidade de realmente encontrar alguma coisa que servisse para o tal livro a deixava deveras ansiosa.

Antes de todos voltarem aos trabalhos no campo, para poderem ir à feira mais tarde a fim de vender os produtos colhidos, Hanabi e Neji proferiram mais alguns minutos de sermão a Hinata – mesmo, no fundo, sabendo a necessidade do livro se concretizar. Afinal, ninguém deveria mexer com os Hyuugas e sair ileso. Ao mesmo tempo, Hiashi saíra de casa para que pudesse arranjar o meio de locomoção da Hyuuga mais velha.

Hinata não iria para a feira com a irmã e o primo, pois ainda sentia-se envergonhada pelo acontecido no dia anterior e queria evitar ao máximo encontrar qualquer pessoa que estivera na multidão. Ela só não esperava que um deles, mais especificamente o “líder”, aparecesse em seu portão no meio de uma tarde ensolarada.

— Hinata! — Ela escutou seu nome ser chamado pela tão conhecida voz.

Neji e Hanabi já haviam saído para a feira e o pai ainda não tinha voltado. Ela continuava dentro de casa, arrumando as coisas que precisaria para passar ao menos uma semana fora. Estranhou de início, achando que talvez estivesse mesmo enlouquecendo, contudo, a voz soou mais uma vez.

— Ei, Hinata!

E ouviu passos do lado de fora da casa. Era Kiba! Deveria sair e encontrá-lo? Ou fingir que não estava também?

— Eu sei que você está em casa! — ele disse novamente, quebrando qualquer possibilidade de fingimento.

— Já vou! — anunciou convencida.

Parou em frente a um velho e enferrujado espelho a fim de ajeitar os cabelos e verificar se estava ao menos apresentável para ver Kiba. Não, Hinata não tinha o mínimo interesse no Inuzuka, apesar de se darem tão bem desde sempre. Na verdade, Kiba tinha um imenso carinho pela amiga e desejava internamente a irmã mais nova dela.

— Oi, Kiba — saudou e sorriu breve após abrir a porta da frente e dar de cara com ele.

— Oi… — Ele coçou a nuca, ligeiramente envergonhado. — Encontrei Neji e Hanabi na feira e eles disseram que você tinha ficado em casa… Então eu resolvi vir te ver e… Conversar sobre o que aconteceu ontem.

Hinata escutava tudo o que o moreno dizia, escorando-se no batente da porta. Estava séria e conforme as palavras saíam dos lábios dele, as cenas do dia anterior vinham à tona e ela só queria esquecê-las.

— O que tem para conversar? — quis saber, crispando os lábios em seguida.

— Eu gostaria de me desculpar! — Ele foi direto e ela ergueu as sobrancelhas, surpresa. — É verdade que nós da cidade precisamos muito mais da riqueza que sobrou do que os Uchihas, mas o que disseram sobre você, Neji, Hiashi e… Hanabi... — Ele tinha um brilho nos olhos ao falar da mais nova. — Bom, eu não compactuo com absolutamente nada do que disseram! Ainda mais quando vocês sempre foram muito bons e gentis comigo. — A Hyuuga ficou incrédula, mas muito orgulhosa das falas do amigo. — Então eu queria que você me desculpasse… Eu também não vou mais incentivar nada daquilo e vou me certificar de que ninguém pisará na velha propriedade!

Hinata tinha um sorriso enorme nos lábios, pois reencontrou seu verdadeiro amigo naquelas palavras. Levada pela impulsividade, pulou os degraus e se lançou aos braços do Inuzuka a fim de dar-lhe um abraço apertado e reconfortante.

— É claro que eu te desculpo, Kiba! — dizia com o rosto escondido na curva do pescoço masculino. — Te desculpo com todo o meu coração.

Ele apenas limitou-se a apertar a cintura fina da moça, estava realizado demais por poder resolver o mal entendido. Ficaram naquela posição por poucos segundos até Hinata tomar a iniciativa de se separarem, ainda mantendo-se perto dele.

