Pelos Olhos Teus escrita por Victoria Aloia


Capítulo 8
Capítulo 7 - Recomeço


Notas iniciais do capítulo

Como prometido, o sétimo capítulo!
Espero que aproveite a leitura!



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Nos três últimos dias de férias deixei meu novo material arrumado, uniforme separado e concentrei minha energia apenas na ansiedade para iniciar a nova fase da minha vida. Na noite da véspera do primeiro dia tive um sonho muito estranho com uma época muito distante e vestidos longos de baile. A julgar pelo livro que estava lendo, não dei muita atenção àquilo e segui com a animação para iniciar o colegial. 

Ainda não tinha tido notícias de Augusto até a manhã daquele dia tão aguardado. Acordei mais cedo do que precisava, comi um sanduíche e tomei um copo de leite antes de sair. Minha mãe me levou até a porta do colégio que ficava a dois quilômetros da minha casa. A esperança de encontrá-lo ali era grande, mas já estava na hora de entrar e ele não estava em meu campo de visão. Despedi-me da minha mãe, que me beijou a testa e me abraçou apertado. 

O colégio era diferente da minha antiga escola em diversos aspectos. Enquanto caminhava pela calçada uniforme e arborizada, observava a fachada branca e arcaica do que descobri minutos depois ser o “prédio antigo”. Desci a rampa íngreme até as catracas de entrada, que estavam desbloqueadas para o início das aulas. Assim que passei por elas, com minha mochila azul marinho cheia de pequenas ilustrações de cerejas pendurada em um dos ombros, tive a visão de um boulevard com mesas coloridas e talvez umas cinquenta crianças ao redor delas com suas bolsas com rodas e lancheiras de personagens nas costas. À minha direita tinha uma quadra de handball com cinco vezes a quantidade de pessoas que estavam no boulevard. Ainda tinha uma quadra coberta à esquerda da quadra de handball, uma outra de basquete ao fundo e outra poliesportiva no fim do terreno. Definitivamente era um colégio muito grande. Tudo nele era colorido com as quatro cores do emblema, inclusive seu uniforme. Dentre tantos rostos desconhecidos, mesmo com o sentimento de que quando visse Augusto poderia vomitar borboletas que estavam em meu estômago, queria vê-lo e não o encontrava. 

Comecei a achar que ele não apareceria mesmo. Até que, enquanto a coordenadora chamava os alunos para suas salas, finalmente minha busca terminou. Eu o procurara em todos os cantos, e quando o encontrei ele parecia camuflado na multidão, mas ao mesmo tempo destacado e deslocado. Assim como em uma cena clichê de romance, nossos olhares se encontraram. Ele ajeitou a postura, pegou a mochila do chão e começou a vir em minha direção, que estava sentada em um dos poucos espaços livres da arquibancada que dividia as quadras de handball e a coberta, com um livro na mão para disfarçar o nervosismo e me distrair da sensação de estar rodeada de tantas pessoas e me sentir sozinha ainda assim. 

A cada passo que Augusto dava entre a multidão de alunos que iam e vinham no espaço térreo da escola, cada um indo para uma direção a caminho de sua respectiva sala, meu coração dava um pulo. Enfim chegou até mim e disse:

— Quanta gente aqui…

— Sim… É… Eu tentei te ligar, deixei mensagem pra me retornar quando desse. Está tudo bem? - Eu perguntei no lugar do que eu realmente queria saber: será que a gente estava bem?

— Ah, sim. Estou tocando em frente, sabe? Precisava de um tempo para colocar os pensamentos em ordem. E fiquei sem jeito de atender ou retornar suas ligações… Te devo desculpas - Ele falou, estralando os nós dos dedos sem saber muito bem o que fazer com as mãos.

— Está tudo bem. Eu também não sei como reagiria àquela notícia… Já sabe em qual turma ficou? - Perguntei tentando mudar de assunto.

— No primeiro B, e você?

— A. - Falei com um fio de alívio em não ter que encará-lo por tanto tempo do meu dia.

— Atenção, alunos do primeiro ano do Ensino Médio: turma A, por favor dirijam-se à sala de Literatura, no segundo andar; turma B, podem seguir para o laboratório de Biologia, também no segundo andar e turma C, por favor vão para o primeiro andar até a sala de Matemática. - A coordenadora estava chamando as turmas por ano e então subimos juntos os dois lances de escada do “prédio novo”. 

