Pelos Olhos Teus escrita por Victoria Aloia


Capítulo 11
Capítulo 10 - O começo do fim


Notas iniciais do capítulo

Olá você!
Desculpe a demora na postagem, mas espero que goste...



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Depois de falar com Cora sobre quem iria ou não, ela me perguntou se eu não chamaria o Augusto. Estávamos bem distantes depois da volta do acampamento. Não nos víamos mais na praça, apenas no colégio. Nossas interações eram resumidas a quando estivéssemos em grupo. Em contrapartida, Mateus se aproximava cada vez mais de nós, tanto do grupo quanto da minha pessoa em especial. 

— Não acredito que logo você não vai chamar o Augusto para um final de semana na praia! É uma oportunidade única e…

— Eu sei, mas não tenho tanta certeza se ainda quero essa oportunidade. Não estamos nos falando muito esses tempos.

— Ainda pelo o que aconteceu no acampamento? - Cora não tinha muita paciência com a relação que eu tinha com Augusto.

— Sim… É mais difícil do que parece.

— O que me parece é que você está com medo. Medo de ele tentar algo, medo de se entregar, medo de várias coisas.

— Está me chamando de medrosa?

— Achei que isso era óbvio! Vai chamá-lo ou não?

— Está bem… Eu vou chamá-lo então. 

Desativei a tela do celular e fui caminhar um pouco. Precisava colocar as ideias no lugar. Augusto não tinha dado nenhum sinal de que queria algo comigo, então ela só podia estar se referindo ao Mateus. O que também não fazia sentido. Não contei para ninguém sobre o “nosso momento” no acampamento. A única pessoa que talvez saiba de algo é Alice. Não creio que as duas sejam tão próximas para que ela tenha contado algo à Cora. Estaria tão na cara assim que poderia acontecer algo entre nós?

Ao caminhar pelo bairro, absorta em meus pensamentos, não reparei em quem vinha em minha direção. Só notei quando o ruído das rodas de resina rolavam pelo asfalto fazendo o barulho característico de skates. Ele estava próximo demais para eu voltar à esquina e mudar de caminho. Chegando rápido, parou o skate com uma manobra brusca e o pegou na mão. 

— Oi. - Ele falou primeiro.

— Oi… - Eu estava nervosa, não com raiva, mas sem saber como agir perto dele. Tínhamos o bairro todo para andar, por que trombar com ele naquele momento? 

— Então, eu queria te pedir desculpas… 

— Não, está tudo bem. Eu também devia te pedir desculpas.

— Estamos quites, então. - Ele estendeu a mão para que eu a apertasse. 

— Sim. - O simples toque dele me arrepiou, mas ele não pareceu notar. Ele nunca notava. - Bom, eu queria mesmo te perguntar uma coisa: você está livre no final de semana do ano novo? Vai viajar ou algo assim?

— Não, não vou viajar. Por quê?

— Bom, a Cora te chamou para ir à praia. Ela tem uma casa na praia e minha mãe quem vai nos acompanhar. Se quiser vir, é muito bem-vindo.

— Maravilha! Estava mesmo precisando sair de casa por um tempo. E ir à praia é sempre bom.

— Como assim? Está tudo bem? - Comecei a me preocupar, talvez tivesse acontecido algo na casa dele. Realmente não nos falávamos há um tempo. 

— Não é nada de mais… Nada que nunca tenha acontecido, mas não tô muito afim de falar sobre isso agora. Vai continuar a caminhada?

— Estava pensando em voltar para casa, na verdade. Mas posso conversar, se quiser.

— Não! Vai lá então, te mando uma mensagem depois, pode ser?

— Claro.

Com isso nos separamos e voltei para casa. Mais aliviada por ter falado com Augusto, mas ainda confusa com meus sentimentos, e a parte racional do meu ser parecia não querer colaborar naquele momento. Pedi que Cora me mandasse os detalhes para enviar aos nossos amigos e acertar tudo com quem iria. 

