(eu reconheci) minhas cores nela escrita por Martell


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Então galera, minha última fic para esse projeto incrível que é o November Hinny.

Não saiu exatamente como eu queria, mas saiu e é isso que importa.

Não foi revisada, então perdão pelos possíveis erros, e é isto, espero que vocês gostem!

Ah, e tem uma coisa que pode ser gatilho (vou explicitar nas notas finais) na parte i. para que ninguém leia algo que possa fazer mal.



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Tom Riddle

Harry e Ginny se conheciam desde sempre. Moravam na mesma rua, frequentavam a mesma escola, seus pais eram amigos de décadas. Eram tão grudados que ouviram durante a maior parte de seus anos formativos que eram gêmeos de famílias diferentes ou, para o horror dos dois, que iriam namorar.

O primeiro ano em que passara no internato na Escócia sem Ginny fora um dos piores da vida de Harry, portanto, estava disposto a compensar o tempo perdido com sua melhor amiga assim que ela entrasse em Hogwarts.

Por isso que notara antes de todos quando começara a desaparecer com uma frequência alarmante, chegando até mesmo a ignorar os planos que havia marcado com ele ou Luna. Inicialmente ficara magoado com a atitude de Ginny, mas havia colocado todo o seu foco em descobrir o porquê estava agindo dessa maneira e só depois analisar se valia a pena se chatear sobre a situação.

E quando viu exatamente o que a amiga estava fazendo não teve capacidade de permanecer irritado. Na verdade, sua capacidade cognitiva fora drasticamente reduzida ao encarar o sorriso brilhante de Tom Riddle.

Tom era um dos estudantes mais populares de Hogwarts e era fácil saber porque: inteligente, educado, gentil com os outros colegas, sempre disposto a ajudar quem precisasse, monitor-chefe e tão bonito que parecia irreal. Harry, entrando na puberdade, não entendia completamente o porquê sempre sentia frio na barriga ao redor do garoto mais velho.

O que estava acontecendo era que Ginny estava com dificuldade em algumas matérias e Tom, sendo o melhor aluno em quase todas, havia se voluntariado para ser uma espécie de tutor extraoficial. A única coisa que pedira foi que não contasse a ninguém sobre as aulas e que se encontrassem em salas abandonadas no lugar da biblioteca.

Claro que Ginny havia dito sim, sem pensar duas vezes. Se o rosto corado da menina fosse alguma indicação, jamais deixaria passar a oportunidade de um tempo a sós com o garoto. Harry não conhecia ninguém que o faria.

Quando Riddle perguntou se queria ajuda em algo disse um sim gaguejado, tão vermelho que achou por um segundo que ia passar mal. Quando pediu, também, para que não comentasse com os outros nem mesmo questionou a decisão.

E foi então que Harry e Ginny se viram se encontrando com o monitor em horários alternados e se juntando tarde da noite para comentarem sobre como Tom era prestativo e talentoso, rindo e corando. Foi Ginny que apontou que talvez sentissem algo pelo garoto mais velho e a partir de então começaram a criar cenários onde a paixonite dos dois dava em algo mais sério.

Era claro que sabiam que nada aconteceria, ambos eram crianças praticamente, e mesmo que se não fossem havia o problema dos dois gostarem dele. Mas isso não importava, já que Riddle não os olharia com algo além de repulsa se soubesse dos sentimentos que haviam desenvolvido – pelo menos a Harry, que mesmo estando em paz com o fato de gostar de garotos e garotas como seu Tio Moony, sabia que nem todo mundo aceitava pessoas como ele.

O motivo de Tom pedir por silêncio e isolamento se tornou claro quando, nas lições, ele começou a tocá-los com mais frequência e ficar cada vez mais próximo. Inicialmente haviam ficados felizes, afinal ele estava os notando! Porém, com o tempo, só ficavam cada vez mais desconfortáveis com os olhares e toques sem permissão.

Nenhum dos dois sabia o que fazer. Era como se o sonho inocente na forma de um homem bonito, gentil e mais velho houvesse se transformado em um pesadelo abruptamente. Ginny havia pedido para cessar as aulas, mas de alguma forma Tom a havia convencido a continuar. Harry continuava deslumbrado, de certa maneira, repetindo para si que estava interpretando tudo isso de forma errada. Mesmo assim, quando Riddle o abraçara de maneira intima demais na última lição, sentira como se fosse vomitar.

