Recomeços escrita por Sophia Snape


Capítulo 25
Paris é uma festa


Notas iniciais do capítulo

De agora em diante, queridos leitores, navegaremos na reta final de Recomeços. Tenho que agradecer muitíssimo a todos os leitores que me acompanharam até agora, me dando força e incentivo. Sinto muitíssimo por ainda não ter conseguido responder os comentários maravilhosos que tenho recebido, mas tenham a certeza de que eles são os responsáveis por eu ter conseguido dar continuidade a essa história. Cada um de vocês tem um lugar muitíssimo especial no meu coração ♥

Sobre o capítulo: desde o começo eu tinha essa viagem para Paris em mente. Eu não sabia como ou quando, mas sabia que eles passariam pela cidade luz. De início, eles viajariam sem ter se declarado ainda, alheios aos sentimentos um do outro; depois, a própria história se conduziu de outra maneira e fiquei feliz com o resultado.

Uma das cenas foi inspirada num dos episódios da segunda temporada de Modern Love, e se quiserem saber podem conversar comigo depois.

Como sempre, um super hiper mega agradecimento à Julia Fernandes, minha beta que ainda de corrigir ainda deixa notas lindas ♥

Quero falar muito e não posso haha então boa leitura!



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Uma semana depois e Hermione tentou, sutilmente, abordar o aniversário dele. Ela sabia que era no dia 9 de janeiro desde a escola, descobrindo por acaso ao encontrar um registro dos professores na biblioteca. Era uma sessão esquecida, escura e empoeirada, e os alunos raramente passavam por lá. Hermione estava estudando exaustivamente para os Exames Finais quando voltara para terminar o último ano, e ela dividia o tempo ajudando a reorganizar a biblioteca e qualquer outra coisa que Minerva pedisse. Numa dessas incursões, numa tarde esquecida de um sábado no outono, o livro acabara em suas mãos por acaso — ou tanto quanto as coisas em Hogwarts acontecessem ao acaso, claro.  

Ela ficara extasiada com o que encontrara, mesmo sabendo que provavelmente não era um livro para ser lido. Mas ela já havia infringido regras piores, então sua curiosidade grifinória levara o melhor sobre ela. Foi um ano estranho, confuso, e Hermione mal se sentia encaixada na sala de aula, por mais absurdo que isso parecesse. Hogwarts não parecia certo. Nada ali parecia. Mas quando Hermione viu o nome dele, um pequeno, breve registro de uma vida tão conturbada e misteriosa, ficara extasiada. A data ficou com ela, guardada na sua mente e no seu coração, como aquele amor platônico, que antes ela achava que seria para sempre apenas uma admiração profunda.  

E agora Hermione mal sabia como dizer isso a ele. Severo ficaria bravo? Ela jamais contaria para as outras pessoas da vila, claro, mas esse pequeno detalhe era só mais um lembrete da conversa que ela estava evitando. Hermione prometera a si mesma que contaria tudo a ele assim que o Ano Novo passasse, mas como ela poderia? Ele se entregou a ela naquela noite, confiou nela, contara tudo. E então desabara, mostrando uma vulnerabilidade que ela tinha certeza que ele não mostrara para ninguém em toda a sua vida. Hermione ficou em choque, paralisada pelas emoções que corriam entre eles naquele momento. Seu coração doeu por ele, doeu por todo o sofrimento que ele passara, pela vida que tivera.  

Ela queria expulsar todos os seus fantasmas, todos os demônios que o assombravam. Toda a dor. Eles haviam chegado um pouco cansados da festa e apenas dormiram nos braços um do outro, aconchegados no calor e na promessa de um futuro emocionante que se desenhava à frente deles, e então Hermione foi acordada durante a madrugada pelos gritos estrangulados dele. Ela lançou um  Lumus  e o que viu fez o seu coração quebrar em mil pedaços: ele estava tendo um pesadelo. Suando frio e pálido, lutando por algo que não podia realmente alcançá-lo fisicamente, mas minava cada pedacinho do seu emocional, corroendo-o de dentro para fora.  

— Severo, acorde. — ela o chamou suavemente, apertando levemente o braço. Ele apenas se contorcia na cama, as mãos agarrando o lençol enquanto um gemido estrangulado de medo escapava dos seus lábios. — Severo! Severo, acorde.  

Ele parou de repente, seus olhos se abrindo lentamente enquanto ele absorvia o quarto ao redor, sob a névoa do sono e dos sentimentos ruins do pesadelo. — O que — ele piscou, de repente se dando conta da mulher ao seu lado. — Hermione — ele sussurrou, assustado. Então ela o puxou para o si, sentindo-o trêmulo contra ela, frio como a neve lá fora.  

— Está tudo bem agora. — ela o acalmou, sussurrando palavras carinhosas no seu ouvido. 

— Apenas um pesadelo. — Severo disse, não encontrando os seus olhos. — Minha camisa. Onde ela está? — ele perguntou de repente, frenético, como se ainda estivesse confuso. 

Hermione franziu a testa, puxando as mãos dele para o seu coração. — Severo, amor, calma. Fale comigo. O que aconteceu? — ela implorou, assustada.  

— Não quero que olhe para isso. — ele cuspiu, se afastando bruscamente até o limite do colchão. Ele apoiou o rosto da nas mãos, seu corpo se curvando para fora da cama. Hermione teve que segurar um soluço, o coração partido para o quão quebrado ele parecia. 

Hesitantemente, como se estivesse se aproximando de um animal ferido, Hermione tocou o seu ombro, sentindo-o endurecer com o toque. Olhando parcialmente por cima do ombro, ele a viu segurando sua camisa branca enrugada.  

