Midnight Lovers escrita por Pandora Ventrue Black


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

"Verbatim" - Mother Mother



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Selena passou a noite em claro, o que era uma péssima ideia já que seu primeiro dia de aula na Phips High começaria no dia seguinte. Não conseguiu pregar o olhos, pois toda vez que o fazia o número 1692 aparecia rodeado por penas negras e sangue. Os corvos e o ano da histeria coletiva de Salém não deixava de percorrer sua mente. Mesmo sendo quase duas da manhã, a garota não ia ser capaz de deitar e descansar, mesmo depois do chá de ervas feito por sua mãe. Ninguém sabia explicar o ocorrido, muito menos Celeste.

A garota encara o amuleto feito por Nykkia que estava pendurado na janela. Era uma espécie de colar feito com várias miçangas coloridas intercaladas. Mesmo com Seth fazendo um feitiço de proteção na casa e Nykkia indo para sua casa no centro para fazer mais amuletos, Selena não se sentia segura, o desconhecido a assustava.

— Lena? — Uma voz baixinha a chama pela porta, mas não é capaz de afastar a garota de seus devaneios.

Maninha?

Bash?

Eu vi algo lá fora…

Selena congela. Não era o suficiente os corvos?

O que viu?

Eu acho que foi um Espírito, mas não tenho certeza.

Sebastian, não ouse seguir o Espírito.

A garota se levanta rapidamente da cama, tropeçando em sua camisola antiga (cortesia de sua avó, que mantinha roupas que pertenciam o século passado). Ver Espíritos nunca é um bom sinal no mundo sobrenatural, pois são almas-perdidas entre os mundos e isso só significava duas coisas: assuntos não terminados ou um espírito atordoado.

Selena abre sua porta com rapidez, se Sebastian seguisse a alma, ele estaria encrencado.

Irmão você sabe muito bem que não pode seguir Espíritos!

Não ia segui-lo, apenas te avisar que tem algo acontecendo

Onde viu?

Apesar do medo, a garota estava curiosa, nunca havia visto uma alma circulando no mundo dos vivos, apenas havia sido alertada por sua mãe e por seu pai. Seus olhos se encaminham para o relógio, estava muito perto das três da manhã, horário no qual o véu entre o Mundo Humano e o Mundo das Almas se torna levemente mais fino.

Horário perigoso, mas isso intrigava cada vez mais a curiosidade de Selena.

O Espírito passou rápido, mal deu para vê-lo direito.

Por onde passou?

Perto da floresta, ao lado do gazebo.

Movida pela curiosidade e pela ânsia de esquecer o que havia acontecido na tarde anterior, Selena sai de seu quarto e caminha em silêncio pelo corredor escuro da Mansão Blackwaters. Sua mãe costumava dizer que as almas que vagam sem destino costumam ser pessoas perdidas no mundo humano, que não encontraram seu verdadeiro propósito. São pessoas amaldiçoadas a conviverem com o próprio fracasso, assim como Anthony Phips, o amor da vida de Bridget Bishop. Ele permitiu que seu pai insano fosse mais forte do que o seu amor por Bridget.

Anthony a colocou na forca.

Anthony matou seu próprio filho.

— O que os senhores pensam que estão fazendo? — Sibila uma voz que Selena e Sebastian conheciam muito bem.

Era Celeste em uma camisola de algodão com seus cabelos presos por um lenço branco de seda.

— Não deveriam estar acordados a essa hora, sabem muito bem que é perigoso!

— Eu não consegui dormir, vó — Selena explica — Bash veio ao meu quarto para avisar que…

— Viu um Espírito? — A senhora indaga fechando o seu robe 

Sebastian assente se aproximando de sua avó.

— Não me lembrava das noites serem tão agitadas aqui em Blackwaters!

— Onde enfiou a sua educação, Sebastian Bishop Nightingale? — Celeste exclamou dando um tapa na cabeça de seu neto — Tenha mais respeito pelo os que partiram dessa vida!

