Another Kiss And You'll Be Mine escrita por Anne Masen


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Essa história marca uma revisita a escrita há muito desejada, e eu não consigo imaginar um jeito mais especial de fazer isso do que através desse projeto. Vou guardar com muito carinho na memória.

Queria agradecer a minha amiga e velha parceira na vida fanfiqueira, Debora, por ter betado o capítulo, por todo o apoio com a escrita dessa fic e por nunca largar minha mão. Tu manda muito bem, Esguicho!

Um beijo a todas as meninas da POSO 2020 e obrigada por tudo o que foi compartilhado nesses três meses, volto a repetir que foi incrível conhecê-las e surtar com vocês!

Para a minha querida amiga oculta, Izzy, obrigada pela oportunidade de escrever essa história. Ela é uma short-fic de seis capítulos, e foi um desafio e tanto, no melhor sentido possível da palavra! Adorei os seus combos, e o que escolhi foi o 2 (a música Não é por maldade da Ludmilla e a foto do estúdio de tatuagem), e curti demais me aventurar por um universo que nunca tinha explorado antes, espero que você goste dela tanto quanto eu gostei de escrevê-la!



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Ela tinha que admitir para si mesma que sentira falta do verde. O frio e a umidade ainda eram sua parte menos favorita, mas sempre achou a floresta que cercava a estrada uma paisagem encantadora e estranhamente reconfortante, por mais que essa não fosse a descrição que a maioria das pessoas teria para uma densa parede de árvores engolida por neblina.

Quando era criança, gostava de fazer trilhas e explorar a floresta que ficava atrás da sua casa. Tinha a sensação de adentrar um mundo mágico saído diretamente dos livros de contos de fadas, e muitas vezes seu pai teve que ir a sua procura pois ela esquecia da hora, perdida em pensamentos imaginando que criaturas fantásticas poderiam viver escondidas ali. À medida que o carro avançava pela estrada até Forks, as lembranças dos anos na cidade onde cresceu a invadiram, como um filme particular dentro da sua cabeça. Ela olhou para o seu braço esquerdo, repousado no volante, onde uma representação das mesmas árvores que agora passavam como um borrão pela janela do carro estavam gravadas em tinta preta na parte interna do antebraço. Quando voltou os olhos para a estrada foi bem a tempo de ver a placa de boas vindas da cidade.

Quando as primeiras casas começaram a surgir no horizonte, ela reduziu gradualmente até a velocidade apropriada para uma área habitada. Ao parar em um sinal, tentou espreguiçar o pescoço puxando com a mão a cabeça em direção aos ombros, sentindo os músculos tensionados protestarem por alguns segundos. Mesmo com uma parada para comer no meio do caminho, sentia que uma névoa de cansaço lentamente tomava conta do seu corpo, cobrando o preço das horas de viagem, e ela não via a hora de sair do confinamento do carro.

O relógio no painel mostrava que faltavam dez minutos para as três da tarde, e que ela estava dentro da previsão de chegada que dera a Angela na última vez que conversaram por mensagem, uma vez que ela visitaria a amiga antes de seguir para casa. Não estava ansiosa para dar início a sessão de conversas monossilábicas as quais se resumiam as interações com Renée, então estava feliz por ainda ter algumas horas de sobra até lá. 

Determinada a focar na parte da viagem para a qual estava realmente animada, passou direto pela esquina onde normalmente faria a curva no quarteirão da casa dos pais e seguiu por mais dois blocos até uma ruazinha à direita, e ao final desta parou em frente a uma casa azul, sorrindo ao ver a placa de boas vindas postada ao lado da caixa de correio no jardim muito bem cuidado. Ela conseguia visualizar a amiga na loja de jardinagem considerando cuidadosamente qual a melhor opção entre uma placa simples de caligrafia bonita ou uma placa de caligrafia bonita e três vasos de flores ao redor, e no final escolhendo as flores porque quem diabos não gosta de flores?

