Trail of Blood escrita por Isa G


Capítulo 2
II ◇ something bloody going on here


Notas iniciais do capítulo

Para entrar no clima da festa do capítulo (pra quem gosta de um rockzinho):

Creedence – Down On The Corner
The Standells – Dirty Water
Talking Heads – Psycho Killer
The Sonics – Have Love, Will Travel



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II

something bloody going on here

 ◇

 

sábado,

28 de outubro

 

Nada acontecia na pacata cidade de Hogsmeade. Tirando um furto de carne no açougue ou uma blitz na frente dos únicos dois bares da cidade, o que estampava as manchetes do diário local eram os avisos da igreja, ou como ontem, a reportagem sobre a maior abóbora já colhida na região.

O que não impedia Lily de comprar O Profeta Diário sempre que podia, com seus restos de trocados do bolso. Velhos hábitos eram difíceis de perder, mesmo sem uma coluna policial decente.

— Bom dia, Sr. Lovegood — cumprimentou ela ao alcançar a banca, com um sorriso gentil ao dono. — Como anda as coisas com O Pasquim?

O Pasquim era o projeto de uma vida do velho Xenófilo Lovegood. Um dia, ele tinha certeza, seria o periódico mais lido da cidade.

— Na mesma de sempre, querida. Embora quase tenha conseguido o patrocínio da funerária. A Srta. Trelawney pareceu impressionada com meus rascunhos sobre os ritos à Deusa Lua e seus filhos...

— Oh, parece... promissor. Vou levar só o Profeta dessa vez.

Segurando o jornal firme nas mãos, Lily foi para casa, cuidando para desviar da mercearia, que ela descobriu há duas semanas que seu pai contratara um vendedor para ficar com um olho nela. Ele era impossível.

— Como você está? — perguntou assim que bateu a porta, observando sua colega de apartamento, que parecia mais miserável do que quando a deixou essa manhã.

Alice apenas encolheu os ombros, abraçada ao porta-retratos com a foto dela, Frank, os pais e um gato feioso laranja. Lily, tentando ser prática, sacou do congelador algo para o almoço das duas.

O telefone fixo, pregado na parede, tocou no momento que a garota tirava a lasanha do forno. Esperava seu pai, que não ligava há dois dias.

— Ei, ruiva. Só pra lembrar, passo aí mais tarde, ok?

— Lene? — Lily franziu o cenho, ajeitando o pano de prato que quase caíra do seu ombro. — Não lembro de ter combinado nada para hoje...

— A corrida, Lily!

— Ah, verdade. Diga aos meninos que mandei boa sorte.

Escutou um grunhido impaciente do outro lado da linha.

— Diga você. Ligue para seus pais, dê um pouco de trela e escape por umas horinhas. Você já vai na festa de Halloween de todo jeito hoje, não acho que passar a tarde fora seja o fim do mundo.

— Que festa, Lene? Nem é o dia das bruxas. A data é terça.

— Mas hoje é sábado, oras. E você prometeu ontem pra gente!

Era um tanto injusto considerar alguma coisa de Lily quando a mesma estava sob efeito do álcool. Aliás, ter apagões de memória após bebedeira era a especialidade da garota.

— Tudo bem, mas não importa, não posso e nem gosto dessa celebração besta.

— Você... não gosta de Halloween? Quem não gosta de Halloween, Lily! Dá um tempo. Sirius vai vestido de cowboy, e eu irei apreciar os jeans apertados naquele corpinho. Acho que você sai perdendo...

Rindo, prometeu que tentaria dar uma passada, no que Marlene não pareceu tão convencida assim. Terminou a ligação com um suspiro.

E, aparentemente, sua nova amiga a conhecia bem o bastante para não confiar em um retorno, enviando um esquadrão para escoltá-la duas horas mais tarde.

Os meninos apareceram embaixo da janela do seu quarto, buzinando. Becky estava reluzente e pronta para qualquer competição. Ela era vermelha com partes cromadas pintadas de dourado, um pouco cafona e definitivamente chamativa demais para seu gosto.