— No caso que não partiram! 

Selena sorri, apesar de insuportável, ela ama o seu irmão e ele sempre foi capaz de tirar um sorriso de seu rosto. Celeste, por outro lado, se sente insultada e dá um bom puxão de orelha em Sebastian.

— Ok! Certo! — Ele reclama se escapando das unhas postiças vermelhas de sua avó — Nunca mais criticar os Espíritos…

— Exatamente! — A senhora exclama orgulhosa — Aprende rápido, meu neto!

— … Perto de você! — Sebastian exclama e se movimenta rápido o suficiente para escapar da surra e entrar em seu quarto sem fazer um mínimo barulho.

Idiota! Uma hora dessas você vai ficar de castigo!

E sinto que você adoraria passar um tempo sem a minha magnífica presença.

Certamente!

Mentirosa, eu sei que você me ama! Tem que amar, afinal sou mais velho que você, Lena!

Bash, você nasceu apenas três minutos depois de mim. Você não é mais velho!

Sua matemática está errada, maninha.

Selena revirou os olhos, era uma discussão inútil. Desde que Sebastian descobriu que era minutos mais velhos que sua irmã, era impossível o convencer de que não havia diferença entre os dois. “É uma batalha perdida”, dizia Seth quando uma Lena de sete anos vinha correndo para seus braços, chorando por ser a “mais nova”.

— O que fizeram com ele lá em Miami? — Celeste resmungou fechando seu robe cintilante 

— Ele sempre foi assim, vovó…

A senhora sorri e se aproxima de sua neta. Selena estava fria e inquieta, ainda transtornada com os corvos, mas ela não tinha com quem conversar sobre. Seus pais e sua avó não sabiam o significado dos corvos e do porque do mundo sobrenatural ter lhes dado tanto sinal, sabiam, na verdade, apenas o básico: algo ruim estava para acontecer e tinha relação com as perseguições de bruxas de 1692. 

Nada substancial.

Seria o início de uma nova Inquisição?

Pode até ser o retorno de Bridget Bishop.

Pior ainda, a maldição dela finalmente aconteceria.

Mas não tinha como afirmar nada.

— Você está bem, minha querida?

— Defina bem…

Celeste sorri, ela sabia que sua neta ainda estava nervosa com tudo que aconteceu. A senhora a aconchega em seu abraço e juntas descem para a cozinha. A Bishop mais velha podia não saber o motivo de todo o alarde da natureza, mas sabia como alegrar, nem que seja um pouco, os seus netos.

— Chocolate ou um leite quente?

— Chocolate quente, por favor — Selena respondeu se sentando na ilha fria de mármore.

Selena estava cansada, não só por conta dos corvos, mas também por conta da viagem de carro. Ela tinha dormido bem mal no hotel que pararam no meio da viagem, Sebastian e Seth não paravam de roncar e o vento do lado de fora batia contra a janela de forma brutal.

— Aqui está, minha querida! — Celeste a serve com um chocolate quente e cookies de chocolate mornos, a forma preferida de sua neta de comê-los.

— Obrigada, vovó…

A garota come em silêncio, estava gostoso. Era o tipo de comida que ela ansiava para comer toda vez que ia para Salém, algo familiar que só sua avó era capaz de fazer. Não era feito com magia, e mesmo que fosse não teria o mesmo sabor. Era o amor com que os cookies eram feitos, o melhor ingrediente.

— Quer conversar, Lena?

— Tenho tanta coisa entalada que não sei nem por onde começar…

— Comece, então, pelo menor problema.

— Salém!

— Seu menor problema é uma cidade? — A senhora sorriu se sentando ao seu lado — Isso soa como um grande problema…

— Não queria vir para cá, vovó — Ela suspira, voltando o seu olhar para a xícara vazia — Gosto da senhora e de Nykkia, mas você não podia ter se casado com um senhor que morasse, sei lá, em Nova York?