***

O Natal passou sem novidades. Fomos para a casa da minha tia, comemos muito, meus tios deram vexames com as mesmas brincadeiras e piadas de sempre. Estava tudo “sob controle”. Quando voltamos para casa tratamos logo de fazer as malas. Cat foi bem cedo na sexta-feira para a casa de Marcus; Lucas discutia com minha mãe sobre não caber seus tênis, bonés e o videogame na mesma bolsa. Era apenas um final de semana no feriado de Ano Novo e tudo estaria fechado. Não tinha muito o que fazer, além de andar na orla da praia ou ficar na piscina durante o dia e ir para o salão de jogos à noite. Então levei dois vestidos de tecidos leves, minha canga, dois conjuntos de biquíni, minha rasteirinha e a roupa para assistir à queima de fogos na noite de Ano Novo.

À noite estavam todos na porta da minha casa com suas mochilas e bolsas de viagem, esperando a van que alugamos para poder levar todos de uma vez. Minha mãe foi ao lado do motorista com um lugar vago. Depois vinham Mad, Cora e eu; seguidos de Teo, Tomas, Augusto e Alice; e por último Lucas e Nico. Quando estávamos quase partindo, junto de um carro que parou na porta de casa, Cora falou:

— Temos mais um passageiro, moço.

— Ah não. Você não fez isso! - Eu estava incrédula.

— Fiz, e você devia me agradecer!

— Você me confunde, sabia?

— Quem chegou? - Augusto falou do terceiro banco, esticando o pescoço para ver quem tinha entrado no carro.

— Fala galera! - Mateus entrou no veículo e sentou-se junto com minha mãe no banco da frente. - Estamos prontos? - Ele parecia empolgado.

— Estávamos até você chegar. - Augusto falou baixo, mas eu (que estava sentada no banco a sua frente) pude ouvir. Alice o repreendeu.

Saímos com a van em direção à estrada. A viagem durou pouco mais de uma hora, o que se considerar o dia do ano, foi um milagre. A casa ficava dentro de um condomínio fechado no litoral norte, e era a última casa da rua. Um sobrado que parecia ter sido colocado ali por mãos divinas. A casa tinha duas saídas: uma para a rua asfaltada, e a dos fundos que já era na areia. Do lado de fora dava para ver que os fundos dela estavam alicerçados por uma pedra imensa. Estando na ponta da praia tínhamos a vista do mar, com o pé na areia, e também do bosque que ladeava o condomínio. Para a nossa surpresa, toda a parede que findava a casa era um imenso janelão de vidro. A vista era de tirar o fôlego. 

No térreo ficava um lavabo, a cozinha americana com ilha e conceito aberto para a sala de estar. Esta, por sua vez, tinha uma TV de tela plana (talvez a maior que já vi), um sofá tão grande quanto o próprio cômodo, e um tapete de corda. O sofá com certeza foi usado por Lucas e Nico durante todo o feriado. Não me admirei quando minha mãe os comparou com as plantas quase criando raízes no tapete. 

No segundo andar ficavam os quartos. Com a exceção da suíte master que tinha vista para a praia, os outros dois quartos eram iguais: uma beliche e uma cama de casal, um sofá e um banheiro próprio. Lucas e Nico usavam o quarto apenas para se trocarem, então ficaram com minha mãe na suíte master. Cora estava me evitando tanto que abriu mão de dormir na cama de casal e foi logo para a beliche. Alice fez o mesmo, então fiquei com Mad. Os meninos foram para o outro quarto. Me perguntava como Mateus estava se sentindo, se Augusto estava “se comportando” ou se estavam trocando farpas como no acampamento. Eles não se davam muito bem, mesmo com a aproximação de Mateus com o grupo.

Me lembro que aquela noite demorou a passar. Quando dei por mim, já ouvia o canto dos passarinhos do lado de fora da janela. Fui até o banheiro para lavar o rosto e escovar os dentes. Não me recordo de levar um susto tão grande como o que estava prestes a tomar até pouco tempo. Quando abri a porta, tentando não fazer barulho, dei de cara com Cora parada em minha frente. Meu coração pulou alguns saltos. 

