A Criança do Labirinto escrita por Daniela Lopes


Capítulo 11
Fuga


Notas iniciais do capítulo

Cansada das decisões arbitrárias do Rei goblin, Helen toma uma decisão que pode colocar sua vida em risco.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/797624/chapter/11

 

Helen voltou ao jardim no dia seguinte e continuou com seus cuidados às plantas de Hoogle. Fadas e outros seres ficavam ao redor dela, perguntando coisas, contando aventuras ou simplesmente ajudando a mulher a mexer na terra. Ninguém percebia que às vezes, uma coruja pousava numa coluna próxima e permanecia ali, observando a moça.

            Também era possível ver Jareth escondido, observando Helen cuidar do jardim. Os servos percebiam-lhe a presença, mas eram proibidos de fazer alarde disso, enquanto Helen confidenciava que sentia falta de Jarod, que tinha medo do Rei goblin e de seu temperamento, mas acima de tudo, estava ansiosa por tocar no bebê assim que nascesse.

            Cansada, Helen avisou aos companheiros que precisava repousar e saiu dali rumo ao quarto, onde lavou as mãos, tirou a roupa suja de terra e colocou um tipo de camisola, deitando-se em seguida. Adormeceu minutos depois sem perceber que Jareth estava em seu quarto.

Ele avaliou a mulher adormecida e aproximou-se da cama. Ela respirava calma e profundamente e Jareth inclinou-se em sua direção. O perfume que ele conhecia da pele dela veio até ele e aqueceu seu rosto. Ele sussurrou para si:

—Seria tão mais fácil...

Então ele beijou-a docemente, movendo os lábios sobre os dela quase como o sutil toque de uma pena. Ela suspirou na boca dele e Jareth sumiu no ar, deixando o quarto. A curandeira atravessou a porta e olhou Helen adormecida:

—Ah, menina... Quem sabe como isso vai terminar? Se ele ao menos...

Maria estava regando alguns vasos de flores que recebera de presente de Hoogle, quando ouviu o farfalhar de uma capa atrás de si. Ela virou a cabeça e se deparou com Jareth ali, olhando-a com o rosto pálido, mas os olhos em brasa. Ela abandonou o que fazia e caminhou até o filho:

—Jareth?

Ele andou dois passos e caiu de joelhos, desesperando-a:

—Meu filho?

Ele abraçou-a pela cintura e afundou o rosto na saia do amplo vestido que ela usava. O corpo dele foi sacudido por fortes soluços e Maria ajoelhou-se junto dele, abraçando-o, assustada:

—O que aconteceu com você? Meu querido! Conte pra mim o que...

Mas o choro silencioso do Rei goblin é a única resposta que a mulher recebe.

A noite chegou ainda tempestuosa. Maria estava ao lado de Albert e ambos velavam por Jareth, deitado em sua cama, profundamente adormecido. A curandeira foi chamada e Maria pediu:

—Tem algo que possa fazer por ele? Jareth nunca esteve assim...

 A criatura avalia o rosto dele e suas mãos:

—Não posso curá-lo desse mal, senhora...

—Que mal?

—Sua porção humana.

            Maria exclama e abraça Albert com força. O falso conde fala:

—Talvez Helen possa fazer isso...

            A curandeira balança a cabeça:

—Não conte com isso! O Rei foi... Duro com a moça e...

            Maria balança a cabeça:

—Oh! Esqueça... Isso não vai se resolver de uma hora para outra... Obrigada por vir aqui.

            A criatura de inclina e sai dali rumo ao quarto de Helen. No trajeto, Maddy, Hoogle e outro duende esperavam a curandeira cheios de perguntas. Hoogle foi o primeiro:

—Então?

—O quê?

—Como ele está?

—Dormindo.

—E a senhora Maria?

—Preocupada como uma boa mãe ficaria.

            Hoogle balança as mãos:

—Bah! Não tem nada de movimento aqui! Vamos embora!

            A curandeira começa a rir enquanto andam para longe dali e no quarto de Maria, Jareth desperta devagar. Ele olhou ao redor e viu sua mãe sentada, olhando o horizonte chuvoso pela janela. O Rei sentou-se na cama e perguntou:

—O que houve? Porque estou aqui? Na sua cama?

—Você desabou...

—Eu...?

            Albert aproximou-se da cama e ofereceu uma taça de água, mas Jareth se recusou. Maria seguiu até ele e tocou sua face:

—Precisa resolver isso, meu querido. Eu tenho medo que seus sentimentos machuquem você ainda mais...

            Jareth se descobre e sai da cama. Ele apanha a capa sobre uma cadeira e fala secamente:

—Não se preocupe, mãe. Não vai acontecer de novo. 