Ela imaginou se Ben, uma das pessoas mais reservadas que Bella conhecia, teria opinado sobre a tendência da namorada a uma decoração ultra receptiva ou se ele só teria sorrido e concordado, feliz em ver Angela feliz, como fazia desde que começaram a sair juntos na época da escola.

A porta da frente se abriu antes mesmo que Bella tivesse dado a volta completa no carro, uma mão segurando o casaco e a outra a pequena bolsa tira colo. O corpo esguio de Angela apareceu na entrada, usando um vestido de alcinhas estampado, e não muito depois a figura alta de Ben surgiu atrás dela, usando jeans e camisa verde escura básica. Ao alcançar a varanda onde eles a aguardavam, Bella sorriu ao abraçar a amiga.

    — Estou um pouco decepcionada que você não me deixou apertar a campainha, queria ouvir a Branca de Neve invocando os animais da floresta — disse com os braços ainda em volta de Angela.

    — Não seja ridícula — Angela tentou fingir irritação cutucando a cintura da amiga, fazendo-a se contorcer, mas não conseguiu esconder o largo sorriso no rosto — já disse que esse é o toque do meu celular, não a campainha.

    Com um último aperto elas se soltaram, e Bella virou-se para abraçar Ben.

    — Você tem sorte que ela está com muita saudade pra ligar que você não reparou na fonte nova — Ben sussurrou no seu ouvido. — Mais um fora e talvez você fique sem bolo.

    Angela, que àquela distância ouviu tudo, deu um tapa no ombro dele.

— Eu nunca faria isso! E mais, o tour ainda nem começou, ela ainda tem chance de se redimir.

Bella riu e deixou-se ser guiada casa adentro por uma Angela muito animada para mostrar a nova decoração que ela e Ben haviam finalizado recentemente. O interior era exatamente o esperado depois do jardim. Cada canto havia sido cuidadosamente decorado por mãos que claramente desprezavam a estética fria e estéril de casas modernas de cidades grandes. 

As paredes, do mesmo azul celeste com detalhes em branco da parte de fora, refletiam a luz natural que entrava pelas janelas, deixavam os cômodos bem iluminados e combinavam muito bem com a mobília de madeira clara. E claro, as flores. Nas almofadas do sofá creme, na cortina de renda, em pequenos vasinhos espalhados por quase todas as superfícies. Angela adorava restaurar mobílias antigas; dizia que elas tinham mais personalidade que um móvel novo, e era preciso reconhecer seu talento para combinar os mais variados estilos de forma harmônica. 

O tour pela casa terminou no quintal dos fundos, onde uma mesa rodeada por três cadeiras fora arrumada com café, bolo e sanduíches em louças de porcelana que pareciam ter saído do filme A Bela e a Fera. Ao se aproximarem, Bella notou o porta-retrato com uma foto dos três na época de escola, sorrindo para a câmera e com Ben abraçando as duas pelos ombros. Pegando o objeto nas mãos, ela o levou ao peito e olhou para a amiga fazendo um beicinho.

— Ok, eu oficialmente te odeio por ser tão fofa, Ang.

    Angela bufou e fez um gesto afetado com as mãos.

    — Não fique tão lisonjeada, eu faço isso pra todas as visitas.

    As duas riram, sabendo muito bem que era mentira. Angela era uma das pessoas mais afetuosas que Bella conhecia, certamente mais do que ela, e demonstrava isso para quem amava com muita facilidade, mas nunca se não fosse sincero.

    Como se tivesse ensaiado, sentiu e ouviu a barriga roncar, e entre risos eles se sentaram à mesa. Ela não se deu conta do quanto estava com fome e comeu até sentir que não aguentaria mais um pedaço de bolo sem passar mal depois. Adorou as duas horas que passaram jogando conversa fora, rindo e contando as novidades de desde a última vez que se viram. 