— Você quer me matar de susto, garota? - Falei com irritação, mas ainda sussurrando, com a mão sobre meu peito.

— Se eu não te falar agora porque eu chamei o Mateus, você nunca vai saber. Preciso falar com você.

— Não podia esperar eu sair do banheiro como uma pessoa normal? 

— Não. Agora vem comigo. - Ela pegou meu pulso e me levou até fora do quarto. Descemos as escadas e fomos em direção à cozinha. 

— Não vamos acordar os meninos? 

— Olha para eles. Você acha que essas pestes vão acordar? Pode falar normalmente agora.

— Você é quem tem que falar. Para quê você chamou o Mateus aqui?

— Porque se eu fosse esperar você fazer isso, eu ficaria mais velha que a rainha da Inglaterra. Você precisa superar o Augusto, prima! Ele está com a Alice agora. Hora de seguir em frente. 

— E você acha que eu não sei disso? Não nos falamos direito por muito tempo. Boa parte do semestre eu conversei mais com o Mats que com o Guto. Mas você sabe que isso não é simples. 

— Sim, eu sei. E é por isso que eu preciso que você tente seguir em frente. Não fique presa a alguém como eu fiquei com o Otávio. Olivia, você não pode perder sua vida atrás de um garoto que não tem nada a ver com você! Dê uma chance para ele. Dê uma chance para você, para ser feliz. 

— Eu sou feliz, tá! O Mats é legal, mas eu não sei…

— E nunca vai saber se não tentar. Agora vamos voltar para o quarto, você tira um cochilo e quando acordarmos de novo você vai colocar seu biquíni e, como uma promessa de Ano Novo, você vai se dar a chance de ter algo real com alguém real. Pode ser?

Eu sabia que aquela era uma guerra vencida. Uma pergunta retórica de Cora significava o fim de uma conversa. Voltamos ao quarto e eu fiquei pensando no que ela me disse. Estava cristalino como o vidro daquela janela que eu não teria chances com Augusto. Resolvi tentar mesmo me dar a chance da felicidade. 

Quando acordamos cerca de três horas depois daquela conversa com Cora, mal tomamos café e já saímos para a praia. Era o último dia do ano e merecíamos um descanso, depois de todos termos tirado boas notas nos quatro bimestres, e também recarregar as baterias para o nosso último ano no colégio. Pensar naquilo me dava uma nostalgia antecipada. 

Parecia uma cena de filme. Todos saindo correndo em direção ao mar logo pela manhã. O dia amanhecera abafado, sem nuvens e com um sol escaldante. O calor era tamanho que ainda às nove da manhã estava fazendo trinta graus. Teo e Tomas mergulharam de primeira e começaram a jogar água em Cora e Mad que estavam entrando mais devagar para se acostumar à temperatura. Alice estava montando o guarda-sol com minha mãe e Augusto ficou para ajudar a posicionar as cadeiras na areia. 

— Não vai entrar? - Outro susto. Mats parou ao meu lado na parte rasa do mar.

— Vou, só estou… Sei lá… - A água estava gelada, mas era um refresco no calor. As ondas ao longe não chegavam à parte onde o pessoal estava, a areia molhada sob nossos pés.

— Registrando o momento? - Ele não olhava para mim. Encarava o horizonte.

— Sim. Como você sabia disso?

— Você tem cara de quem faz isso. - Ele sorriu de um lado e seus lábios revelaram uma covinha em sua bochecha. 

— E de quê mais eu tenho cara? - Me virei para vê-lo.

— Isso ainda tenho que descobrir…

Alice me chamou para debaixo do guarda-sol já montado. Ela não queria entrar no mar tão cedo e minha mãe voltou para a casa para nos dar mais espaço e liberdade. Começamos a falar de futilidades, assuntos aleatórios como os filmes em cartaz naquele mês e outras coisas relacionadas ao cinema. Alice adorava falar sobre isso. Não me admira que ela tenha escolhido cursar cinema na faculdade. Depois de algum tempo, eu estava lendo meu livro e sendo interrompida constantemente com pedidos insistentes do pessoal para que nós entrássemos no mar, e neguei todos eles. 

