Os Desqualificados escrita por S Q


Capítulo 23
Aquela-Que-Não-Deve-Ser-Nomeada




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 O cronograma da apresentação já estava estabelecido: Patrick, Ana e Ricardo seguiriam com seus instrumentos para o palco, e Milena entraria na câmara de som do anfiteatro para cantar lá de dentro. Se despediram então, desejando sorte e cada um foi para o seu lado. Os músicos não sabiam o que lhes esperava quando as cortinas do palco se abriram para a banda; felizmente, o lugar estava com o público lotado, muito graças às opiniões recentes de Magno que fizeram muitos fãs darem uma nova chance para a DESQ. De onde Milena estava, ela podia até não ver o público, mas ficava extasiada só de ouvir os ruídos de animação da plateia. E o show ainda nem tinha começado.

 Durante a apresentação, a plateia foi à loucura com as novas músicas da banda. A cada novo som, o povo parecia se animar e pular cada vez mais. Mas uma em especial foi a que mais agradou. Ela se chamava “Não Há Perfeição” e se já destoava do nome do sucesso anterior “O que Há de Melhor”, a própria melodia parecia oposta ao outro hit da banda, mas sem perder a qualidade. Enquanto “O que Há de Melhor” começava com o som energizado da bateria e da guitarra, “Não Há Perfeição” iniciava com um som suave do baixo e ia acelerando aos poucos. Era uma música carregada de emoção que fazia ser impossível não se deixar levar pelo som. A tag da música logo foi parar nos trends do Twitter, ainda mais rápido que o sucesso anterior da banda. Até os haters da banda, ao verem os vídeos que alguns dos que estavam na plateia, gravavam e postavam, admitiam que era um trabalho bom. E mais uma vez, destaque para a performance incrível de Milena, mesmo sem aparecer para o público. 

 Magno não tinha conseguido ir ao show, por conta de seus compromissos, mas conseguiu ver o frisson no Twitter. Infelizmente, justo naquela noite, precisou participar de uma reunião na revista onde trabalhava. Abriu o celular em um pequeno momento de intervalo e ficou feliz ao ver a repercussão do show. Um colega de trabalho pegou levemente em sua mão enquanto lia as postagens.

— Está felizinho, hein, Magno?

— Você não imagina o quanto, querido! É muito satisfatório ver que um texto publicado repercutiu bem. Bem não. Melhor ainda do que eu esperava.

— Que texto? Posso ver? - perguntou o outro.

Magno mudou a página e estendeu o celular na direção do outro. 

“A banda Os Desqualificados, que também atende pela abreviação DESQ, ultimamente foi alvo de difamações nas redes sociais; tão fortes que geraram a lamentável briga que cancelou o show do grupo no Rio de Janeiro e inclusive gerou um hiato após o ocorrido.  Ao que aparenta, tudo começou com uma série de postagens acusando a banda dos mais diversos absurdos que até hoje não foram confirmados. Infelizmente, por questões éticas (que essa pessoa não teve) não posso revelar o nome da envolvida, mas quem acompanhou o caso pelas redes sociais sabe de quem estou falando. 

Para ela em específico, faço a crítica de hoje: quem perde tempo se dedicando a estragar uma carreira brilhante, sem tomar cuidado com a sua, só pode ter um recalque muito grande. E já dizia a sabedoria popular, tudo que a gente planta, a gente colhe. Todo mundo deve tomar cuidado ao desejar a derrota de alguém. Pode ser que a próxima derrotada seja exatamente a pessoa que planta discórdia. Procurando as visualizações nas principais plataformas de streaming, não é difícil perceber que, apesar de todo o rebuliço, a tal artista ainda continua atrás da DESQ em número de reproduções musicais. Levando em consideração que a carreira da banda é bem recente, isso só aponta para uma decadência Daquela-Que-Não-Deve-Ser-Nomeada. Artistas mais preocupados em causar do que com a arte em si, acabam caindo no esquecimento. Temos diversos exemplos de barraqueiros que conseguiram seus 15 minutos de fama e nunca mais se soube deles.