— Obrigada. — ele murmurou depois de um tempo, e sua voz estava rouca. Ele rapidamente se vestiu, escondendo as suas cicatrizes físicas, e o quarto foi engolido pelo silêncio. Hermione o tocara de várias maneiras nos últimos dias, mas a região do antebraço, onde estava a Marca Negra, era um território proibido.  

Mesmo desbotada, Hermione podia ver os seus contornos, e Severo sempre endurecia quando o seu toque chegava muito próximo da marca. Ela entendia e respeitava isso, se convencendo que o momento certo chegaria. Ela só não esperava que seria assim. 

Ela o puxou pelos ombros, fazendo-o se deitar novamente, e Severo endureceu ao lado dela. Aos poucos, Hermione traçou padrões carinhosos pelo rosto dele, depois deitou a cabeça dele em seu peito, entrelaçando os dedos no seu cabelo escuro e escorregadio, massageando o couro cabeludo num gesto calmante.  

E quando ela o envolveu, o segurou, pôde sentir seu corpo tremer com as emoções remanescentes de um pesadelo que ela queria a todo custo expulsar da cabeça dele, cobrindo-o com memórias felizes, apagando toda a sua dor, todos os seus traumas. E não foi até que ela sentiu a umidade se espalhando pelo seu peito que Hermione percebeu que ele estava chorando. — Deuses, Severo.  

Ela sussurrou de volta, deixando as lágrimas caírem livremente pelo rosto. Ela o embalou pelo que pareciam horas, sentindo-o tremer em seu abraço, soluçando em sua angústia, e Hermione ficou com ele o tempo todo, abraçando-o forte, deixando-o aquecido e seguro, mostrando a ele que era bem-vindo, que não havia julgamentos, que só havia os dois ali, naquele momento. 

Sempre 

A sensação daquela noite ainda ecoava tão forte em sua mente que Hermione tinha vontade de chorar apenas com a lembrança. O que aconteceu depois disso foi apenas um borrão. Eles conversaram noite a dentro, sussurrando baixinho no travesseiro, e Severo desabafou com ela. Suas inseguranças foram postas à prova, seus medos, culpas, vergonhas. Traumas. Ela jamais imaginou que veria o dia em que Severo Snape falaria por horas seguidas. E Hermione apenas o escutou, vez ou outra murmurando seu entendimento, sua compreensão, esperando que pelo menos um pouco da sua dor pudesse ser dissipada.  

O barulho do sino a despertou, indicando a entrada de um cliente. Ela piscou, forçando um sorriso, deixando os pensamentos descansarem no fundo da sua mente enquanto o dia avançava. Eles esperavam que a primeira semana do ano seria calma, mas ao invés disso tiveram um ritmo intenso de trabalho. Muitos clientes novos chegando, novos lotes pós-feriado para os clientes fixos, e a promessa de um ano agitado. 

A perspectiva de voltar a estudar quase a deixava tonta. Ela estava tão empolgada que mal podia entender como passara tanto tempo longe do meio acadêmico. Hermione se forçou a acreditar em tantas coisas que não condiziam com ela... Era triste. As mentiras que contamos a nós mesmos costumam ser as piores, e o seu estrago até mais profundo. E a culpa era dela, acima de tudo. Na tentativa de agradar a todos ela fora covarde, renunciara seus próprios desejos, e envolveu a todos na mentira que ela contava a si mesma. E agora ela estava fazendo de novo.  

— Em que posso ajudar, senhor? — ela se distraiu entregando e anotando pedidos, verificando e-mails e contratos, agendando reuniões com fornecedores. No fim do dia estava exausta, só queria um longo banho quente e- 

Uma xícara de chá levitou até ela, pousando suavemente no balcão. Hermione sorriu. — Achei que estivesse precisando.  

— E estou. Obrigada, Prof. Snape. O senhor é sempre um chefe muito gentil.  

Ele bufou, divertido, enquanto cruzava os braços e encostava no balcão. — Como estão os currículos para o novo atendente?  

Hermione suspirou depois de tomar um longo gole. — Separei alguns para mostrar a você, e descartei outros de primeira. Acho que vamos conseguir alguém até o fim de janeiro.  

Severo assentiu, aliviado, depois olhou para ela longamente.  

— O que foi? — ela sorriu, colocando a xícara no pires num tilintar suave.  

Ele apenas deu de ombros, desviando o olhar. — Não é nada. 

— Claramente é alguma coisa. — ela revirou os olhos, se aproximando dele. — Tenho permissão para beijá-lo agora que o horário de expediente acabou? 

Severo levantou uma sobrancelha elegante, tirando uma mecha de cabelo do rosto dela e enrolando atrás da orelha. Eles haviam combinado algumas regras agora que estavam juntos e coexistiam no mesmo ambiente de trabalho. Severo estava preocupado com a dinâmica, com receio de que pudesse ser naturalmente desagradável e isso afetasse o relacionamento deles. Hermione revidou, dizendo que palavras ferinas não a afastariam, mas concordou com algumas regras mesmo assim. Eles combinaram de evitar qualquer contato físico mais...  intenso  durante o dia, e especialmente no laboratório — ela ficou um pouco decepcionada com isso, porque tinha pensado em vários cenários envolvendo aquela bancada em particular. 

— Já passa das 18h. — ele sorriu, puxando-a para si.  

— Então aquela bancada do laboratório não é totalmente fora de possibilidade? 

Ele riu, a voz de barítono mandando ondas de calor até ela. Hermione estremeceu. — Não, Srta. Granger, não é nem remotamente fora de possibilidade.  