Alice me perguntou algo sobre o Mateus que eu não entendi pois voltara a me concentrar na mesma página que estava fazia pelo menos quinze minutos, quando antes mesmo de eu poder perguntar o que foi que ela disse, Augusto apareceu em minha frente e começou a chacoalhar o cabelo molhado em cima de mim. 

— Vocês não vão vir mesmo? A água está uma delícia, sente só… - E com isso jogava mais água sobre mim.

— Nossa, que maduro da  sua parte, não? Já falei que quero ler meu livro. E estou fazendo companhia à sua namorada que está tomando sol.

— Que sol, se vocês estão sob o guarda-sol? - Eu o ignorei e voltei minha atenção ao livro. - Bom, já chamamos você várias vezes. Agora não estamos chamando, vocês estão sendo intimadas a comparecerem naquele mar!

— Nossa, como ele sabe falar bonito… - Alice falou.

— Fique sabendo que eu sei usar palavras difíceis quando quero… e ser persuasivo também. - Ele agachou para ficar no mesmo nível dos meus olhos e me encarou. 

— Isso é verdade. Quer dizer, a parte da persuasão, não. - Alice colocou seus óculos de sol em formato de coração e continuou deitada sobre a canga estendida na areia embaixo da sombra do guarda-sol. 

— É, eu não entendi essa parte também. - Dei uma leve risada.

— Pode deixar que eu não vou explicar, vou te mostrar. - Dizendo isso, ele passou os braços pela minha cintura de forma tão rápida que nem sei como explicar, só que quando percebi já estava sendo carregada para o mar. 

— Augusto, o que você está fazendo? Me põe no chão agora. - ele começou a fazer cócegas na lateral da minha barriga. - Não! Para com isso… - Eu falava entre risadas incontroláveis. - Me solta!

— Seu desejo é uma ordem. - Ele me atirou na água.

Quando emergi, notei que Mateus olhava a cena toda e estava desconfortável com a situação. Éramos amigos, tanto eu e Guto como eu e Mats, até então. Não havia nada com o que se preocupar. Pelo menos era o que eu pensava até aquele momento. Mas depois dessa cena que Augusto fez comigo, Alice também se juntou a nós. Não éramos tão próximas quanto Mad ou Cora, mas não a via como “inimiga” ou coisa do tipo. A rivalidade entre mulheres nunca deveria existir. E os dois se gostavam, quem estava sobrando naquela relação inexistente, platônica por assim dizer, era eu e tinha consciência disso mesmo que fosse um processo dolorosamente lento desapegar de Augusto. 

***

Já passava das três da tarde e os sanduíches que minha mãe fez tinham ido embora há tempos. Não era de se espantar que estivéssemos morrendo de fome. Nunca fui de ficar faminta, ou nervosa se não tivesse uma alimentação regrada, então me ofereci para guardar as coisas enquanto o restante corria de volta para a casa para almoçar. Tamanha não foi minha surpresa ao notar que Mats não tinha ficado para me ajudar, mas sim Augusto estava ali, recolhendo os rastros dos sanduíches na areia e colocando dentro do lixo improvisado. 

— Não precisava ter ficado. Podia ter ido comer com os outros. - Eu falei, em tom de agradecimento 

— Não é nada. Além do mais, se fizermos juntos acabaremos mais rápido e nós dois poderemos voltar ainda em tempo de encontrar algum resquício do almoço que sua mãe fez.

— Bom, isso é verdade. Do jeito que eles saíram correndo quando minha mãe nos chamou, devia haver um buraco negro no lugar do estômago deles. - Nós dois rimos. Sentia falta desses momentos descontraídos. Recentemente tudo com ele era um sinal de alerta. Fazia tempo que eu não abaixava minha guarda com Augusto.

