Meu nome é Nirvana escrita por belle_epoque


Capítulo 8
É um circo e o Guto é o palhaço.


Notas iniciais do capítulo

Oi
Não sei se as pessoas estão gostando dessa história, acho que não. Porque ela tem uma narrativa meio cansativa ne? Mas enfim, eu acho divertida e tenho muitos capítulos já escritos... sendo assim, se divirtam!

(Obrigada Radiante como o Sol por sempre me apoiar ;-;)

Bisou ♥
Belle.Époque



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Eu juro que se ouvir mais alguém falando na maldita festa que Augusto Macciani vai dar em sua casa no lago, eu vou surtar. Sério. Parecia que as pessoas não sabem falar de outra coisa na escola e é claro que eu estou tipo: “pff, e daí que vai ter um pula-pula, tatuagem de renna, piscina aquecida, drinks com bebida, Karaokê, música ao vivo e um quarto escuro?”

O que Guto estava planejando tinha nome: orgia.

Algo tão baixo-nível como ele.

Eu já havia ouvido falar sobre a casa do lago dos Macciani.

Não sou muito boa em geografia, mas aí vai: nossa pequena cidade era dividida em duas partes: o centro e a parte rica. O centro ficava perto do mar e costumava ser a parte rica (com grandes casarões antigos de frente para a costa), até que os pescadores com suas humildes palafitas de madeira começaram a migrar para lá... fazendo com que os ricos migrassem para outra parte: o lago.

Hoje em dia, era praticamente um condomínio fechado. E de luxo, claro.

Lembra de quando eu falei sobre piqueniques no lago aos sábados?

Era só uma lembrança agora.

Se pessoas em condomínios costumavam dividir piscina, na minha cidade eles haviam dividido um lago inteiro. Talvez os ricos achassem legal ter uma mansão onde pudessem andar de pedalinho e lanchas quando quisessem, sem povão e pobres à vista. Uma prova de que o dinheiro comprava tudo.

Sinceramente, eu gostava da minha casa grande e confortável entre o centro e o lago, mas para algumas pessoas, o suficiente não era o bastante, né? Para quê ter uma casa grande e confortável quando você podia ter uma mansão com segurança 24h no lago?

— Certeza que Guto só está fazendo tudo isso para esfregar na sua cara que ele pode — Cibele me disse ontem. Acho que esperando me consolar.

Não que eu precisasse ser consolada, claro.

— Típico de pessoas que não têm classe — eu respondi, de um jeito que aprendi com a minha avó. Nunca pensei que repetiria algo que ela costumava dizer. — Ele está montando um circo e mal sabe que é o palhaço.

Ela riu e eu baguncei os cabelos dela.

Cib tem uma risada fofa. Como o som de um pequeno animal.

— Como você consegue, Nirvana? — me perguntou. — Guto faz de tudo para te humilhar, te irritar, te fazer subir pelas paredes... e você consegue dar risada e tirar graça disso tudo. Eu já teria surtado, na moral.

— Cibele, olha para aquilo — eu disse, apontando para o dito cujo que estava há alguns metros longe da gente, conversando com algumas garotas bonitas a maquiadas como bonecas. — A única coisa que eu sinto por ele, é pena. E ranço. Ele querer jogar na minha cara que tem uma casa maior que a minha..., bem, Freud explica, não é?

Ela deu uma risada maldosa.

— Meu deus, Nivi! — ela disse, chocada. Piadas de cunho sexual fazem isso com Cibele. — Eu sei que concordamos que é impossível, mas e se...

— Não.

— ... ele gostar...

— Já disse que não!

— E se ele fizer essas coisas porque gosta de você e quer sua atenção?! — ela concluiu, caindo na gargalhada logo em seguida.

Eu revirei os olhos, enojada com o pensamento.

Eu e o cara-de-rato?! Nunca! Sério, no dia em que isso acontecer você pode dar um tiro na minha cabeça porque significa ou eu desisti de mim mesma ou que tive morte cerebral porque ele só pode ter deixado de funcionar.

