Sobrenaturais escrita por Panqueca de Grão de bico


Capítulo 1
Capítulo Um


Notas iniciais do capítulo

Oiii, espero que goste!



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Lauro bocejou. Precisava descansar, mesmo querendo ficar e ajudar tia Lili. Mas simplesmente tinha começado a ficar sonolento, daqui a pouco derrubaria alguma coisa. Assim que falou, ela compreensiva como sempre, entendeu. E que ele não se preocupasse, Juliana, a filha dela, logo chegaria.

 

Sua tia vendia bolos, tortas capcakes, sanduíches, coxinhas, sucos, e refris. Num espaço pequeno de concreto, cobertura de telhas e uma porta de madeira. As paredes recém pintadas, por ele mesmo, porque sempre amanheciam pichadas.

 

O negócio era em frente à uma escola estadual. Logo que Lauro se distanciou dos clientes em pé ao balcão pedindo algo, estava passando perto dos alunos fora da escola escorados no muro ou sentados em bancos de concreto. Ouviu um "psiu", e ignorou.

 

Aquela escola em si não lhe trazia boas lembranças, seu último namorado era dali. Ano passado concluiu o ensino médio. Então, felizmente, não o via mais. Depois que terminaram, passou a ir por outro caminho, agora que já parecia ter passado muito tempo, voltou pelo caminho que era mais curto.

 

Já fazia um ano que não o via. Araniel era o seu nome. Falava muito que queria viajar por aí sem destino, ser nômade, sempre em movimento. De verdade, torcia que tivesse conseguido. Ele, Lauro, continuava como há um ano: vivendo de bicos. Frustrado por estar estagnado.

 

Sem objetivos e emprego fixo. E só com ensino médio não havia grandes chances. Já entrara na faculdade umas duas vezes, e logo desistira. A verdade é que não sabia o que queria ser profissionalmente para o resto de sua vida. Às vezes queria ser muitas coisas, às vezes só ficar em casa jogando. Quando estava com Ara, tinha se animado a ser um eterno viajante. O outro o convidava, e ele dizia sim. Seis meses depois, o relacionamento terminava.

 

Sua família perguntava no início cadê o Ara, depois de um tempo, pararam. Quando ele disse que gostava de garotos, alguns familiares não apoiaram. Mas sua mãe e irmã, sim. Então, Guilherme o primeiro namorado, sofreu um pouco. Esteve presente em jantares silenciosos, demonstração de afeto escondido, um longo tempo para o sogro falar com ele de verdade. E por isso Lauro sentia uma grande gratidão. Eles não eram amigos de se falar todo dia, mas ainda conversavam, curtiam as publicações um do outro nas redes sociais. Foi um bom término.

 

Ara como o segundo relacionamento foi mais tranquilo. Até dormir na casa de Lauro, no quarto, ele pode. Eles não transaram, assim como ele não transou com o primeiro namorado. Porque Lauro não sentia desejo sexual, vontade de transar. Na verdade, Lauro os conhecera num grupo de rede social em que a maioria eram assexuais.

 

Da família, só contou para à irmã, porque a assexualidade ainda é muito encarada como um problema a ser resolvido. E não como uma orientação sexual, uma característica, como o que é de fato. A irmã estranhou no início, porém depois entendeu. O que foi muito bom, porque assim tinha alguém próximo para conversar sobre. Também foi a única pessoa para quem ele contou sobre como foi o término.

 

Após chegar em casa, com a casa silenciosa, se lembrou que a família tinha ido ao aniversário de uma das suas dezenas de primas, Rana. O seu objetivo era descansar, porém quis comer algo antes. Havia arroz, feijão e carne prontos, mas optou por fazer uma sopa. Estava diminuindo seu consumo de carne por uma questão ideológica. A sopa logo ficou pronta e ele a comeu. Sentiu calor e foi tomar banho. 

 

Ainda no banheiro se enxugou e se vestiu. Ao sair, no meio do quarto, estava Ara. Como ele tinha entrado? Apesar de que estava tão lindo quanto a última que o viu.

 

— Você arrombou minha porta, ou eu realmente esqueci de trancar?

 

Ele ainda poderia ser uma alucinação também, sempre era uma hipótese.

 

A resposta dele foi um revoltante e simples "não". Pausa. Sorriso. Sentou-se na cama sem permissão. Disse de modo casual, que havia se teletransportado. Lauro cruzou os braços indignado e foi olhar sua porta: intacta e trancada. Verificou as janelas, uma estava aberta. Ara havia o seguido, e o observava. 

 

— Ei, senti saudade...

— Ah, não vem não, A. Você é quem foi embora.

 

Lauro não conseguiu esconder o tom magoado. E é porque tentava se convencer de que havia superado.