Eles ficaram abraçados por um tempo, absorvendo o prazer de estarem nos braços um do outro, quando Severo se remexeu inquieto. Hermione percebera que ele estava distante e um tanto quanto taciturno durante todo o dia, e decidiu lançar a cautela ao vento para perguntá-lo. — O que está preocupando você? 

Severo finalmente olhou para ela, passando as costas dos dedos pela sua bochecha. Hermione fechou os olhos, suspirando suavemente. — Estava pensando sobre aqueles fornecedores que querem uma reunião presencial.  

Hermione levantou o rosto. — Em Paris?  

Severo assentiu. — Você me falou deles ano passado, e estávamos muito atolados na época. Conversaram comigo brevemente ontem e, bem, não são clientes simples. Seria um grande negócio. 

Hermione se afastou, curiosa. — Quão grande? 

— Muito.  

— Pare de fazer suspense! — Hermione bateu nele levemente, ansiosa.  

— Bruxa! — ele exclamou falsamente, fazendo-a rir. — Bem, se você está tão curiosa... 

— Eu estou.  

— Eu vivo para satisfazê-la, senhora.  

Hermione estalou a língua. — Severo! 

— Hermione? 

— Você é impossível. Fale logo antes que eu enfeitice você.  

Severo suspirou dramaticamente. — Consigo pensar em punições melhores. Além disso, é divertido irritá-la.  

— Vou te dizer o que é divertido. Agora anda, estou curiosa. 

— Muito bem. Uma grande empresa trouxa entrou em contato para uma parceria. Eles querem os produtos de beleza com ingredientes naturais. Disseram que nunca viram nada parecido, e querem conversar.  

— Claro que não viram. Você é o melhor Mestre de Poções.  

Severo sorriu. — O melhor? 

Hermione revirou os olhos, sorrindo com carinho. — Não vou repetir. Não queremos inflar o ego de um sonserino. Já é grande o suficiente. 

— Grande? 

— Merlin, todos os homens são assim quando o assunto envolve o tamanho do — ela gesticulou para a frente das calças dele.  

Severo jogou a cabeça para trás, rindo profundamente. — Bem, Srta. Granger, o que são os homens se comparados a rochas e pedras?  

Hermione relaxou, perdendo a batalha de parecer exasperada para rir com ele e completar. — Ou a carruagens que funcionem. E pare de citar Jane Austen para me distrair, sonserino terrível.  

Severo a puxou novamente, rindo. — Bem, a empresa é a  Loccitane .  

— Sério? — Hermione exclamou, surpresa. Era realmente muito mais do que ela esperava, e exigiria muito da pequena botica.  

Ele assentiu, falhando ao esconder o seu sorriso diante da empolgação dela. — Conversei diretamente com um dos diretores, mas ele preferiu conversar pessoalmente. Teríamos que ir na sexta e- 

— Para Paris? 

— Sim, e então nós- 

— E a reunião seria com esse diretor? 

— Com o Sr. Baussan, sim.  

— Mas, é depois de amanhã! Nós nem temos um projeto e- 

Ele a silenciou com um dedo. — Vou chegar lá, bruxa.  

Hermione apertou os lábios. — Desculpe. Não vou interromper.  

— Sim, você vai. Como eu ia dizendo, a reunião seria na sexta, às dez. É apenas uma conversa inicial, mas se isso satisfazer a sua ansiedade tenho certeza que eles não serão contrários a uma  pequena  — ele enfatizou, e Hermione sorriu — apresentação.  

— Então nós vamos viajar? — Hermione estava quase dando pulinhos de alegria.  

— Bem, teríamos que fechar a loja na sexta, claro, mas acho que é por uma boa causa.  

— Ou podemos pedir para alguém de confiança ficar no atendimento.  

— Defina de confiança. — ele estreitou os olhos. Hermione abriu a boca para responder, mas ele completou: — E que não envolva ninguém com sobrenome Potter ou Weasley.  

— Na verdade, ia dizer alguém com o sobrenome Lovegood.  

Severo arregalou os olhos, chocado. — Você está completamente louca, bruxa? A Srta. Lovegood é- 

— Perfeitamente capaz de atender, e sabe guardar segredos. Além disso, ela já sabia sobre nós. Não sei como ela faz isso, mas não importa. Confio nela.  

— E por que você acha que ela estaria disponível? 

Hermione deu de ombros. — Não custa tentar.  

Severo suspirou, massageando a testa. — Não sei se gosto disso. São só dois dias afinal, e- O quê? — ele perguntou quando a viu mordendo o lábio inferior.  

— O quê? — ela perguntou, como se não soubesse o que ele estava falando. 

Severo bufou. — Você morde o lábio quando está nervosa ou quando está segurando uma opinião. Desembucha.  

— Bem, é que eu pensei... — ela começou, deslizando as mãos pelo peito dele. Seu coração batia forte. Ela estava sendo muito ousada?  

— Sim? 

— Bem, já que estaremos em Paris, por que não passamos o fim de semana?  

Severo se remexeu desconfortável, olhando para o chão. — Bem- 

Hermione sentiu o rosto esquentar, imaginando que ele estivesse desconfortável com a proposta. — Quer saber? Esqueça que eu disse. Vamos focar na reunião e- 

— Você tem essa mania terrível de me interromper e tirar palavras da minha boca. — Severo olhou para ela com uma carranca. — Ia dizer que pensei em — ele pigarreou — jantarmos em Paris na sexta e, sim, passar o fim de semana.  

Hermione parou, em choque. Depois a realização do que ele estava tentando dizer a atingiu e ela sorriu. — Severo Snape, você está me convidando para um encontro?  

Ele colocou a mão na nuca, envergonhado. — Bem, eu — ele exalou, nervoso por não encontrar as palavras certas. — Sim. Tomei a liberdade de reservar um lugar e- 

— Um  lugar ? — Hermione sorriu. — Você está me convidando para o jantar  e  para o café da manhã, Sr. Snape? 

