Internato Limoeiro escrita por sam561


Capítulo 40
Capítulo XXXIX - Coração aberto


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura e tem recadinho nas notas finais



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Cebola acordou e ficou deitado encarando o teto deixando a própria mente o guiar. Estava com preguiça de se levantar.

 

Seu pensamento estava longe quando pensou em Mônica, a garota que em tão pouco tempo lhe proporcionou uma de suas maiores mudanças.

 

"Mudanças…" falou alto.

 

Ainda com esse pensamento, fez uma breve comparação entre o começo do ano e o momento em que estava, não fazia tanto tempo assim, ainda era junho, mas pelos vários acontecimentos parecia ter se passado vários meses.

 

Diante disso, soltou um riso.

 

"Nossa… eu nem acredito que tanta coisa aconteceu! Quebrei minha máscara; saí e voltei pra monitoria; fiz amigos incríveis que se importam comigo…" enumerava até sentir algo estranho com as duas últimas palavras.

 

Seu olhar se voltou para o teto escuro e lembrou de seu antigo grupo. Isso o remeteu à sua promessa feita à Mônica, que nunca cumpriu: falar com Toni.

 

O moreno tateou a mesinha que ficava ao lado de sua cama e, de lá, pegou seu celular e trocou algumas mensagens antes de se levantar e ir se arrumar.

 

                                        *

Distante dali, Toni estava no shopping, havia acabado de sair de uma sessão de terapia e esperava Gabriela, por algum motivo aquele era o único horário livre da moça.

 

Assim que ela chegou, ele sorriu. Eles não se falavam desde a comemoração de sexta-feira.

 

"Oi!" ele a cumprimentou com um beijo na bochecha e ela sorriu.

 

"E ai? Eu achei que você estaria com cara de morto! 'Tá cedo." Gabriela disse olhando as horas, dez e quinze da manhã.

 

"Eu acordo mais cedo que isso todos os dias! Eu sei que a gente tinha combinado de sair hoje, mas fui intimado pra uma espécie de reunião pra daqui uns trinta minutos, desculpe!" Toni falou.

 

"Ah, relaxa! Eu entendo!" ela disse com um sorriso.

 

"Mas como eu não sou um bom menino… posso atrasar um pouco." ele disse piscando um olho.

 

"Nossa, que malvado. Já que você 'tá requisitado, vamos tomar um café. A praça de alimentação daqui tem uma cafeteria ótima que já abriu." ela disse e o rapaz assentiu.

 

O caminho foi silencioso, eles não sabiam ao certo como lidar um com o outro. Ao pedirem seus cafés e se sentarem, ficaram em silêncio por alguns segundos.

 

"E ai? Acordou cedo só porque eu pedi?" a moça quebrou o silêncio após um gole em seu café.

 

"Não, eu fui pra psicóloga hoje." respondeu.

 

A loira olhou surpresa.

 

"No feriado?" perguntou e ele assentiu.

 

"Ela foi generosa. Cobrou a mais? Cobrou a mais! Mas foi bom falar frente a frente." ele explicou e a moça sorriu.

 

"Muito bom pra você. E seu pai? Por que ele te buscou tão cedo na sexta?" a loira perguntou.

 

Toni riu.

 

"Ele disse que só os gritos do meu avô eram meio cansativos. Em outras palavras, 'tava com saudades de mim." respondeu e ela sorriu.

 

"E você 'tava com saudades dele?" perguntou e o rapaz deu de ombros.

 

"Sei lá, eu 'tô acostumado a ficar direto no IL. Mas e você? Não me diga que só 'tava livre agora porque vai passar o dia estudando?!" ele perguntou e ela riu.

 

"É tentador, mas decidi descansar um pouco. Sugeri aos meus pais que fossemos à praia! Aquela que fomos com a escola. E eles adoraram a ideia! Mas temos que ir cedo porque vai estar lotado." respondeu.

 

Toni riu divertido.

 

"Sinto quebrar suas expectativas, mas seu cedo já 'tá tarde. A essa hora, num feriado, já deve estar cheio." comentou.

 

"Confesso que não colaborei muito! Eu sugeri hoje!" ela revelou.

 

O loiro levantou os braços.

 

"Pô, mas aí você complicou pra eles! Aposto que eles só aceitaram porque viram que você queria sair dos livros um pouco." o rapaz supôs e ela riu.

 

"Foi exatamente isso que aconteceu. Eu 'tava pensando em levar um livro pra fazer algumas atividades de vestibular, o que acha?" comentou e ele negou com a cabeça.

 

"Cê toma jeito, Gabriela! É pra descansar!" ele exclamou e a loira riu mais.

 

A moça o olhou por alguns segundos enquanto ele bebia seu café.

 

"Toni, na sexta depois do meu jogo, eu te beijei..." começou e ele riu.

 

"Algo me diz que sei disso." Toni falou e ela o olhou feio.

 

"Corrigindo, como você sabe, a gente se beijou e… eu queria saber… o que você achou?" a moça perguntou.

 

Toni a encarou.

 

"Por que você 'tá me perguntando isso?" perguntou.

 

"Curiosidade." a loira respondeu.

 

"Curiosidade ou receio de eu não ter gostado?" o rapaz questionou e ela riu.

 

"Você 'tá se achando demais, Toni." ela disse e ele riu antes de tocar no queixo da moça com ternura.

 

"Gabriela, os melhores beijos são aqueles em que você não se preocupa com essas coisas, só deixa rolar. E aquele foi assim, você se jogou em mim e me beijou! E foi ótimo! Mas confesso que me surpreendi ao ver que uma pessoa que fica tanto tempo estudando consegue beijar tão bem." ele disse olhando para a moça que riu.

 

"Eu também fiquei surpresa, achei que levaria uma bicada, já que você é um galinha." ela zombou e o loiro não evitou um riso.

 

"Você 'tá colocando as asinhas pra fora e eu que sou galinha?" rebateu e ela lambeu os lábios olhando os dele.

 

"Não é só galinha que tem asa, Toni." a moça comentou e ele riu.

 

"Me beija logo, Gabriela!" Toni exclamou e ela sorriu antes de juntar seus lábios aos dele, que tinham um gosto de café.

