O Sexta Feira escrita por Miss Krux


Capítulo 35
Capítulo 35 - Trocar segredos




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O dia apontava no horizonte há algumas horas, Verônica foi a primeira a acordar, as lembranças ainda estavam frescas em sua memória, causando certo dor de perda e insegurança devido as incertezas, mas como sempre não permitiu-se abalar, ela sobreviveu 11 anos no platô, sozinha, buscando pelo paradeiro de seus pais, lutando a cada dia com os obstáculos da vida e consigo mesma, acreditando que eles estivessem vivos.

Em seu íntimo torcia para que isso não acontecesse novamente, não queria acreditar que depois de todos esses anos o passado estava prestes a se repetir, mas se fosse necessário sobreviver sem Malone, por mais que o amasse com todas suas forças, de corpo e alma, ela assim o faria, naquele momento precisava organizar todos os seus pensamentos, conter os seus sentimentos e buscar os seus instintos, para que fosse capaz de criar aquela criança que crescia em seu ventre, fruto do amor do casal, que jurou para si mesmo cuidar e proteger, como os seus próprios pais um dia fizeram.

A garota levantou-se e não demorou para encontrar o cientista e Jessie no laboratório, estava disposta a ajudar com a nova invenção.

 

Marguerite despertou logo em seguida, ouvindo os passos próximos e as conversas animadas, por alguns instantes pensou que tudo não tinha passado de um de seus pesadelos enfadonho, ou pelo menos era assim que desejava, mas a metade do Oroboros em suas mãos era como um lembrete vivo, que a fez recordar do quão real era toda aquela situação, não demorou muito para todos os sentimentos de culpa e ressentimento voltarem à tona, como se a empurrando e pressionando contra a parede.

Permitiu-se chorar em silêncio enquanto se trocava, por sorte desde a última viagem ao platô haviam abastecido os suprimentos, munições, medicamentos e mesmo as vestimentas, um meio de prevenção, caso tivessem que retornar durante algum período mais extenso para o platô, ideia do Roxton, que obviamente estava certo aparentemente, como sempre.

O pequeno bilhete rabiscado caiu de seu vestido, ela quase havia se esquecido dele, o que no dia anterior lhe causou sorrisos, agora só a levou a mais lágrimas, a gestação fazia parecer como se todos os seus sentimentos estivessem intensos, quase impossíveis de mantê-los, de lutar contra, de deixá-los abaixo da superfície.

Demorou um pouco mais do que o habitual para se recompor e sair do quarto, passou direto pela cozinha, e assim como Verônica, ela também desceu as escadas sem olhar para trás, rumo ao laboratório.

M - Então por onde devo começar?

C - Marguerite? Ahan... Minha cara, eu...

... Bem, não esperava encontrá-la acordada ainda, você está se sentindo bem?

... Digo, tem certeza que não prefere descansar mais um pouco? Ainda me parece abatida.

O cientista parecia surpreso, quase sem reação, como se não soubesse encaixar as palavras adequadas ou em dúvida sobre o que fazer ou não fazer. Preocupava-se com Marguerite, admirava a sua determinação, mas tinha consciência que certas situações era necessário certo tempo talvez.

M - Quanto mais eu descansar, mais tempo eu perderei.

... Se vai tentar construir uma nova máquina de tele-transporte eu quero estar junto, acredito que posso ajudar e sei onde poderá obter algumas peças úteis.

C - É mais do que posso aceitar, se for o que estou pensando.

Challenger já havia pensando na possibilidade que a herdeira estava prestes a sugerir, mas usar o automóvel dela, o qual tinha conhecimento do seu carinho pelo objeto, pensou que não seria justo, pelo menos não partiria dele a proposta.

M - Pois então aceite Challenger, um automóvel no meio da selva de nada adianta, só irá atrair mais predadores ou curiosos, como se já não tivemos problemas demais para resolver.

... E se existe alguma peça que seja útil, faça, desmanche, monte, remonte. Faça o que você faz de melhor, invente. Se isso ajudar a nos levar para casa, ele é todo seu.

C - Eu acredito que sim Marguerite, que pode ter algo que vá nos ajudar.