— Aproveita, ruiva. Estamos indo pra pista agora — disse Sirius, a encarando lá embaixo na rua.

A pista era a estrada de chão batido no vilarejo Hogwarts, claro.

— Vocês piraram? Andem logo, vão se preparar! Não posso ir, já disse pra Lene! — respondeu ela, mas ficou tão contente em perceber que talvez estava mesmo sendo incluída e fazendo amizades, que sorria feito uma idiota. O que não ajudou em nada para que eles a levassem a sério.

— Mas a gente quer você lá! — foi James quem disse. Ela ergueu as sobrancelhas em surpresa. Marlene realmente estava falando a verdade quando avisou que ele só estava em um mau dia ontem.

Ela suspirou. Era difícil dizer não, principalmente com seu coração estranhamente palpitando. Desceu as escadas de dois em dois, apenas de robe e pantufas, debruçando-se na janela aberta do carro.

— É o seguinte rapazes: saiam com a vitória e os bolsos cheios que eu apareço para comemorar à noite.

— Mas-

— Se não vencerem, podem esquecer que eu existo, não ando com perdedores.

Eles riram, um pouco nervosos.

— Eu realmente gosto dela! — exclamou Sirius e se despediram, cada um dando sugestões indecentes para uma fantasia.

No que Lily concordava, mesmo com uma dorzinha no peito por mentir.

▪ ▪ ▪

Tudo bem. Lily disse que não queria encrenca com o pai e nem estaria afim de participar de uma piada em forma de celebração que era o dia das bruxas, mas, alguns fatores colaboraram para ela acabar a noite com a língua na garganta de um garoto e ficar de frente com a morte na volta para casa.

Passando das cinco da tarde e acabando de preparar café, conseguiu com muito custo fazer Alice tomar um banho. Recostada agora na poltrona de frente à TV velha de tubo, Lily abriu o jornal.

Cerrando os olhos, lia a manchete em destaque:

“Morte Misteriosa de Animais Aterroriza Fazendeiros de Hogsmeade

Havia uma foto ao lado, de um campo aberto, onde podia-se distinguir alguns borrões estirados na grama, desfigurados e sujos de sangue – ou assim ela supôs, odiando aquilo estar em preto e branco. Resolveu ler o primeiro parágrafo:

 

“Na madrugada entre os dias 27 e 28 (hoje), foram registradas mais de dez ocorrências na parcela rural do município. O motivo: cerca de trinta animais encontrados sem vida, com ossos e vísceras expostos. O Departamento de Polícia Local está apurando os detalhes. Segundo o xerife, Fleamont Potter, as circunstâncias encontradas em todos os casos são um mistério. (...)” 

 

Havia, também, uma entrevista com dois proprietários de novilhos que Lily não se dispôs a ler, interessada em analisar a foto novamente.

Parecia... Não.

Não poderia ser, poderia? Essas marcas concentradas mais no pescoço dos animais do que em qualquer outro lugar, mesmo que estivessem quase irreconhecíveis. Algum animal muito selvagem pareceu estraçalhar a cerviz dos pobres bichos, disso ela não tinha dúvidas.

E mesmo se fosse... bom, ela não estava liberada.

Além de que, alguém certamente cobria essa área.

Lily não conhecia essa região, não fazia ideia de qualquer registro de ataques e o principal: não tinha recursos. Claro que tentara extrair algumas informações logo que fora enxotada para cá, mas sem sucesso algum. O modo que sua família deixara ela e a irmã às cegas foi muito bem feito.

— Aconteceu alguma coisa? — Alice, parada na soleira da porta, a observava roer as unhas. — Você está com uma cara pior que a minha.

Lily, levantando o olhar, mordeu o lábio inferior.

— Não sei — Respondeu, simples. Notou que Alice estava vestida para sair. — Resolveu ir à casa de Frank?

— É o jeito. Uma situação que ou resolvemos de vez ou pode esquecer que existo, sabe?