 

O beijo não durou muito já que o celular da moça tocou.

 

"Eu tenho que ir!" ela exclamou enquanto colocava sua bolsa no ombro.

 

"Aproveite a praia e nada de ficar calculando comprimento de onda!" ele disse e ela riu.

 

"Boa reunião pra você. Tchau, Toni." despediu-se e saiu.

 

Toni sorriu para si mesmo e olhou as horas, estava atrasado pra seu compromisso.

 

                                          *

Após um tempo, Cebola chegou ao ponto de encontro, uma padaria, e se sentou em uma mesa de quatro lugares. Após alguns minutos, uma primeira pessoa das que havia enviado mensagem chegou.

 

"Acho bom que realmente seja urgente! Eu morro longe daqui!" Penha disse se sentando.

 

"É urgente, mas vamos esperar os outros, eles precisam ouvir também." ele disse e ela deu de ombros enquanto desbloqueava seu celular.

 

Cebola observou a ex digitar e, julgando pelo sorriso que ela esboçava, imaginou ser Nikolas. Fazia um tempo que os dois não se falavam ou ficavam sozinhos um com o outro.

 

"Ér… eu divido dormitório com o Nikolas! E mesmo assim quase nunca vejo ele! É até engraçado!" tentou puxar conversa e ela o olhou.

 

"Mas até que ele é gente boa, sabe?" continuou e a morena riu.

 

"Sei, eu namorro com ele. De verdade e sem interresses de popularridade por trás." a moça respondeu e ele assentiu com um riso.

 

"O que fez você dar moral pra um cara que vive escondido na biblioteca? Você sempre fez o estilo amostrada." Cebola perguntou e ela riu.

 

"Por que quer saber?" Penha perguntou e ele deu de ombros.

 

"Curiosidade." o rapaz respondeu.

 

Penha se reclinou na cadeira.

 

"Nik sempre foi uma pessoa incrível comigo, e isso chama a atenção. Então dirria que foi o contrárrio, ele que me deu morral." explicou com um sorriso.

 

"É bom ver que você 'tá feliz nesse seu namoro de verdade." Cebola falou sincero e ela assentiu.

 

"Digo o mesmo." ela comentou.

 

Antes que falassem mais alguma coisa, Denise e Toni apareceram.

 

"Acho bom que seja realmente urgente." o loiro disse e Denise concordou.

 

Cebola respirou fundo e apareceu um funcionário trazendo consigo um cardápio. Toni foi o único que não pediu algo.

 

"Esses dias Mônica me lembrou do combinado do nosso antigo grupo de um cuidar do outro, mas depois do exposed, ninguém sequer falou com ninguém. Então devemos desculpas uns aos outros." Cebola falou e Toni riu.

 

"O primeiro a dizer que esse grupo era uma merda é o mesmo que só veio se desculpar porque a namorada disse que precisava. Patético, Cebola." comentou.

 

"Patético é justo você, a pessoa que mais ficou sozinha, estar debochando!" o outro rebateu.

 

"Justamente por isso ele pode debochar o quanto quiser. Todo mundo podia ver que Toni 'tava sozinho e ninguém foi falar com ele, inclusive você!" Denise disse vendo os pedidos chegarem e o funcionário logo sair.

 

"E você por acaso foi? Não foi! Então não pode me julgar!" Cebola retrucou.

 

"Eu não 'tô te julgando, Cebola! Só 'tô dizendo que você era muito mais próximo dele! Era quem mais fazia sentido ir atrás!" a ruiva rebateu.

 

"Por que vocês 'tão brigando por uma coisa que eu nem me importo mais? Todo mundo seguiu em frente! A gente nem era amigo de verdade, nem precisava dessa reunião." Toni falou.

 

"Você ainda não entendeu que eu 'tô tentando me redimir?" Cebola questionou.

 

Penha bufou.

 

"Ai, gente! Que briga mais ridícula! Cebola, seja sincerro, você quis reunir a gente só pra agradar a Mônica, né?" ela disse.

 

"Não! Eu quis reunir porque eu realmente quero resolver as coisas entre nosso antigo grupo! Mesmo não sendo realmente amigos, a gente passou por vários momentos juntos!" exclamou.

 

"É realmente por isso? Porque você já começou dizendo que Mônica te disse o que fazer! Uma coisa é ela te fazer pensar e você chegar a essa decisão, outra é ela falar e você só obedecer." Penha começou.

 

"Forra que você falou que quer se redimir, mas por que exatamente?" concluiu com uma pergunta.

 

"A resposta é óbvia, Penha!" ele respondeu e ela cruzou os braços.

 

"Se é tão óbvia, qual que é?" rebateu e ele tremeu a boca.

 

"Ér… porque… ah, 'cê sabe, porque é o certo a se fazer." o moreno respondeu.

 

"Essa é a pior resposta que eu já ouvi! E olha que há muito tempo venho ouvindo muita coisa." Toni comentou.

 

"Mas que porra! Eu eu só quero que vocês percebam que no momento que mais precisamos, ninguém se apoiou mesmo tendo um combinado sobre isso!" Cebola exclamou zangado.

 

"Caramba, será que eu preciso desenhar, Cebola? Todo mundo ligou o foda-se porque ninguém se importava com ninguém! No máximo a Sofia, e você nem se deu o trabalho de convidar ela pra essa reuniãozinha tosca!" Toni exclamou.

 

"É mesmo, se você 'tá todo arrependido, por que não chamou ela?" Penha perguntou.

 

"Pra que eu chamaria a Sofia? Ela foi a primeira a pular fora! Foi muito antes do exposed!" Cebola respondeu estralando os dedos ao fim.

 

"E por que mesmo que ela saiu? Porque ela era tratada feito lixo! Principalmente por você e pelo Toni! E você ao menos pediu desculpas, Cebola?" Denise questionou e ele abriu e fechou a boca.

 

"Tirando você, aposto que ninguém mais pediu! 'Tá bom que Penha mudou da água pro vinho, mas mesmo assim ela e Toni não fazem o estilo de quem pede desculpas. Você eu sei que pediu pra todo mundo que prejudicou, deles eu não ouvi falar nada." respondeu.