            E sai dali a passos firmes sem olhar para trás, aborrecido por ter fraquejado diante de seus súditos, logo ele, um rei cheio de poder e orgulho. Quando chegou ao salão do trono, mandou chamar todos os duendes, goblins e fadas que habitavam o castelo e anunciou:

—Estão proibidos de deixarem seus afazeres para ficarem pajeando a mulher. O tempo dela nesse castelo é curto, então não quero que criem nenhum vínculo com ela.

            Hoogle ergue a mão e Jareth suspira:

—Fale, Dooble.

—É Hoogle, meu senhor.

—Está registrado. Mais alguém?

—Ainda não falei nada, Rei Jareth!

—Então fale logo!

—Eu não acredito que isolar a mulher possa ser algo... Correto! Acho que...

            Jareth se levanta de seu trono, visivelmente zangado:

—Vai discutir a decisão de seu mestre? Acha que não sei o que estou fazendo?

            As criaturas se curvam, silenciosas e assustadas. Seu rei estava realmente mudado e deixara de ter o senso de humor peculiar ao qual estavam acostumados. Diante de sua nova postura, era sábio não aborrecê-lo. Então Jareth sentou-se e bufou:

—Estou cansado! Me deixem em paz!

            Visivelmente chateados, os seres do castelo deixam o salão e desaparecem dos corredores e salas, tornando o lugar deserto e silencioso. Helen despertou com a serva Bone e a curandeira sentadas, silenciosas, ao lado da cama.

            Bone chorava baixinho e a curandeira afagava seu ombro com carinho. Helen sentiu a aura delas e o estranho silêncio ao redor:

—Eu... Perdi alguma coisa? O que houve?

            A curandeira, cujo nome era Bedra, sorriu sem graça:

—Ah... Nosso amado rei está de... Mau humor. Ele ordenou que os servos do castelo parem de importunar você e...

            Helen desce da cama e sai para o corredor. Não havia o movimento diário de criaturas barulhentas, encardidas e confusas que normalmente enchia cada canto daquele lugar. Era opressivo o silêncio que tomava conta do lugar e Helen sentiu o peito doer. Ela saiu dali a passos largos, punhos fechados e o rosto em brasa. Seguiu rumo ao salão do trono e ficou frente a frente com o Rei goblin.

            Ele ergueu os olhos para ela e sorriu, desdenhoso:

—Ora! A que devo sua inusitada visita?

            Ela estava descalça, cabelos despenteados e trajando camisola, mas não se importou:

—Você... Ordenou que ninguém desse castelo pode se aproximar de mim? Está... Me isolando?

—Estou protegendo a cabecinha fraca deles... Podem acabar se apegando a você e quando for embora, vai partir o coração deles!

            Helen anda de um lado a outro, furiosa:

—Ora, que generosa é sua intenção de protegê-los de mim! Seu autoritarismo só não é maior que sua arrogância! Como ousa decidir por eles? Como pode decidir o que devem ou não sentir? Logo você que...

            Jareth inclina a cabeça e fala:

—Seu tom me diz que está falando mais por si do que por eles...

            Ela para de andar e encara o rosto dele:

—Também falo por mim... São eles que estão me ajudando a não enlouquecer nesse lugar... Talvez não aprecie a companhia deles, mas eles o respeitam, admiram e temem de uma forma inexplicável. Maria me contou sobre o que aconteceu com vocês dois e agora vejo que é um...

            Helen morde o lábio para se impedir de falar alguma palavra mais ofensiva. A raiva que sentiu fez com que ela saísse dali rumo ao quarto e fechou a porta. Ela aproximou-se de Bone e segurou as mãozinhas dela:

—Preciso que me ajude! Tenho que sair desse lugar ainda hoje!

—Perigoso! Mestre fica bravo!

—Não me importa! Quero sair pelo Labirinto! Sei que tem uma passagem lá e posso tentar. De lá, peço ajuda para voltar ao meu mundo!

            A curandeira entrega um lenço encardido e velho para Helen e diz:

—Se vai mesmo tentar, amarre isso em seu pulso. Quando estiver na floresta, ela vai te proteger dos perigos que habitam nela.

            Helen troca a camisola por um vestido mais grosso, coloca uma manta nos ombros e calça botas quentes. Abraça Bedra e murmura:

—Obrigada por tudo!

            A criatura afaga os ombros de Helen e sorri:

—Tem certeza disso?

—Eu não posso deixar meu filho nascer num lugar assim! É insano!

—Boa sorte, querida!

            Bone puxa a barra do vestido de Helen:

—Vem! Antes que o mestre procure você!

—Depois de nossa conversa, duvido que ele queira me ver hoje... Vamos embora!