Celeste sorri e mexe seus dedos para que a xícara vazia de sua neta se tornasse cheia de chocolate quente novamente.

— Lena, lembre-se, mantenha seus amigos próximos e…

— … Seus inimigos mais próximos. Sim, eu sei — Ela resmungou observando a fumaça da bebida quente — Só porque estou ciente não significa que estou confortável.

— Entenda, minha querida, precisamos ser mais inteligentes que eles. Somos bruxas e eles Caçadores, uma espécie que busca o desequilíbrio no mundo sobrenatural —  Celeste explica observando a lua do lado de fora — É nosso dever impedir tamanha destruição…

— Infelizmente…

Selena suspirou, estava mais cansada do que tinha imaginado.

— E os corvos? — Ela indaga bebericando de sua xícara — Nada vem a sua mente desde o incidente?

— Nada além do vago, minha querida. Pode ser qualquer coisa a essa altura do campeonato… Sinto muito mas não há nenhuma Davina em nossa família, muito menos nessa cidade!

— Nem Nykkia? Com suas leituras?

— Nykkia não é uma Davina, meu amor, não vai poder te dizer o futuro, sabe muito bem disso… O máximo que ela pode fazer é esperar que tudo dê certo!

— Então estamos perdidas?

Celeste sorri e dá um beijo na testa de sua neta.

— Somos Bishop, nós sempre damos um jeito — Ela fala acariciando a bochecha de Lena — Agora descanse. Em poucas horas será o seu primeiro dia de aula!

— Nem precisa me avisar… Estou martelando isso na minha cabeça desde que saí de Miami.

— Vai dar tudo certo, querida, mas antes precisa dormir!

Selena concorda, o cansaço havia se instalado em seu corpo. As duas sobem em silêncio, pensativas. Celeste estava apreensiva, o mundo sobrenatural estava querendo lhe dar um sinal, mas ela não sabia lê-lo. Selena estava exausta de tanto pensar, ela tinha a escola, o Chamado e agora os corvos para lidar. “Algo comum e básico para uma garota de dezesseis anos!”, ela pensa ao se jogar na cama. O sono não demorou para vir, mas desta vez foi uma noite sem sonhos.

 

⇻♡⇺

 

Definitivamente se misturar na Phips High ia ser impossível. Sebastian e Selena estavam parados na porta dupla de vidro da escola e encaravam a multidão de adolescentes. Dava para notar distintos grupos de pessoas, extremamente normal. Havia meninas usando saias de cores claras e suéter que variavam de um bege claro a um branco cor de neve. Em outro canto estava os jogadores, com seus casacos com o emblema da Phips High: uma águia de duas cabeças.

Isso vai ser interessante!

Parece assustador, ter que passar, de novo, por uma socialização…

Vamos, Lena, vai ser divertido!

Sua visão de diversão é extremamente deturpada, Bash.

— Olá, bom dia! — Um homem alto, de terno e cabelo branco pega os gêmeos desprevenidos.

Selena dá um pulo pra trás e Sebastian aperta com força a alça da mochila.

— Ah! Mil perdões, não queria assustá-los! — Ele fala esticando as duas mãos para os novos alunos — Sou o diretor Pine, é um prazer conhecê-los!

Os gêmeos cumprimentam o diretor da escola, com certa estranheza por par de Selena.

— Não sabia que os diretores eram os primeiros a dar boas-vindas aos novatos! — Sebastian comenta.

— Não é rotineiro a chegada de novos alunos na Phips High — Ele comenta com um largo sorriso no rosto — Venham, me acompanhem. 

Sebastian e Selena seguem o diretor em silêncio. A garota observava os olhares curiosos dos alunos, sem entender tamanho fascínio. Não se vestia de uma forma brega ou ruim, apenas uma usava um jeans preto e um moletom feito por Kathy: de um azul bem escuro e com a data do primeiro campeonato estadual ganho com a liderança de Selena.

