Pelos Olhos Teus escrita por Victoria Aloia


Capítulo 5
Capítulo 4 - Jogos interclasse


Notas iniciais do capítulo

Olá você!
À quem acompanha a postagem semanal, mil desculpas por não ter postado na hora combinada... Surgiram alguns imprevistos, mas tudo bem agora.

Espero que curtam a leitura e até as notas finais.



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Foram as férias mais rápidas de todas a meu ver, mas fiz bastante coisa. Fui à casa da minha prima, passei uma semana na casa da minha avó, visitei museus e fui ao parque  umas duas vezes. Assisti filmes em dias de chuva, e até encontrei as meninas algumas vezes. As festas de final de ano  não tiveram novidades, como sempre fomos para a casa da minha tia na zona leste da cidade e nos amontoamos novamente no mesmo sofá de sempre. Vi o show do Roberto Carlos pela TV com minha avó e brindamos à entrada do novo ano com champanhe sem álcool observando a queima de fogos da janela do apartamento. 

Janeiro começou com muito calor. Nos dias mais quentes, quando só ficar em casa com ventilador ligado e janelas abertas não era o bastante, eu entrava no chat online para chamar Augusto e avisá-lo que iríamos para a praça com Breno que, por conta da oficina de seu pai ser próximo à praça, andava de skate pelo bairro com muita liberdade. Fomos só nós três durante boa parte do mês, mas quando as aulas do nosso nono ano começaram, as coisas mudaram um pouco.

Augusto passou a ser mais arrojado, arruaceiro, não ligava muito para a aula, estava sempre envolvido em brincadeiras e levava bronca dos professores frequentemente. Enquanto eu abraçava cada vez mais projetos para ter pontos extras para receber a indicação de bolsa de estudos para colégios particulares que faziam parceria com a escola, ele parecia pouco se importar com o futuro. 

Eu participava de projetos de artes, como teatro e pintura, me juntei ao clube do livro junto de Mariana e ainda jogava xadrez depois da aula. Fazia aulas de reforço e estudava até aos finais de semana. Eu me dedicava muito e Augusto por sua vez não dava a mínima para a escola, e mesmo assim tirava boas notas, era inteligente, mas fazia o típico despreocupado. 

Aquilo estava começando a me irritar. A atitude despretensiosa dele para com tudo ao redor, ele agia como se não ligasse, como se nada importasse, como se nada valesse a pena o suficiente para ter a atenção dele. Contudo, quando estávamos só nós dois naquela maldita praça, ele mudava. Voltava a ser o garoto atencioso e brincalhão de sempre.

Parecia que ele fingia ser duas pessoas e eu não entendia o motivo daquela cena toda. E, honestamente, não era da minha conta. Só sabia que aquela atitude de “não estou nem aí para nada” não era ele de verdade e ele parecia notar que eu percebia qual era a do joguinho dele. Quando íamos juntos para a escola, com uma distância de uns dois metros entre nós, ele era brincalhão, mas sem ser mau. Ao chegar na escola, ele se transformava, falava pouco comigo e suas piadas eram quase cruéis. Sempre estava preparada para o que quer que viesse dele, mas nunca, nem em um milhão de anos, poderia me preparar para o que aconteceria naquele nono ano.

***

A palhaçada toda começou logo depois de um dos jogos de futebol interclasse que aconteceu no meio do semestre. Melissa, uma garota um ano mais nova que a gente, comandava um pequeno grupo de meninas com pompons e vestindo calças legging com blusas tão pequenas que eu tinha certeza serem, pelo menos, três tamanhos menores do que elas realmente usavam. Era a nossa versão de líder de torcida, por assim dizer. 