— Quero que saiba que eu vou ao território Uchiha. — E, dessa vez, Kiba era quem estava surpreso. — Partirei amanhã. Eu lhe disse que escreveria o livro só pelo prazer de vingar o que disseram sobre minha família. — A voz de sinos não passava de um sussurro.

Entretanto, logo a expressão de Kiba suavizou e ele entendeu que aquele era o destino de Hinata.

— Você tem todo o meu apoio, Hina.

Ambos trocaram sorrisos e, em seguida, latidos animados os interromperam de continuar a conversa adequadamente. Byakugan vinha correndo do milharal e, atrás dele, corria Akamaru – o imenso cachorro e fiel escudeiro de Kiba.

— Você não disse que tinha trazido Akamaru! — Hinata exclamou, abaixando-se para receber os animais ofegantes.

— É que não deu tempo!

 

Mesmo a bela e a fera

 

Conforme o sol corria pelo céu, a lua surgia no horizonte para acompanhá-lo, embora cada um seguisse seu caminho solitário. Kiba foi embora após ele e Hinata conversarem mais um pouco sobre as próprias vidas e como tudo seria dali para frente. Hanabi e Neji demoraram mais algumas horas para voltar com o lucro do dia e o pouco que sobrou da mercadoria, mas Hiashi ainda não tinha dado sinal de vida.

— Irmã — Hanabi chamou pela mais velha, que estava sentada sobre uma das três camas de solteiro posicionadas paralelamente no quarto. Hinata parou de dobrar algumas puídas blusas e voltou seu olhar para a mais nova em um pedido mudo para que continuasse. — Ah… É, bem… — Tentava encontrar as palavras certas enquanto enrolava nervosamente os dedos na bainha da saia.

— O que há? — perguntou, preocupada. Hanabi aproximou-se da irmã e sentou-se ao seu lado na cama.

— Eu estou com medo. — E, antes que Hinata pudesse dizer que não havia nada a temer, continuou: — É muito perigoso, Hina… Você tem certeza que precisa ir sozinha? Você poderia levar o Byakugan com você…

— Ah, Hana… — Ela ergueu uma mão para acariciar a bochecha da mais nova, observando os olhinhos vermelhos. — E deixar vocês desprotegidos? Nem pensar! — Hanabi abriu a boca para retrucar, mas Hinata foi mais rápida estalando a língua no céu da boca três vezes e dizendo: — Vocês vão precisar mais do Byakugan do que eu. Sem falar que não teria como fazê-lo andar todo o caminho a pé... E nem pense em dizer para vir comigo você ou Neji! Sobrecarregaria o papai demais, também não quero que ele fique sozinho...

— Droga, Hina… — Semicerrou os olhos, dando-se por vencida. — Eu vou enlouquecer sem você aqui.

— Não vou demorar muito, eu prometo. — E abriu um sorriso sincero. — Devo levar no máximo um mês.

— Vou acreditar em você — sussurrou, levando as mãos à que estava em seu rosto, aninhando-se ao carinho. — Mas se a senhorita não voltar no findar deste mês, eu juro que vou atrás de você e te arrasto pelos cabelos!

Ambas desataram a gargalhar. Durante o tempo que precisasse passar no castelo Uchiha, Hinata sabia que sentiria falta da irmã e de todas as palavras rabugentas que ela dizia. Assim como sentiria do pai… E de Neji. Por alguns segundos cogitou deixar para trás toda aquela história boba de escrever o livro sobre uma lenda – que talvez nem existisse –, entretanto, foi mesmo o que durou: alguns segundos.

— Hiashi voltou — Neji disse, entrando no quarto sem bater ou sequer anunciar sua presença.

O sol se pusera há bastante tempo, de mesma forma fizera a lua, então, era uma noite de densa escuridão – as estrelas, inclusive, não ousaram aparecer. As garotas, acompanhadas de Neji, correram pela casa a fim de chegar à porta da frente e encontrar o pai atravessando os portões de madeira. Ele vinha andando muito devagar, parecendo cansado e ofegante, e segurava uma corda que se conectava às rédeas de um enorme cavalo tão negro como o céu acima deles. Quase não conseguiam enxergá-lo.