 

O outro pediu desculpas. Alegou não ter tido escolha. Naquele dia não poderia explicar, porém se ele deixasse, hoje ele iria.

 

— É que sinceramente não sei se faz diferença.

 

Lauro foi honesto. Ele foi-se. Disse que queria terminar, que precisa ir. Foi uma escolha. Cada um é livre para fazer o que quiser, e o disse a ele. Então se reservava ao direito de não querer saber. Queria saber há um ano. Não mais agora. 

 

— Desculpe, mas tanto faz. Eu tô cansado, eu vim para casa dormir. Então...

 

Inesperadamente, Ara se ajoelha, e diz "por favor, me deixe explicar, Lau". O ato mexeu com ele. Quis se aproximar e abraçá-lo. Quis tirar essa distância de tempo e física, e só estar junto a ele, perto, sentindo seu cheiro e sua respiração.

 

— Uau, desculpe, não consegui ignorar esse seu pensamento. Também quero te abraçar.

 

Agora Lauro estava assustado. Como assim? Ele estava brincando, ou ele queria dizer que além de se teletransportar, lia pensamentos também? Não ia ser tão fácil brincar com seus sentimentos de novo. 

 

"Se você realmente ouve pensamentos. Saiba: eu ainda o amo."

 

Ara pediu para ele parar. Que Lauro não fazia ideia do quanto era difícil se controlar para não ouvir os pensamentos dos outros, principalmente de quem se amava. 

 

"E você me ama?"

 

— Sim. Não teve um dia que eu não tenha pensado em você, Lau.

 

Lauro o questionou com raiva e confuso, sobre o que deveria pensar. Por que tinha vindo? O que queria de fato? Ou ele estava dormindo e isso era um sonho?

 

— É por isso que não te contei. O ser humano, toda criatura na verdade, tem muitas complexidades. Ser gay ou bi, assexual, é só uma fatia dessa complexidade. Há o sobrenatural, Lau. E não só como ficção. É real.

 

Não soube o que dizer. Sim, nós somos tantas coisas, mas com poderes? Com habilidades sobrenaturais? Isso era... insano!

— Eu posso provar. Me deixe te teletransportar para algum lugar, por favor! 

 

Lauro tentou esquecer a mágoa. Tentou parar de só querer se opor, de querer dizer não. Tentando se pôr no lugar do outro. Sabia muito bem o que era contar algo que provavelmente as pessoas não receberiam bem. E querer muito que elas não desvalidassem isso. Ara era um garoto legal, não tinha razão para engána-lo. Ele acreditava no que dizia. 

 

— Tudo bem, A. Mas eu escolho para onde. 

 

Ara perguntou se podia se aproximar, disse que precisaria de contato físico. Se tudo bem colocar a mão no seu ombro. Ele concordou. Mesmo sob o aviso de que manter os olhos abertos o deixaria tonto, não os fechou. O objetivo era ver o que aconteceria. 

 

No entanto, a sua volta era uma profusão de imagens desfocadas e retorcidas se movendo. Nada defínivel. Aquilo fazia sua cabeça doer. Por isso quando sentiu seus pés no chão de novo, os olhos estavam fechados. Mesmo assim se desequilibrou, e Ara o ajudou. Agradeceu. Olhou em volta assustado. Definitivamente, aquela não era a sua casa. Nem a sua cidade. Havia pedido para ir à cidade em que nascera, que visitou algumas vezes. Estavam numa das atrações turísticas de Campelho.

 

Dentro do museu das pimentas. Numa sala com quadros de pimentas nas paredes. Foram saindo, e depois de alguns minutos, estavam na rua. 

 

"Isso é assustador e também incrível, A."

 

— Eu sei. E se você quiser posso te levar para onde estou ficando.

 

Ao invés disso, Lauro preferiu que ficassem por ali mesmo. Agora estava disposto a ouvir o que ele queria falar. E assim que acharam bancos de concreto numa calçada pouco movimentada, o outro começou.

 

Quando ele falava de viajar por aí, era porque mesmo sem grana, poderia. Só teria que arranjar um jeito de se manter. Descobriu ainda criança o que poderia fazer, mas só foi entender mesmo aos 12, 13 anos. Entender que os seus colegas de classe não dormiam num lugar e acordavam noutro. Ou tinham dores de cabeça todo dia por causa das milhares de vozes. Sempre odiou multidões. Até os 14 ainda se forçava a ser social, depois se isolara. O que não ajudava tanto assim. 

 

Todo lugar tinha pessoas... pensando. Até que ele entendeu que as pessoas não teria como controlar, mas sua mente, sim. Então começou a treinar. Até que encontrou grupos de pessoas que alegavam terem habilidades sobrenaturais. Conversou com algumas. A maioria não tinha habilidade nenhum, apenas duas. Laura e Nina. 