Seu tom era brincalhão, mas Severo rapidamente endureceu, constrangido. — Eu não estava implicando que passaríamos a noite, claro. Só pensei que talvez, bem, não importa. Posso cancelar e- 

— Geralmente sou eu que falo sem parar. — ela sorriu com carinho, tocando o lábio dele com a ponta dos dedos. — Eu poderia passar a noite com você em qualquer lugar do mundo. 

Ele bufou, depois levantou uma sobrancelha. — Qualquer lugar, você diz. Vou guardar essa informação para referência futura.  

— Então nós temos um encontro em Paris? Onde vamos ficar? Vamos poder ir ao Louvre? Oh, Severo, podemos almoçar no Le Grand, e depois quero te mostrar a pequena sorveteria que meus pais me levavam. E então podemos sentar na escadaria da Ópera Garnier e — ela escondeu o rosto nas mãos, percebendo que ele a olhava divertido — sinto muito.  

Severo riu baixinho. — Sim, temos um encontro em Paris. Para a segunda pergunta: é um segredo. E, sim, que tipo de pessoa seríamos se não fôssemos ao Louvre?  

Ela balançou a cabeça, incrédula. — Não acredito que vamos à Paris! Estou tão animada. — Hermione o abraçou, depois distribuiu vários beijos no seu rosto. Severo se divertiu diante a sua empolgação, sentindo o coração pular uma batida com isso. Ele esperava que ela gostasse, claro, mas não podia imaginar essa resposta animada. — Temos tanto a fazer! Vou falar com a Luna imediatamente, e então arrumar as malas. — ela desvencilhou os braços do pescoço dele, praticamente pulando ao contornar o balcão enquanto pegava o casaco e as luvas.  

— Você pode querer colocar um traje trouxa de gala também. — ele falou quando ela alcançou a maçaneta.  

Hermione se virou para ele, uma sobrancelha levantada. — Trajes de gala? 

— Talvez não tão formais, mas para a noite, sim.  

— Para que? 

Severo torceu o canto da boca num meio sorriso. — Paciência, bruxa. Não seja tão grifinória.  

Ela praticamente bateu o pé. — Isso é impossível. Agora vou ficar remoendo essa surpresa até sexta. Não é justo deixar uma informação pela metade, Severo Snape.  

— Que pena? — ele disse em resposta, se desviando quando ela lançou uma luva em sua direção.  

— Não faz mal — Hermione deu de ombros, fingindo indiferença — Só vou ter que deixar para trás meu presente para você.  

— Presente? — ele cruzou os braços sobre o peito, curioso.  

— Bem, o que eu posso dizer? Paciência, Severo. — ela simplesmente lançou um beijo no ar e saiu para o ar frio da noite, ecos da sua risada suave ficando para trás.  

Severo sorriu consigo mesmo, balançando a cabeça. Segurando a luva vermelha em suas mãos, ele a trouxe até os lábios e beijou antes de guardar em segurança no bolso interno do seu casaco.  

Seria um final de semana inesquecível, e ele mal podia esperar.  

... 

— Você já fez isso antes? — ele perguntou, desconfiado.  

— Claro. — ela assentiu rapidamente, dando de ombros. Severo levantou uma sobrancelha, cruzando os braços sobre o peito. Ele poderia parecer intimidante, mas a toalha branca enrolada em torno do ombro e o cabelo úmido caindo para todos os lados eliminava qualquer chance dele parecer remotamente assustador.  

— Você não me convenceu.  

Hermione riu, parando ao lado dele com uma tesoura nas mãos. — Não chegue com isso tão perto da minha orelha, bruxa. Eu quero mantê-la.  

— Muito engraçado — ela o beijou rapidamente na bochecha. — Agora, fique quieto. Não se mova.  

— Acredite, Hermione, vou ficar o mais imóvel possível.  

Era quarta-feira, 9 de janeiro, e Hermione queria demonstrar de todas as maneiras que o amava. Ela decidira não comprar nenhum presente, nem comentar nada com ele, ou persuadi-lo a falar, então ela decidiu apenas mostrar com gestos simples o quanto ele era amado. Ela não planejara exatamente cortar o seu cabelo, mas eles iriam viajar, afinal, e foi a desculpa perfeita para pegar a tesoura e fazê-lo sentar na cozinha.  

Ela teve que fechar os lábios para não sorrir, porque ele parecia adorável demais com aquela toalha de rosto mal cobrindo os seus ombros, e uma carranca persistente que indicava claramente que ele estava achando tudo aquilo absurdo.  

— Eu nem mesmo preciso cortar o cabelo, Granger. Uma varinha faz tudo o que é preciso.  

Hermione revirou os olhos, sorrindo com carinho. — Não seja resmungão. Eu quero fazer isso.  

— É uma maneira de dizer que o meu corte está ruim? — ele apertou os lábios, e Hermione parou com o pente na metade do caminho.  

— É uma maneira de dizer que amo você, e amo cuidar de você. Agora, pare de fazer isso. Se não quer que eu corte, é só dizer. — ela respondeu um pouco exasperada, olhando firmemente para o perfil dele. Severo olhava resolutamente para a porta, mas ela pode notar que ele hesitara por um milésimo de segundo. 

Ele fez uma careta. — Hermione, é que — ele parou, incerto de como dizer isso, e ela esperou pacientemente. — Eu sei que você está tentando comemorar o meu aniversário. Não sei como descobriu, mas também não é um segredo.  

— Severo, eu- 

— Não estou bravo, Hermione. Mas você não precisa fazer isso. É só mais um dia comum, não me importo em comemorar. Aliás, prefiro que ele passe inteiramente em branco.  