 

"Perra lá! Todo mundo tinha que se desculpar do mesmo jeito? Eu me desculpei com quem eu vi que não serria perda de tempo! Mas, além disso, eu procurrei mudar minhas atitudes! É bem melhor que palavras vazias! E outra, eu me desculpei sim com a Sofia! Posso até não andar com ela, mas nós tivemos uma conversa!" Penha exclamou.

 

"E eu, que sou esse lixo que você pensa, também pedi desculpas a ela! Não só pra ela, pra todos que achei necessário. Recebi muito xingamento em troca, mas mesmo assim estou me esforçando pra melhorar." Toni falou.

 

Cebola abriu a boca surpreso.

 

"Ah, eu não sabia disso. Olha, eu sei que nunca fomos amigos de verdade, mas vocês também foram importantes nessa minha mudança, foram o parâmetro do tipo de pessoa eu não queria ser."  falou.

 

O loiro bufou.

 

"Cebola, de coração, coloca na sua listinha de 'coisas a mudar' um tópico dizendo: parar de jogar a culpa de minhas ações nos outros. Cara, você fala como se alguém tivesse te forçado a agir como agia!" exclamou.

 

"Toni tem razão, você nunca foi um santo!" Penha falou apontando para ele.

 

"Eu não 'tô culpando vocês! Mas era uma atmosfera ruim!" Cebola se defendeu.

 

"Ah, nhem nhem nhem atmosfera ruim. Vai se foder! Você, eu, o Toni e a Penha sabíamos muito bem que era errado o que a gente fazia! Mas a gente ignorava isso e continuava! E ninguém nunca deu um soco na sua cara te obrigando a fazer nada! Então só para de agir como se a gente fosse vilão e você um garotinho inocente sendo que você sabe muito bem que não foi isso que aconteceu, Cebola! Assume pelo menos uma vez na vida!" Denise disse alto apontando o dedo no rosto dele.

 

"E acho difícil a Mônica nunca ter te dito isso." Penha falou.

 

Cebola respirou fundo e ia dizer algo quando uma funcionária foi até eles.

 

"Lamento, gente, mas vou ter que pedir que vocês se retirem! Vocês 'tão discutindo muito alto e isso 'tá incomodando os demais clientes." ela disse e eles olharam em volta, muitas pessoas os encaravam.

 

Os quatro saíram após a conta ser paga.

 

"Expulsa da padarria. Nunca imaginei que isso acontecerria." Penha comentou.

 

"Incomodando os outros clientes... Aposto que eles estavam gostando da treta! Deu pra ver no olhar!" Denise disse fazendo os demais rirem.

 

Cebola respirou fundo, tudo que foi dito lá dentro havia sido absorvido por ele. Por mais que os amigos já tivessem lhe dito sobre ele sempre culpar seu antigo grupo, era completamente diferente ouvir dos ex membros.

 

"Vocês têm razão! Eu preciso assumir que eu fiz o que fiz sabendo o que 'tava fazendo. Mas com o apoio de vocês, eu continuava mais ainda."  falou de repente enquanto andavam.

 

"Sim, ninguém nunca disse que não tinha incentivo, só que você sabia o que 'tava fazendo! A culpa não é só nossa, como você fala!" Penha disse.

 

"Você tem razão numa coisa, Cebola: tivemos vários momentos de apoio mútuo, não na coisa certa. Me disseram uma vez que eu 'tô em uma metamorfose, acho que vocês também 'tão. Não ligo se isso que vou dizer vai parecer forçado, inútil ou falso, mas… vocês têm meu apoio nessa mudança! Tenho que ir agora, falou pra vocês." Toni disse antes de sair rapidamente.

 

"Eu concordo com o Toni e também vou emborra. Meu ônibus passa daqui a pouco. Tenham um bom ferriado." Penha disse também saindo rápido.

 

Denise não disse nada, apenas continuou andando na direção oposta à de Cebola que, por sua vez, sorriu. O antigo grupo havia ficado no passado, assim como vários pensamentos.

 

                                                                                  *

Um pouco  distante dali, Milena estava sentada no jardim com seu cachorro em seu colo. Estar em casa sempre a deixava cansada, principalmente por saber que em algum momento ouviria alguma novidade sobre os irmãos. 

 

Porém, daquela vez era diferente. Enquanto trocava mensagens com Tikara lembrou do dia em que ele a aconselhou a falar com seus pais sobre as comparações. Ele não havia sido único a recomendar isso, mas fora o único que a viu desabar por conta disso.

 

Confiante, Milena levantou do gramado e foi direto para a sala, onde os pais assistiam televisão.

 

"Mãe, pai, sei que vai parecer estranho, mas… eu quero ter uma conversa importante com vocês." ela falou séria.

 

Os dois se entreolharam.

 

"Não me diga que você 'tá grávida, Milena?!" o pai falou e ela arregalou os olhos.

 

"O quê? Não! Eu estudo em um internato, nem tem como isso acontecer!" falou ignorando o que viu em seu dormitório na noite do interescolar.

 

"Enfim, a questão não é essa! Eu… eu quero falar sobre mim!" falou e eles pareciam não entender.

 

"Aonde quer chegar, minha filha? Isso 'tá estranho." a mãe comentou.

 

Milena colocou os cabelos para trás e respirou fundo enquanto se sentava no outro sofá.

 

"É que nunca falamos sobre mim sem que meus irmãos ganhassem destaque. Não sei se perceberam, mas o tempo todo eu sou comparada a eles!" começou.

 

"Sempre que EU faço alguma coisa, em vez de falarmos sobre o que EU fiz, falam do que meus irmãos superdotados 'tão fazendo de um jeito que faz parecer que sempre são melhores que eu em tudo que eu faça." continuou.

 

"Eu não tenho inveja do sucesso deles, muito pelo contrário, eu fico muito feliz. Mas dói sempre ser comparada! Dói sentir que nunca de fato se importam com minhas vitórias! E guardar tudo isso pra mim… também 'tava doendo." finalizou.