 

Verônica observando o diálogo entre os amigos, caiu por si, foi então que percebeu que todos estavam tão entretidos com a ideia de retornar a Londres e inclusive ela mesma, que não pensaram em nenhum momento no presente. Ainda que construísse a máquina e obtivessem êxito, até acontecer, possivelmente desempenharia mais tempo do que imaginavam.

V - Espere um pouco, nós não estamos pensando em tudo, antes de qualquer coisa, temos que ter a consciência de que isso pode demorar mais do que gostaríamos, principalmente você Marguerite.

M - Quer dizer, ficarmos pressos novamente aqui?!

É ... é possível, com a sorte que temos, parece que terei que criar meu filho entre homens macacos e lagartos pré-históricos.

C - Ora minha cara espere um instante, acredito que com a experiência que adquirimos nos últimos anos, mesmo que tenhamos que enfrentar mais algum tempo neste platô, saberemos lidar melhor com as futuras adversidades.

V - Isto mesmo professor, e enquanto permanecemos aqui, eu tive uma ideia, que acredito que possa nos ajudar também.

... Comigo e com Marguerite nesse estado atual, não acho que poderemos e nem devemos sair das proximidades da casa da árvore, mesmo depois quando as crianças nascerem, durante os primeiros meses será arriscado.

... Challenger, não me entenda mal, mas você não tem muita experiência com caça, nem a senhora Jessie e sem os rapazes por aqui, nós somos em quatro, eu e Marguerite possivelmente estaremos nos alimentandos por dois, ou seja, é como se fossem seis pessoas, os suprimentos não irão durar por muito tempo.

... Ainda está cedo, eu e você podemos ir até a aldeia de Zanga, posso pedir ajuda a Assai, para que nos forneçam pelo menos um de seus guardas e um de seus caçadores, enquanto isso, vocês duas permaneçam dentro do perímetro da cerca elétrica, se concordarem, acho que seria interessante a senhora Jessie aprender a atirar e no momento Marguerite, você é mais indicada para isso.

Acerca do plano que Verônica propôs havia muito a que pensar, desde o dia anterior, após o retorno à casa da árvore nenhum deles questionou-se sobre os próximos passos a traçar, bem verdade, voltaram toda a sua atenção tão-somente a nova invenção e nada mais, esqueceram-se por completo do lugar que estavam, talvez ainda estivessem confusos demais sobre os últimos acontecimentos. Mas por hora, a ideia da garota era tudo o que tinham, e a mais coerente e sensata também.

C - De fato, acho justo que tenhamos que adotar tais medidas, irei organizar meus equipamentos e em 30 minutos saímos Verônica.

M - Ótimo, se conseguirem, volte antes do anoitecer, a cerca elétrica estará ligada, também deixarei o elevador travado e por prevenção, estarei de guarda.

... Senhora Jessie, assim que saírem, daremos início as aulas de tiro, vou preparar um café, hoje será um longo dia.

Jessie - Certo, eu a ajudo com o café e no que mais for preciso.

V - Também estarei subindo com vocês, uma ajudando a outra, pode ser tudo mais rápido.

 

—--//---

 

Ned - Isso é loucura, vocês têm ideia do que estão sugerindo?

J - Eu concordo, ninguém vai acreditar nessa história.

L.Garson - Não se tivermos os argumentos corretos, provas o suficiente e senhores forem convincentes.

L.Hang - Exatamente Doutor Garson.

... Lord Roxton e o Senhor Malone, creio que carregam tal concepção porque ainda não possuem conhecimento concreto de todas as nossas investigações, como sabe, elas iniciaram enquanto estavam perdidos no platô, não tivemos muito tempo para conversarmos ou esclarecer quaisquer dúvidas sobre, com toda esta perseguição, digamos que o “relógio” não nos favorável.

Garson consultava o horário, já era madrugada, muito provavelmente o departamento estaria mais vazio agora do que qualquer outro momento, ele ainda teria que desarquivar os registros do caso Krux e discorrer a próxima manchete, optou por ele mesmo fazer, talvez com o auxilio do Malone, mas para que isso fosse possível, demandaria certa disponibilidade de tempo.