Hermione assentiu, colocando a tesoura e o pente em cima da mesa. — Entendo.  

— Bom — Severo piscou, se sentindo um pouco ridículo. Ele estava prestes a tirar a toalha e se levantar quando ela o parou, colocando a mão em seu ombro.   

— Não disse que eu concordo. Severo, é o seu dia, sim, e não precisamos fazer um grande negócio. Respeito a sua decisão. Mas isso é o que quero fazer para você  sempre . Todos os dias.  

— E isso inclui cortar o meu cabelo? — ele perguntou, cético. 

Hermione quase bateu o pé no chão da cozinha, mas se controlou. Ele estava sendo deliberadamente obtuso, e ela sabia que era só uma maneira dele se fechar em torno de si mesmo. Afastá-la para que ele não se magoasse.  

— O que está realmente incomodando você, Severo? Você poderia simplesmente conversar comigo, e então podemos passar por isso.  

— Nada está me incomodando, Hermione. Vamos acabar logo com isso.  

— Deuses, você faz parecer como se estivesse fazendo algo horrível. Incline a cabeça para trás.  

Ele se recusou a olhar para ela no processo, fechando os olhos para a sensação da água morna molhar o seu cabelo. Os dedos dela vieram em seguida, massageando suavemente o couro cabeludo enquanto ela esfregava o shampoo com a ponta dos dedos. Era... indescritível. Quando alguém fizera algo assim por ele? Talvez a sua mãe, quando ele era muito, muito novo, mas ele sequer tinha lembranças disso.  

As pessoas geralmente se referiam ao seu cabelo como gorduroso, sujo, seboso. Passou muito tempo desde que comentários assim o incomodassem, mas ele estaria mentindo se dissesse que os adjetivos nada gentis não o atormentavam. Severo sabia que não era bonito, e não tinha ilusões sobre isso, mas o incomodava pensar no que Hermione pensava a respeito. Ela dissera várias vezes que adorava a sua aparência, e ele não teve dúvidas da sua atração por ele, mas a insegurança praticamente gritava em seu ouvido.  

Mas agora, enquanto a água escorria, ele só conseguia pensar em como era bom. — Pronto, pode voltar. Devagar. Isso. 

Severo era muito alto, e a cabeça de Hermione mal alcançava o seu queixo quando estavam de pé. E agora, sentado ali, seus olhos estavam bem na altura dos seus seios enquanto ela se inclinava sobre ele para secar o seu cabelo. E de repente toda a briga anterior parecera tão idiota. Ele  era  um idiota, tentando forçar uma briga apenas para que ele a afastasse, imaginando que a qualquer momento ela iria embora.  

Ela começou a passar o pente pelos fios úmidos, devagar, como se tivessem todo o tempo do mundo, e então se abaixou para olhar atentamente para a pontas presas entre os dedos. Quando o olhar dela ficou satisfeito, Severo a viu alcançar a tesoura e, com uma expressão nada menos que compenetrada, cortou os fios sobressalentes.  

Hermione repetiu o mesmo padrão em silêncio, até voltar para a frente dele novamente, parando entre as suas pernas. Severo a parou abruptamente, e eles finalmente seguraram o olhar. Ele engoliu em seco antes de começar, mas finalmente disse: — Fui um idiota. Sinto muito.  

Ela suspirou, assentindo suavemente. — Está tudo bem.  

Severo balançou a cabeça. — Não, não está. Não sei porque fiquei tão defensivo. Esse dia não me traz boas lembranças, é só isso. 

— Então por que não substituímos com boas lembranças? Quero dizer, se eu não estragar completamente o seu corte. —  ela riu sonoramente, e Severo abriu o mais ínfimo dos sorrisos em resposta.  

— Achei que já tivesse feito isso antes.  

—  Bem — ela corou, mordendo o lábio inferior —, minha mãe costumava cortar o cabelo do meu pai, e eu sempre observava. Não acho que possa ser muito difícil. 

— Merlin — Severo soltou uma risada curta, depois a puxou para o seu colo —, a verdade, Hermione, é que talvez este seja o primeiro aniversário decente que tenho há muitos, muitos anos. Me acostumei a não celebrá-lo. Depois da morte de — ele hesitou, mas Hermione sabia que ele estava falando de Lily — bem, nos anos que seguiram eu sequer me lembrava desse dia. Eles passavam no meio do estresse, da culpa, da sobrecarga dos dias em Hogwarts.  

— Se você não se importa — ela disse depois de um tempo, beijando-o carinhosamente na ponta do nariz — gostaria de comemorar o seu aniversário a partir de agora. Com bolo e tudo. Não precisamos falar para mais ninguém, mas esse dia é muito importante para passarmos como qualquer outro. Foi nesse dia que o homem que eu amo nasceu.  

Severo piscou, sem conseguir olhar de volta para ela. — Bem — ele pigarreou, e Hermione sorriu com carinho.  

— Então eu posso continuar?  

Ele revirou os olhos dramaticamente, e Hermione bufou. — Você pode tirar essa camisa se você quiser, sabe. Não queremos fios de cabelo nela.  

Hermione mencionou casualmente, e Severo olhou divertido para ela. — É um costume trouxa tirar a camisa para cortar o cabelo? 

Hermione assentiu várias vezes. — Com certeza! Todos os trouxas fazem isso, então... não sou eu quem faz as regras.  

Ele riu baixinho, seu peito retumbando num som rouco. Hermione respirou fundo. — Então... pelo bem dos costumes trouxas e etc.  

