Onde crescem as rosas selvagens escrita por themuggleriddle


Capítulo 3
1.2


Notas iniciais do capítulo

Obrigado, birdiepoe e Lyn Black pelos reviews :DD
Espero que gostem desse capítulo.



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Thomasin Riddle era a primeira a levantar no dormitório, com passos leves e uma pressa curiosa para se arrumar. Logo cedo, ela já servia como um lembrete de o quão errado o plano de Dumbledore havia dado.

Hermione, em sua cama que agora tinha cobertas verde escuro, afundava o rosto no travesseiro e tentava ficar o maior tempo possível deitada. As noites eram passadas em claro, o sono chegando tarde e acabando cedo. Quando amanhecia e as meninas começavam a se movimentar, a primeira sempre sendo Thomasin, Hermione fechava os olhos com força em uma tentativa vã de voltar a dormir e acordar daquele sonho ruim.

Era pra ser difícil, tão difícil quanto a busca pelas horcruxes, mas era para fazer sentido. Encontrar Tom Riddle e impedi-lo de se tornar Voldemort fazia sentido, afinal, o bruxo das trevas era uma ameaça real e o seu eu mais jovem era tão real quanto ele, pelo que Harry e Ginny haviam descrito. Thomasin Riddle, no entanto, não fazia sentido. Ela não existia nos relatos dos amigos ou nas memórias armazenadas por Dumbledore, logo, não havia lógica em tentar impedi-la de… se tornar Voldemort? Aquilo poderia acontecer? Se pudesse, o Voldemort dali não era o seu e pará-lo não mudaria nada para Harry, Ron ou seus pais.

Algo havia dado muito errado e Hermione ganhara Thomasin ao invés de Tom. Onde devia haver o rapaz bonito descrito por Harry, havia uma garota de postura impecável e olhos frios. E cada vez que aquele rosto surgia na sua frente, mais a bruxa sentia o mundo ao redor ficar um pouco menos palpável.

“Vamos, Hermione.”

A voz de Dorea havia se tornado um alarme. Quando a colega chamava, Hermione sabia que era hora de deixar de lado as suas frustrações e se ajeitar para mais um dia de aulas, por mais que a vontade de se afundar nas cobertas fosse maior. Não que ela prestasse muita atenção nas lições: sua cabeça parecia constantemente cheia de algodão, como quando ela ia para a praia e entrava água em seu ouvido, mas ao menos fingia estar atenta. Seus cadernos, doações do professor Slughorn, permaneciam em branco e seus livros, praticamente intocados. No entanto, ninguém questionava o seu comportamento: todos esperavam que uma refugiada de guerra tivesse dificuldades em se adaptar à vida longe dos conflitos.

Volte e meia ela se pegava agradecendo Gellert Grindelwald pela enorme confusão que este havia criado na Europa no início do século. Sem isso, Hermione Granger provavelmente teria muito mais dificuldade de se passar por Hermione Sergeant, uma órfã fugida da França, onde os conflitos causados pelo bruxo das trevas e o ditador alemão trouxa aterrorizavam a todos. Ela se perguntava quais as chances de Grindelwald continuar sendo Gellert Grindelwald, ou se, como Voldemort, havia uma mulher que tomara o seu posto naquele tempo.

De vez em quando, no meio da aula, Hermione sentia uma imensa vontade de rir. Era como se o riso borbulhasse dentro de si, subindo-lhe pela garganta e só não saindo para fora por conta dos dentes pressionados uns contra os outros. Ela queria rir do seu azar e do que havia acontecido. Queria rir da expressão séria de Thomasin Riddle, que tinha mania de morder o lábio inferior enquanto se debruçava para fazer anotações em seus cadernos e sempre acabava com a mão suja de tinta, e de si mesma, que prestava atenção nesses detalhes inúteis. Queria rir do resultado miserável da sua tentativa de ser nobre e honrada, como Harry sempre havia sido. Queria rir das ideias que surgiam tarde da noite, planos de como se livrar de Thomasin e que envolviam a banheira do dormitório ou travesseiros macios. Nessas horas, a bruxa respirava fundo e fechava os olhos, tentando se imaginar no seu próprio tempo, com Ron mastigando goma de mascar ao seu lado enquanto Harry dormia na frente deles. Também tentava imaginar Riddle como ela devia ser pelos relatos dos amigos: sem curvas dos quadris ou seios, sem rosto delicado, sem cabelos compridos; imaginava-a reta e alta, como Tom Riddle deveria ser, com a voz grave e quem sabe até uma sombra no rosto ao fim do dia. Aquilo a acalmava um pouco e, se focasse apenas nos olhos azuis, podia se perder um pouco mais naquele faz-de-conta.