 

Os pais tinham a feição incrédula e um grande sentimento de culpa. Mesmo que pudessem concluir que a adolescente queria apenas chamar a atenção deles ou que era apenas uma das famosas fases, como sempre ouviam por aí, eles perceberam que era algo maior e mais sério.

 

Naquele momento, um fato fez tanto sentido na cabeça dos dois que chegaram a sentir os ombros pesarem: Milena não ficava no internato aos fins de semana só para estudar, ela também ficava para fugir do desconforto que sentia ao estar com a própria família. Ela fugia deles.

 

"Milena… a gente nunca se tocou que fazia tantas comparações, por que nunca nos disse como se sentia?" a mãe perguntou indo se sentar com ela.

 

Milena deu de ombros e não disse nada. O pai também se aproximou.

 

"Nós te devemos desculpas, minha filha! A gente fala deles porque nos orgulhamos, mas isso não significa que nos orgulhamos menos de você! Olha todas as suas vitórias e suas lutas pra alcançá-las! Nós temos milhares de motivos pra estarmos felizes com isso e erramos em não demonstrar da mesma maneira que fazemos com seus irmãos!" ele disse e Milena assentiu enquanto passava as mãos nos olhos úmidos, não queria chorar.

 

"Milena, nós erramos em te deixar nessa situação. Não consigo nem imaginar tudo que você sentiu e guardou pra você mesma! Você sempre se mostrou forte e independente, seus velhos aqui precisam de um toque pra perceberem que estão agindo mal. Você é nossa filhinha, e queremos que você fique bem!" a mãe falou e Milena sentiu os olhos marejarem mais e soltou um soluço.

 

"Essa conversa é muito ruim!" comentou com um riso ainda limpando as lágrimas que insistiam em cair.

 

"Não, é necessária! Vamos fazer assim, nós dois prometemos que vamos parar com essas comparações entre as histórias de vocês e vamos nos policiar! Já a senhora, dona Milena, pode tentar se abrir um pouco mais! Sei que é difícil, mas às vezes faz bem você falar." a mãe disse enquanto afagava os cachos da filha, assim como o pai.

 

Milena sorriu ainda com os olhos marejados. Por mais que fosse só um início de mudança, saber que seus pais a ouviram e estavam dispostos a mudar fazia com que uma chama de esperança esquentasse seu peito.

 

"Temos um acordo! Lá no IL acordos são levados muito a sério, então vamos continuar nessa vibe." falou e eles riram.

 

"Essa conversa devia ter acontecido há muito tempo, mas nunca é tarde! Por que você não nos fala um pouco mais sobre como é esse lugar que você tanto fica?" o pai perguntou e várias coisas vieram a sua cabeça, seria uma conversa interessante.

 

                                                                   *

Um pouco longe dali, Do Contra assistia televisão quando Nimbus apareceu na sala. O irmão o achou calmo tendo vista de onde ele iria dali umas horas, então decidiu irritá-lo.

 

"Tá calmo, hein, DC?! Nem um pouco nervoso pra hoje?" perguntou e o irmão deu de ombros

 

"Não, a Ramona vai estar lá." respondeu simples.

 

"Quem é Ramona?" a voz da mãe soou da cozinha.

 

Nimbus sorriu abertamente.

 

"A namorada do DC, que ele vai conhecer os pais hoje." respondeu e o irmão arregalou os olhos.

 

"Isso é por irritar o Xaveco chamando ele de cunhadinho." o mais velho falou baixo.

 

"E ele não é, caralho?" Do Contra rebateu.

 

"Não oficialmente." o outro respondeu.

 

A mãe apareceu com uma xícara de café em mãos.

 

"Namorada? Você tem namorada, meu filho? E já vai conhecer os pais dela?!" ela perguntou.

 

Do Contra suspirou.

 

"É recente, mas por culpa do Nimbus a mãe dela descobriu e quer me conhecer." respondeu fuzilando o irmão, que ria.

 

"Eu quero conhecer ela também! Traz ela aqui hoje!" a mãe disse animada.

 

"Hoje não dá! Conhecer duas famílias no mesmo dia não dá certo. Outro dia eu trago ela e vocês se conhecem. Prometo!" exclamou e a mãe assentiu.

 

"Tudo bem, mas eu vou cobrar!" ela disse deixando a sala em seguida.

 

Do Contra socou o braço do irmão com força.

 

"Olha o que você fez, linguarudo do cacete! Você tem sorte que não sou rancoroso, Nimbus! Porque senão eu falava que sua vida amorosa anda agitada!" falou baixo.

 

Nimbus olhou para o corredor antes de encarar o irmão.

 

"Você sabe que minha situação é muito diferente da sua!" exclamou.

 

"Justamente por isso que não vou falar e em respeito àquela pessoa." falou e a mãe retornou.

 

"Meu filho, você vai pôr uma roupa decente, né?" ela perguntou.

 

"Eu 'tava pensando em usar uma camiseta preta com calça jeans e coturno, o que a senhora acha?" Do Contra falou cínico e ela bufou.

 

"Maurício, você 'tá indo conhecer a família da sua namorada! Tem que causar boa impressão!" a mãe exclamou séria.

 

"Mãe, a Ramona sabe que esse é meu estilo." argumentou.

 

"Mas os pais dela não! E esse seu esmalte aí… ou arruma ou tira! Todo descascado desse jeito 'tá feio!" ela exclamou e saiu em seguida.

 

Do Contra bufou e encarou o risonho irmão.

 

"Como eu te odeio!" exclamou.

 

"Ah, DC, é uma boa você usar outra roupa às vezes. Ramoninha já deve ter cansado de te ver sempre do mesmo jeito." comentou.

 

"Aquela pessoa já deve ter cansado de ver sua cara e nem por isso 'tô dizendo pra você fazer uma plástica." o mais novo rebateu e o outro riu e viu a tela do celular acender, havia chegado uma mensagem.

 

"Há! Enjoou da minha cara, você disse. Parece que não! Mãe, vou dar uma saidinha." Nimbus falou antes de ir se arrumar.

 

Do Contra suspirou e olhou para suas próprias unhas, de fato estavam muito descascadas.