L.Garson - Doutor Hang e Detetive Hugo, os julgo plenamente capazes de orientar os civis daqui em diante, como sabem preciso anexar novos argumentos pertinentes ao caso, e para tanto, estou requerendo a sua colaboração Donald, vez que, parece tão envolvido quanto os demais presentes, ou seja, mais do que capacitado para me auxiliar.

... Por via das dúvidas, estarei levando comigo a chave da saída extra dos fundos e terão outros inspetores nas proximidades, entendo que não irão fugir e acredito piamente em vocês, mas tenho também uma reputação e um cargo a prezar, portanto, prefiro não arriscar, além disto, tivemos problemas demais por um dia.

... Até mais tarde senhores, qualquer dúvida, podem interfonar na sala de arquivos ou no meu gabinete.

Assim que a porta fechou por detrás dos homens mais velhos, John e Malone não perderam tempo, encurtaram o espaço entre eles e os investigadores o quanto antes, não que fossem arrumar novas confusões, mas ambos tinham certeza que muito do que estava acontecendo ali, os outros dois tinham uma certa relação e por óbvio escondiam muito mais do que haviam falado.

J - Então qual dos dois começará a falar?

L.Hang - Eu farei, mas dispenso as agressividades, se o quisesse morto, já o teria feito, até porque eu não compartilho com meu irmão Shangai Xan apenas o sobrenome, mas também toda a criação. Sendo assim, é desnecessário sua atitude.

... Vamos, sentem-se os dois, irei explicar o que tem acontecido, mas se colaborar apenas.

Ned - Espera, você é irmão do Xan?

L.Hang - Exatamente senhor Malone, 04 anos mais novo que ele para ser preciso, mas podemos contar essa história em uma próxima ocasião.

... Como sabem ou imagino que presumam pelo menos, Lady Elizabeth Roxton nos contratou há algum tempo, acontece que, encontramos muito mais do que o paradeiro de vocês e do meu próprio irmão.

... Me diga Roxton, lembra-se por um acaso de quando tinha aproximadamente 07 anos e os seus pais visitavam Londres, mais especificamente a casa de um casal próximo a família de vocês, e de uma garotinha que você e seu irmão brincavam as vezes.

John parecia confuso com aquele questionamento, ele lembrava-se muito vagamente daqueles momentos quando criança, mas de qualquer maneira, o que isso importava, pensava que nada tinha relação ao caso em si.

J - Posso talvez me lembrar, mas e daí, o que isso tem a ver?

L.Hang - Sua mãe me alertou que isso aconteceria, mas tendo em vista que não temos muito tempo e que assim que sairmos daqui você terá uma conversa mais detalhada com a Lady Roxton, já que são assuntos de família, eu não irei me estender muito e irei direto ao ponto.

... A mesma garotinha que brincava era Marguerite, a afilhada que um dia seus pais choraram pela perda era Marguerite, a família que meu irmão assassinou cruelmente era a de Marguerite, todas as minhas investigações me levaram a Marguerite, portanto, tudo o que aconteceu hoje, foi por conta de Marguerite, ou seja, o passado e o presente possuem mais relações do que você imaginava.

... Compreende melhor do que estamos tratando aqui?

O lord ficou boquiaberto, tanto como Malone, ao seu lado, ainda que Roxton sabia a respeito das investigações, dos registros que a sua mãe obteve sobre o passado de Marguerite, não imaginou que fosse tão longe, muito além de suas expectativas, e outra, o que significava tudo aquilo que o investigador estava apontando.

J - Impossível, eu ... Marguerite ... é...

L.Hang - É verdade, veja com seus próprios olhos já que não acredita no que estou contando, tome, pegue, estes são todos os documentos que obtivemos acerca da sua esposa.

... Antes de qualquer plano que tenhamos, talvez seja recomendável conhecer um pouco mais sobre ela, ou relembrar eu diria.

 

—--//---

 

M - Pronta?

Jessie - Sim.