Hermione riu, observando com prazer enquanto ele deliberadamente abria botão por botão. Seu sorriso foi embora quando o tecido claro passou pelos ombros fortes, e Hermione ofegou. Ele era tão deslumbrante. Ela lambeu os lábios, incapaz de se concentrar. Severo apenas levantou uma sobrancelha elegante. — E então?  

Ela piscou, querendo se bater por ser tão óbvia. Tinha sido ideia dela, afinal. — Claro, eu vou- bem. — Hermione se inclinou sobre ele novamente, os seios parando a centímetros do rosto dele. 

— Eu deveria ter ido num salão trouxa há mais tempo. — ele brincou, e Hermione franziu a testa, confusa, até entender o que ele estava falando. 

— Se você deixar outra mulher cortar o seu cabelo a partir de agora — ela brincou — terá muito o que explicar, Severo Snape. 

Algo faiscou no seu olhar, um lampejo travesso que Hermione não tinha visto ainda e a balançou até o núcleo. Ele sorriu pelo canto da boca e Hermione entendeu tarde demais as suas intenções. — Severo, não!  

Ela riu, dando gritos indignados enquanto ele esfregava o cabelo úmido na frente da blusa dela, deixando o tecido transparente. — Agora sim. — ele apreciou enquanto os mamilos apareciam através da blusa.  

— Sempre soube que você era um pouco pervertido. Bruxo impossível. — ela reclamou com carinho enquanto tentava ignorar a mão dele tocando os seus seios por cima do tecido branco de algodão.  

— Se eu errar o corte, a culpa vai ser sua. — ela avisou, e ele continuou suas ministrações mesmo assim, ignorando-a. Seus polegares finalmente atingiram o bico dos seios, massageando-os, e Hermione ofegou.  

— Severo. — ela fechou os olhos.  

— Sim? 

— Pare de me provocar. — ela implorou, ignorando o desejo que lentamente começava a queimar dentro dela.  

Com um aceno rápido, a tesoura e o pente foram lentamente tirados da mão dela, levitando até pousar na mesa. Hermione estava prestes a protestar quando ele a puxou para o seu colo, colocando suas coxas ao redor do quadril dele. Qualquer reclamação que estivesse na ponta da língua morreu no instante em que ela sentiu a ereção dele através da calça. 

— Você disse que quer tornar o meu aniversário memorável, certo? 

Hermione assentiu. — Você tem algo em mente? 

Os olhos dele brilharam, malicioso. Seus lábios tocaram a nuca dela, mordiscando levemente a pele. Depois, ele sussurrou. — Acredite, Srta. Granger, eu tenho.  

... 

Hemingway disse que Paris era uma festa, e Hermione não poderia concordar mais. A cidade era linda, borbulhante, viva. Havia uma sensualidade inerente a ela, em cada pedra nas calçadas, em cada parede desgastada pelo tempo. Era uma experiência sensorial como nunca, e Hermione estava em êxtase porque pela primeira vez ela poderia saborear a cidade de uma perspectiva romântica.  

A entrevista havia sido um sucesso absoluto, e ela estava tão orgulhosa da Botica e, especialmente, de Severo que doía. Ela amava que o pequeno negócio dele estava ganhando forma e território. Severo merecia ser feliz e ter sucesso em um trabalho que ele realmente gostava e se sentia realizado. E o que eles ofereceram para a Botica foi, no mínimo, surpreendente.  

Eles saíram da reunião um pouco assustados, divididos entre a alegria completa e o pânico. Severo mal sabia o que dizer, mas a oferta de parceria tinha sido muito melhor do que esperavam. Ela olhou para ele na estreita rua de pedra, sob o cinza do frio europeu, e seu rosto estava tão sereno, tão leve e descontraído, que Hermione sorriu.  

Ela queria que ele se sentisse assim sempre, totalmente sem amarras, sem dores do passado, sem o medo. Às vezes, enquanto andavam pela vila, Hermione ainda podia sentir o quão tenso o seu ombro ficava, como se a qualquer momento ele pudesse ser atingido por alguma coisa. Os rescaldos da guerra o assombravam mesmo depois de quase uma década. Mas ali, naquela cidade que parecia parada no passado ao mesmo tempo em que avançava rapidamente para o futuro, ele parecia simplesmente livre. Eles seguravam a mão um do outro como se tivessem feito isso a vida toda.  

Eles sorriram um para o outro, e Severo revirou os olhos. — O quê? — Hermione perguntou, rindo, mesmo que ela já soubesse.  

— Estamos parecendo dois idiotas.  

— Nós somos um daqueles casais, não somos?  

Severo suspirou dramaticamente, mas não soltou a sua mão nem por um segundo. — É o que parece.  

Ele a puxou para um abraço, depois a girou. Seus pés saltaram do chão enquanto o seu corpo tremia de felicidade. Ela queria gritar e rir ao mesmo tempo, porque tudo aquilo parecia muito bom para ser verdade.  

Hermione deslizou do seu abraço, sentindo que ainda flutuava mesmo depois que os seus pés tocaram o chão. Eles se beijaram ali, no frio, com a Cidade Luz como testemunha, turistas passando em volta deles, parisienses apressados atravessando a rua, e a Torre brilhando na esquina.  

— Agora eu tenho o meu amante em Paris. Posso finalmente dizer que sou uma parisiense completa. — ela disse, se lembrando do que eles conversaram alguns meses antes. 

— Não um filósofo existencialista, temo. — Havia um lampejo de diversão em seus olhos, e Hermione sorriu, abraçando-o. Ela deitou a cabeça no peito dele e decidiu que não haveria melhor sensação do que ela aquela. Hermione não queria ir embora nunca do seu abraço. Queria se envolver nele e nunca mais sair.  