— Acho que você não poderia estar mais certa. Boa sorte, espero que fiquem bem. De verdade.

— Obrigada. Boa festa lá no Amos, ele sempre se supera a cada ano, você vai ver — Lily a olhou interrogativa. — É onde vai ser a festa de Halloween, ouvi você antes. Fica pertinho da casa dos pais de Frank, aliás. Bom, vou nessa antes que eu desista...

Ela não pareceu ouvir realmente, os ouvidos com um zunido chato, acabando de tomar uma decisão.

Aguardou impaciente a amiga pegar a bolsa, achar as chaves e voltar em busca de um casaco, para então, se enfiar no moletom de qualquer jeito e correr ao outro lado da rua em um pulo só, onde havia uma cabine de telefone.

Olhando para os lados, empurrou duas moedas e discou uma longa sequência de números. Prometera a si mesma que só voltaria a usar esse recurso em casos extremos – e desconfiança e curiosidade era uma dessas coisas.

Ora, seu palpite não era infundado.

Não percebeu que segurava a respiração quando finalmente foi atendida.

— Por gentileza, nome e protocolo.

— Lily Evans. Protocolo de rastreamento A13.

Uma pausa.

— Certo. Direcionando a ligação.

O coração disparava em expectativa, fazia tanto tempo que não tinha contato com a Rede. A conhecida voz afiada encheu seus ouvidos segundos depois.

— Alô. Skeeter aqui. Número de procedimento: 29581014. Qual o contratempo a ser apurado?

— Rita, — ofegou Lily quase engasgando. — Sou eu, Lily. Olha, desculpa incomodar, mas-

Evans. — rosnou. — Sabe que não tem mais autorização para usar essa linha. Raios, não tenho ideia de como passaram sua ligação. Desligando...

— NÃO! Por favor, não! Escute, preciso só de uma pequena informação e prometo deixar em paz-

A ouviu suspirar pesadamente na linha.

— Essas foram as exatas palavras da última vez. A senhorita não me deixa saída, terei de reportar à Flamel esse episódio — dizia a mulher, completando com um quê desdenhoso: — Seu pai sabe que anda nos procurando?

Se havia alguém mais difícil de se lidar que a supervisora chefe da Rede, — a organização que fazia tudo funcionar para os caçadores —, com certeza Lily não teve o desprazer de conhecer ainda.

— Olha, só quero saber quem está cobrindo a região de Sutherland. Apenas isso. Mudei recentemente e me sentiria infinitamente mais segura em saber quem está no cargo aqui. Por favor, eu realm-

— Pettigrew.

— -ente... desculpe?

A família Pettigrew está à cargo. Satisfeita? Se me permite, voltarei ao meu trabalho agora. Resolvendo assuntos reais e não tagarelando com uma adolescente inútil.

Mordendo o lábio, pensou em perguntar o histórico da cidade também, mas estaria abusando da boa vontade da antiga chefe.

— Eu... não, não. É isso. Ótimo. Muito obrigada, Skeeter.

— Que seja. E Evans...

— Sim?

— Não volte a ligar. Estarei eu mesma retirando manualmente seu nome e dígito.

Um soco no estômago doeria menos que isso. Desanimada, desligou.

Passou algum tempo com a testa grudada no vidro frio da cabine, culpando-se por gastar, pelo que parecia, sua última ligação desse jeito.

No momento que chegou de volta ao apartamento, o telefone da própria casa tocou. Era seu pai. Com respiração entrecortada pela sensação de ter sido pega no flagra, Lily respondeu o melhor que pôde todas as inquisições de sempre do Sr. Evans.

Assim que acabou, não voltou a colocar no gancho.

Precisava encher a cara e sabia o lugar certo.

▪ ▪ ▪

— Por Deus, não poderia ter se esforçado ao menos um pouco? — Essa foi a primeira coisa que Marlene disse ao ver Lily quatro horas depois.