Talvez quem realmente chamasse atenção fosse Sebastian, com sua calça de moletom cinza escuro e uma camisa esportiva de manga comprida. O garoto chamava atenção, já que era bem alto, ruivo e bonito. Selena podia ver algumas garotas olhando para seu irmão e sorrindo, tentando flertar apenas com o olhar.

Estão te olhando.

Oi?

Os garotos estão te olhando, Lena!

Selena podia sentir o seu irmão arder de raiva. A chuva do lado de fora parecia apertar, sinônimo do poder de Sebastian emanando dele. Os gêmeos podiam fazer isso, controlar o clima, mas apenas funcionava de forma involuntária; nunca conseguiram fazer nevar em Miami para aproveitarem o inverno montando bonecos de neve.

Se acalme, Bash, está piorando o clima lá fora.

Não consigo… Eles te olham de uma forma que me deixa furioso.

Lembre-se que normalmente são esses caras que você faz amizade, seja bonzinho, Bash, ou passará o ano sem nenhum amigo!

Você é minha amiga.

A voz de Sebastian sibilava na mente da garota.

Sou sua irmã, Sebastian, e não se preocupe comigo, não me interesso por garotos.

Uma gargalhada alta ecoa tão rápido quanto apareceu. Era Sebastian. Ele sabia muito bem que nenhum desses garotos tinha chance com sua irmã e isso fez sua raiva se dissolver no ar. Apesar de extremamente irritante, Bash cuidava de sua irmã como um urso cuida de sua comida preferida.

O diretor Pine andava com calma e o sinal tocou antes dos que os três alcançassem o escritório. Era uma sala pequena e, agora que todos os alunos estavam em suas respectivas salas, silenciosa.

— Aqui estão seus horários — Ele fala entregando aos gêmeos um papel plastificado — As salas estão escritas ao lado do nome do professor, a cantina está no final desse corredor e logo serão iniciadas as seleções para os clubes e times… — Pine fica em silêncio, acariciando sua barba branca — Espero que os dois entrem no Eagles.

— Desculpa, mas acho que não entendi — Selena fala sem tirar seu olhar do papel.

— Eagles? — Sebastian indaga com um sorriso no rosto,

— Dei uma pesquisada nos seus nomes e vi que são atletas de excelência… Ficaria mais do que satisfeito se pudesse elevar a, bem, a qualidade do nosso time de vôlei e basquete.

— Quando começam as seletivas? — Sebastian indaga.

— Daqui dois dias, não abrimos a escola nos finais de semana para evitar transtornos — Pine explica abrindo a porta de seu escritório — Agora, sigam para suas aulas, não quero interromper o aprendizado de vocês dois!

Os gêmeos saem do escritório em silêncio. Por mais que tenha se passado uma semana desde que tocou uma bola de vôlei, Selena sentia falta de jogar. Quando estava na quadra era apenas ela e a bola, lhe fazia tão bem poder descontar seu estresse com saques.

Vai fazer, Lena?

Óbvio!

Sebastian dá um soco no ar. Os dois são extremamente competitivos. Sebastian não precisava usar de sua magia para fazer cestas, era bom no basquete. Ganhava medalhas e troféus desde os doze anos, tinha um passado glorioso que provavelmente lhe renderia uma bolsa de estudos em uma faculdade daqui alguns anos.

Qual o seu primeiro horário, Bash?

História com o professor Rick Cain. Você?

O mesmo.

Selena dá uma espiada rápida no papel que seu irmão carregava. Estavam, novamente, juntos em todas as aulas. Era difícil ficarem separados quando estudavam na mesma escola, nunca ficaram, mesmo mudando de estado.

Estavam parados na frente da sala 2B, a aula não havia começado ainda e parecia que o professor Rick Cain não estava lá. Selena abre a porta devagar e sente, de novo, o olhar dos estudantes os cerca.

Ótimo. Perfeito.

Eu começo ou você?