Recolhemos as embalagens de refrigerante, os sacos de lixo, as cadeiras e o guarda-sol. Faltava apenas uma canga na areia. Abaixei para pegá-la rapidamente pois o vento começava a soprar mais forte e ela seria levada para longe. Vi que ele também faria o mesmo, mas fui mais rápida. Queria evitar qualquer tipo de contato físico ou visual que esses momentos clichês proporcionam. Já era difícil o bastante me concentrar no Mateus enquanto ele estava ao meu redor, quem dirá depois daquela brincadeira. Era melhor prevenir do que remediar. 

Dividimos o peso das coisas e fomos em direção à casa, e apostamos corrida já perto da entrada. Quando terminamos de almoçar, minha mãe falou que tinha uma surpresa para nós. Ela ficou sabendo de um luau de Ano Novo organizado pelos outros moradores do condomínio. Nos empolgamos, claro, mas minha mãe impôs uma condição: Se deixássemos a casa toda arrumada antes de sairmos e isso incluía a cozinha com a louça do almoço. Não foi lá um grande esforço, pois a casa não estava tão bagunçada, e na cozinha fizemos uma linha de produção terminando tudo em menos de uma hora. 

Finalmente pudemos descansar um pouco antes de nos arrumarmos para a última noite do ano. Fui uma das últimas a ficar pronta, Cora conseguiu bater seu próprio recorde. Os meninos estavam praticamente iguais uns aos outros, com exceção de Mats que usava um chapéu panamá, todos estavam de bermuda branca e uma camisa estampada com alguma flor tropical e chinelos. Nós, meninas, nos produzimos um pouco mais: vestidos longos, cabelos soltos com ondas, sandálias rasteirinhas e um pouco de maquiagem. Afinal, estávamos na praia, mas ainda era reveillon. Deixamos os meninos embasbacados, o que não era muito difícil de fazer. Tão impressionáveis… 

Fomos todos para o local indicado por minha mãe. Não era difícil ver as tendas, a iluminação feita por tochas e ouvir a música de longe. É incrível o que uma iluminação e artigos de decoração não fazem. O lugar estava muito chique. Chegando mais perto, vimos uma pista de dança feita com uma espécie de deck de madeira ladeada por tochas, tocava música pop, e as pessoas dançavam sobre a plataforma meio fora do ritmo por conta da bebida. Drinks coloridos servidos em taças cristalinas, cerveja sendo posta em canecas de vidro e até os refrigerantes estavam sendo transpostos em um recipiente mais elaborado e com canudos de papel que se desmantelavam minutos depois de terminarem as bebidas. Tudo isso servido por três pessoas que ficavam atrás de uma bancada muito bem fincada na areia e que me lembrava um móvel da casa de Cora de tão elegante. 

— Não acredito que minha mãe nos deixou vir a uma festa com bebida alcóolica. 

— Ah, mas eles estão pedindo as identidades aqui. Não tem perigo de confundirmos uma cerveja com guaraná.  -  Mad falou.

Não que eu fosse beber ou algo do tipo, mas era meio estranho estar em uma festa com adultos semi-bêbados aguardando o fim do ano. Mesmo estando com meus amigos, me senti um pouco deslocada no meio daquela finesse toda. Fomos todos até o “bar” e pedimos sucos e refrigerantes. Era quase cômica a sensação de estar em uma festa badalada, com adultos e adolescentes, mas não era como vemos em filmes ou seriados de televisão. Não havia ninguém adulterando as bebidas para os menores de idade, não houve briga, nem escândalos, nada como eu pensei que seria - no bom sentido. 

Começou a tocar uma música do início dos anos 2000 e Cora logo arrastou Mad para a pista. Alice estava abraçada com Augusto conversando com a gente. Mateus falou que ia até o bar pegar mais um copo de suco de limão e se ofereceu para pegar mais se alguém quisesse. Ninguém pediu nada, então lá foi ele sozinho. Tomas aproveitou a deixa e perguntou:

— O que está rolando entre você e o Mats? - Senti meu rosto esquentar e minhas bochechas enrubescerem. Foi automático olhar para Augusto. Me odiei por fazer isso, ainda mais na frente de Alice.