Ela meramente deu de ombros como resposta. Estava com um vestido simples preto de manga ¾, meia calça fina também preta e seus coturnos, contrastando com o look vibrante de abacaxi da Marlene, que poderia dar uma tremenda dor de cabeça se olhasse por muito tempo.

— Bem, ao menos resolveu ir, já é alguma coisa...

— E você fica me devendo essa, uma hora dessas vou precisar de um favor e irei cobrar — brincou Lily enquanto a amiga revirava os olhos.

O lugar que estavam indo não era longe do bairro que Lily morava, assim como qualquer coisa em Hogsmeade. Agora Marlene tagarelava sobre a vitória massacrante dos meninos — com direito a uma fuga no final, com o pai de James aparecendo cuspindo pelas ventas na viatura da polícia.

— O tio Fleamont não vai deixar barato, com certeza vai cortar as asinhas do Jay dessa vez. Ainda bem que ele é um dos melhores da turma de Direito, se não, acho que expulsaria o garoto de casa...

— É só ele sair. Tão mimado assim para não escolher viver uma vida de adulto?

— ‘Tá brincando? Já viu a mansão que eles moram? Eu também não me mudaria... além disso, James se sente pressionado em seguir os passos do pai desde que a mãe dele morreu. Não ia deixar o velho sozinho assim.

— Ah! — Foi tudo que Lily conseguiu dizer.

— A boa notícia é que agora ele tem um problema a menos... — Sorrindo, Marlene olhou de esgueira para Lily enquanto dirigia. — A Emmeline não apareceu e o Jay não quer mais saber dela. Só falta agora o Sirius parar de ficar se esfregando com a Mary Mcdonald para minha semana ficar completa!

Lily lhe devolveu um sorriso, sem perceber.

— E seus pais, alguma chance de saberem que não está em casa?

O sorriso da garota se transformou em careta.

— Acredito que amanhã a gente descobre...

Não queria admitir, mas chegou na festa há menos de cinco minutos e estava realmente impressionada. Tinha tantos pisca-piscas, morcegos recobrindo todo o teto da sala e cozinha e abóboras brilhosas, que Lily até simpatizou. A mesa de bebidas com certeza não era nada ruim. Mas também poderia ser o fato de estar tocando The Standells a todo volume nas quatro grandes caixas de som.

— Olha se não são minhas garotas favoritas! — Um cowboy especialmente quente apareceu na frente delas, tentando as laçar com uma corda dourada, mas só conseguiu mesmo quebrar um abajur ali ao lado. Distribuiu beijos e abraços de fazer qualquer uma perder o ar e então as olhou melhor. — Nossa, Lily. Mal te reconheci nessa fantasia! — exclamou Sirius, brincalhão. Sinalizou para Marlene tirar algo de dentro do decote (que logo depois percebera, era um baseado), acendendo-o.

— Engraçadinho. Mas ei, parabéns! Soube que deixaram os outros comendo poeira hoje!

— HÁ SE DEIXAMOS — urrou, baforando a fumaça na cara de Lily. — Deveria ter visto, ruiva. Não querendo me gabar, não, claro que não, mas foi do caralho mesmo!

— Não se preocupe, Lene fez toda uma demonstração, quase acho que estive lá... — disse ela, tentando se fazer ouvir em meio ao som.

— É mentira dela! — Adiantou-se Marlene, para depois virar-se para a amiga. — E você, não elogie muito, eles estão impossíveis desde então! Vem, vamos dançar.

E a puxou pelo pulso para o meio da sala, onde todos os móveis foram afastados. A batida de um rock animado ressoava, e quase sem querer, o corpo de Lily começou a acompanhar, o copo de cerveja esquecido nas mãos. Em algum momento talvez tenha pego o cigarro de alguém também.

— Ah, que ótimo, para a festa você vem, né — reclamou James Potter, assim que a viu.

Apesar de não querer admitir estar tão contente assim em vê-lo, ficou extremamente incomodada com a fantasia escolhida pelo garoto.