 

                                          *

Xaveco estava sentado em uma mesa que ficava do lado de fora de uma lanchonete esperando Nimbus. O loiro estava nervoso, não pelo encontro e sim pelo que queria falar.

 

Não demorou para o moreno chegar e se sentar de frente para ele.

 

"Oi!" cumprimentou com um sorriso.

 

"E ai! Chegou rápido!" o loiro comentou.

 

"Não queria te deixar esperando." Nimbus falou piscando um olho e o outro riu.

 

"Parece animado hoje." observou.

 

"Ah, eu 'tava enchendo o saco do DC. Ramona vai conhecer nossos pais em breve e ele os dela hoje." revelou e viu uma garçonete chegar com dois sucos de maçã.

 

"Já?! Nossa, como eles são apressados!" o loiro comentou e Nimbus riu.

 

"Digamos que sem querer eu adiantei com os pais da Ramona. O contrário foi de propósito, assim meu irmão para de te incomodar te chamando de cunhadinho." falou e o outro riu.

 

"Você é mau, Nimbus. Mas… não me incomoda tanto assim ser chamado de cunhadinho, só quando tem mais gente junto. Te incomoda?" perguntou e o moreno negou.

 

"Não, nem um pouco. Quem sofre mais é a Ramona, o cunhado é mais bonito que o namorado." brincou e o loiro riu sentindo o clima ficar mais leve.

 

"É mesmo." ressaltou.

 

"Consegui tirar um sorriso! Você parecia tenso." Nimbus comentou e o loiro passou as mãos nos cabelos.

 

"É que… eu queria sua opinião em uma coisa." falou e o outro assentiu.

 

"Pode falar." incentivou dando um gole em seu suco.

 

Xaveco soltou o ar pela boca.

 

"Eu 'tava pensando em dizer pro Nik e pro Tika que eu sou gay. Mas eu 'tô com um pouco de medo." falou e o outro franziu o cenho.

 

"Medo? Você acha que eles não vão te aceitar?" o moreno perguntou.

 

"É! Eles são tipo meus irmãos e quero ser sincero com eles! Mas… não sei se saberia lidar com uma possível falta de aceitação!" Xaveco desabafou.

 

Nimbus pegou na mão de Xaveco, que olhou surpreso. Por mais que eles já tivessem trocado vários toques, aquele, com ternura e nenhuma sutileza, nunca havia acontecido em público.

 

"Xaveco, eu entendo esse seu receio.  É impossível saber qual vai ser a reação da pessoa, mas se eles realmente gostam de você, eles vão prezar pela sua felicidade. E se você é feliz com outro cara, não tem motivo pra eles ficarem contra. E se ficarem, talvez não sejam de fato amigos." falou calmo.

 

"Esse é meu medo, Nim. Não seria nem tanto por perder a amizade com alguém que não te aceita, e sim uma decepção por ser justo eles." confessou e Nimbus assentiu.

 

"Sei do que você 'tá falando. Mas eu acho que eles vão te aceitar, são pessoas boas, a gente percebe isso. Mas, se estivermos enganados, pode contar comigo pra qualquer coisa." concluiu e o loiro sorriu.

 

"Obrigado! E… é a primeira vez que você segura na minha mão em público sem, sabe, parecer que não 'tá segurando. 'Tá perdendo a vergonha?" brincou ao fim e Nimbus riu.

 

"Eu nunca tive vergonha, e sim receio do que podem fazer." esclareceu e o outro tombou a cabeça.

 

"Como assim?" perguntou e Nimbus respirou fundo passando as mãos nos cabelos.

 

"Sabe, Xavier, relacionamentos gays têm tanto amor quanto um relacionamento hétero, ou até mais. Mas muita gente não vê isso, muito pelo contrário, veem como se fosse uma aberração, uma safadeza ou sei lá o quê." começou.

 

"Eu nunca te disse, mas eu já tive um namorado. Uma vez a gente saiu e demos as mãos, como qualquer outro casal. Foi aí que um grupinho veio pra cima da gente e começou a nos xingar e um deles conseguiu dar um soco nele. A gente conseguiu fugir, mas com um sentimento péssimo de impotência." confessou e o outro olhava surpreso.

 

"Ele era assumidamente gay pra família e eles decidiram se mudar. A gente terminou e eu não consegui me envolver com ninguém até você aparecer." Nimbus continuou e o cacheado sorriu fraco.

 

"Eu superei ele há muito tempo, mas aquela dor que ele sentiu, eu não quero que você sinta. Por isso eu tento ser sutil ao máximo, por isso eu falei sobre não pular etapas aquele dia." revelou e muita coisa fez sentido na cabeça do loiro.

 

Nimbus, de repente, sorriu abertamente.

 

"Mas tem um porém: você me faz querer pular todas essas etapas e querer curtir o momento ao máximo sem me importar com nada nem ninguém. O que você fez comigo, Xavier?" perguntou e o loiro sorriu.

 

"Eu não fiz nada, só roubei seu coração. Mas ladrão que rouba ladrão…" brincou e o outro levantou a sobrancelha.

 

"E por que eu sou ladrão?" Nimbus perguntou.

 

"Roubar o coração alheio não é crime, senhor Mauro?" Xaveco perguntou e o outro negou.

 

"Nem sempre." respondeu.

 

Foi a vez de Xaveco tocar a mão de Nimbus, mas quis ser sutil em respeito ao que o moreno acabara de dizer.

 

"Eu sinto muito pelo que aconteceu com você e aquele cara. Ninguém deveria passar por isso! Mas fico feliz que agora você está bem!" falou e o outro assentiu com um sorriso.

 

"Posso te garantir! E tem dedo seu nisso. Mas mudando de foco, você vai falar pros seus amigos?" perguntou e o loiro sorriu amarelo.

 

"Eu só queria uma opinião mesmo, eu já ia falar! Hoje, inclusive!" revelou e o outro arregalou os olhos.

 

"Hoje? Xavier… você é bem apressadinho!" exclamou e ele riu.

 

"Não é de hoje que eu 'tô pensando nisso. E eu 'tô decidido!" o loiro exclamou e o outro assentiu.