Se havia uma coisa que ela lamentava de não morar mais em Forks era não vê-los com mais frequência. Sendo as famílias de Forks, os três cresceram juntos e tinham uma forte amizade mesmo antes das coisas entre Angela e Ben se tornarem mais que isso, o que aconteceu no segundo ano do ensino médio, quando Angela tomou a iniciativa. Mas diferente deles, Bella não conseguia se ver tendo a vida que queria aqui, então ela se mudou para Seattle e eles tiveram que se acostumar com a nova realidade de se verem apenas algumas vezes por ano, quando um deles podia fazer uma visita.

    O sol começava a se pôr enquanto Bella se preparava para ir embora. Estava dentro do carro quando Ben se aproximou da sua janela.

    — Não acredito que quase esqueci disso, mas você já sabe da mais nova novidade da cidade?

    — Os Johnson tiveram mais um filho? — ela tentou. A família carregava a fama de uma família de coelhos, tanto que àquela altura talvez nem devesse mais ser considerado novidade.

    — Agora temos nosso próprio estúdio de tatuagem.

    As sobrancelhas de Bella se ergueram.

    — É mesmo? De quem?

    — Lembra do filho dos McCarty? Ele abriu um há alguns meses, fica na avenida principal, deve passar por ele no caminho.

    — Vou ficar atenta — prometeu.

    Ben estava certo, não foi difícil encontrar o lugar — como era com a maioria das coisas numa cidade daquele tamanho e bastaram alguns minutos para avistá-lo. Em fonte de estilo retrô, o nome McCarty’s Ink brilhava em neon vermelho contra a vidraça da porta. De onde estava, depois de estacionar na frente da loja, não conseguia ver ninguém lá dentro, embora houvesse um sinal de aberto. 

    O lugar parecia cantar por ela, instigando-a a entrar. Podia sentir a familiar sensação de borboletas no estômago de quando estava diante da grande paixão da sua vida: tatuagem. Desde muito jovem ela era encantada com a ideia de gravar arte no corpo pra sempre, mas Forks, sendo a cidade pequena que era, nunca foi um lugar muito promissor para o ramo. As pessoas tinham que ir para cidades próximas como Port Angeles para sequer serem tatuadas por um profissional, e era especialmente difícil se você desejava aprender a tatuar, então sair de Forks era uma das primeiras coisas que uma pessoa precisava ter em mente se quisesse viver daquilo. É o que a grande maioria dos artistas aspirantes a tatuadores que ela conheceu tiveram que fazer, e foi o que ela estabeleceu para si como meta antes mesmo de terminar o ensino médio.

Ver pela primeira vez um estúdio na cidade onde ela cresceu despertava nela uma emoção que não sabia nomear. Ela tinha uma breve noção de quem eram os McCarty, sabia que eles eram uma família que tinha vindo do Tennessee e que nela havia algumas gerações de tatuadores. Pelo que lembrava, o sr. McCarty tinha sofrido um ataque de urso do qual por pouco saiu com vida, no entanto, o acidente o custara parte do braço, o que o forçou a parar de tatuar. Ela o vira algumas vezes pela cidade com o filho, mas nunca chegou a conhecê-los de fato. Agora ela tinha a oportunidade.

Viu o próprio reflexo dar um passo em direção a porta, uma mão saindo do bolso do casaco para alcançar a maçaneta. Conferiu a hora no celular. Se ela não demorasse ainda poderia evitar o resmungo de Renée sobre se atrasar para o jantar. Faria um rápido desvio no caminho e logo seguiria em frente.

Um sino soou quando ela empurrou a porta, e ela recebeu de bom grado a lufada de ar quente que a envolveu assim que a fechou atrás de si. Havia um balcão de recepção e uma pequena área de espera com um sofá e algumas poltronas em frente a uma mesa de centro com revistas e catálogos. A primeira coisa que notou foram as paredes: de um lado, inúmeros designs de tatuagens do mais variados estilos, emoldurados com vidro e bordas pretas de madeira. Do outro, um painel com fotos de família dos McCarty, os artistas ao longo das gerações posando ao lado dos seus clientes, exibindo o trabalho com orgulho. Em muitas delas identificou a figura corpulenta do sr. McCarty, tatuagens cobrindo quase toda a pele visível, com exceção do rosto, esticado em um sorriso de criança.