Você, Bash. Seja o cavalheiro que você nasceu para ser.

— Bom dia, novatos! — Uma voz masculina ecoou pela sala.

Rick Cain estava na sala, só que se sentava no fundo. Parecia saber que Selena e Sebastian ia aparecer na porta. Era um homem novo, de cabelos castanhos perfeitamente cortados e usava uma calça social clara e um suéter com desenhos geométricos, provavelmente da idade de Nykkia.

— Bom dia, professor. Desculpa a intromissão e… — Sebastian tenta falar mas é interrompido.

— Não tem problema, meninos. Se apresentem para turma e começaremos a aula, ok? — Ele fala com um sorriso carismático no rosto — Nome, idade e algo interessante sobre os dois.

Selena assentiu e se encaminha para a parte da frente da sala.

— Me chamo Selena Bishop Nightingale, tenho dezesseis anos e… — Ela fala mas uma face familiar chama sua atenção, era a garota loira que correu perto da Mansão Blackwaters — Bem, era capitã do time de vôlei da minha antiga escola.

Sua paquera está aqui, maninha!

Selena fuzila seu irmão com o olhar.

Privacidade, por favor!

— Meu nome é Sebastian Bishop Nightingale, mas prefiro Bash… Só minha mãe me chama assim e normalmente ela quer me dar uma bronca — Um sorriso sedutor surge em seu rosto.

Selena podia perceber as meninas da sala arfando por conta de seu irmão, principalmente uma garota de cabelos escuros como a noite e ondulados que estava no fundo da sala, mascado de forma irritante um chiclete. 

— E eu sou o irmão mais velho! — Ele exclama e olha para Lena.

Você ama esse tipo de atenção, não é mesmo?

Você sabe que sim, Lena.

Pois esteja ciente, Bash, que há alguém de olho em você.

Eba! Quem?

No fundo da sala, com chiclete.

Lena!

O que foi?

Sebastian revira os olhos, parecia ofendido.

Você sabe das minhas preferências, maninha.

Selena sorri. Ela sabia perfeitamente o tipo de gente que interessava Sebastian. O professor Cain agradece a breve apresentação e assume o controle da turma. Selena se sentou ao lado da janela, exatamente na área central e logo foi acompanhada de seu irmão.

— Podemos começar a aula, alunos?

Os gêmeos respiram fundo em conjunto.

Um novo ano letivo estava começando. No fundo dos corações de Selena e Sebastian eles sabiam que esse ano ia ser completamente diferente de todos os outros, alguma coisa estava predestinada a acontecer. O sinal dos corvos era um indício, mas o ar de Salém parecia diferente.

Era como seu pai dizia: “Dá para sentir a mudança no ar”.



⇻♡⇺

 

Nada como uma aula maçante sobre a história de Salém para piorar o humor de Selena. O professor Rick Cain fez questão de contar todo o acontecimento da caça às bruxas na pequena colônia britânica pelo ponto de vista de William Phips, o assassino de Bridget Bishop.

Depois de menos de vinte minutos do início da falação, Selena estava concentrada em outra coisa. Ela precisa descobrir mais sobre o mundo bruxo, encontrar uma Davina ou até mesmo ir para a loja de vodu de Nykkia, desconhecer o significado da mensagem clara dos corvos a deixava extremamente irritada.

— Estou surpresa por ainda estar prestando atenção na aula… — Uma voz melódica a faz despertar de seus devaneios.

Era a garota que estava sentada na carteira de trás. Tinha seus cabelos presos em pequenas tranças, um rastafari estiloso. Sua pele era escura, bem mais do que Nykkia e, aos olhos de Selena, ela podia muito bem ser uma divindade: bela e misteriosa.

— Meu nome é Jamilla, a propósito... — Ela sussurrou tentando não chamar a atenção do professor — … e bem-vinda a Phips High, a escola mais chata dos Estados Unidos...

— Jamilla, já quer começar o ano com uma belíssima detenção? — O professor alerta.