M - Ótimo, quero que preste atenção ao seu redor, sinta o que te cerca e também o solo sobre os seus pés, mantenha a posição, se for destra, o seu pé esquerdo sempre terá que permanecer levemente aberto para fora, quanto a arma não esqueça, não basta apontar, precisa oferecer um apoio com a outra mão livre, caso contrário, por conta da pressão do gatilho e do disparo, a bala é leve, poderá “subir”.

... E o mais importante não é só mirar ou apontar, visualize o alvo, e não...

Jessie - Tenha presa, temos todo o tempo do mundo.

M - Como sabe disso?

Jessie possuía conhecimentos sobre pontarias e tiros, quando ela e a Lady tiveram total ciência do perigo que se submeteriam, ambas aproveitando o espaço da propriedade de Avebury, contrataram instrutores particulares que a ensinaram as melhores táticas sobre o assunto, por isso a familiaridade.

Era verdade que mais uma vez cometeu um erro, outro de comentário infeliz, e se Marguerite já estava desconfiada, isso só agravou a sua atual situação com a herdeira. No entanto, depois de todos os acontecimentos, não lhe restava outra opção senão revelar todos os seus segredos, além do mais, tinha consigo a concepção de que, a partir de agora dependeriam uma da outra, conviveriam mais tempo juntas e tratando-se do lugar que se encontraram, faria o que julgava necessário, antes hoje, do que mais tarde.

Jessie - Eu aprendi junto com a Lady Roxton.

M - Porque será que isso não me surpreende?!

Jessie - Porque você é tão perspicaz quanto a sua mãe, e tão astuta como o seu pai.

M - E o que sabe sobre quem eu sou ou deixo de ser?!

... O que sabe sobre os meus pais?!

Jessie - Eu e a Liz sabemos tudo sobre você, e sobre eles também.

M - Liz?!

Jessie - Reconhece não é mesmo? Já ouviu este nome antes?

M - Talvez.

... É um nome comum como qualquer outro, pode ser que já tenha escutado aqui ou ali, apenas isso.

Jessie - Claro, ou talvez é o que queira acreditar, o que pretende falar para sim mesma.

... Não precisa ser assim Marguerite.

 

Ela aproximou-se da herdeira, o quanto julgava apropriado, a mulher mais jovem a encarava como nunca vez, de tal modo que parecia pronta para se defender, estudava os seus traços, passos e olhares, Challenger avisou que a conversa entre elas não seria fácil, que teria que ter cautela, escolher bem a palavras e suas atitudes. A alertou sobre o seu gênio incrivelmente e assustadoramente analítico.

Marguerite em contrapartida recuou do seu toque, tantas perguntas rodeavam seus pensamentos, e agora mais estes, era verdade, o nome “Liz” soava familiar, como um chamado jogado ao vento ou um soprar da brisa, nada mais além disto. Por toda a sua vida ela buscou saber sua origem, suas raízes, quem ela era, sobre os seus pais verdadeiros e não compreendia como a esposa do homem que tanto admirava, que carregava um amor paterno, como ela poderia saber tanto de si.

Jessie - Eu sei o que deve estar pensando, acredite eu sei.

... Mas antes de pensar qualquer coisa, deixe-me explicar o que está acontecendo aqui, por favor.

M - Se eu permitir que faça o que está propondo, o que me garante que seja verdade?

Jessie - As provas que eu tenho são as minhas garantias.

... Como por exemplo, eu sei do seu relicário, que possuí com tanto carinho e cuidado, e imagino que Marguerite, a escolha do nome tem sido por conta dele, é uma das poucas recordações dos seus pais.

... Assim como sei cada palavra gravada nele:

“Para a nossa querida Marguerite, sempre em nossos corações”.

M - Anne pode ter falado isso para você ou mesmo o Challenger.

Jessie - Talvez, mas nenhum deles jamais aproximaram-se do seu relicário, o que dirá toca-lo e ler as escritas, talvez nem Lord Roxton tenha feito.

...Ou estou errada sobre?

M - Não, ninguém se aproxima das minhas joias, nem mesmo o John.

Jessie - Então como eu saberia disso?

M - Eu ainda não sei.

... Mas continue falando, acho que podemos trocar segredos Jess.

 


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