Concentrada por um instante admirando o lugar, não reparou que não estava sozinha, como primeiro imaginara, até que uma movimentação atrás do balcão chamou sua atenção. Seu primeiro pensamento quando pousou os olhos no homem que surgira de um corredor que levava ao interior do estúdio foi que ele era lindo. Era alto, provavelmente uns vinte centímetros maior que ela, corpo esguio e rosto angular. O cabelo cor de bronze era grande o suficiente para formar uma espécie de escultura desalinhada, com cara de constantemente ser ajustado pelas mãos. Olhos verdes a encaravam de volta com uma atenção que ela não soube nomear. Ele não parecia em nada com o filho McCarty, que pelo que ela lembrava era muito parecido com o pai, de cabelos escuros e cacheados, então ela descartou a ideia.

Não poderia ter passado mais do que poucos segundos, mas quando ele rompeu o silêncio entre eles, ela se viu soltando o ar que nem percebeu estar segurando.

— Olá, posso ajudá-la? — seu tom era simpático.

Ela se forçou a ignorar a parte do seu cérebro que focou no quanto a voz combinava com a beleza física do dono. Ficou desconcertada por um segundo, percebendo então que ela não tinha exatamente um plano para estar ali além de conhecer o lugar e quem sabe o dono, mas não é como se fosse esperada ou algo do tipo.

— Oi, o... dono está? — ela torceu para que não soasse tão perdida quanto estava, tentou uma busca rápida na memória pelo nome do filho de McCarty, mas nada.

    — Sim, mas ele está com um cliente agora — ele apontou para trás por cima do ombro, para o corredor de onde havia vindo. Uma leve ruga surgiu entre as sobrancelhas grossas quando seus olhos desviaram brevemente para o computador no balcão. — Você tem uma sessão marcada? 

    — Hm… Não, não, na verdade só estou de passagem, eu não conhecia o estúdio — ela disse. — Na última vez que estive na cidade vocês não tinham aberto ainda.

    Ele assentiu em reconhecimento, e ela sentiu seu olhar acompanhá-la enquanto andou até onde ele estava, parando a uma distância aceitável do balcão. Ela notou como as pálpebras dele abaixaram para manter o olhar nela. Se estivessem mais próximos, era provável que ela precisasse inclinar a cabeça para cima para manter contato visual.

    Não que fosse um cenário possível para eles. Ela afastou o pensamento.

    — Sou Isabella — ela estendeu a mão entre eles, e acrescentou. — Bella.

    — Bella — ele testou. Sorrindo, ele apertou sua mão. — Edward.

    Ela recolheu a mão e a enfiou no bolso do casaco. Ele passou a mão pelo cabelo, acomodando os fios em uma nova bagunça. Apertando os lábios para não sorrir, ficou satisfeita ao ver que estava certa.

    — Emmett ainda deve levar alguns minutos lá dentro, mas você pode esperar por ele aqui, se quiser — ele informou.

    Emmett. De alguma forma, o nome combinava com a lembrança que ela tinha dele.

    Ela estava prestes a dizer que seria melhor deixar pra outra hora pois ela tinha que estar em outro lugar, quando um estrondo de coisas caindo no chão fez os dois se sobressaltarem. Por instinto, ela fechou os olhos, ficando completamente parada no lugar como se isso fosse ajudar contra um possível ataque do que quer que tivesse provocado o barulho. Quando ousou espiar com um olho só, Edward não estava mais lá, mas próximo à ponta do balcão, e parecia se posicionar entre ela e o corredor.

