Minha Âncora escrita por CM Winchester


Capítulo 4
Capitulo 3




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Vesti uma regata preta, jaqueta de couro cinza, calça jeans e meus tênis all star preto botinha. Fiz um coque despojado e desci as escadas, encontrei meus pais a mesa tomando café sendo servidos pelas duas empregadas.
Me sentei a mesa puxando o guardanapo para cima das pernas e pegando a taça com agua a bebendo um pouco.
— Terminaram o trabalho ontem? - Mamãe perguntou.
Meu pai dizia que eu era a copia de minha mãe quando tinha 17 anos. Com os cabelos loiros e olhos extremamente verdes, os anos tinham passado, mas ela continuava linda. Meu pai já tinha os cabelos castanhos e os olhos negros, era americano. Mas se mudou para a França quando tinha 5 anos. Eles se conheceram no colegial. Ele era um nerd que tinha um futuro brilhante pela frente enquanto ela era a líder de torcida mais desejada da escola. Um clichê.
— Sim e comemos brigadeiro. - Me servi de café um vicio herdado do meu pai.
Não conversávamos muito. Papai falava sobre as coisas da empresa com a minha mãe, me sentia de fora. Nessas horas queria ser uma adolescente daqueles filmes em que podem conversar sobre tudo com os pais.
Terminei meu café e peguei minha mochila seguindo para jardim onde o carro estava me esperando, passei pela casa de Mel para dar uma carona e fomos para a escola.
— Como esta?
— Bem. - Respondi descendo do carro antes que o motorista descesse para abrir a porta.
Eu não precisava chamar mais atenção do que já chamava.
— Tem certeza?
— Tenho. Vou ficar o mais longe de Isaac. E pretendo ir ate o shopping fazer compras no sábado, pode me fazer companhia?
— Claro. Estou precisando de um vestido novo. Queria fazer uma tatuagem, mas isso enlouqueceria meus pais.
— Com certeza. - Respondi rindo. - E os meus pais tambem. Eles me tirariam do testamento. - Ela gargalhou.
— Não duvido nada.
Na aula de literatura Isaac sentou ao meu lado e eu me concentrei no livro a minha frente.
— Me desculpe por ontem. - Lancei um olhar para cima.
— Não vai se repetir. Pode ter certeza que vamos ser só dois colegas de aula. Como você sempre quis. - Voltei minha atenção para o livro.
— Não entendo você. Não consigo entender por que fazer tudo aquilo.
— Não precisa entender, só precisa esquecer. - Fechei o livro. - Professora posso sair? Não estou me sentindo bem.
— Ok. Passe na enfermaria.
Levantei pegando minha mochila e sai da sala de aula. Passei na enfermaria pedindo um remédio para dor de cabeça depois fui sentar na escada para esperar por Mel, fiquei trocando algumas mensagens com Nate. Quando finalmente o sinal tocou ela veio correndo e ultrapassando todos que tinham pela frente.
— O que aconteceu?
— Menti para sair da sala. - Levantei pegando minha mochila do chão.
— O que vai fazer?
— Depois da escola praticar parkur.
Eu praticava parkur uma vez por semana para não perder a agilidade. Ate hoje não entendia como consegui convencer meus pais a me deixarem praticar parkur, mas eles acabaram aceitando desde que eu aprendesse a fazer ioga que era algo que minha mãe amava. No fim descobri que não é tão chato quanto imaginei.
— Você devia parar de ter horário para tudo. Daqui uns dias você vai ter hora ate para ir ao banheiro.
— Qual o problema de ter uma vida controlada?
— O problema minha cara amiga é que é chato. Muito chato! Quebrar as regras é bom as vezes. Matar aula é saldável. - Revirei os olhos.
— Você não vai me convencer a matar aula, não adianta.
— Um dia você vai encontrar alguém que te faça quebrar as barreiras. E eu vou estar lá para dizer "Viu como é bom?".
— Você é uma idiota. Mas então me acompanha de tarde?
— Sim. - Enrugou o nariz. - Estou precisando me exercitar um pouco. Estou muito sedentária. - Parou no corredor segurando meu braço.
Olhei para ela depois olhei para o corredor vendo as lideres de torcida em volta dos meninos do time, inclusive do Isaac.
— Por que todas as lideres de torcida são vadias?
— Uma pergunta que eu não poderei responder. - Resmunguei virando no corredor.
Era o caminho mais longo, mas eu não precisaria olhar para aquilo.
Já fui convidada para ser líder de torcida, mas não aceitei. Não era algo que eu gostava e não queria um compromisso de ficar ensaiando e depois animando nos jogos. Preferia ter minha vida o mais simples possível. Já bastava ser milionária e estudar em uma escola comum, ser líder de torcida só chamaria mais atenção.
Passei pela sala de instrumentos musicais e parei olhando. Abri a porta e entrei observando ate encontrar o violão. Poderiam achar que eu fosse rebelde, meus pais queriam que eu tocasse piano ou violoncelo, eu tocava violão. Queriam que eu dançasse ballet, eu preferia praticar parkur. Sorte a minha que eles estavam ocupados demais aceitando minhas opiniões e me deixando viver minha vida do jeito que eu queria.