 

"Boa sorte." Nimbus disse levantando o copo e os dois brindaram.

                                            *

As horas pareceram voar, era cerca  de quatro da tarde quando Ramona sorriu para Do Contra assim que abriu o portão. Ele havia sido convidado para um lanche da tarde.

 

"Oi! 'Tá diferente hoje! Espero que não esteja com expectativas, porque seria decepcionante." ela disse e ele sorriu antes de dar um selinho nela. Ele usava uma camisa azul, calça jeans e all star preto.

 

"Minha mãe me obrigou a usar algo mais bonitinho. Só por curiosidade, quantas pessoas eu vou ter que cumprimentar?" ele perguntou.

 

"Não é seu dia de seu sorte. Além da minha mãe, o marido dela e o meu pai, tem duas pessoas que você meio que conhece." a moça respondeu.

 

"A sua prima e sua avó? Ah, não. E eu achando que seria só sua mãe!" comentou.

 

"O mundo é engraçado, parece que eu ter um namorado anima as pessoas. Meu pai veio da Amazônia especialmente pra te conhecer." a ruiva revelou.

 

"Eu tenho que me sentir honrado ou amedrontado?" o moreno perguntou e ela deu de ombros.

 

"Não sei, vamos descobrir isso agora. Mas temos que ver como vamos nos vingar do Nimbus." ela disse e ele riu.

 

"Vamos pensar numa ótima vingança!" ele disse entrando ao lado dela.

 

Ao chegar na cozinha, Do Contra sentiu ser encarado, mas, ficou normal.

 

"Esse é Maurício, meu namorado. Mas ele gosta de ser chamado de Do Contra." Ramona apresentou.

 

Antes que ele dissesse alguma coisa, foi abraçado por uma mulher de cabelos negros e curtos.

 

"É um prazer te conhecer! Sou Viviane! Sua sogra!" ela disse animada.

 

"É um prazer, dona Viviane." o rapaz disse.

 

"Só Viviane!" ela pediu.

 

Do Contra se virou para um homem ruivo e alto que tinha o olhar sério.

 

"Olá, rapaz! Sou Ramon! Pai da Ramona!" ele se apresentou apertando a mão do rapaz com força.

 

"É um prazer, senhor Ramon. Vejo que tivemos uma homenagem." ele comentou abanando a mão após ser solta.

 

"Só porque nasceu ruiva! Se fosse com o cabelo preto, seria algum nome de bruxa, como Viviane gosta." Ramon comentou risonho.

 

"Eu já te disse que não existe isso de nome de bruxa! E outra, sua mãe se chama Glória, e sempre foi uma bruxa de desenho animado, dessas caricatas." Viviane alfinetou.

 

"Viviane… não me testa!" a avó de Ramona falou e o rapaz revirou os olhos só de ouvir a voz dela.

 

"Sou Carlo, marido da Viviane e professor de geografia." um homem negro e careca se apresentou.

 

"Sou Glória, mãe do Ramon." a avó falou e DC forçou um sorriso, sem cumprimentá-la formalmente.

 

"Sou Amanda, prima da Caipora." a ruiva de cabelos longos disse e ele levantou a sobrancelha.

 

"Mesmo? E como mesmo a gente invoca a Caipora? Você que é prima dela deve saber." o rapaz perguntou irônico.

 

Amanda riu.

 

"Bobinho, Caipora é a Ramona." explicou.

 

"Ah, eu não sabia. Até porque chamo ela pelo nome: Ramona. Devia tentar." ele disse e Amanda o encarou surpresa e sem graça.

 

"Vamos comer! Estamos famintos!" Viviane falou e eles se ajeitaram na mesa.

 

Do Contra se sentou enquanto Ramona ajudava a mãe a arrumar a mesa. Não tão longe de si, estavam Amanda e a avó e era possível ouvir a conversa.

 

"Esse garoto é estranho, você viu aquela coisa na orelha? E a unha pintada? Que horror!"  a mais velha exclamou.

 

"É alargador, vó. E nem é tão grande. Mas sabe o que me surpreende? Ele é bonito! O que ele viu na Ramona?" a outra falou com desdém.

 

Do Contra respirou fundo e decidiu ignorar o que ouviu, não queria estragar o momento.

 

"Sei que vocês se conheceram no internato, mas como foi?" Viviane perguntou.

 

"Durante um trote de boas vindas. A gente se falou, nos tornamos amigos e aqui estamos." ele respondeu olhando para a namorada.

 

"Deve ter deixado muita menina triste." Amanda comentou.

 

"Eu duvido, metade da escola me acha estranho." o moreno respondeu.

 

"E a outra metade?" Ramon perguntou.

 

"Um bom baterista que joga xadrez muito bem!" Do Contra respondeu.

 

"Nunca ouvi ninguém dizendo isso." Ramona revelou.

 

"Mas também nunca ouviu não falarem!" ele disse piscando um olho e um apontou o dedo para o outro enquanto riam.

 

Viviane e Ramon riram enquanto os demais franziram o cenho.

 

"Concordo com a primeira metade! Esse menino é estranho!" a mais velha disse alto, para que eles ouvissem.

 

"Que bom que a senhora se identificou com IL, vó! Pensando no que a senhora disse naquele dia que visitou…" Ramona comentou e a mais velha estreitou os olhos, não se lembrava.

 

"A senhora gostou do IL, mãe? Tinha me dito que o lugar mexia com a cabeça da Ramona." o pai lembrou.

 

A mais velha ainda não lembrava o que falara, mas Amanda sim.

 

"Ramona, você não tem vergonha na cara, não?" perguntou séria.

 

"O que foi, Amanda? Ramona nem disse nada!" Viviane exclamou.

 

"Minha vó disse que aquele lugar era horrível! Logo, Ramona disse que ela é horrível." Amanda explicou.

 

Do Contra segurou o riso e Ramona revirou os olhos para a prima.

 

"Eu não disse isso! Eu quis dizer que mesmo ela tendo achado horrível, ela se identificou com alguma coisa. Você 'tá pondo palavras na minha boca, Amanda." explicou-se.