Ao chegar lá, eu segui reto até o fim do corredor e virei à direita enquanto Augusto imediatamente foi para a esquerda, subindo mais alguns degraus depois de nos despedirmos. Ele pediu que nos encontrássemos ao final das escadas para o intervalo alegando não querer ficar sozinho, mas eu duvidava que com o jeito dele isso iria acontecer. 

A sala era ampla, com uma boa iluminação, vista para algumas árvores frondosas que cresciam na calçada do lado de fora dos muros da escola, um quadro branco com uma escrita simples dizendo o nome da professora e os dias que teríamos aula com ela. Escolhi a última carteira ao lado da janela, no fundo da sala. A cadeira azul era bem mais confortável do que parecia. Arrumei meu material na mesa, já anotando as informações do quadro, e vi a professora entrando na sala e encostando a porta atrás de si quando o último aluno passou por ela. Sua estatura era baixa, ela vestia uma calça jeans, sapatinhos baixos e uma camiseta clara por baixo do avental sem mangas. Algumas canetas acompanhavam seu óculos pendurado no bolso do avental, que logo foi colocado em seu rosto de expressão séria, mas amável. Seu cabelo curto e preto dava ainda mais a impressão de dureza, mas foi o tempo de ela abrir a boca e dar as boas vindas ao novo ano letivo que todo o ar carrancudo foi pelos ares. 

Tive duas aulas seguidas, depois foi a vez de História. O colégio não tinha salas fixas para as turmas e sim para os professores, então foi só atravessar o corredor para entrar na sala que era exatamente uma réplica da primeira. A aula foi maravilhosa, a professora apresentou o programa e informou sobre os trabalhos do bimestre. Quando o sinal tocou anunciando o horário do intervalo comecei a recolher minhas coisas com calma. Não queria passar vinte e cinco minutos procurando assuntos para falar com Augusto, ou tomando cuidado com o tom da conversa. Aquele era o primeiro dia que conversávamos em algumas semanas, então não sabia até onde eu podia ir. Desci as escadas lentamente torcendo para que ela fosse infinita. Sabendo que ele estava bem já era o bastante para mim, mas agora que estávamos de volta estudando juntos era difícil encará-lo sentindo tudo o que eu sentia. 

Não me surpreendi quando não vi ninguém ao final do último lance. Foi um alívio, na verdade. Poderia ler em paz e sem a preocupação de ter Augusto me analisando a cada movimento. Sentei em um banco do boulevard e abri meu livro. Foi o tempo de eu tirar o marca páginas do miolo e ler a primeira frase quando ouvi a voz dele me chamando. Realmente, “alegria de pobre dura pouco”. 

— Ei, Olívia! - Levantei os olhos do livro e encarei aquela face rosada que vinha correndo em minha direção e vi mais dois garotos idênticos atrás dele.

— Oi, não era para nos encontrarmos na escada? - Falei torcendo para que ele desse qualquer desculpa.

— Sim, mas você demorou e os caras falaram que se não nos apressássemos ficaríamos só com os salgados murchos ou queimados da cantina. Esse aqui é o Tomas e esse é o Teo. Eles são gêmeos, não é legal? Eles são iguaizinhos, né?

— Estou vendo… - Ri com meus próprios pensamentos - Sou a Olívia. Tudo bem?

— Sim, você já tem companhia para o intervalo? - Perguntou um dos gêmeos, qual dos dois eu não saberia dizer.

— Ela tem sim, e parece que você também, não é Teo? Então porque não vai ficar com sua trupe e deixa as meninas conversarem em paz? - Uma voz feminina falou atrás de mim. 

A reconheci da aula de Literatura. Me virei e vi que a garota de cabelos pretos e bem lisos estava encarando o Teo com provocação. Ali tinha coisa. Ela chegava a ser uns vinte centímetros mais baixa que eu, mas estava prostrada com firmeza pousando suas mãos na cintura. 

— Tudo bem, então. Vai ficar bem sem mim? - Augusto perguntou com um sorriso no canto de seus lábios.