Em considerações gerais, não posso realmente afirmar com certeza se ela estava mentindo ou não, porém devemos lembrar que a banda pouco se manifestou sobre as acusações, sendo uma outra pessoa a maior fonte de tais informações. Eu não vejo isso como fonte confiável.”

— Uau, partiu pro ataque, hein? — falou seu colega de trabalho e atual peguete nas horas vagas.

— Zulu, deixa eu te contar uma coisa… fui eu que entreguei a chave do conservatório para a DESQ. — Essa hora o outro arregalou os olhos, que já eram grandes, surpreso. — Por isso, cada vitória deles me dá uma enorme alegria. Eles inclusive me pediram para ser agente de marketing deles e não posso negar.  Tenho uma dívida com esses jovens. Eu me sinto… um pouco responsável pela fama deles.

— Claro, dá para entender. — disse Zulu. — Na verdade, isso só me faz te admirar ainda mais. — falou sorrindo e chegando mais perto de Magno.

— Certo, mas é melhor a gente deixar isso lá pra fora. — Falou o crítico de arte, com um olhar malicioso por trás dos seus óculos. — Agora precisamos voltar à reunião. Zulu se levantou, dando um sorriso de comercial de pasta de dente.

— Claro, claro. A revista não pode ficar sem seu principal colunista e os textos precisos do nosso maior crítico de arte. 

Magno ficou cheio de si com os elogios, e ajeitando os ralos cabelos alvos que possuía, voltou com o colega à reunião com os editores. 

Enquanto isso, Graziele tinha chamado Jaques à sua mansão. Ela sabia que o show de retorno da DESQ estaria acontecendo naquele momento e precisava se distrair naquele momento. “Se distrair” para ela, era dar uns amassos em Jaques. Ele geralmente não ligava, ter sua grande paixão ali nos seus braços era suficientemente bom, porém, depois daquele tempinho que já estavam juntos, ele começava a desejar brevemente um pouco mais de carinho. Mais demonstrações de preocupação, respeito e amor do que simplesmente se pegarem. Jaques não queria dar o braço a torcer, mas começava a se sentir como se estivesse sendo usado. Principalmente após a conversa com Magno e o texto dele. Era como se os olhos do jovem estivessem começando a se abrir. Graziele reparou que o namorado tinha parado de lhe retribuir os beijos e carícias e comentou:

— Que foi, meu lindo dos olhos azuis? Tá cansado? Já sei como te animar. 

Ao invés de respeitar o humor dele, Graziele colou seu corpo ainda mais ao do namorado e começou a tocar nele de uma maneira mais forte e precisa, quase selvagem. Instintivamente ele chegou para trás, mas ela aproveitou o movimento e abocanhou o pescoço dele. Jaques quis pedir para ela parar, mas se sentiu mal, a vida inteira nunca tinha aprendido a fazer sua vontade profunda valer, então não soube dizer não. Ainda assim, Graziele comentou:

— Nossa, mas você tá fraco hoje, hein? 

De qualquer forma, ela prendeu Jaques ali até o horário que sabia que o show já teria terminado. Depois, foi como se ele já tivesse cumprido o seu papel e simplesmente o dispensou de volta para a casa dele. Mas não sem antes dizer:

— Os idiotas desqualificados podem ter conseguido cumprir o show, mas isso não vai continuar assim. Não adianta tentarem me diminuir. Eles não vão fazer mais nenhum show.

Jaques curvou as sobrancelhas.

— O que você tá planejando dessa vez? 

Havia um ligeiro tom de acusação ali mas Graziele não percebeu, ou se percebeu, ignorou. 

— Bom, você sabe que agora que namoramos temos um compromisso um com o outro né? Quero que você faça uma coisinha pra mim. Mas relaxa, na hora certa você saberá o que é.


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