***

Quase um mês havia se passado desde que Hermione chegara em 1944 e ela ainda não sabia o nome de todas as meninas com as quais compartilhava o dormitório. Sabia que havia Dorea, sempre gentil e prestativa, e Thomasin, séria e inconveniente. Eram os únicos nomes dos quais se lembrava, mas já havia reparado nas outras alunas: uma garota de cabelos negros que adorava passar batom vermelho antes das aulas, outra com cabelos ruivos presos sempre em tranças e que passava mais tempo com alunas da Corvinal, e uma bruxa loira que volte meia estava encarrapitada na cama de Thomasin e parecia ser a única que arriscava se aproximar mais da garota.

Não que Riddle fosse ameaçadora. Talvez fosse isso que assustasse Hermione acima de tudo. Ela era quieta e talvez até um pouco fria com o seu modo distante, mas não era rude. Pelo contrário, Granger já havia visto a garota conversando com a monitora da Grifinória em um tom de voz agradável e, durante os cafés da manhã, ela puxava assunto com os outros, mas sempre dando prioridade para a menina loira do dormitório cujo nome Hermione não fazia muita questão de lembrar.

A mesma garota loira que agora encarava Hermione como se esta fosse alguma das criaturas sobre as quais eles estudavam em Animais Fantásticos e Onde Habitam. Granger abaixou os olhos para o prato de comida e cortou um pedaço minúsculo de bacon, tentando ignorar o olhar da outra bruxa. Ela o levou à boca e forçou-o para dentro, fazendo com que seus dentes o amassassem até forçá-lo goela abaixo. Comer havia se tornado um fardo com cada comida virando poeira em sua boca.

“Quantas mudas de roupa você tem mesmo? Tirando os uniformes,” perguntou Dorea, apoiando-se no cotovelo para se inclinar sobre a mesa do café da manhã.

“Ahm, duas?,” disse Hermione, encolhendo-se em seu lugar. Era bom sumir entre os alunos de Hogwarts. Era ruim ter atenção diretamente sobre si. “Mas é só o que eu uso.”

A garota loira ao lado de Thomasin sacudiu a cabeça com a testa franzida e os lábios pressionados.

“Precisamos fazer algo sobre isso,” a garota cujo nome ainda fugia da mente de Hermione falou. “Acho que devo ter algo… Não, tenho certeza de que tenho!”

A jovem estalou os dedos e se levantou em um pulo, correndo para fora do salão. Thomasin, que permaneceu sentada ao lado do lugar vazio, olhou para os dois lados, certificando-se de que ninguém a estava vendo, e afanou o resto da salsicha deixada pela colega. Por estar prestando atenção única e exclusivamente em Riddle (estava sendo sempre assim: sua atenção só conseguia ter foco quando Thomasin estava envolvida), a ação pareceu lenta e bem orquestrada, mas na verdade tudo não durou mais de dois segundos.  Quando os olhos de Riddle encontraram Hermione outra vez, ela franziu a testa e crispou os lábios. Era a primeira vez que Thomasin quebrava a feição educada que tinha para com os outros alunos.

“Precisa de algo?” ela perguntou, antes de piscar e respirar fundo. Hermione negou com a cabeça. “Já está conseguindo se achar no castelo? Precisa de ajuda para chegar até a próxima aula?”

”Não.”

Riddle a observou por um momento, fazendo a bruxa encolher os ombros e desviar o olhar para o outro canto da mesa, onde um grupo de meninos ria de alguma piada.