O dia em que Ginny se trancara no banheiro feminino chorando porque Tom havia tentado beijá-la, Harry decidiu que tinham que colocar um final nisso, o que quer que isso fosse. O problema é que não tinham provas, nada além da palavra de dois pré-adolescentes de 12 e 11 anos contra a de um garoto de 18 anos, respeitado pelos professores e admirado pelos alunos.

Mas a intervenção de Harry não fora necessária quando Myrtle Warren, uma aluna do quinto ano, foi encontrada em uma situação lastimável e as investigações apontaram para o envolvimento de Tom. Harry e Ginny chegaram a conversar com o diretor sobre o que havia acontecido com eles, implorando para que ninguém soubesse da história deles com Riddle, envergonhados demais para encarar o julgamento dos amigos. Já bastava os seus pais terem sido informados.

Quando um diário foi encontrado nas coisas do garoto descrevendo coisas absurdas e horríveis, com direito a fotos assustadoras e reais, Tom Riddle foi expulso e condenado.

Prometeram nunca mais tocar no assunto e assim o fizeram durantes muitos anos.

Cedric Diggory

Todo o fiasco com Riddle servira apenas para os aproximar ainda mais – e os deixarem aterrorizados de confiar em estranhos com boas intenções, além de inseguros em relação a capacidade de reconhecer situações de perigo, mas preferiam não pensar nas consequências desse pequeno lapso de julgamento por parte de ambos.

Desde então ninguém havia capturado o olho de Ginny e Harry ao mesmo tempo. A menina sabia que eram jovens, ela mal havia completado 13 anos, mas todas as garotas estavam conversando sobre seus primeiros beijos e, assumindo com base nas reclamações do amigo, os meninos também. Era como se todos estivessem prontos para relacionamentos, menos eles.

E foi aí que encontraram Cedric Diggory no verão e o mundo de ambos virou de cabeça para baixo.

Já conheciam Cedric. Ele morava no mesmo bairro que os Weasley e os Potter, além de também frequentar Hogwarts, estando dois anos na frente de Harry. Mas os Diggory não eram próximos das outras famílias e o garoto mais velho circulava em um círculo social muito distante do de Harry e Ginny.

Mesmo assim, Ginny gostava do garoto. Não era sua amiga, nem sabia nada dele além do superficial, mas ele parecia tudo o que poderia querer em um namorado. Seus sentimentos não eram profundos, nem nada do tipo, mas as vezes, antes do dormir, gostava de imaginar cenários onde ele a notaria, pequena Ginny Weasley, nada especial, conquistando o garoto de ouro de Hogwarts.

Harry, por sua vez, nunca a havia dito nada, mas era óbvio que seus olhos seguiam o outro nos corredores quase que voluntariamente. Porém isso não significava nada, Harry tinha uma tendência a gostar de qualquer pessoa minimamente gentil e bonita que fosse um bom jogador de futebol, principalmente se essa pessoa pudesse o derrotar.

Aparentemente, Ginny pensou de maneira sarcástica enquanto sentia o sangue todo se acumulando em seu rosto e via Harry gaguejar enquanto falava com Cedric, é só um garoto mais velho, bonito, charmoso e inteligente aparecer que Harry se torna completamente inútil. Quando se viu incapaz de responder de maneira coerente o comprimento de Diggory, continuou pensando, envergonhada, e eu também.

As três famílias estavam indo juntas em uma caravana para um jogo importante da liga nacional. Só os Weasley e os Potter já ocupavam boa parte do ônibus quando se somava aos agregados, deixando Cedric e o pai, Amos, claramente deslocados. O garoto estava sentado sozinho com fones de ouvido e lendo um livro, enquanto o homem havia se juntado à James Potter e ambos começaram uma competição nada sutil de exaltar as virtudes dos filhos.

Harry e Ginny pegaram os últimos bancos e estavam sussurrando furiosamente sobre mais um menino bonito. De certa forma, gostava desses momentos, de poder dividir algo com o melhor amigo dessa forma. Não era como se fossem brigar por uma pessoa, não importava o quão especial. Também era pouquíssimo provável que algo além de uma paixonite se desenvolvesse, menos ainda o garoto retribuir o sentimento de qualquer um dos dois.

Até que Harry, saindo para pegar doces que havia deixado na bolsa junto a mãe que estava no início do ônibus, se desequilibrou e caiu justamente no colo de Cedric. Exatamente como numa cena de comédia romântica clichê, começou a corar e gaguejar desculpas, mas o mais velho apenas sorriu e o segurou firmemente, um tom rosado adorável no topo de suas bochechas enquanto dizia que estava tudo bem.