            Elas seguem por um caminho que Helen não conhecia ainda, mas confiava na serva. Chegaram num nicho mal iluminado e Bone tocou em algumas pedras na parede, abrindo uma pequena porta que acessava um corredor do temido Labirinto de Jareth. Helen saiu e a duende entregou-lhe um pedaço de raiz enrolado:

—Leva isso... Diga que quer ir para a floresta e ela dizer qual direção seguir aqui dentro... Raiz faz parte da floresta e quer voltar pra lá. Quando sair do Labirinto, enterra ela no caminho com gratidão!

            Helen sorri e recebe a prenda, abraçando Bone em seguida:

—Obrigada por tudo!

            Bone ri e coça a cabeça:

—Helen é bonita e tem bom coração. Eu gosto disso!

            A jovem mulher ri e entra no labirinto, tendo a porta fechada atrás dela. Caminhou por algum tempo e segurou a raiz com ambas as mãos, olhando para ela, falou confiante:

—Como você, eu desejo voltar para a floresta!

            A raiz estremece nas mãos de Helen e a haste seca e enrolada se move devagar, serpenteando e movendo sua ponta na direção que Helen deveria seguir. A cada curva de corredor, a haste se movia para a direção seguinte, fazendo a moça avançar. A claridade do dia, em alguns pontos, era substituída por sombra densa que deixava Helen com medo. Ela ouvia sons estranhos, risadinhas distantes, passos rápidos atrás dela, mas não podia recuar. Precisava sair dali e chegar ao seu mundo, para depois pensar como cuidaria de seu filho longe da loucura do Rei goblin.

            Por quanto tempo caminhou entre os corredores ela não soube precisar. Parou por um tempo e falou:

—Raiz! Preciso descansar um pouco.

            A haste retesou-se e enroscou na forma antiga, como se adormecesse. Helen guardou-a no decote, sentou-se no chão empoeirado, encostou-se na parede e respirou fundo. Gostaria de saber quanto faltava para escapar dali, mas pelo momento, tomaria fôlego e seguiria quando tivesse mais descansada.

            Quando abriu os olhos, anoitecera e o labirinto estava mergulhado em trevas e numa estranha névoa que avançava. Ela tirou a raiz do decote e falou:

—Como você, eu desejo voltar para a floresta!

            Mas a raiz não se moveu, permanecendo enrolada como antes. Helen suspirou:

—Talvez a luz do dia seja o que a faz funcionar também. Agora estou por minha conta...

            Analisou o local onde estava e refletiu que, se tentasse andar às cegas, poderia colocar a perder todo o caminho percorrido sob a orientação da raiz mágica. Sentou-se e fechou os olhos:

—Melhor esperar a claridade e continuar. Não posso me arriscar sem...

            Súbito, ela ouve ao longe um estranho uivo. Não pertencia a nenhum animal que conhecia e ela ergue-se de uma vez, tocando a barriga:

—Céus! Que som foi esse?

            Atenta, ela ouviu batidas fortes que reverberavam ao longo do Labirinto até chegar onde estava. Ela recuou alguns passos e pensou:

—De onde está vindo? Parece estar em todo lugar! Oh, Deus! Eu estou sozinha aqui!

            Naquele momento, Helen arrependeu-se de tentar fugir através de um caminho desconhecido num mundo desconhecido. Tateando a parede do corredor, buscou um nicho ou fenda para se proteger, mas nada oferecia abrigo da possível ameaça. Ela apurou os ouvidos e esperou. Então ela escutou um chiado e um arrastar pesado, vindo da sua direita, a direção de onde tinha iniciado sua caminhada. Sem saída, correu dali na tentativa de ganhar distância e descobrir como escapar daquele lugar.

            Então ela ouviu o som de algo subir as paredes do corredor e ficar no alto, de onde podia ver além. A coisa arfava e chiava e Helen sentiu o sangue gelar. Ouviu toda a sorte de história dos perigos escondidos no Labirinto e ali estava ela, pronta pra se tornar parte dessas histórias.

Quando não conseguiu mais correr, encostou-se ao máximo contra a parede e prendeu a respiração. A coisa arrastava-se por cima do paredão e cheirava o ar, procurando Helen. Então saltou a poucos metros da moça e virou-se na direção dela.

Continua...

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Jareth está cada vez mais perdido em seu próprio antagonismo. Helen se sente envolvida pelas criaturas do Labirinto e a possibilidade de ficar isolada delas enfurece a jovem mulher. Contando apenas com o apoio das criaturas e com a sorte, se lançou numa perigosa aventura. O que há escondido entre os muros do intrincado labirinto?



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Criança do Labirinto" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.