Selena sorri. 

— Me desculpe, professor! — Jamilla exclama com um largo sorriso no rosto — Estava apenas tentando fazer a novata se sentir bem-vinda!

Rick Cain revira os olhos e pede silêncio mais uma vez, porém a garota não parecia ligar.

— Selena, certo?

— Isso mesmo… — A bruxa responde baixinho — Não tem medo de ficar de detenção?

— Rick sempre ameaça, mas nunca cumpre. Prefere gastar os quarenta minutos a mais na escola com sua esposa grávida…

A mente de Selena vaga para a placa na entrada de Salem, logo não seria mais um “6”.

Fazendo amizades, maninha. Parabéns!

Quieto, Bash!

Sebastian sorri e volta a rabiscar em seu caderno. Selena nunca teria um pingo de paz em sua vida, mas ela não se importava. Os gêmeos estavam conectados, eram dois seres interligados por uma só alma, nem Lena nem Bash queriam desfazer de tal conexão. 

— Eu não estou nem um pouco afim de descobrir… — Lena retrucou.

— Vai por mim, garota!

— Jamilla, esse é meu último aviso! — Rick alerta, mesmo sem olhar para turma; estava ocupado demais escrevendo o nome das bruxas mortas por William Phips.

E lá estava o nome dela.

Bridget Bishop.

A primeira a morrer na mini Santa Inquisição de Salém.

Selena sente a sala, esfriar, como se estivesse prestes a ocorrer uma nevasca naquele pequeno cômodo. Os gêmeos sabiam que logo os alunos iriam fazer a conexão, afinal tinham falado em alto e bom som que eram Bishop, que carregam o nome de uma bruxa.

Suposta bruxa, já que os humanos nunca saberiam a verdade.

Rick se vira para a turma e bate duas vezes no quadro. Duas vezes em cima do “P”.

— Sei que grande parte de vocês está cansado de ouvir a mesma história todo ano e…

Alguém pigarreou alto, era óbvio que todos os alunos naquela turma sabia quem era Bridget Bishop. Grande parte deles nasceram em Salém, cresceram ouvindo sobre a caça às bruxas, sobre Bridget Bishop, William Phips, Tituba e todos os outros envolvidos. Sabiam o desenrolar da história: primeiro uma criança convulsionando, pessoas alegando que isso era trabalho do diabo, uma escrava tentava ajudar mas rapidamente fora julgada como bruxa e, depois, começou a histeria.

Rick respira fundo e solta o giz.

— Quero propor essa ano uma mudança! — Ele parecia muito animado, contrastando com a sala entediada — Árvores Genealógicas.

Selena suspira. 

Não havia nada mais confuso do que a genealogia dos Bishop.

Legal! Isso vai ser divertido!

Mergulhar no mar de álbuns e livros de nossa avó vai ser divertido, Bash?

Nada melhor do que dez quilos de poeira, aranha e alergia…

Reveja o seu dicionário pessoal, Bash, para mim isso soa como uma missão impossível.

Não seja chata, maninha. Vamos descobrir tanta coisa sobre os nossos antepassados!

É, sobre como a irmã da senhora que iniciou a nossa linhagem lançou uma maldição em uma cidade e agora controla corvos suicidas! Uau, estou me divertindo muito!

Sebastian sorri.

— Farão isso em trios, para não ser tão trabalhoso. Três cabeças pensantes são melhores do que uma!

— Fale isso para o Lincoln, nada passar dentro daquela cabeça oca! — Um menino de jaqueta vermelha (provavelmente do time da escola) grita enquanto atira uma bolinha de papel na cabeça de outro garoto.

— O de jaqueta vermelha é o Hugh, capitão do nosso time de basquete — Explica Jamilla baixinho — Lincoln e ele são melhores amigos, apesar do ódio destilado.

Selena sorri, agradecida pela explicação. Esses são os tipos de garotos que Sebastian provavelmente faria amizade. seu irmão adorava pessoas extrovertidas e idiotas.