Foi aí que Ginny sentiu pela primeira vez o monstro furioso em seu peito se rebelando contra a cena fofa a sua frente. Ciúmes como nunca havia sentido dominou todo o seu corpo e teve que desviar os olhos de Harry que ainda estava sentado no colo do outro garoto, como um idiota.

Quando o amigo voltou – sem os doces – um sorriso envergonhado ainda estava em seu rosto e ele só conseguia falar de como os olhos de Cedric eram de um tom de mel único, como ele fora gentil e não o deixara se sentir mal. Como Ced havia dito que deveriam se falar mais dali para frente. Ginny absorveu cada informação como uma esponja, repetindo para si mesma que estava feliz por Harry.

Quando Harry, animado, contou sobre o seu primeiro beijo com todos os detalhes possíveis, apenas sorriu, se negando a deixar a irritação que sentia se estender ao amigo. Harry não tinha culpa de ter sido notado por Cedric e não merecia que ficasse chateada por algo que nenhum dos dois tinha controle. Afinal, Ginny havia repetido inúmeras vezes que não sentia nada demais e que não tinha problema ele aceitar o convite de Cedric.

Parecia que só ela estava ficando para trás.

iii. Nymphadora Tonks 

O término com Cedric fora complicado, mesmo eles só tendo saindo durante alguns meses. Mais uma vez, esse momento de dificuldade servira para aproximar ainda mais Harry e Ginny.

Sabia que a amiga ficara incomodada com seu relacionamento e havia se culpado muito por ter saído com o garoto mais velho mesmo assim, então era um alívio perceber que estavam mais unidos do que nunca. Prometeu para si mesmo que nunca, jamais, gostaria de uma pessoa que Ginny se sentisse minimamente atraída.

Então seu tio Remus trouxe para casa a sua namorada Nymphadora Tonks – me chame de Tonks!— e Harry desenvolveu o seu crush mais inapropriado da vida. E, para piorar tudo, Ginny parecia ainda mais encantado pela mulher do que ele.

Não que alguém pudesse julgá-los, Tonks era simplesmente incrível. Divertida, esperta, brincalhona e muito bonita, ela havia invadido a vida de Remus como um furacão e arrastado todos que o conheciam junto. Não muito mais velha que Harry e Ginny, sempre tinha algo para comentar e seu passatempo preferido parecia ser fazê-los rir.

Ela era prima, de alguma maneira, de Sirius, padrinho de Harry, então ficara surpreso por não ter a conhecido até o momento, principalmente levando em consideração que o homem praticamente morava com os Potter.

Ao contrário de Harry, Ginny ainda não havia realmente questionado a sua sexualidade, então a mera presença de Tonks desencadeou uma crise que fora evitada até esse momento. A garota passara horas e horas agonizando pelo fato de não ser tão heterossexual quanto havia pensado, mas Harry deu todo o suporte possível para a amiga, entendendo que, diferente dele, estava passando por algumas dificuldades em se aceitar.

Estava feliz por Tonks ser completamente inalcançável, tanto para si quanto para Ginny. Não sabia o que aconteceria com a sua amizade se algo como Cedric se repetisse.

Passaram o verão inteiro seguindo a mulher mais velha como cachorrinhos, passando suas noites juntos discutindo sobre o seu cabelo – não sabiam como o tom de rosa conseguia ser sempre tão vívido – seus interesses – Ginny começara a ouvir uma banda simplesmente para acompanhar a conversa animada de Tonks – seu relacionamento com Remus – eles eram adoráveis juntos, mesmo que Harry tivesse ficado surpreso com a diferença de idade.

Comeram mais potes de sorvete entre si do que a família inteira, lamentando a impossibilidade de Tonks olhar para qualquer um dos dois. Assistiram inúmeras comédias românticas, chorando abraçados com os finais tristes e felizes, projetando todas as suas expectativas nos personagens e reclamando pelo fato de que nunca aconteceria com eles.

Quando não estavam com Tonks, estavam um com o outro. Remus, como era de se esperar, já havia percebido a paixonite das crianças e havia decidido provoca-las levemente de maneira bem humorada, o que só fazia Harry se jogar dramaticamente em cima de Ginny para reclamar do tio ou a menina o arrastar para mais uma pegadinha as custas do homem. No fim do verão, era impossível pensar em Harry sem pensar em Ginny e vice-versa.