Juro que só não protestei naquele instante, porque o maldito olhou para nós. Como se percebesse que estávamos falando dele. Deu-nos um sorriso convencido, provavelmente achando que seu plano babaca e infantil estava funcionando, seu amigo ergueu o olhar também e nos encarou ao perceber a atenção de Guto.

Se não me engano, o nome dele era Daniel.

Acho que não disse isso antes, mas ele é um garoto negro, de cabelos curtos e rosto bonito. Sarado e cheio de estilo, como Michael B. Jordan (e eu sei, parece covardia comparar um homem com ele, Michael é um Deus!). Eu pessoalmente não tenho nada contra ele, e pelo modo como não dirigia a palavra a mim, poderia supor que ele não tem nada contra mim também. É uma pena que esteja tão mancomunado com Guto.

E eu só estou dando ênfase à ele agora... porque tive uma revelação.

Bastou ele (Daniel) olhar em nossa direção para Cibele desviar o olhar e se virar de costas imediatamente, puxando-me pelo braço em direção à nossa sala de aula. E é claro que isso me chamou atenção porque, bem, era uma situação atípica. Em geral, eu era quem dava as ordens. Não que me importasse com a inversão de papéis, por isso a segui.

Mas logo percebi que ela estava com as bochechas rosadas...

E minha ficha despencou.

— Ai meu deus... — eu comecei.

— Cala a boca — ela pediu.

— Você gosta-...

— Shiu — insistiu.

— Você gosta do Daniel — eu sussurrei animada.

Quer dizer, tá, a minha melhor amiga tem uma paixonite pelo capanga do cara que eu odeio, mas quem liga? Ela está apaixonadinha! Eu podia ter desistido de arrumar um namorado (e dado uma de Xuxa afirmando que no Brasil não há homem para ela), mas puxa vida! Cibele merecia uma paixão adolescente! Quer dizer, olha para ela: meiga, fofa, prestativa, bonita... ela é tipo uma heroína de romance!

E teve que me rebocar até a sala de aula para que eu não acabasse gritando no meio do corredor que Cibele tinha uma paixão secreta por Daniel. Poucos alunos iam para a sala de aula durante o horário do almoço e recreio, só os excluídos (nós), por exemplo.

Certificando-se de que éramos só nós duas na sala de aula, ela soltou:

— Ele é... meio... bonitinho, não é?

Um “awwwn” escapou da minha boca.

— E inteligente — ela acrescentou, como se isso fosse importante. E era.

Bonitinho, por bonitinho, Guto também é. Pena que não tem cérebro.

É muita crueldade dizer que eu gostaria que o médico houvesse avisado para a mãe de AuGutoto que o seu filho ia nascer acéfalo para que ela pudesse ter a chance de abortá-lo? Porque eu tenho certeza de que ele já me disse coisa pior.

— Eu esqueci de fazer meu dever de casa da aula de Espanhol e ele me passou a cola ontem — ela confessou, com o rosto vermelho como um tomate. Espanhol era uma aula facultativa, podíamos escolher entre espanhol e inglês, eu havia escolhido inglês. — E eu nem tinha pedido... foi tão... legal.

Ela se sentou na própria cadeira e eu a envolvi nos meus braços como se fosse a coisinha mais preciosa do mundo e precisasse protegê-la. Sim, Cibele é isso para mim. Um cristalzinho sem defeitos que preciso proteger.

— A gente precisa dar um jeito de aproximar vocês — eu disse, com empolgação.

Ela recuou, alarmada.

— Não.

— Como assim não? — perguntei, confusa.

— Não! Nirvana. Não precisa nos “aproximar” — ela disse, sem graça. — Ele nem deve saber que eu existo e...

— Cara, ele te passou uma cola! Você não passa cola para qualquer pessoa assim no colégio — eu comentei. Quer dizer, eu espero né. Não é como se eu tivesse experiência... sei que ninguém me passou cola antes. — Se ele não sabe que você existe, é uma boa hora para fazer ele passar a saber.

Ela ficou ainda mais envergonhada. Parecia que ia ter um troço.

— Não... não, não, não, não! — ela insistiu. — Ele é amigo do cara que você odeia!

— Algo fácil de ser resolvido — eu confessei. — Só preciso matar Guto antes.