“Eu lhe aconselharia a ficar longe deles,” disse Thomasin, apanhando os seus livros e se levantando. “São todos puro-sangues com casamento marcado.”

Granger acompanhou a garota com o olhar, antes de olhar para o próprio prato, onde metade do café da manhã permanecia intocado. Ela empurrou um pedaço de bacon de um lado para o outro, antes de bufar baixinho e largar o talher. Se tentasse comer mais, iria vomitar. Sentia vontade de vomitar o tempo todo, junto com o peso no peito. Pelo menos não estava com vontade de chorar naquele momento.

Ela se levantou e, durante minutos que pareceram longos demais, caminhou pelos corredores até alcançar a sala de Feitiços. Apesar de não prestar atenção nas aulas, pelo menos aquelas horas eram períodos nos quais os outros estudantes ficavam em silêncio e a deixavam menos desconfortável. A voz do professor parecia um zumbido a mais em sua cabeça e a mantinha parcialmente ancorada na sala de aula, apesar de não entender uma palavra sequer do que ele falava.

***

“Calma!” A mão de Dorea em seu ombro fez Hermione se forçar a focar na garota parada à sua frente. Aos poucos, ela distinguiu os olhos enormes por detrás das lentes grossas e os cabelos bagunçados. “Desculpa, eu não quis te assustar.”

Atrás dela, a garota loira da sonserina as observava com os olhos arregalados e os lábios pressionados um contra o outro. Ela se aproximou devagar, apoiando uma mão no braço de Black e a puxando para longe.

“Melhor dar espaço,” a menina falou e sorriu para Hermione. “Talvez a gente tenha se empolgado um pouco.”

Estavam paradas na porta da sala de Feitiços, pouco após o fim da aula. Granger sentira uma mão a puxando pelo braço assim que pisara no corredor. Era apenas Dorea, mas aquilo não a impediu de se afastar em um pulo e quase puxar a varinha. O barulho dos alunos conversando a sua volta parecia prendê-la no lugar.

“Vamos voltar para a masmorra?” perguntou Dorea, dando um passo para trás e esticando a mão na direção de Hermione, que a observou por um longo minuto, antes de aceitar a mão dela. ”Ótimo.”

Ter Black a guiando pela mão a fez se deslocar com mais facilidade pelos corredores do castelo. O calor dos dedos da bruxa a fazia se sentir mais real no meio de todo mundo e saber que havia alguém a guiando era reconfortante. Ela podia relaxar um pouco e se deixar levar.

“Posso saber por que vocês… se empolgaram?” perguntou Hermione, enquanto subiam para o dormitório.

“Bom,” a menina loira falou, cantarolando. “Você falou que tem poucas roupas fora os uniformes, que, inclusive, logo vão ficar tudo gasto se você continuar os usando dia e noite.”

“E Arxa tem roupas de sobra,” disse Dorea.

Hermione piscou uma, duas vezes enquanto se aproximava da sua cama. Sobre as cobertas, diversas mudas de roupa estavam estendidas: suéteres, vestidos, saias, calças, blusas, gorros e até lenços. Eram peças bonitas, feitas com tecidos de qualidade e com uma costura exímia. Eram roupas caras, roupas que Dorea usaria. Ou Pansy Parkinson. A bruxa esticou as mãos e deslizou os dedos por um vestido bordô mais macio que qualquer coisa que ela já havia usado.

“Arxa?” Granger perguntou, limpando a garganta.

“Mildred tem razão: você é distraída!” a loira riu, apoiando-se na pilastra da cama. “Talvez ela tenha usado um termo um tanto mais pejorativo, mas tudo bem.” Ela ajeitou o peso sobre os pés e fez uma reverência mínima e jocosa. “Arantxa Malfoy, ao seu dispôr… Apesar de eu já ter me apresentado no início do mês.”