Quando voltaram para a escola, os sentimentos foram sumindo com o tempo, mesmo que as vezes Harry sonhasse com cabelo rosa chiclete e Ginny ficasse abraçada com o disco que havia ganhado de presente da amiga mais velha.

iv. Dean Thomas

Após superarem definitivamente Tonks, Harry e Ginny seguiram em frente – ou tentaram. Acompanhou o amigo tendo os seus encontros decepcionantes com Cho Chang, outros nem tão decepcionantes com Susan Bones e, para o seu horror, saindo com George por algumas semanas. Além disso, nada a convencia de que não estava se encontrando com Neville as escondidas, mas nenhum dos dois havia confirmado – e nem negado, no caso de Harry, o bastardo – quando os questionara.

Ela, por sua vez, havia explorado um pouco mais sua sexualidade com algumas meninas e se sentia confortável em se rotular como bissexual. Além disso, havia namorado Michael Conner por alguns meses, mas nada tão sério que a tivesse deixado machucada quando acabou.

E então veio Dean Thomas.

Ginny sabia que Harry era interessado no garoto, da maneira vaga que Harry era interessado em muitos dos seus colegas, mas nunca faria nada sobre isso. Ou era o que preferia acreditar. Sabia que não era nada que iria prejudicar a amizade dos dois profundamente, mas quando se pegou olhando com cada vez mais frequência para Dean, hesitou em comentar com o melhor amigo.

Quando percebeu que ele a estava olhando de volta, sabia que deveria falar para Harry. Mas não falou, afinal, ele nem estava tão interessado assim em Dean, certo? Além do mais, Dean era hétero, então nada poderia acontecer entre os dois de qualquer forma.

Ginny odiava brigar com Harry, porque os dois eram teimosos e orgulhosos, nenhum disposto a ceder um milímetro. E essa briga foi maior do que qualquer uma que haviam tido até o momento.

Porque não era Neville com quem o seu melhor amigo estava se escondendo pelos cantos, era com Dean, que o implorara para não contar para ninguém, por não estar fora do armário. E Harry, como a pessoa leal que era, nem mesmo comentara com Ginny, a pessoa com quem dividia tudo na sua vida. Mas não soubera desse fato durante todo o seu relacionamento.

Quando Dean havia a chamado para sair, só dissera sim e não falara para ninguém. Quando Harry não a cumprimentara no jantar, apenas achou que não a tinha visto. Até notar os olhares nervosos que Dean lançava na direção do garoto, parecendo quase envergonhado. Decidiu ignorar o problema, já que não era possível que seu amigo estivesse realmente bravo.

E foi para Hogsmeade para o seu encontro e tentou não se irritar com Harry passando pelos dois sem nem mesmo olhar na direção do casal. Dean estava claramente desconfortável, mas não pensou muito sobre como o garoto estava se sentindo, focada em sufocar a sua culpa e substituir por raiva.

Uma semana depois Harry continuava frio e Ginny continuava ficando cada vez mais irritada. Sabia que havia errado em não conversar com o amigo – como ele havia feito em relação a Cedric, sempre hesitante com o que você sentia, verificando de novo e de novo se estava tudo bem sair com o garoto— mas ele estava sendo infantil com toda a situação, se recusando a olhar para Dean, com quem dividia o dormitório.

E com isso em mente decidiu enfrentá-lo, com ressentimento e raiva e culpa e medo de perder o seu melhor amigo. Harry, em um show de controle de seu temperamento nada tranquilo, só a deixou fazer as suas acusações – egoísta, arriscando a amizade por besteira, a punindo por ter sentimentos – sem retaliar. No fim, só disse que não era ele que havia arriscado a amizade e que se era isso que ela pensava sobre tudo, talvez fosse melhor se afastarem.

O mês que passou com Dean foi miserável. Harry havia seguido a sua palavra e a cortado de seu círculo e até mesmo Thomas fora afetado – enquanto Ron, Neville e Seamus orbitavam o Potter, o outro ficava olhando os seus melhores amigos com uma expressão de que esperava que fosse acontecer, mas mesmo assim estava decepcionado.

Claramente havia algo na situação que não tinha conhecimento e que apenas os meninos poderiam lhe dizer, mas era orgulhosa demais para ser a primeira a ceder. Mesmo tendo sido a ela a ignorar os sentimentos de Harry, ela quem havia escondido os próprios sentimentos do melhor amigo  e que havia desconsiderado que sua atitude teria consequências que não estava pronta para enfrentar – mesmo com tudo isso, ainda esperava que Harry pedisse desculpas.