Claro que falei isso brincando, mas Cibele me olhou como se eu fosse realmente capaz de fazer algo desse tipo. Alô! Eu não estava numa novela mexicana (muito menos numa série da Netflix!)... se bem que a sra. Erileusa bem poderia dizer que tentou me transformar numa Paulina Martins, mas eu estou mais para Paola Bracho.

— Nivi, você não vai fazer nada e ponto! — ela pediu, envergonhada.

Caso não tenha ficado muito claro: ordens não funcionam direito comigo.

— Você me entendeu? — ela insistiu. — Nada!

Eu tenho certeza de que qualquer figura de autoridade que você veja na minha vida (sei lá, mãe, pai, professores, diretor, minha babá...) poderiam lhe dizer que há duas coisas que são psicologicamente impossíveis para Nirvana Trindade: reconhecer uma figura de autoridade e seguir à ordens.

Eu sei que a eu-do-futuro provavelmente vai dizer algo do tipo: “não se meta nisso Nirvana! Não é da sua conta e tem a ver com a sua amiga apaixonadinha...” mas a verdade é que eu conheço Cibele bem demais. Sei que se não for empurrada na direção certa (para cima de Daniel, eu acho) não vai fazer nada. E tenho quase certeza de que se Daniel não levar um empurrão, ele também não se mexer.

É a famosa lei da inércia... dos apaixonados.

—--

LUGAR: Palacete Pinho Rodrigues.

ESTADO: Caindo aos pedaços.

O professor de história me fez ler um capítulo de uma tal de Françoise Choay hoje de tarde, durante nossas reuniões do clube. Sim, era um clube de fachada, mas isso não queria dizer que eu não mostrasse à ele alguma das coisas que eu fotografava/anotava, e que ele não me orientasse (com, por exemplo, textos sobre casas antigas e sobre... bem, coisas antigas em geral).

O texto falava sobre patrimônio e monumento histórico.

Em uma de minhas passagens preferidas, a autora diz que o sentido original do termo vem do latim: monumentum, que por sua vez, deriva de monere (“advertir”, “lembrar”), aquilo que traz à lembrança de alguma coisa. Sendo assim, o que faz de um monumento, um monumento, é precisamente o seu modo de atuação sobre a memória, a fim de preservar e manter a identidade de uma comunidade.

“O monumento é uma defesa contra o traumatismo da existência” ela escreveu: “Um dispositivo de segurança. Ele constitui uma garantia das origens e dissipa a inquietação gerada pela incerteza dos começos”.

Se era esse o caso, como as pessoas dessa cidade simplesmente deixavam seus monumentos históricos ruírem? Estou aqui, sentada num sofá velho e empoeirado, equilibrando um celular para iluminar, porque eu precisava escrever isso. Precisava comparar as mansões construídas perto do lago, em detrimento das casas antigas e abandonadas do centro. Importantes demais para permitirem uma demolição, insignificantes o suficiente para acabarem no esquecimento.

Pela primeira vez, não saio caçando fantasmas.

Ao contrário, apenas fico sentada esperando eles virem até mim.

E inexplicavelmente eles vêm. Não do jeito que eu queria, mas de um jeito fantasioso. Como se eu fosse capaz de preencher lacunas, de consertar o papel de parede desgastado, o teto com um enorme buraco onde o telhado desabou... E me lembrar de como era quando havia vida ali, antes do abandono. A riqueza e luxo da época.

No sofá onde estou, é provável que a Senhorita Lucinda Rodrigues tenha recebido o seu pedido de casamento de Gregório Fraga, um ricaço da cidade, em 1870 e pouco. Como dizia na história que eu havia pesquisado mais cedo. Haviam escravos servindo-os, porque era assim naquela época (infelizmente) e me perguntei se eles pareceriam tão infelizes o como eu os imaginava.

E mesmo assim, tudo estava ruindo.

As memórias... estavam ruindo. Sumindo aos poucos.

Percebo que é disso que eu gosto. Monere. Advertir, lembrar.

Fico ali, até dar 00h e poder dizer a mim mesma: “Parabéns Nirvana. 16 anos”.

 


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