Augusto, que nunca gostou de jogar futebol - sempre preferindo o basquete e o skate - se inscreveu para entrar no time, depois de passar o jogo inteiro contra o oitavo ano babando da arquibancada pelo show de Melissa e sua trupe. Ela se exibindo como um pedaço de carne para leões famintos em plena savana africana. Ele completamente enfeitiçado por seus olhos claros e cabelos pretos até a cintura, milimetricamente alinhados e presos em uma parte por um laço vermelho, assim como o de suas “seguidoras”.

Eu sinceramente não sei o que eu tinha na minha cabeça. Foram tantas, inúmeras, incontáveis coisas que me alertaram e até hoje sinto vontade de estapear minha própria face quando lembro o que eu fiz. Enquanto eu me escondia atrás dos livros e passava a um estado bitolado de tanto estudar, ele estava chamando a atenção como podia e, quando conseguiu, eu acordei, mas era tarde demais. 

Na final dos jogos interclasse o oitavo ano venceu por um gol de diferença, mas foi o mais novo jogador do nono ano quem ganhou um prêmio, aos olhos dos outros garotos da escola. Ao final do jogo, depois de ter confirmado com o professor sua vaga no time para o próximo jogo, ele veio até a arquibancada e cochichou algo nos ouvidos de Breno e Wallace, depois olhou em direção às meninas da torcida do oitavo ano para em seguida me encarar. E, para melhorar a maré de sorte de Augusto, eu conhecia Melissa pois ela era vizinha de Paula, e como ia muito à casa dela, passei a conversar um pouco com ela. 

Ele me fez um breve questionário sobre a vida dela e ficou surpreso ao saber que ela estava solteira. Melissa havia terminado o namoro relâmpago de dois meses com um garoto de outra escola, o que deixou Augusto muito contente pois significava que seu caminho estava livre para suas investidas. Particularmente não via graça em Melissa. Ela não tinha nada de mais, nem física nem emocional nem intelectualmente, porém Augusto também não era em nada excepcional, então eles bem que se mereciam a final de contas.

Contudo, ele era um Don Juan e não queria nada sério (até onde me contara). Ele só precisava de uma pequena ajuda para começar a conversar com ela. É tão estranho pensar que tínhamos uns quatorze ou quinze anos nessa época. Parece uma coisa tão infantil, mas séria ao mesmo tempo.

Então, tive a brilhante ideia: vou apresentá-los, já que ele está tão interessado. Como se tivesse levado um choque, enlacei meu braço ao de Wallace e fui até a grade da quadra onde Melissa ainda estava reunida com seu esquadrão de clones. 

— Oi. Então, você está vendo aquele menino com boné branco ali? - Apontei para onde Augusto e Breno estavam, junto de Mariana, Paula e Lúcia.

 – Sim, o bonitinho. O que ele quer? - A voz dela era mais aguda do que eu me lembrava.

— Ele quer ficar com você. Obviamente. - Não sei quem era mais estúpida, eu por me prestar àquele papel ou ela por se fazer de sonsa.

— Ah… Tudo bem. Fala para ele me encontrar na árvore perto do portão na hora da saída. - Ela jogou o cabelo para o lado e voltou sua atenção às meninas.

Me virei e dei de cara com Wallace semi-petrificado pelas mini medusas de Melissa que o encaravam, enrolando entre os dedos mechas de cabelos alisados como se ele fosse um marinheiro à deriva no mar e elas prontíssimas para abocanhá-lo. Puxei-o pelo braço e fomos contar a boa-nova a Augusto. O estado em que aquele garoto se encontrava era patético. Sem o mínimo de autoestima, na minha opinião. Ele estava ansioso, batendo o pé, mexendo a perna compulsivamente e sentado na arquibancada com os cotovelos apoiados no joelho como se esperasse uma notícia muito importante. 

Quando contei a ele que ela o esperaria na saída da escola, ele quase saltou de alegria. E como combinado, lá estava ele escorado no grosso tronco da árvore ao lado de fora do portão da escola com a mochila equilibrada em um dos ombros, com a maior cara de bad boy.