    Ela só podia ver as costas dele enquanto ele cautelosamente seguia de volta para o corredor, sumindo de vista. De onde estava ela não podia ver muito, pois o corretor tinha uma curva, então teve que se contentar em esperar ansiosamente, reprimindo o ímpeto de ir atrás de Edward.

    Os segundos pareciam horas, e ela já estava com o celular em mãos, pronta pra chamar ajuda quando ouviu passos vindo do corredor. A última coisa que esperou foi ver Edward aparecer com um sorriso no rosto.

    E um gato.

    — Olha só quem entrou pela janela dos fundos de novo — ele cantou, coçando o queixo do bichano. — O que eu vou fazer com você, Abigail?

    Os olhos de Edward praticamente brilhavam para o animal, uma bola de pelo cinza deitada de barriga pra cima em seus braços, a cabeça jogada para trás aproveitando o carinho que recebia. Os dois eram uma visão e tanto, a fofura encarnada, e Bella nem tentou fingir que a imagem de um belo homem chamando um gato pelo nome de forma tão afetuosa não o tornava ridiculamente mais atraente aos seus olhos. Quase doía olhar para ele agora.

    Ele parou na sua frente, afrouxando o aperto em Abigail como se para exibi-la melhor. O olhar que ele a lançou deixava claro que ele esperava que ela também fizesse carinho na gata.

    — Ela é sua? — perguntou, uma mão acariciando a parte de cima da cabeça de Abigail.

    Ela viu o sorriso dele ficar pesaroso.

    — Quem me dera. Ela é do vizinho, mas adora vir aqui, provavelmente porque sabe que vai ser recebida assim — ele riu. — É uma pena que ela prefira derrubar parte do nosso estoque ao entrar pela janela a usar a porta da frente.

    — Edward, ponha ela no chão, agora!

    Bella disparou o olhar para a porta, esperando ver o tal do vizinho irromper enfurecido por ali achando que eles teriam sequestrado a gata. Mas a voz de trovão na verdade vinha do estúdio, da montanha de homem que aparecera ali sem que eles percebessem.

    Agora esse era um McCarty. Altura e músculos de sobra acompanhando um rosto que tinha um ar juvenil mesmo estampando certa urgência e, claro, tatuagens que iam de um pulso, cobrindo ombros e peitoral, até o outro, visíveis pela regata preta simples que ele usava.

    Ao seu lado, Edward bufou, revirando os olhos.

    — Está tudo bem, Emm. — e ajustou a gata no colo.

    Emmett deu mais um passo na direção deles, os braços estendidos na direção de Edward.

    — Dê ela aqui, ou coloque-a no chão — insistiu, uma sobrancelha arqueada.

    Bella só conseguia olhar entre os dois, confusa pelo contraste entre o alarme de Emmett e a calma de Edward. Será que Abigail era secretamente agressiva e estava esperando o momento certo para atacar? Emmett falava como se tentasse persuadir Edward a entregar uma arma de fogo ao invés de um gato que parecia prestes a cair no sono de tão tranquilo que estava. E se esse fosse o caso, Edward não parecia se importar nem um pouco em estar prestes a ser massacrado.

    — Eu já disse que está tudo bem, seu idiota, eu acabei de pegá-la — Edward parecia quase na defensiva.

    — Foi isso que você disse da última vez e eu tive que arrastar a sua bunda pro hospital. Passa a gata, Edward.

    Bella ficou surpresa por um buraco não surgir no meio da cara de Emmett, tamanha a força com que Edward o fuzilava com o olhar, mas com um suspiro e um último revirar de olhos, ele entregou Abigail.

    — Você não tem um cliente pra atender? — Edward cruzou os braços sobre o peito e apoiou o quadril no balcão. Bella queria rir do seu tom petulante, como o de uma criança que teve o balão estourado, mas se conteve.

    — Eric provavelmente precisa de um intervalo. Tenho visto ele ficar pálido desde que comecei a tatuagem, e olha que é uma coisinha de nada — respondeu Emmett, sem se abalar, acariciando Abigail.