Porém, até Seamus, o único que havia dito alguma palavra sobre o assunto com ela, com a percepção emocional de uma cadeira, havia apontado o quão improvável isso era. Segundo o irlandês, todos os que sabiam do que havia acontecido estavam irritados com Dean e que não acreditava que ela ainda estava com ele depois de tudo. Quando perguntara o que esse “tudo” era, apenas deu de ombros e disse para perguntar ao seu namorado. Disse também para agradecer o fato de Ron não entender exatamente o que estava acontecendo.

Tudo ia de mal a pior, sem nenhuma perspectiva de melhora, já que não estava pronta para pedir desculpas. Decidiu ir ao campo de futebol clarear a mente, mas no meio do caminho parou por causa das vozes familiares vindas de um corredor mal iluminado.

— Eu já te perdoei, Dean, mas eu não posso fingir que nada aconteceu, – dizia Harry, o tom de sua voz indicando que estava triste.

— Eu... eu não posso mudar o passado, sei disso, mas eu gosto de você, de verdade, – e esse era Dean, quase implorando, pelo que poderia observar.

— E sua forma de mostrar isso é sair com outra pessoa? – E lá estava a sobrancelha arqueada que sempre tivera inveja, complementando o sarcasmo.

— Ginny é legal o suficiente e você sabe que eu não estou pronto, mas... eu sinto falta da gente, amor, – continuou Dean, se movendo para segurar a mão de Harry, que apenas suspirou.

— Não existe “a gente”. Eu não sou seu amor, – respondeu, puxando a mão do aperto do garoto, – eu não precisava andar de mãos dadas pela escola, eu não precisava de um pedido de namoro público. Mas começar a sair com Ginny? Minha melhor amiga? E achar, por um segundo, que eu continuaria com essa farsa, trairia a confiança dela dessa maneira, por você?

Havia escutado o suficiente. Andou para longe, o mais rápido possível, as palavras de Harry ecoando em sua cabeça até as lágrimas se acumularem em seus olhos. Se tivesse conversado com Harry sobre gostar de Dean teria descoberto tudo antes de se envolver dessa maneira, mas escolhera ignorar a sensação ruim e entrar de cabeça no relacionamento.

Havia acusado o amigo de tantas coisas, da maneira mais hipócrita possível. Ela sabia que ele estava interessado por Dean e ignorara o fato de propósito, porque uma vez na vida ela queria algo só para si.

Harry e Ginny dividiam tudo, eram parecidos em quase todos os aspectos – desde a sexualidade e o time de futebol preferido até o gosto musical e o grupo de amigos. O livro favorito, a comida e a cor preferida eram as mesmas, além de jogarem na mesma posição. E na única vez que pensara que tinha uma coisa que era só dela – sabendo que iria magoar Harry – estava errada.

Mandou uma mensagem que não usava desde um pequeno incidente com Padma Patil, indicando a Harry que precisava dele imediatamente. Estava sendo egoísta e talvez ele nem aparecesse com a forma que vinha tratando o amigo, mas nem 10 minutos se passaram e sentiu os braços fortes e familiares a cercando.

Deixou as lágrimas caírem livremente, assim como pedidos de desculpa. Falou da culpa que sentira ao não falar com ele e ignorar os seus sentimentos, a culpa de querer algo mesmo sabendo que poderia machucá-lo. Em meio aos soluços, confessou que sentia que os dois eram tão parecidos que temia, as vezes, que se fosse necessário escolher, eles sempre escolheriam Harry. Porque se fosse ela, também o escolheria todas as vezes.

Ele a deixou chorar em seu ombro, passando as mãos pelos longos cabelos ruivos, ouvindo seu desabafo sem dizer uma palavra sem ser de conforto. Ginny continuou, pedindo perdão por esperar que ele fosse atrás dela mesmo tendo sido insensível, porque ele sempre colocava a amizade em primeiro lugar e ela não havia considerado, nem por um segundo, que não o faria mesmo tendo errado dessa forma. Perguntou, por último, porque não havia contado sobre Dean quando começara a sair com ele.

— Ele me pediu segredo, porque ele não estava pronto para assumir para o mundo que gostava de homens. Acho que não estava pronto nem para se aceitar, Gin, – disse baixinho, ainda mexendo no cabelo dela, – e eu não poderia quebrar a confiança dele dessa maneira. Mesmo ele sendo um idiota, eu jamais faria isso com alguém. Eu te amo, muito, mas não estava em posição de te falar. Ninguém pode expor um detalhe tão íntimo da vida de outra pessoa sem permissão, é cruel até mesmo considerar.