Eu sabia que eles não puxavam as rédeas por que sabiam que eu assumiria a empresa quando fosse maior de idade, começando com um trabalho mais a baixo e subindo para o topo. Mel sempre mandava eu tomar as rédeas da minha vida, o problema é eu não queria decepciona-los por isso tentava ao máximo entrar em um acordo sobre as coisas que eles queriam e que eu queria.
Mas um dia eu teria que seguir os planos deles, assumir a empresa, ser uma empresaria rica e bem sucedida.
— Sabia que encontraria você aqui. - Ergui meus olhos para a Mel parada na porta com o ombro encostado no batente e de braços cruzados. - Você toca e canta bem. Você compôs umas musicas quando éramos mais novas, por que não tenta algo assim.
— Por que isso é incerto. Posso estar no topo em um dia e no fundo do poço no outro. - Jogou os braços para cima desistindo de argumentar.
Ela sabia que eu era teimosa, não sei por que tentava ainda.
Larguei o violão e seguimos para a aula.
— Não me leve a mal, mas você tem talentos. Muitos talentos. É uma ótima cantora, toca violão muito bem e ama fotografia. Minha mãe sempre diz que temos que fazer o que gostamos.
— Sim, desde que não faça a veia da testa dos nossos pais explodirem. - Gargalhou me empurrando. - Nate teve sorte no ramo na musica.
— Teve sorte com as suas letras.
— Ele queria que eu fizesse um dueto com ele.
— Deve esta feliz. Conseguindo tudo que sempre quis, cheio de vadias em volta dele.
Se ela tinha se recuperado do fim do namoro? Não, ela não tinha se recuperado. Nunca amei ninguém para entender esse sentimento, mas eu sabia que Mel amava Nate, amava ele desde que éramos crianças. E o idiota do meu irmão tambem gostava dela, mas infelizmente não o suficiente.
— E como vai ser quando se mudar para Nova York quando for para faculdade?
— Acho que vou para Oxford. - Deu de ombros me encarando. - É uma faculdade boa.
— Ótima. - Falei. - Vou sentir falta de você quando o ano acabar, mas eu mais do que ninguém desejo todo o sucesso do mundo para você amiga. - Riu enquanto me abraçava.
A tarde nos encontramos na praça perto da minha casa, Mel já estava alongando quando cheguei. Nós começamos a correr e pular os obstáculos. Eu me sentia mais leve quando fazia isso. Mel me acompanhou nos saltos.
Quando paramos ambas estávamos cansadas, compramos uma agua e nos sentamos em um banquinho qualquer.
— Seu motorista vai vir busca-la?
— Ele deve estar me esperando lá. - Olhei o relógio no celular e suspirei. - Preciso ir. Jantar de negócios hoje a noite.
— Nem me fale. - Resmungou antes de jogar um pouco de agua no rosto. - Nos vemos depois.
— Sempre podemos escapar. - Pisquei para ela que riu assentindo.
Quando caminhei em direção ao carro do motorista senti um calafrio, uma sensação de que estava sendo observada. Olhei em volta, mas não vi nada.
Respirei fundo tentando controlar meu coração. Tudo o que eu precisava fazer era me controlar. Muitas vezes eu tinha que lembrar que não era uma pessoa fácil de ser atacada, mas ainda assim existia aquele medo sufocante.
Meus pais sempre tiveram muito medo que algum maníaco resolvesse me sequestrar por causa do dinheiro. Vivi minha vida toda sendo seguida por seguranças, agora que eu já era uma adolescente já tinham me deixado um pouco em paz. Eu podia sair e ir onde quisesse desde que o motorista me levasse.
A noite o jantar foi chato como todos os outros, Mel e eu trocamos mensagens sob os olhares nada satisfeitos dos nossos pais. Quando finalmente tivemos uma folguinha fugimos para o jardim com uma garrafa de espumante.
Estava distraída bebendo na garrafa mesmo quando vi um vulto na escuridão. Baixei a garrafa enquanto juntava as sobrancelhas.
Levantei do balanço deixando Mel sentada, ela estava focada trocando mensagens com um garoto qualquer. Avancei pelo jardim sem medo algum. Meu maior defeito. Nunca tive medo. Não tinha medo de escuro, não tinha medo de animais. Não sei se pelos meus poderes serem o que são, eu nunca tive medo. Sempre tive a certeza que ficaria bem.
Olhei entre as arvores e flores, mas não conseguia ver quase nada. Mas eu tinha certeza que havia algo ali. A lua cheia estava linda deixando tudo iluminado. Ao longe ouvi um uivo. Meu coração acelerou. Era o uivo do meu sonho. Avancei mais entre as arvores mais fechadas do jardim encontrando a escuridão.
Ate que encontrei algo. Pareciam olhos. Olhos amarelos. Parei no mesmo lugar.
Então os olhos sumiram.
— Lie? - Virei assustada para Mel que avançava entre as arvores. - O que esta fazendo aqui?
— Achei que tinha visto algo. - Murmurei olhando por cima do ombro. - Mas... Acho que era só minha imaginação mesmo.
— Vai dizer que esta tontinha com um espumante. - Debochou pegando a garrafa da minha mão e virando o resto.
— Não. - Respondi.
— E o Pernalonga?
— Deve estar em alguma toca.
Estranhei o fato dele não estar correndo pelo jardim, de noite era o horário que ele mais estava agitado, mas devia estar assustado com o movimento dentro da casa.
Enquanto caminhava para o banco lancei um olhar para trás, só encontrei a escuridão.
Mas naquela noite olhos amarelos povoaram os meus sonhos.


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