— Hugh e Lincoln, por favor, comportem-se ou querem detenção por uma semana?

A sala é invadida por um silêncio ensurdecedor. 

— Certo, obrigado, meninos — O professor fala pegando sua agenda — Eu mesmo separei os trios, não adianta implorar que não mudarei de ideia. Combinado?

Alguns alunos assentem e outros bufam. Nunca era uma boa ideia escolher os grupos, mas era uma forma mais tranquila de montar trios sem que ninguém ficasse de fora. Um caminho prático seguido por muitos professores que deixava diversos alunos estressados.

— Jamilla, Alexandra e Selena! — Ele fala sem tirar o olho do papel.

A gêmea estava agradecida por não ter que escolher seu próprio trio, afinal mal tinha conversado com as pessoas de sua turma. 

— Sebastian, Hugh e Lincoln!

Isso!

Você sabe que provavelmente vai ter que fazer todo o trabalho sozinho, né?

Quem disse que eu queria fazer o trabalho, mana?

Lena suspira. 

O que pretende fazer, espertão?

Somos bruxos, não somos?

Você não pode manipulá-los, Bash! Mamãe, quando descobrir, vai…

Se ela descobrir, Lena. Acredito que não contará a ela…

De toda forma, você não tem poder o suficiente para controlar dois humanos!

Apenas espere e veja, Lena.

Se você se meter em confusão, eu juro que…

E então a conexão foi cortada. Simples assim. Apenas Sebastian podia fazer aquilo, o que impedia Selena de descobrir o seu plano. Às vezes a garota se perguntava se era realmente uma bruxa, já que seu irmão parecia ter herdado todos os poderes.

— Pronta? — Jamilla pergunta parando na frente da mesa de Selena.

Lena apenas concorda, ainda queria socar o seu irmão. 

O sinal toca, fazendo com que Sebastian saia correndo do campo de alcance de sua irmã. Entretanto, Selena não deixaria seu irmão esquecer que sua ideia era lamentavelmente ridícula, assim como todos os outros planos que teve para se safar de fazer os trabalhos escolares.

Antes que Sebastian pudesse alcançar a carteira de Hugh e Lincoln, Selena mexe suas mãos quase que imperceptivelmente debaixo da cadeira, fazendo o irmão tropeçar nos próprios cadarços e cair em cima de duas meninas, que, infelizmente, pareciam mais do que satisfeitas com a súbita aproximação do aluno novo.

— Droga… — Sebastian geme, rouco e sedutoramente, apenas para irritar sua irmã e arrancar suspiros das garotas.

Então é uma guerra, maninha?

Apenas porque tropeçou em si mesmo?

Sebastian ri e se levanta, forçando seus músculos a saltarem por debaixo da camisa, truque comumente usado por ele para propositalmente irritar sua irmã e fazia as meninas enrubescer.

Muitas outras guerras foram iniciadas por muito menos, Lena.

Uma ameaça silenciosa.

Como quiser, maninho!

— Seu irmão é mesmo desastrado assim ou só quer jogar seu charme em Natalie e Emily?

— Acho que um pouco dos dois, Jamilla — Selena comenta arrumando seu material intocado durante a aula toda.

— Milla, por favor, é mais fácil

— Como quiser — A garota sorri e se levanta, não podia demorar se não se atrasaria para a próxima aula — Onde está Alexandra?

— É loira de roupas escuras e piercing na sobrancelha… Deve ter visto ela quando se apresentou para a turma.

Era a garota bonita do dia anterior. Esse era seu nome: Alexandra.

— Claro! Vi sim! — Seus olhos percorrem a sala, ela não estava mais ali, nem no correr quando Milla e Lena o atravessaram para ir para a próxima aula. Química, a pior matéria do mundo.