Hermione piscou lentamente e desviou o olhar para a loira. O sorriso divertido ainda repuxava os seus lábios e ela parecia estar esperando alguma resposta, a expectativa fazendo seus olhos brilharem. O nome ressoou em sua mente e puxou um fiozinho de memória que ela foi impedida de seguir por Dorea, que a apressava para provar as roupas para que pudessem ser ajustadas o mais rápido possível.

***

O relógio da torre de Hogwarts havia batido três horas da manhã quando Hermione conseguiu se lembrar quem era o Malfoy que ela procurava em suas lembranças.

Como se tivesse surgido do nada em sua mente, uma memória a tirou do estado de sonolência e ansiedade causada pela insônia que a perseguia desde que havia chegado naquele ano: fios de fumaça se erguiam de caldeirões, Harry tinha os olhos grudados naquele maldito livro do Príncipe Mestiço enquanto ela tentava seguir as instruções corretas para preparar a Poção do Morto-Vivo. A voz de Draco Malfoy ecoava em algum lugar, abafada pelo borbulhar das poções:

“Senhor, acho que conheceu o meu avô, Abraxas Malfoy?”

“Sim. Fiquei triste quando soube da morte dele, apesar de que não fora nada inesperado. Varíola de dragão, naquela idade...”

Hermione se sentou na cama com olhos arregalados encarando o veludo escuro das cortinas do dossel. Ela havia ouvido falar sobre Abraxas Malfoy e a influência dele no Ministério da Magia, apesar do nome muitas vezes ser ofuscado pelo do próprio filho, Lucius. A idade, pelos cálculos rápidos que ela fazia em sua cabeça, condizia com a que o avô de Draco deveria ter em 1944.

Engolindo em seco, a bruxa se esgueirou para fora da cama com a varinha em punho. As cortinas dos dosséis de suas novas colegas de quarto estavam todas fechadas e a escuridão tomava conta quase que por completo do lugar, salvo pela discreta luz tremeluzente que entrava por debaixo da porta. Ela se aproximou da cama que ficava em frente a sua e puxou as cortinas desta com cuidado, antes de murmurar ‘Lumus’, apesar de manter a varinha atrás do tecido para não correr o risco de acordar ninguém.

Os cabelos loiros esparramados pelo travesseiro pareciam mais dourados do que pálidos, diferente dos de Draco Malfoy. O rosto, no entanto, trazia alguns traços elegantes que ela reconhecia tanto no colega quanto em Lucius. Agora, como diabos ela conseguira encontrar um tempo e espaço onde Tom Riddle e Abraxas Malfoy eram garotas? Aquela era a única pergunta que surgia em sua mente. Como voltar para casa já havia deixado de ser uma dúvida viável, ela agora se contentava em descobrir como fora parar naquela situação.

E foi enquanto pensava nisso, ainda olhando o nariz discretamente arrebitado e o lábio superior delicado da sonserina adormecida, que Hermione ouviu o farfalhar de cobertas.

“Nox,” a garota murmurou, vendo o rosto de Arantxa sumir na escuridão e puxando a cortina para fechá-la outra vez.

Segundos depois, a luz esbranquiçada do feitiço voltou a iluminar o dormitório, agora vindo da cama ao lado da ocupada por Malfoy. Olhos azuis a encaravam com cuidado enquanto Thomasin Riddle espiava por entre as cortinas de veludo verde. O rosto pálido parecia uma aparição no meio da escuridão.

“Precisa de algo?” a menina perguntou. Havia um toque de agressividade em sua voz, algo que Hermione esperava ouvir no chiado de uma gata que tenta proteger a própria ninhada.

“Não,” disse Hermione, ouvindo a sua própria voz vazia.

A bruxa ainda sentia o olhar de Thomasin em suas costas quando voltou a se esconder em sua cama, pouco antes da luz pálida da varinha se apagar novamente. Hermione respirou fundo, sentindo algo em seu estômago se revirar enquanto voltava a se deitar.

 


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Notas finais do capítulo

"Agora, como diabos ela conseguira encontrar um tempo e espaço onde Tom Riddle e Abraxas Malfoy eram garotas?" A senhora encontrou um ficwriter entediado no meio do caminho.



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