— Hana, pegue um copo d’água para o papai — Hinata disse, descendo os degraus de entrada e caminhando em direção ao pai.

Quando ele chegou mais perto, a Hyuuga percebeu o semblante cansado e sujo pela poeira da estrada; bem como pudera observar as grandes proporções do cavalo. Estava mais grata por poder vê-lo no fim do dia do que pelo pai ter conseguido o animal que a levaria até a propriedade Uchiha, então não mediu esforços em abraçá-lo com força.

— Que bom que voltou, estávamos preocupados — disse e logo em seguida Hanabi apareceu com a água. Hiashi bebeu tudo em duas goladas.

— O senhor nos deixou preocupados! — a mais nova ralhou.

— Saiu sem nem dizer para onde iria… — Neji concordou, completando a fala de Hanabi.

— O importante é que eu trouxe a recompensa. — E estendeu a corda para Hinata. — Agora é seu e você pode partir.

Hinata suspirou fundo e pegou o cabo das mãos do pai com um olhar triste. Deu meia volta para seguir até o celeiro, onde Kaguya e Amaterasu ficavam, a fim de acomodar o belo cavalo e dar-lhe de comer e beber. Hanabi e Neji levaram o pai para dentro de casa, ele deveria estar morrendo de fome depois de tanto tempo fora.

Quando tudo ficou devidamente preparado para a manhã, cada Hyuuga seguiu para sua respectiva cama com a finalidade de aproveitarem a última boa noite de sono com Hinata em casa.

 

No dia seguinte, todos se reuniram para o café da manhã, entretanto, permaneceram em silêncio; ninguém queria admitir que Hinata ia embora. Ao sentirem-se devidamente saciados, levantaram-se e cada um seguiu para uma tarefa diferente: Hanabi arranjou uma trouxa com comida suficiente para que durasse ao menos duas semanas, incluindo alimentos que não estragariam facilmente; Neji fez uma bolsa com tudo o que precisaria para arrombar um castelo; Hinata foi buscar o cavalo; e Hiashi apenas preparou o coração para ver a filha partindo.

Ela nunca havia montado em um cavalo antes, mas não parecia muito difícil. O patriarca ensinou-lhe a subir sem que se estatelasse no chão do outro lado, a indiciar para o cavalo qual lado ele deveria seguir e a fazer com que parasse, sem machucá-lo. Era bem simples, inclusive. 

— Eu não acredito que vou ter que tirar leite da Kaguya todo dia agora… — Hanabi dizia, soando raivosa, embora as lágrimas e o ranho saindo de seu nariz dissessem completamente o contrário.

— Nós vamos sentir sua falta, não demore — Neji comentou e Hinata sentiu vontade de chorar.

— Vá com Deus, minha filha — Hiashi se pronunciou também uma última vez.

— Eu prometo que não vou demorar, como já tinha dito a Hanabi antes — ela respondeu, sua voz firme a fim de passar tranquilidade e certeza a sua família.

Hinata fez o movimento para que o cavalo começasse a galopar e não olhou para trás, pois ela sabia que, se o fizesse, perderia toda a coragem que conseguira reunir e não avançaria nem mais um passo. Seu peito doía como se seu coração estivesse dilacerando aos poucos.

Então ela soube: aquele era o peso de se fazer uma promessa…

 

Sentimento assim…

Sempre é uma surpresa


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

um capítulo para mostrar o motivo que levou a Hinata a ir para o castelo e como ela chegou lá! diferente do conto original, no qual ela troca a própria vida pela do pai, aqui eu quis desproblematizar (?) um pouco as coisas kkkkk acho que na história original eles romantizam um pouco o cárcere, sei lá. enfim! hahaa
espero de coração que vocês estejam gostando ♥
eu tive que fazer uma pequena mudança: a fanfic agora terá uma parte 4! eu e minha síndrome de não conseguir fazer nada curto... aiai
e me sigam no instagram! @gatitamatsushita (ou, se preferir, tem o link no meu perfil), tô sempre postando um spoilerzinho. inclusive, se forem lá hoje (20 de fev), tem spoiler da parte 3 hihih

um beijão pra todo mundo e até o próximo! ♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Conto da Fera" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.