    Só então ele pareceu notar Bella.

    — Desculpe a entrada brusca, alguém tem que garantir que a Felícia aqui não tenha uma crise alérgica. Sou Emmett, bem vinda a McCarty’s Ink.

    Os dois trocaram um aperto de mão, a mão de Emmett engolindo a sua.

    — Bella — ela devolveu o sorriso que Emmett oferecia. — Obrigada, eu gostei muito do estúdio, meus parabéns.

    Emmett estreitou os olhos, parecendo analisá-la.

    — Você me parece familiar. Já nos conhecemos antes?

    — Não oficialmente, não. Mas como todo bom cidadão de Forks, tenho certeza que já nos vimos por aí.

    Ela quase pôde ver a lâmpada se acender em cima da cabeça dele.

    — Ah, sim! Filha do chefe Swan, não é? — ela assentiu em resposta. — Não acredito que nunca nos esbarramos de fato. Acho que meu velho e o seu pescaram juntos algumas vezes.

    — Uma proeza mesmo — ela concordou.

    — Aposto que onde quer que estejam, estão felizes que finalmente nos conhecemos.

    Emmett falara com a naturalidade de alguém que realmente acreditava no que dizia. Ele não hesitou ou desviou o olhar, como a maioria das pessoas fazia ao falar de Charlie perto dela, como se temessem sua reação. Às vezes, quase pareciam querer esquecê-la, evitando mencioná-la por completo. Bella não tinha se dado conta que, em algum momento, passara a esperar por isso também, de forma que a postura de Emmett foi uma agradável surpresa, e ela se viu comovida pela sinceridade dele.

    Ela sorriu e assentiu para ele, sem saber o que dizer, mas esperando que fosse o suficiente. Felizmente, o foco da conversa mudou.

    — Então, está procurando por um emprego ou o que? — o sorriso de Emmett era brincalhão.

    Ela ouviu a risada baixa de Edward.

    — Você é quem provavelmente deveria pedir para trabalhar com ela.

    Ele estava com a mesma expressão de mais cedo, quando tinha os olhos fixos nela, mas agora parecia mais seguro do que quer que tivesse concluído a seu respeito. Ela levantou uma sobrancelha para ele.

    Pela segunda vez Emmett pareceu captar algo, e isso o fez soltar outra risada rouca.

    — Porra, sim, eu poderia aprender uma ou duas coisas com uma grande tatuadora como você — Emmett deu corda.

    Então eles a conheciam. Huh.

    — Primeiro, “grande” parece um exagero — ela fez uma careta.

— Sua quantidade de seguidores no Instagram discorda — Edward pontuou.

Ela revirou os olhos, e algo dentro dela ficou inquieto com o sorriso torto que o gesto tirou dele.

— ...Mas obrigada. Segundo, vocês não parecem precisar de ajuda — terminou, gesticulando com a mão para a parede coberta de quadros.

    — Conhecimento nunca é demais — argumentou Emmett, dando de ombros, mas havia um quê de orgulho na sua voz que fez Bella rir.

    Foi então que Edward espirrou, e isso pôs Emmett em ação de novo.

    — Ok, esse é o nosso sinal, vou levar essa fujona pra casa e voltar lá pra trás. Bella, foi um prazer, vou cobrar minhas dicas outra hora — ele se aproximou para apertar seus ombros em um meio abraço por causa de Abigail, agora dormindo enroscada contra seu peito. — E você — ele apontou para Edward — é melhor trocar essa camisa.

    Emmett saiu pela porta da frente antes que pudesse ver o dedo do meio que Edward levantara para ele mas, pelo sorriso que exibia no caminho, conhecia o amigo bem o suficiente para imaginar a reação dele.

    Sozinha novamente com Edward, ela notou que ele fungava discretamente, o rosto um pouco corado. Se por vergonha ou por alergia, não sabia dizer. Com um sorriso tímido, ele se afastou até estar atrás do balcão outra vez, virando de costas antes de estender uma mão e puxar o suéter que usava por cima da cabeça. Ele usava uma camisa branca por baixo.