Desde o ano anterior que voltávamos juntos, e quão incrédula não fica minha feição hoje em lembrar que eu estava lá, parada do outro lado da rua, esperando que ambos parassem de tentar engolir um ao outro em pleno sol do meio dia. Realmente foi uma atitude muito idiota. Porém, não mais do que o que aconteceria um tempo depois. Na volta para casa, quinze minutos mais tarde que o normal, o assunto foi como ele estava feliz e como me agradecia por tê-los apresentado, ele dizendo que estava nas nuvens e que ela era muito mais do que tinha imaginado. Demorei um tempo para cortá-lo pois queria saber se ela de fato era só um rostinho bonito, mas poupei-me dos detalhes sórdidos. 

Faltava pouco tempo para as férias de inverno e conforme o clima esfriava, minha amizade com Augusto seguia o mesmo curso. Ele não passava mais o tempo na praça pois estava na casa dela, não fazia mais piadas porque estava ocupado elogiando-a, começou a se vestir de um jeito diferente, como se a aparência dele passasse a importar, cortou o cabelo e até seu icônico boné deixara de usar. Ele dizia que não, mas era inegável a forma como o namoro dele com Melissa, que era para ser algo casual - apenas uma ficada com uma garota da escola - o havia transformado. 

Não fui a única a ter notado as mudanças, temperamentais inclusive, de Augusto. Breno, que era mais próximo que Wallace, comentava comigo quase diariamente que sentia falta de como as coisas eram antigamente. Eu também sentia, mas não admitiria isso tão fácil. Chega a ser irritante o quão orgulhosa eu era. Passadas duas semanas de aula, depois que Augusto havia nos contado que estava namorando com Melissa, lá foi ele com outro anúncio: não poderia ir conosco ao parque no sábado seguinte pois iria para a praia com a família dela. 

Que ele aproveitou a praia, não tivemos dúvidas. Mas dois dias depois de ter voltado ele ainda não tinha falado com ninguém. Eu estava na casa da Paula e quando olhamos pela janela do quarto, de relance, vimos uma menina muitíssimo parecida com a própria Melissa atracando-se com um menino do oitavo ano chamado João Pedro no banco da praça de frente para a entrada da casa de Paula. Chamamos Mariana e ela confirmou que a garota não só parecia com Melissa como era ela. 

Chegamos ao consenso de não contar nada para Augusto. Ele estava muito feliz, mesmo que nos tenha deixado de lado. Caso contássemos, pareceria ciúmes de tão cego que ele estava por ela. Ele não admitia ter mudado por ela, quem dirá aceitar que não estávamos vendo coisas. Ao voltar para casa naquele dia, acabei desabafando com minha mãe e ela me disse coisas que eu deveria ter prestado mais atenção. Não foi só mais um daqueles “papos de mãe”, ela me deu conselhos reais que eu simplesmente ignorei. Não devia ter feito aquilo. 

Nessa mesma noite, repassei cada uma das atitudes que eu tinha tomado até então com relação a Augusto. Acabei dando voz a algo que vinha gritando no vácuo da minha mente a tempos e eu apenas sufocava com a desculpa de sermos amigos e estar confundindo os sentimentos, principalmente naquela situação. 

Eu chorei. Chorei por ter feito aquilo comigo mesma, por ter me permitido fazer tudo o que fiz, desde quando falei para ele que gostava do Júnior lá no sítio de Cora, até tê-lo entregado à Melissa de mão beijada. Eu gostava dele. Esse tempo todo eu gostava do Augusto. E, parecendo clichê ou não, assim como tantas outras coisas eu só fui perceber tarde demais.


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Notas finais do capítulo

Então... O que achou? Comente para eu saber se está gostando da história até aqui. Críticas construtivas são muito bem vindas.
Nos próximos capítulos teremos uma evolução das personagens, alguns saltos temporais com flashbacks... Vocês nem esperam o que vem por aí!

Obrigada por acompanharem e até o próximo caítulo.



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