 

"E convenhamos, se tivesse dito que Glória é horrível, ela não estaria errada!" Viviane comentou pegando um pãozinho.

 

Glória ameaçou levantar quando Ramon interferiu.

 

"Gente! Tem visita na casa, vamos ao menos parecer normais!" ele pediu.

 

Ramona teve uma ideia.

 

"E se a gente fosse pro jardim? A essa hora dá pra fazer uma fotossíntese boa!" ela disse olhando para o namorado que sorriu.

 

"Como parecer normal quando a própria anfitriã não colabora?" Amanda comentou.

 

"Nesse caso, é uma piada interna nossa. Gostamos de tomar sol juntos." Do Contra explicou. 

 

"Ah, que fofo!" Viviane disse sorridente.

 

Amanda levantou.

 

"Vamos embora, vó. Isso me deu enjoo." ela disse.

 

"Cuidado, enjoo assim de repente pode ser gravidez." a morena falou venenosa.

 

Glória fez menção de avançar em Viviane, mas apenas deu o braço à neta.

 

"Abusada! Nos acompanhe até porta, meu filho. E garoto, eu achava que Ramona era esquisita até conhecer você." falou séria saindo e ele olhou surpreso enquanto ela se afastava.

 

"Nossa! Acho que nunca me chamaram de esquisito com tanta convicção." comentou rindo.

 

"Ignora ela! Essa velha não bate bem!" a sogra disse.

 

"Vejo que Ramona ficou até mais feliz com a saída dela." o padrasto de Ramona comentou.

 

"Ela parece mais feliz por outro motivo, amor. Vocês fazem fotossíntese, né? Então mostra seu tão amado jardim pra ele, Ramona." Viviane falou.

 

"É uma ótima ideia! Vamos lá." Ramona disse e saiu da cozinha com Do Contra.

 

Ramon apareceu olhando às horas.

 

"Por que você faz essas coisas, Viviane? Provocando minha mãe na frente do namorado da nossa filha! Olha a vergonha!" comentou.

 

"Ela claramente tem problemas com a Ramona, só você não vê! E outra, Ramona confia no garoto." ela respondeu.

 

"Esse que é o problema. Eu tenho que ir, mas antes, vou falar com ele." disse e a ex negou com a cabeça.

 

O jardim de Ramona possuía uma variedade de plantas que surpreendeu Do Contra. Ela parecia gostar bastante do lugar.

 

"Seus pais não sabem sobre sua treta com aquelas duas, né?" ele perguntou.

 

"Não. Preferi não falar." a moça respondeu.

 

"Sem querer ser intrometido, mas… por que elas não gostam de você?" perguntou e ela riu.

 

"Minha vó odeia minha mãe e isso se estendeu a mim. Fora que ela acha que sou muito sem personalidade, diferente da Amanda. E a Amanda… eu não sei por que não gosta de mim." respondeu observando uma samambaia.

 

"E não tem curiosidade?" perguntou e ela deu de ombros.

 

"Não, pelo menos não mais. Quero me poupar de estresse, sabe? Mas e ai? O que achou dos meus pais?" perguntou.

 

"Seus pais são legais. Gostam de discutir, mas são legais." o rapaz opinou e ela riu.

 

"Eles nunca vão parar de brigar, mas não se odeiam." ela disse e o rapaz viu uma cabeleira ruiva se aproximar. Era o pai de Ramona.

 

"Ramona, minha filha, eu preciso ir. Foi ótimo te ver! E rapaz… quero falar com você!" exclamou e o moreno assentiu antes de se afastar com o outro.

 

"Eu não faço o estilo amedrontador, mas se você magoar minha filha, eu saio de onde estiver e vamos ter conversa muito séria!" o mais velho exclamou e o outro assentiu.

 

"Sim, senhor. Mas não se preocupe, não pretendo magoar ela." Do Contra falou e o outro riu. 

 

"Todos dizem isso até magoarem! Eu já fiz isso!" falou.

 

"Senhor Ramon, eu sei que o senhor se preocupa com ela, mas dou minha palavra que vou fazer o possível pra manter minha promessa." Do Contra disse e o ruivo o olhou bem.

 

"Seja respeitoso e bom a ela! Ah, e só pra você saber, ensinei a ela umas técnicas de autodefesa quando fomos pra floresta amazônica juntos. Tchau, filha!" ele disse e ela gritou um tchau.

 

Do Contra se aproximou dela ainda surpreso.

 

"Você já foi pra Amazônia e me chama de jabuticaba? Podia me chamar de qualquer outra coisa exótica!" o moreno exclamou e ela riu.

 

"Se meu pai falou da Amazônia, ele falou da autodefesa. Nem me surpreende que sua surpresa foi essa." ela comentou e ele riu.

 

"Você me conhece. Mas não terminamos de ver suas plantas!" falou e continuaram olhando as plantas.

 

Viviane observava a cena com um sorriso, Ramona havia mudado muito.

 

                                        *

Enquanto isso, um pouco longe, na casa de Nikolas, os meninos jogavam vídeo game. Xaveco estava esperando o melhor momento para falar o que tanto queria, mas nenhum momento parecia propício.

 

O loiro olhou para os dois e suspirou. Iria falar.

 

"Gente! Pausa aí rapidão, tenho uma coisa séria pra falar." Xaveco disse.

 

Pela voz do rapaz, os dois perceberam ser sério. Então pausaram o jogo e se viraram para o amigo.

 

"Fala aí." Nik disse.

 

O cacheado umedeceu os lábios e passou as mãos nos cabelos, era mais difícil do que imaginava.

 

"Eu… ér… bom…" falava e os dois se entreolharam.

 

"Xavier com vergonha da gente? Essa é nova! Desembucha!" Tikara falou.

 

"Tá querendo tirar nossa atenção pra ganhar? Não vai conseguir!" Nikolas disse.

 

"Espertinho, você!" Tikara falou e Xaveco revirou os olhos.

 

"Eusougay!" falou embolado e os dois franziram o cenho.

 

"O quê?!" perguntaram em uníssono.

 

"Abre a boca pra falar!" o de cabelos lisos reclamou e o amigo suspirou.