— Vamos, Srta. Granger. Não quero irritar nenhum parisiense hoje. — ele segurou a mão dela na dele perto do coração, depois a puxou suavemente e deu um beijo no nó dos dedos. Então, olhando diretamente para ela, completou: — Merlim sabe como eles podem ser obstinados.  

Hermione tombou a cabeça para trás e riu.  

O restante da tarde passou num borrão. Eles visitaram tantas livrarias quanto possível, e pararam várias vezes em diferentes cafés para comer as mais variadas delícias que a capital francesa proporcionava. Eles desistiram de qualquer ponto turístico em prol de simplesmente andar pela cidade, apreciando a vista dos prédios históricos, as ruelas pouco visitadas, os restaurantes escondidos em vielas espremidas.  

Às cinco horas da tarde, quando a cidade já estava mergulhada na escuridão das noites longas de inverno, eles decidiram encerrar o dia. Hermione estava curiosa para saber onde ficariam, já que o Severo havia sido nada menos que misterioso sobre isso. Ele apenas dissera que era surpresa e nada o faria dizer uma palavra. E Hermione tentou. No fim, ela desistiu e apenas se entregou a sensação de ansiedade que a dominara, o frio na barriga delicioso que vinha quando ela estava ao lado dele.  

Como eles estavam na Paris trouxa, optaram por pegar um táxi até o lugar onde ficariam, assim poderiam continuar apreciando a vista ao longo do Sena. Hermione deitou a cabeça no ombro de Severo, sentindo o cansaço vencê-la, enquanto era embalada pelas lembranças do dia. O cheiro e o calor dele a envolveram, e ela sentiu suas pálpebras pesarem enquanto a vista mudava do lado de fora da janela.  

Pouco tempo depois e ela sentiu os lábios dele na sua testa, despertando-a suavemente. Ela acordou sem saber onde estava enquanto a névoa do sono passava, e ela piscou confusa.  

— Chegamos.  

Hermione olhou em volta e bocejou, aceitando a mão dele para sair do carro. Suas malas haviam sido enviadas mais cedo, então eles só tinham as bolsas pessoais e algumas sacolas encolhidas das livrarias que haviam passado pelo centro.  

Olhando ao redor, Hermione se viu numa adorável rua de pedra, com prédios baixos e históricos bem típicos do estilo parisiense, mas numa área que claramente parecia nobre. Hermione levantou uma sobrancelha, e Severo apenas deu de ombros, curvando os lábios misteriosamente antes de pagar o motorista.  

A rua estava tranquila, mas mais adiante Hermione pôde ver um pequeno bistrô na esquina com algumas mesas do lado de fora. Uma música suave tocava, e os garçons serviam casais com seus casacos longos de inverno. Parecia uma pintura, e Hermione sorriu. Ela estava muito feliz. 

— Vamos subir? — a voz grave dele a alcançou, seguido da sensação quente e acolhedora do seu braço contornando os seus ombros. Hermione suspirou feliz e assentiu. De repente ela foi assaltada por um frio na barriga e borboletas no estômago, como se estivessem se conhecendo pela primeira vez. E de certa forma, era. Eles se conheciam novamente todos os dias, e de certa forma ela esperava que essa sensação nunca fosse embora.  

O prédio era antigo, como a maior parte dos prédios em Paris, claro, mas este tinha o privilégio de um minúsculo elevador adaptado no vão entre as escadas, onde elas faziam curvas infinitas até o topo. De certa forma, a lembrava um pouco Hogwarts, porque mesmo sendo um prédio totalmente trouxa, era mágico em sua história, na sua beleza.  

Severo, sempre o cavalheiro impecável que era, abriu a porta e eles se espremeram no pequeno espaço que os levaria até o andar certo. Hermione estava tentando segurar a sua ansiedade e curiosidade, não querendo ser a sabe-tudo irritante na primeira viagem deles.  

— Merlim, Granger. — ele riu ao lado dela, e Hermione levantou uma sobrancelha.  

— O quê?  

Ele balançou a cabeça. — Você tem perguntas. Então faça.  

Ela bufou, corando. — Você pode me culpar?  

O elevador parou suavemente e Severo saiu, segurando a porta para que ela passasse. — Não posso. Só estava curioso para saber até quando aguentaria.  

Hermione bateu levemente no peito dele. — Sonserino impossível. 

Os olhos dele enrugaram nos cantos com carinho, e Hermione sentiu o coração expandir no peito. Ela percebera que ele adorava quando ela o chamava carinhosamente de sonserino, como se ela reconhecesse as características que sempre foram ligadas a ele como xingamentos e colocasse um novo significado amoroso por trás disso. Era tão doce.  

Hermione estava prestes a comentar como o corredor parecia ter saído direto de um portal da Paris nos anos 20 quando Severo abriu a porta do meio. Ela ofegou, passando por ele sem sequer notar o quanto ele parecia ansioso. Era um apartamento inteirinho para eles, e era perfeito.  

— Severo, o que- como? Eu, quero dizer... — Hermione estava sem palavras. Ela entrou no apartamento com cautela, como se estivesse pedindo permissão, ou como se Gertrude Stein fosse sair de um dos cômodos a qualquer momento oferecendo champagne. — Eu não entendo. 

Severo colocou as mãos no bolso do casaco, depois deu de ombros. Seu olhar não encontrava o dela quando ele respondeu. — A Valérie ofereceu.  

— Ela é dona deste apartamento?  

— Eu sei. A mulher tem os seus segredos.  

Hermione bufou, em choque. Não porque era grandioso e ostentoso, ao contrário. Era pequeno e simples, mas de extremo bom gosto. Era aconchegante, com o seu piso de tábua corrida, e janelas parisienses que iam do teto ao chão, com finas cortinas brancas ondulando suavemente. Havia uma lareira na parede da frente, e dois sofás confortáveis, e aparentemente muito caros, dividindo o ambiente. Também havia uma pequena estante com títulos que imediatamente chamaram a atenção dela.  