    Ele não podia vê-la, mesmo assim ela teve cuidado de controlar a expressão ao ver a pele exposta dos seus braços, esticada sobre músculos elegantemente definidos, ou a parte inferior das costas que por em segundo se fez visível antes dele ajudar a camisa ao corpo.

    Quando ele voltou a ficar de frente, a recepção parecia ter ficado pequena demais.

    — Eu preciso ir. Prazer em te conhecer, Edward — ela torceu para que a voz dela não estivesse tão rouca para ele como soava para seu ouvido.

    — Espero te ver de novo em breve — ele apertou a mão que ela ofereceu a ele.

    De volta às ruas, ela teve que enfiar as mãos no bolso do casaco para suprimir a sensação de corrente elétrica que perdurou em sua pele o caminho todo até a casa de Renée.

***

    Estar de volta a casa onde cresceu despertava nela um misto de sentimentos bons e ruins. Bons porque ela sempre teria um carinho por Forks e pela memória de uma infância feliz; ruins porque a pessoa que tornou isso possível não estava mais ali, e a ausência dela sempre seria acompanhada de uma dor antiga que na maior parte ela conseguia abafar, mas ficava mais difícil quando tudo à sua volta era uma lembrança do que perdera.

    Talvez fosse bom que muita coisa tivesse mudado ao longo dos anos, graças à forma com que Renée lidava com a morte de Charlie. Desde então, ela se sentira no direito de fazer com a casa tudo o que sempre quis ao longo do casamento, desde retirar os quadros da família Swan das paredes, os quais ela sempre achou “macabro” de se ter, até transformar cômodos inteiros à sua vontade, criando uma sala de ginástica ou um closet para o quarto principal. Para Renée pouco importava que a casa tivesse sido construída pelos pais de Charlie, que ele tivesse feito de tudo para conservá-la com o seu modesto salário, muitas vezes se encarregando ele mesmo fazer os reparos necessários para cortar gastos, e ainda assim tendo que ouvir constantemente da esposa que não era o suficiente para fazer a casa parecer menos velha e antiquada.

    A casa cada vez mais se distanciava do lugar que um dia ela chamara de lar, e isso tornava mais fácil entrar e sair dali sabendo que ela não pertencia mais ao lugar. Quando saiu de lá, Bella estava determinada a não voltar, então ela garantiu que nada pudesse prendê-la, nem mesmo a memória de Charlie. Sabia que tentar lutar contra Renée era um desperdício de tempo e energia, e como com todas as outras coisas que eram divergentes entre elas, decidiu só aceitar e seguir com a própria vida. Aquilo que conseguiu enfiar na caminhonete que o pai lhe presenteara no aniversário de 16 anos, ela levou consigo para Seattle, e o que não coube, deixou pra trás. Agora seu antigo quarto nem parecia mais seu quarto, a única coisa que denunciava que um dia ela estivera ali era o papel de parede desgastado nos pontos onde costumavam estar pregados dezenas de desenhos, pôsteres e fotografias da sua adolescência. 

O jantar com Renée ocorreu dentro do esperado e sem grandes acontecimentos. Ela há muito aprendera que a melhor forma de lidar com os comentários passivo-agressivos de Renée sobre a sua vida era fingir não ouvir o sutil tom de desaprovação ao final de cada frase, e foi isso que se obrigou a fazer a fim de evitar discussões. Houve um tempo que não ter o apoio da mãe quanto a sua carreira a magoava, até que ela finalmente decidiu que a aprovação de Renée não importava mais pra ela. Ela não esperou muito para alegar cansaço da viagem e se retirar.