Alexandra, o feminino do rei da Macedônia. Pelas suas aparência ela parecia mesmo ser da realeza: traços finos e altivos. Sua face exprimia destreza e astúcia, podia muito bem ser algo além de uma humana, talvez um ser sobrenatural. Porém, não havia formas de perguntar, Alexandra havia sumido depois da aula de história de Rick.

Não apareceu nem na cantina, mesmo com Sebastian fazendo barulho com suas gargalhadas gostosas de serem ouvidas. Não estava no fim do dia, quando todos os alunos da Phips High aceleravam pelo corredor em direção ao estacionamento para jogar papo fora e se despedir de seus amigos.

Porém, era no estacionamento que estava um garoto loiro, provavelmente mais velho do que todos os alunos. Loiro, alto e musculoso, em cima de uma moto preta que brilhava como se fosse nova, apesar guidão estar gasto, demonstrando que o veículo era mais velho do que aparentava.

— Todos estão convidados para o Luau de Iniciação de Ano — Ele gritou, fazendo com que todos os estudantes ficassem animados — Vocês sabem muito bem onde é e… Ora, o que temos aqui!

Os olhos do garoto mais pareciam pedras de âmbar e estava repousados em Selena. 

— Aluna nova? Deve ser, nunca te vi por aqui! — Ele fala se aproximando da bruxa.

— Culpada — Ela fala esticando a sua mão para cumprimentá-lo — Selena.

— Magnus — O garoto fala segurando com certa força a mão de Lena.

Um choque percorre o corpo da bruxa. Não daqueles que faz você acordar ou aqueles descritos em livros de romance que faz com que instintivamente as pessoas se apaixonem. Não era um sinal de que Selena havia encontrado sua alma gêmea. Era uma corrente elétrica que, se não fosse interrompida, poderia matar.

Selena sente sua respiração falhar, se afastando rapidamente do garoto.

Lena!

A voz feroz de Sebastian percorre a mente da garota, mas ela não é capaz de responder. Estava numa espécie de transe, como se todo o seu cérebro estivesse lutando contra si mesmo.

— É um prazer conhecê-la, Selena — Sua voz era maliciosa, como um demônio 

— I-Igual…

— O que há? Eu não mordo! — Magnus fala passando a mão em seu cabelo e logo em seguida arrumando sua jaqueta — Te espero na festa, minha querida.

Selena não entendia o por quê dele estar tão indiferente ao que acabara de ocorrer. Magnus se afasta com um sorriso que poderia ser tanto sedutor quanto mortífero e volta para sua motocicleta.

— Lena! — Sebastian finalmente havia alcançado sua irmã — Você está bem?

A garota engoliu em seco. Estava realmente tudo bem?

A responda: Não.

Você sentiu?

Muito fraco, maninha…

O que acha que deve ter acontecido?

— Garota, arrasando corações! — Jamilla fala se afastando de sua mais nova amiga — Agora você precisa ir ao luau! Não tem como negar o convite do cara mais gato do mundo!

O máximo que Selena conseguiu fazer foi dar um sorriso amarelo. Havia algo muito errado com essa cidade.

— Eu busco os dois às 8, sem pestanejar, na Mansão Blackwaters! — Ela fala decididamente se encaminhando para um carro vermelho — Até logo!

Como ela sabe onde moramos?

Não é muito difícil deduzir essas coisas quando se trata de uma cidade pequena, mana… Nossa avó não é tão reclusa assim e…

Antes que Sebastian pudesse falar um conversível branco que tocava “Girls just wanna have fun” em alto e bom som adentra o espaço escola. Era Celeste. Pior ainda, ela Celeste vestida com um sobretudo vermelho e óculos de sol em um dia nublado.

“Como se meu dia não pudesse piorar!”, pensa Selena tentando afastar a energia de Magnus de seu corpo.

Salém, sem sombra de dúvida, estava bem diferente do que Selena se lembrava.


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Notas finais do capítulo

Comentem: ideias, sugestões, elogios; estou sempre aberta para novos aprendizados.



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