— Você sabe que sim. Até depois - Respondi já me virando de volta para encarar a garota que tinha me salvado sem nem saber.

— Te salvei de uma, hein… - Aquilo foi estranho.

— Ah, não era nada. Eu conheço o Augusto e…

— E eu conheço o Teo e o Tomas. Você não vai querer se meter com eles. São mais babacas do que você possa imaginar. Eles não usam o charme de gêmeos à toa, vai por mim. Madeleine, prazer - Ela me estendeu a mão, que segurei num cumprimento.

— Olívia. Você também é do A, não é? Lembro de você comentando algo sobre o Ultrarromantismo na aula de Literatura mais cedo.

— Eu mesma. Adoro essa disciplina! Vem sentar com a gente. Estamos montando um grupo de estudos para as provas e trabalhos - Madeleine me guiou até uma das mesas próximas de onde estávamos com mais três garotas.

Cora só seria transferida para lá no ano seguinte, pois pedira para sua mãe deixar que ela terminasse o Ensino Fundamental na mesma escola. Minha madrinha tinha dado um ultimato nela depois que Cora reprovou no oitavo ano e como punição ela mudaria de colégio no Ensino Médio. O que Cora e eu não encaramos como punição, uma vez que estudaríamos juntas. Eu era vista como modelo educacional na família, e os pais dela acreditavam que colocando nós duas juntas eu poderia ser uma boa influência para Cora.

Enquanto isso não acontecia, seria bom ter amigas com quem estudar e fazer os trabalhos. Até porque, Cora e eu nunca seríamos da mesma turma. E, a julgar pela antecedência com a qual estavam pensando em grupos de estudo, dava para notar que eram pessoas responsáveis. Madeleine me apresentou as meninas: Kora, uma japonesa de cabelos pretos longos e lisos, devia ter quase a minha altura. Giulia tinha cabelos castanhos, presos num rabo de cavalo volumoso e com uma franja que chegava até os óculos que usava. Helena (ou Lena) que tinha a pele bronzeada, cabelos mais claros e ondulados. De todas, fisicamente, Lena se parecia comigo. Meu cabelo não era tão claro quanto o dela, mas nossa estatura e curvas eram bastante parecidas. Não nos encaixávamos no que parecia ser o padrão da escola: garotas baixas, magras e de cabelos lisos e longos. Com o tempo aprendemos a amar nossas curvas e tudo o mais que nos constituía. 

Augusto passou a ir e voltar da escola de carona com os gêmeos, Mad nunca me contou o que tinha de errado entre ela e os meninos, mesmo voltando junto com ela todas as tardes para casa. O primeiro ano passou rápido, com poucos encontros entre eu e Augusto no corredor ou no intervalo (quando ele não estava com sua turma e me ignorava). Ele estava se tornando outra pessoa novamente. 

Quando os “amigos” dele o deixaram depois de ver que ele estava indo mal nas matérias, ele veio atrás de mim e pediu ajuda, até mesmo se ofereceu para trocar de turma com uma garota da minha sala que não tinha se adaptado. Eu não negava ajuda a ninguém, principalmente em relação aos estudos. Fui trouxa de novo? Com certeza. Só que não me arrependo pois o ajudava mais por ser disciplinas que eu gostava e por ter uma troca dessa ajuda. Eu explicava História, Literatura e Geografia e ele tirava minhas dúvidas de Física, Química e Matemática. As meninas não gostavam muito disso, mas eu não me importava pois ele tinha pago para ver, quebrado a cara e aprendido. E para mim, era aquilo que valia.

As coisas entre nós estavam normais de novo. Nossos encontros aos finais de semana na praça viraram tardes de estudo na biblioteca do bairro. Augusto não podia mais se apoiar no carisma e afinidade com os professores para tirar notas, e se ele quisesse continuar ali e se formar, precisaria estudar e levar aquilo tão à sério quanto eu levava.  E ele estava aprendendo. Até que chegamos ao segundo ano. Algumas mudanças de professores e alunos. Cinco pessoas na nossa turma reprovaram. Foi apresentada uma aluna nova no primeiro dia de aula, junto com os projetos extracurriculares do ano e foi aí que tudo foi por água abaixo de novo.


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Notas finais do capítulo

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