Hermione correu os dedos pela lombada. — Fitzgerald, Baudelaire, Proust, Flaubert. Merlin, isso é incrível. Nunca tinha visto essas edições. São tão antigas! E como você não está encantado?  

Severo sorriu, lançando um feitiço para que as bolsas voltassem ao tamanho normal. — Fiquei aqui ano passado.  

— Oh. — Hermione piscou, sentindo o coração apertar. Será que ele tinha... 

— Precisava conversar com um fornecedor, e o Bernard ofereceu. — ele se adiantou, e um traço de curiosidade cruzou o seu rosto. — Está tudo bem? 

Hermione assentiu. — Sim, claro. Só estou sendo boba. Não é nada, não importa.  

— Hermione. — ele se aproximou dela, colocando a mão nos seus ombros.  

— Você esteve aqui com outra mulher? 

Severo ofegou, surpreso, quando a compreensão o atingiu. Ela estava com ciúmes? — Não, eu não trouxe nenhuma mulher aqui.  

Hermione exalou um sorriso nervoso, desviando o olhar para o chão. — Não tenho nada a ver com isso, me desculpe.  

— Hermione. — ele pediu novamente, com mais ênfase.  

— Não é da minha conta.  

— Claro que é. Hermione, nós estamos juntos. Quero saber tudo sobre você, e quero que saiba tudo sobre mim também.  

As palavras dele eram tão claras e honestas que Hermione sentiu o peito apertar, novamente sendo lembrada que ela não estava sendo totalmente sincera com ele. De repente ela foi totalmente tomada pela vontade de contar tudo, e isso a atingiu com tanta força que ela quase abrira a boca.  

— Embora — ele sorriu, beliscando o lábio inferior dela com os dentes —, tenho que admitir: não estou com vontade de saber sobre os seus parceiros anteriores. Sou um homem ciumento.  

Hermione riu suavemente, depois desviou o olhar. —  Um  parceiro, na verdade. Antes de você.  

Severo franziu a testa. — Sério?  

— Sim, sério. —  Foi sempre você , ela queria dizer.  

— Bom. —  ele pigarreou, depois sorriu e a abraçou, sussurrando baixinho. — Eu seria um homem muito egoísta e possessivo se dissesse que a percepção disso quase me faz enlouquecer com um prazer totalmente primitivo? 

Hermione ofegou. — Não. Nem um pouco. Também me sinto da mesma forma. Severo, eu- 

Ele se afastou um pouco, o suficiente para olhar para ela e tocar os seus lábios com a ponta dos dedos. — Não precisa dizer nada. Eu entendo.  

Ela balançou a cabeça, se agarrando a lapela do casaco de inverno dele. — Não, eu preciso. Severo, você não entende- 

— Eu entendo, Hermione. Você não precisa falar nada. — Severo levou um cacho atrás da orelha, passando suavemente as costas dos dedos na bochecha dela. — Você é a primeira mulher com quem eu faço  amor , Hermione.  

Hermione sentiu os olhos arderem. As lágrimas queimaram em sua pele, porque ela o amava tanto que mal conseguia respirar. Ela nunca teve dúvidas quanto ao que era certo ou errado, mas estar nos braços dele a fazia vacilar na sua tão lembrada coragem grifinória. Ela não queria arriscar perdê-lo, mas com essa mentira entre eles ela o tinha em primeiro lugar? 

— Não chore, pequena feiticeira. — o beijo dele em suas pálpebras a fez vacilar. Ela quase soltou o soluço que estava segurando, mas ao invés disso, apenas escondeu o rosto em seu peito, sentindo o cheiro dele através do tecido grosso, esperando que aquele momento não acabasse nunca.  

Ele a levou para o quarto naquela noite e fizera amor com ela. Tão ternamente, tão profundamente, que Hermione mal sentira a própria pele. Parecia muito além do plano terrestre, como se estivessem fazendo amor nas estrelas. Em outro momento, ambos zombariam de uma descrição assim, mas agora era exatamente como se sentiam: como se o mundo todo parasse apenas para que eles pudessem caber na eternidade.  

Hermione afundou as unhas nas costas dele, marcando-o, enquanto Severo se enterrava profundamente dentro dela. Eles gemeram o nome um do outro em uníssono, cantando o prazer que os percorria na noite fria parisiense. Severo a beijou em todos os lugares, e Hermione se arqueou em direção a ele como se o seu corpo só se sentisse completo assim. Era tão bom, tão avassalador, que ela vagamente se perguntou se todas as pessoas que encontravam o amor se sentiam assim.  

— Eu mal tenho dormido à noite com medo de acordar e descobrir que é um sonho. — ele disse, seus narizes quase se tocando enquanto dividiam o mesmo travesseiro. Hermione adorava as madrugadas com ele porque desde aquela noite era o momento em que ele se revelava para ela, dizendo todas as coisas doces que ele não tinha coragem de dizer à luz do dia. — Você é diferente de todas as mulheres que já conheci, Hermione. Na verdade, de todas as pessoas. Nunca vi ninguém como você.  

Nesse momento, Hermione suspeitou que se dissesse qualquer coisa poderia desabar na frente dele. Então ela apenas assentiu, mordendo o lábio inferior com força para impedir que um soluço escapasse. Ela encaixou a cabeça abaixo do queixo dele, aspirando feliz o cheiro de sabonete, e deixou ser levada por um sono agitado e difícil nos braços de Severo Snape.   

... 


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Notas finais do capítulo

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