 

"Você foi o primeiro que eu tive algo sério. Até então eu só ficava. Não tinha chegado nessa parte de contar sobre minhas habilidades. Eu realmente achei que você não aceitaria."

 

Lauro quis dizer que ele tinha se enganado, no entanto, na verdade, não sabia qual teria sido sua reação. Até agora não sabia no que pensar. Apesar da grande prova dada.

 

Entretanto, não foi por isso que foi embora. Alguns dias antes do término Ara começou a sentir dores de cabeça, algo que não sentia desde que começara a controlar sua mente. Acordava no meio da noite com fisgadas finas. Depois, sonhos... perturbadores. Havia pessoas... como ele. Que liam mentes, se teletransportavam, ficavam invisíveis, se transformavam em outras pessoas ou animais, voavam, soltavam raios, fogo. 

 

Nos primeiros sonhos, ele apenas as via. Era como se ele tivesse atrás de um véu as espiando. Nos últimos sonhos, eles viravam para trás, o descobrindo. E o que parecia o líder deles, falou que o acharia. 

 

— São apenas sonhos, dizia para mim. Até que os vi fora deles, perto da minha casa, procurando por um garoto. Não sabiam meu nome.

 

Ara não sabia quem eram, e por mais que tivesse tentado escutar seus pensamentos, não conseguiu. Apenas sabia que eles representavam perigo. Que no meio deles haviam uma mulher que tinha acesso a memórias através do toque. No dia do término, quis muito levá-lo consigo, todavia, não arriscaria que se o pegassem, Lauro estivesse junto. 

 

"Mas não poderia ter ao menos me dito por que estava indo?"

 

Não podia. Porque se eles chegassem até Lauro, era melhor que não soubesse nada sobre ele, porque representaria uma ameaça a ser destruída. Ao mesmo tempo, que não saber, o deixava mais vulnerável. Precisava tomar uma decisão, e foi isso que fez. Eles estavam atrás dele, o seguiriam. Ara decidiu procurar Nina. Não avisando que a encontraria. Como faziam planos de se encontrar um dia, a jovem tinha deixado seu endereço numa das milhares de conversas que tiveram.

 

Se teletransportar para um lugar que nunca se foi requer muito mais energia mental do que quando se vai a escola que sempre frequentou, ou a casa de férias que ia todo ano. Recitou mentalmente o endereço muitas vezes até sentir um formigamento por todo o corpo, estava de olhos fechados, e sentir grama sob os pés. Estava em frente à casa da amiga virtual. Nunca se encontraram. Com um grupo atrás dele, precisava ler a mente dela, antes de se revelar. 

 

Então decidiu se aproximar da casa. Se não conseguisse ler a sua mente, iria embora de imediato. Ela não estava em casa. Mesmo preocupado se alguém o veria perto da janela da casa, esperou. Tendo que disfarçar, quando ouvia pensamentos se aproximando. Até que ela chegou. Precisava testá-la, então enviou uma mensagem. Não queria desconfiar dela, no entanto, estava numa situação em que precisava desconfiar de todos.

Passou alguns minutos e então uma resposta. 

 

"Acabei de chegar do estágio, super irritada com a existência. Aquele lugar me suga", escreveu.

 

Seus pensamentos giravam em torno do estágio, de como estava cansada, de saco cheio de alguns colegas e até chefes. Então precisava estimulá-la. Contou que havia um grupo de sobrenaturais atrás dele, e que não conseguiu ler suas mentes.

 

Os pensamentos dela giravam em torno de medo, surpresa, preocupação. 

 

"Você não sabe nada sobre eles? Me diz exatamente o que aconteceu? Se quiser pode vir pra cá, Ara.", ela digitou.

 

"Pode abrir a porta pra mim então?", ele digitou em resposta.

 

Mentalmente ela disse "o que, como assim?". Mas digitou: "Tô indo". Então ele arrodeou.

 

Lauro ficou quieto apenas escutando todo esse tempo, só se mexera ocasionalmente mudando de posição, para não ficar com cãibra. Mas estava escurecendo, já eram cinco e pouco da tarde. Ara parecia ter muito a contar, e ele queria ouvir. No entanto, precisava voltar para casa.

 

— No que você está pensando?

— Sério que não sabe?

 

Ara disse que já tinha escutado seus pensamentos demais.

 

— É que minha família deve estar em casa, minha mãe deve estar preocupada.

 

Ara segurou no ombro de Lauro, que fechou os olhos. Ainda se desequilibrando ao chegar. Mas ao abrir os olhos... não estava em casa. Recebendo a explicação de que ele precisava lhe dar algo antes. Sem opção, concordou.


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Notas finais do capítulo

Eiii, espero que tenha gostado!



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