Continuaram abraçados por mais algumas horas, conversando sobre tudo e nada, tentando remendar o que esse mês havia rasgado. Ginny terminou com Dean, que pediu desculpas profundamente. Harry voltou a falar com ambos, mas não era o mesmo.

Algo havia quebrado e ninguém sabia como concertar.

i. Harry e Ginny

Ver Ginny com Dean havia sido uma das coisas mais dolorosas da vida de Harry, por mais motivos do que havia considerado inicialmente.

Primeiro, estava tão absorvido em seu romance secreto que nem mesmo havia notado que sua amiga desenvolvera sentimentos pela mesma pessoa com quem estava saindo. Segundo, doía profundamente saber que Ginny não havia confiado nele, como sempre fizera, e mantivera que estava gostando de alguém em segredo. Depois, ela havia ignorado a possibilidade real de o machucar, movida por uma insegurança que, mais uma vez, não havia notado.

Não conseguia agir como se não estivesse magoado, pois estava. Racionalizava na sua cabeça que fora apenas um grande erro de todas as partes, mas era impossível deixar de pensar que, dos três, ele não fizera nada de errado e era o que mais estava sofrendo. Nunca sentira tanto ciúmes na sua vida quanto vendo Ginny e Dean juntos. E, para piorar a sua situação, não sabia de quem estava sentindo.

Ginny sempre fora o centro do seu universo, uma constante que nunca precisara questionar. Não importava para onde estava caminhando, era só para o lado que lá estava ela, com seu sorriso radiante, os olhos brilhando com determinação, pronta para encarar o mundo de frente. O arrastando quando ficava para trás, o empurrando quando precisava, o impedindo de seguir se fosse necessário.

Ginny era maior que o mundo. Às vezes, Harry não sabia se tinha espaço o suficiente para ele.

A primeira vez que a vira beijando Dean quisera afastar os dois um do outro brutalmente, arrastá-la para longe, deixar o outro para trás e voltar para o tempo em que eram Harry-e-Ginny. Mas ela havia gritado em sua cara que não se importava com o que sentia, como se Harry não estivesse queimando por dentro simplesmente por não querer machucá-la.

Então não importava se ela havia terminado ou não, porque o problema não era esse. A amiga havia descontado sua frustração e culpa nele, que tentara ao máximo não deixar sua confusão mental atrapalhar o relacionamento alheio. Teria sido tão apenas contar, dizer “seu namorado implorou por uma semana para voltar pra minha cama enquanto vocês brincavam de casinha”, mas ele não era assim. Iria apenas colocar ainda mais lenha numa fogueira que não tinha previsão de parar de queimar.

O arrependimento dela era quase tão doloroso quanto a sua raiva. Eles não eram assim, nunca foram. Mas aparentemente eram iguais até em suas inseguranças. Harry temia não ter um lugar para si ao lado de uma Ginny que ocupava todo o espaço com sua luz. Ela, por sua vez, temia ser deixada para trás, enquanto o resto do mundo o empurrava para subir cada vez mais alto.

Havia muitas coisas não ditas, olhares e toques ignorados ao longo dos anos. Sempre andaram lado a lado, mas talvez devessem ter parado ao longo do caminho e virado um para o outro.

Mas não gostava de pensar nessas coisas, principalmente enquanto tentava restaurar a sua amizade. Gostaria de dizer que não estava hesitando em relação a Ginny, mas estaria mentindo para si mesmo. Não era algo que gostava de fazer, mas havia criado o hábito com coisas relacionadas à ruiva. Repetir que estava tudo bem não concertaria as coisas magicamente, mas havia passado anos dizendo para si mesmo que a via como uma irmã a ponto de quase acreditar nisso.

E mesmo sendo doloroso, manter uma distância segura o ajudaria a colocar sua mente em ordem. Ou pelo menos era o que esperava.

Ginny, por sua vez, não estava nem um pouco satisfeita com a forma como as coisas estavam andando, porém estava com medo de enfrentá-lo diretamente. Lembrava de maneira vívida como o último confronto havia acabado e não estava a fim de repetir o mesmo erro duas vezes. Muito poderia ser dito sobre ela, mas ninguém jamais questionara sua capacidade intelectual.

Era sua culpa Harry estar emocionalmente distante e não pretendia piorar a situação impondo sua presença não solicitada, porém, não pretendia permitir que se afastasse. Um equilíbrio que ainda não sabia como manter, mas estava tentando mesmo assim. Certas coisas valiam a pena o desgaste mental e Harry era uma delas.