— O quê? - Perguntei atônita. - Não está rolando nada entre a gente. Somos amigos, só isso. 

— Só se for pra você. Tem alguém aí que quer ser bem mais que isso, pelo visto. - Alice falou, mas não foi uma alfinetada. Eu ainda não compreendia se ela era condescendente com a minha situação com Augusto ou se ainda não havia notado.

— Com certeza ele está querendo alguma coisa. - Teo falou.

Augusto não dera um pio sobre o assunto. Parecíamos ter um acordo silencioso sobre as coisas. Eu não sabia até onde ele tinha conhecimento de meus sentimentos por ele, mas não colocaria isso à prova nem em um milhão de anos. Comecei a me sentir sufocada. Aquelas pessoas todas muito animadas e bêbadas, outros adolescentes se beijando por todos os cantos que eu via, meus amigos questionando-me sobre coisas que eu não conseguia responder. Era questão de tempo até Mateus voltar e me ver naquele estado. Só respondi que “podia ser o que eles quisessem imaginar” e pedi licença. A música alta começou a me incomodar muito, então fui caminhar na areia próximo à beira da água. 

Tirei minhas sandálias, as segurei pela fita e passei meus braços ao redor do meu corpo. A brisa fresca do mar começava a esfriar meu corpo e o vestido de alça e saia rendada não ajudava a me esquentar. Em uma espécie de ato falho olhei para trás e vi Augusto sussurrar algo para Alice e depois ela acenar com a cabeça. Mateus saiu do bar e veio direto em minha direção. Comecei a pensar no quê falar para ele. Não queria mentir, mas também não queria que ele soubesse que o motivo de eu estar assim, em plena véspera de Ano Novo, era ele em partes. Virei de volta na esperança que ele mudasse a rota e voltasse ao grupo, mas ele continuou e chegou até mim.

— O que a senhorita está fazendo sozinha aqui?

— Olhar o mar me acalma… Tem muita coisa rolando e estou com medo de não conseguir acompanhar, sabe? 

— Sei bem como é isso. Final de ensino médio, faculdade, vida de adulto… Será que seremos como eles daqui uns anos? - Ele perguntou apontando com a cabeça para a festa se referindo aos adultos bêbados.

— Se depender de mim, não. - Rimos e ele então recomeçou a falar.

— Olha… Tem uma coisa que eu preciso te perguntar. - Ele coçava a nuca, meio apreensivo. Fiz sinal para que continuasse. - Não estou tentando apressar as coisas nem nada, mas eu acho que talvez você também possa sentir isso e… Eu tenho que ser sincero com você… Já faz um tempo que eu gosto de você. - Sua expressão era esperançosa. 

Talvez aquela fosse a chance de me libertar daquele sentimento de conflito interno e finalmente superar Augusto. Afinal, quantas vezes mais eu teria a chance de alguém gostando de mim e deixar essa chance escapar por entre meus dedos como se fossem grãos da areia que estava pisando naquele momento? Olhei para Augusto, tão feliz com Alice. Talvez sentindo que eu olhava para ele, olhou de volta. 

— Eu… - Ouvi ao longe as pessoas fazendo a contagem regressiva: Dez! Nove! Oito! Sete! Seis! Cinco!...

— Isso é loucura, eu sei… - Ele falou. Parecia murcho. Ele me oferecera a rosa, agora cabia a mim deixá-la morrer ou cuidar dela para ela crescer.

— Quatro! Três! Dois! - As pessoas continuavam.

No último segundo, como de súbito, escolhi cultivar a rosa. Eu joguei meus braços ao redor do pescoço dele e o beijei.


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Notas finais do capítulo

Conte o que você achou desse capítulo.
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Até o próximo capítulo.



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