 

"Eu sou gay! Eu gosto de homens!" respondeu e os dois olharam surpresos e não disseram nada.

 

O silêncio pairou no quarto por um tempo.

 

"Vocês não vão dizer nada?" Xaveco perguntou.

 

"Por que nunca disse nada, cara? O tempo todo a gente falando que você não pegava nenhuma mulher sendo que você nem gosta de mulher!" Nikolas comentou.

 

"Porra, agora faz sentido ele dizer que nenhum mina da escola interessava." Tikara falou com um riso.

 

Xavier arregalou os olhos. Esperou tanto pelo pior que não soube reagir à aceitação deles.

 

"Espera aí! Nikolas, Tikara, eu acabei de dizer que eu sou gay! Não incomoda nem um pouco vocês?" ele perguntou e os dois negaram.

 

"Por que incomodaria? Você é nosso amigo! A gente quer que você fique feliz com quem você quiser!" Nikolas respondeu simples e Tikara concordou.

 

"A gente só 'tá meio surpreso, Xaveco, é uma notícia e tanto. Mas acho que nem é tão surpreso, é mais puto mesmo por você ter escondido esse tempo todo. Porra, Xavier! A gente falava pra você pegar mulher o tempo todo! Deve ter sido chato pra caramba de ouvir." Tikara disse.

 

Xaveco não evitou uma gargalhada alta e aliviada. Sem que percebesse, abraçou os dois fortemente.

 

"Seus putos! Eu 'tava com o coração na boca achando que não iam mais querer minha amizade!" exclamou.

 

"Por que a gente faria isso? 'Tô ficando realmente ofendido, Xavier!" Nikolas disse sério e Tikara assentiu.

 

"Não, não pensei isso por mal! É que… muita gente não aceita." Xaveco explicou e o outro assentiu.

 

"Eu sei, cara. Mas fico feliz que tenha se encontrado e confiado na gente!" o dono dos dreads disse e o loiro sorriu mais.

 

"Perguntando o que Nik não teve coragem de perguntar: 'tá pegando quem?" Tikara perguntou.

 

"Eu não ia perguntar isso. Não sou safado que nem você!" o outro exclamou.

 

"Ah, me engana que eu gosto! Mas e ai, Xaveco? 'Tá pegando alguém?" o de cabelos lisos perguntou.

 

Xaveco riu.

 

"Talvez." respondeu misterioso.

 

"Não é que a Milena 'tava certa? Você realmente passa o rodo." Nik comentou fazendo os dois rirem.

 

"Também não é pra tanto, né?!" o loiro disse.

 

"A gente conhece?" Tikara perguntou curioso. 

 

"Conhecem, mas eu só posso falar depois de perguntar se ele quer que eu fale." respondeu e os dois assentiram.

 

"Nossa, todo misterioso… 'tá bom. Vamos voltar pro jogo, eu 'tava ganhando!" o de cabelos lisos disse animado.

 

Xaveco olhou sorrindo para os dois e logo voltou atenção para o jogo e conversas banais.

 

                                           *

Já era fim de tarde e Magali estava em seu quarto entediada. Os amigos ficaram com suas famílias, então ela ficou no quarto praticamente o dia todo. Estava assistindo a uma série quando sua mãe apareceu, ela parecia preocupada.

 

"Magali, não acha que já chegou a hora de falar com seu pai? Faz tanto tempo que vocês estão brigados." ela disse.

 

Magali suspirou.

 

"Mãe, ele foi muito injusto com o Cascão!" exclamou.

 

"É, mas você nem tentou conversar com ele sobre isso. E outra, pode ter sido por causa do flagra." a outra disse.

 

"Flagra nenhum é motivo pra falar tudo aquilo de alguém!" a mais nova falou.

 

"É, mas se coloca no lugar dele, minha filha! Não foi só um diretor vendo dois alunos quebrando regras. Foi um pai vendo a filha beijando alguém! Pode parecer bobagem ou brega, mas… às vezes bate um ciuminho." ela disse e Magali riu.

 

 A mãe tocou em seu ombro.

 

"Você está mudando, eu percebi isso. Mas nós duas sabemos que essa pessoa que fala o que precisa desrespeitando a outra não é você. Você tem todo o direito de discordar das coisas e querer mudanças, mas isso precisa ser feito com respeito." falou e Magali abaixou a cabeça pensativa.

 

"Você fez isso muito bem quando esteve no levante, o que mudou?" a mãe perguntou.

 

"Mudou que foi o Cascão que ele xingou! O menino que eu sou apaixonada e me ajudou a me encontrar! Ele não merece que alguém o trate daquele jeito, mãe! E não me arrependo do que eu disse, mas a senhora tem razão, eu não falo daquele jeito com ninguém." Magali disse e a outra assentiu.

 

"Então fala com ele. Daqui a pouco ele 'tá aí, inventou de fazer uma reunião com professores. Tenho pena de quem trabalha lá." Lina disse saindo em seguida.

 

Magali suspirou e encarou o teto, tinha que falar com o pai.

 

A moça ouviu a porta da sala e saiu do quarto, mas parou no corredor ao ouvir uma conversa.

 

"Lina… o mundo 'tá desmoronando na minha cabeça! Como se não bastasse a Magali brava comigo há dias e eu sem saber como falar com ela sem perder minha autoridade e imparcialidade, tem o prédio precisando de reforma, pais tirando os filhos do internato em massaprocesso por causa de bullying… Um monte de coisa. Por isso hoje na reunião falei com os professores e funcionários uma coisa muito séria…" falou e Magali ficou atenta.

 

Carlito deu um suspiro longo e profundo.

 

"O fim do Internato Limoeiro está próximo." falou sério e visivelmente decepcionado.

 

Magali arregalou os olhos e cobriu a boca com as mão não acreditando no que ouviu. Com isso, voltou para seu quarto com a cabeça a mil.


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Notas finais do capítulo

E com esse finalzinho, e com o coração aberto kk, eu digo a vocês que IL está chegando ao fim.
:(

Em termos exatos, temos mais três capítulos, em que muuuita coisa pode acontecer! ;)

Até mais o/ ♥



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