Depois que tomou um banho e colocou roupas limpas, Bella sentiu que recuperou um terço da energia que a viagem roubara. Foi maravilhoso sentir os músculos relaxando sob a água quente. Ela quase desejou poder ficar ali por horas. Estava usando o secador de cabelo que levara na mala quando seu celular vibrou em cima da bancada da pia. Ela soltou uma risada ao ler as mensagens de Rose pela barra de notificações.

Por favor me diga que você chegou bem

Não vou conseguir arranjar outra pessoa pra dividir o aluguel antes da fatura desse mês vencer

E acho que você levou uma blusa minha

    Afastando o secador da cabeça por um instante, ela posicionou o celular encostado na parede acima da bancada com a tela virada para si e depois abriu a conversa, tocando na pequena câmera ao lado do nome do contato. Alguns segundos depois, o rosto de Rosalie surgiu, e ela riu ao ver a amiga fazer uma careta e afastar o celular assim que a chamada conectou.

    — Puta merda, diga ao seu sequestrador que eu pagarei seu resgate, ele pode desligar a serra elétrica.

    Tão dramática! — Bella revirou os olhos, ainda sorrindo, e enfim desligando o secador. — Sua preocupação com o meu bem estar foi comovente, a propósito.

    — O que eu posso fazer? Tenho que ser uma boa amiga e parceira de negócios, caso contrário corro o risco de perdê-la. E eu realmente não acho minha blusa em lugar nenhum.

    — Se eu te conheço bem e suas habilidades de organização, é capaz da blusa estar enterrada em meio a sua coleção de lingerie.

    — Ok, Marie Kondo, vou procurar de novo — um sorriso lentamente foi crescendo no rosto de Rosalie — mas não acho que esteja lá porque eu usei essa gaveta recentemente. Eu teria visto.

    — Obrigada por isso, é sempre um prazer estar em dia com as novidades da sua vida sexual.

    — Disponha. Já que você está dependendo apenas do seu guarda-roupa, como foi desfilar por aí dessa vez? Exibiu suas tatuagens com outras intenções além de irritar sua mãe?

    Bella parou de ajeitar o cabelo e olhou ceticamente para a câmera.

    — É, tá bom, como se a ideia de flertar com alguém que possivelmente me viu comer terra no ensino fundamental fosse realmente tentadora.

    — É ótimo pra quebrar o gelo no primeiro encontro, nada melhor do que reviver o passado com alguém que provavelmente te viu nos anos mais confusos e conturbados da sua vida, certo? — a mão de Rosalie subiu para coçar uma sobrancelha enquanto ela desviava o olhar e entortava a boca pro cenário que descreveu.

    Bella riu. Terminou de recolher suas coisas do banheiro e voltou para o quarto, levando Rosalie consigo.

    — Você também esquece que aqui chove quase 24h por dia, tenho que usar casaco o tempo todo.

    — Isso de fato dificulta o plano de sedução. Força, guerreira.

    — Mas eu conheci umas pessoas novas.

    — Ah, é? Luz no fim do túnel?

    Bella revirou os olhos.

    — Abriu uma loja de tatuagem aqui, conheci o dono e um outro cara que trabalha lá. Eles são bem legais, e o lugar parece estar indo bem.

    — Então você vai transar com um e quebrar o coração dele indo embora no dia seguinte para desestabilizar a concorrência. Gostei.

    Ela não conseguiu não rir, mesmo enquanto balançava a cabeça em descrença.

    — Parece promissor, mas não, obrigada. Já tenho muita coisa com o que lidar amanhã.

    — Fica pra próxima então.

    Elas se despediram depois de um breve relatório sobre seus respectivos dias. Bella ainda sorria pensando na conversa com a amiga nos minutos que levou até que o sono a arrebatasse. Não contara a Rosalie que talvez uma parte dela não seria totalmente contra a pelo menos parte daquele cenário.


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Notas finais do capítulo

A todo mundo que resolver dar uma chance a história, primeiro obrigada hehe e segundo, comentem, por favor! Vou adorar saber as primeiras impressões de vocês.

Até breve!



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