Passara as últimas semanas refletindo exatamente o porquê de ter feito tudo o que fez na situação com Dean e não estava nada satisfeita com as respostas que havia chegado. Uma de suas teorias, a mais absurda, era a seguinte: Harry passava boa parte de seu tempo olhando para o garoto, então ao se envolver com ele, isso forçaria o amigo a olhar para ela. Mas eles eram amigos desde sempre, Ginny sabia que não era invisível para ele.

Era verdade que não sabia o que fazer sem a atenção do Potter. Passara a vida inteira se banhando nos olhares carinhosos, na risada calorosa. Harry era o sol e ela voava cada vez mais próximo dele, sem temer a queda que inevitavelmente viria.

Cada dia que se passava sem a presença constante do amigo era agonizante. Sempre soubera o quanto ele era essencial em sua vida, mas nunca havia parado para imaginar o dia em que ele não estaria ali. Na sua mente esse cenário não existia, quase como se fosse contra as leis da física que regiam o mundo – onde Harry estava Ginny estava, sem questionamentos sobre. O seguiria até o fim do mundo, pois nada tinha graça sem a sua presença.

Mas agora se encontrava sozinha. Na verdade, não, ele não a havia deixado, mas a cada segundo parecia que se afastava mais um pouco, cortando os laços que passaram anos forjando. Não podia permitir que isso acontecesse, mas não sabia como impedi-lo sem casar mais dor.

O universo, entretanto, parecia ter outros planos, concretizados na forma de Luna Lovegood.

Harry e Ginny estavam junto aos amigos na beira do lago, fazendo um piquenique sugerido por Luna. Hermione havia apontado que choveria em algumas horas, ao que a outra apenas respondera que então se molhariam. Ninguém a contrariou e o fim de tarde observou os quatro mais Neville e Ron conversando calmamente na brisa gélida que anunciava tempestade.

Quando as nuvens se tornaram mais pesadas e o sol começou a se recolher Hermione foi a primeira a se levantar e partir junto a Neville e Ron, deixando apenas os outros três apreciando a vista dos últimos raios de luz refletindo na água, um silêncio confortável que vinha com anos de amizade.

— Eu era apaixonada por você, Ginny, – disse Luna subitamente, assustando os dois. Antes que pudessem comentar, ela continuou: – e por você, Harry.

Harry e Ginny trocaram um olhar incerto, sem saber exatamente o que responder. A loira, por sua vez, continuou serena, sem nem mesmo tirar os olhos do lado.

— Quando eu era mais nova, eu achava que casaria com um dos dois. Mas eu nunca soube exatamente com qual eu gostaria de casar mais, ­– voltou a falar, dessa vez lançando um sorriso para os amigos chocado, – e então eu percebi que nunca poderia casar com nenhum, porque vocês iriam terminar juntos, eventualmente.

 – Do que você está falando, Luna? – Harry pareceu recuperar a voz, mas seu tom demonstrava o desconforto que o assunto causava.

— É só olhar, suas cores e as de Ginny, elas se refletem e se complementam, – respondeu com toda a certeza do universo, – quando vocês estão juntos é bonito de observar.

— Eu não sei do que você está falando, – cortou Ginny, se sentindo envergonhada e perigosamente exposta.

Gotas fracas começaram a cair, o que fez Luna finalmente se levantar, deixando os dois ainda petrificados em cima do pano de piquenique. Ela não parecia nem um pouco perturbada com o que estava acontecendo e o efeito de suas palavras.

— Acho que vocês nunca precisaram reconhecer suas cores um no outro, elas foram crescendo juntas, afinal, assim como vocês. Não importa, exatamente, mas eu achei que deveriam saber, – começou com um ar de finalidade, ainda sorrindo levemente, – eu adoraria me casar com qualquer um dos dois, mas eu acho que vocês nunca veriam as minhas cores, ou pelo menos não se reconheceriam nelas.

— Luna, você não está fazendo nenhum sentido.

E Harry estava certo. Até mesmo para a amiga não muito convencional a conversa estava estranha demais. Mesmo assim, a loira apenas sorriu, balançando a cabeça levemente como se eles fossem as pessoas falando sobre cores e casamentos aleatoriamente.

— Como eu disse, não importa muito. Eu só achei que vocês deveriam saber. Na verdade, eu acho que vocês já sabem, lá no fundo. E está sendo estranho vê-los tão distantes quando o certo é estarem juntos, – terminou mais decisiva do que ambos já a viam visto ser, e começou a caminhar em direção a escola.

Harry e Ginny ficaram parados sem saber exatamente o que fazer, as gotas leves ainda não preocupantes o suficiente para se apressarem a procurar abrigo. As palavras de Luna preenchiam o silêncio, rodopiando no ar que os rodeava. Era difícil admitir que a amiga poderia estar certa, mais ainda admitir em voz alta e arriscar que o outro não sentisse o mesmo.

— Eu não sei do que ela estava falando, é melhor eu entrar antes que comece a chover de verdade.

Ginny nem mesmo o olhou enquanto se levantava, pronta para escapar do momento e do que poderia estar nos olhos de Harry, caminhando rapidamente para as portas da escola. Mal havia admitido para si mesma que poderia estar apaixonada pelo amigo e agora Luna, de todas as pessoas, jogara na sua cara que deveriam estar juntos. Como se Ginny não soubesse disso, como se cada célula do seu corpo não ansiasse a presença do garoto.

— Gin, ei, espera, – gritou Harry, correndo atrás dela e a segurando pelo braço.

Se olharam profundamente por alguns segundos, ele parecia procurar alguma coisa no rosto dela para indicar a sua próxima ação. Harry nunca fora alguém que fugia dos riscos, apenas pensava se estava pronto para assumir as consequências deles. E iria arriscar bastante coisa se decidisse fazer o que queria nesse momento.

— Não vai falar nada, Potter? – tentou arquear a sobrancelha e falhou, o que fez o garoto rir, liberando a tensão que ambos sentiam.

— Eu não sei o que dizer, Gin, – admitiu, desviando os olhos para os pés, – eu só... esquece.

Não acreditava que iria voltar atrás, mas só de imaginar a rejeição que levaria seu estômago embrulhava. Soltou o braço da menina e se virou de volta para o lago, respirando fundo e sentindo as gotas de chuva cada vez mais fortes encharcarem a sua roupa e lavar a vergonha que sentia.

Ginny sabia que deveria seguir para a escola e esquecer esse momento. Mas estava escuro e chovendo e ninguém estava ao redor, o mundo havia se reduzido a ela e Harry e isso era apenas tão certo. Não conseguiria passar o resto da sua vida se perguntando o que teria acontecido se tivesse tentado. Então puxou Harry e o virou, apreciando por alguns segundos o choque refletido no rosto dele, e o beijou.

Por alguns segundos ele não retribuiu e pensou que havia cometido o maior erro de sua vida, até que os braços tão familiares a seguraram firmemente contra o seu corpo e ela derreteu. O beijo era novo e familiar e perfeito, nada que já tivesse sentido antes. Estar com Harry trazia a sensação única que só conseguia definir como “casa” e nunca pensara que suas pernas ficariam bambas como diziam, mas sabia que ele era o que a estava mantendo em pé nesse momento.

Estavam sem fôlego quando se separaram. A chuva havia engrossado e dificultava a visão, mas não importava pois o braço de Harry estava na cintura de Ginny e as mãos dela estavam entrelaçadas no cabelo bagunçado, testas coladas apenas aproveitando o momento. Passaram anos buscando em outras pessoas – nas mesmas pessoas – o que estava na sua frente. Porque no fim do dia, não importava quem passasse em suas vidas, Harry e Ginny tinham um ao outro, de todas as maneiras que importavam. Inclusive essa.

— Então você sabia do que Luna estava falando, Srta. Weasley, – Harry comentou, dando um selinho rápido, como se não aguentasse a distância entre eles.

— Eu te odeio, Harry, ­– e contradisse o seu argumento o puxando para mais um beijo, dessa vez muito mais longo.

Quando se separaram estavam ofegantes, mas eufóricos. Havia muito que precisavam conversar, Harry ainda estava magoado, Ginny ainda se sentia culpada, mas nada importava agora além de estarem juntos. Teriam todas essas conversas quando voltassem para o dormitório, quando tomassem um banho quente e se secasse. Mas estavam na chuva e apaixonados e pretendiam aproveitar o momento.

(Ginny acabou ficando resfriada graças a isso. Enquanto Harry esquentava a sua sopa, disse com toda a convicção do mundo de que havia valido a pena).


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Notas finais do capítulo

- O gatilho em questão na parte i. é que contém menção a pedofilia (Pessoa de 17/18 anos fazendo avanços em crianças de 11/12 anos), nada explicito, mas ocorre a tentativa de um beijo que enfim, repugnante. Crianças de 12 anos SÃO crianças e ninguém nunca esqueça disso.

Enfim, foi isso pessoal kkkk aceito comentários e sugestões, espero que tenham gostado e até a próxima!



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