James estava vestido de vampiro. Daqueles com uma capa longa e preta, camisa branca, gel no cabelo, luvas e — a pior parte na opinião de Lily —, dentes falsos e talco na cara.

Havia sangue saindo pelos lados da boca também. E mesmo assim estava gostoso o suficiente. O que mais a incomodava era se sentir atraída e ao mesmo tempo zangada na presença do garoto.

— Bela fantasia — desdenhou, mas saiu algo como um flerte aos seus ouvidos.

— Obrigado. — James deu uma boa olhada nela, a fazendo ajeitar o cabelo por instinto. — A sua fantasia é de quê?

— De alguém que odeia o Halloween.

— Ahh! Faz sentido. Achei que fosse uma Wandinha versão econômica...

Rindo, revirou os olhos.

Ele parecia conhecer todo mundo ali, e saiu para distribuir cumprimentos como se fosse o dono da festa.

A batida da música Psycho Killer começou no exato instante que Lily tomava uma substância pouco confiável da caneca de um ET simpático, que por um triz ela não tascou um beijo.

— Caramba, — ofegou depois do quarto gole. — O quê exat...

 — Lily! Sobe aqui! — gritou Marlene em cima de uma mesa. O ET e uma fada fluorescente a forçaram para cima do móvel com facilidade admirável. Estava se sentindo um pouco aérea, e não facilitou muito as coisas quando Sirius chegou equilibrando três shots de tequila nas mãos.

— Acho que a gente não ‘tá muito bem não, Lene — soluçou ela no ouvido da amiga assim que conseguiu se equilibrar.

— SÓ APROVEITA!

Logo depois que a batida psicodélica da canção terminou, ela resolveu descer. No momento que seus pés tocaram o chão, sentiu alguém pegar no seu braço.

— Alô, princesa gótica-

Lily virou dando um tapa, por reflexo.

— QUE MERDA, ‘TÁ MALUCA GAROTA?

Ficou atônita, observando um Frankenstein indignado. Seus sentidos a estavam confundindo em meio ao álcool correndo nas veias, definitivamente.

— Bom, desculpe, mas você não deveria chegar assim por trás de alguém! — disse na defensiva e saiu (cambaleou) de fininho.

Atravessou o mar de gente à esmo, acabando por dar um encontrão em duas garotas no processo. Não querendo confusão, achou por bem ir à cozinha, que era a parte mais iluminada de toda a casa.

No caminho, passou por tantos casais se amassando encostados nas paredes, incluindo Sirius, (que sabia muito bem o que estava fazendo em sua humilde opinião), que ela seriamente cogitou puxar o primeiro cara mais ou menos que encontrasse na frente e fazer o mesmo.

E talvez ela tenha acabado de achar, ali concentrado em meio a muitas garrafas no balcão. Ou reencontrar.

O negócio era, ela realmente tinha uma atração por ele. Gostando de outra ou não, não fazia a menor diferença.

— O que está aprontando? — perguntou Lily, chegando por trás.

Ele virou a cabeça rápido e sorriu.

— Veio ser minha cobaia? Não, nem precisa insistir... — falou James, se endireitando e começando a sacudindo a coqueteleira.

Tentou fazer um malabarismo também, mas quase deixara o líquido sair.

— Patético, Potter. — Mas ela sorria. E ele piscou, entrando na onda. James não mais vestia a capa horrorosa, somente a camisa branca arremangada, no que ela agradeceu mentalmente.

Na hora que o garoto foi buscar mais gelo no freezer, um grupo animado adentrou vindo do quintal. Ele largou o que estava fazendo e prontamente colocou o braço ao redor de Lily e a puxou para apresentar aos outros presentes. E ainda bem que ele a estava segurando, ela se sentia fraca, seja pelo álcool ou pelo cheiro dele tão perto, que ficou difícil se concentrar.

— Toma, — ofereceu ele seu copo, assim que voltaram para perto do balcão novamente. — Não está envenenado nem nada, tá?

Era um coquetel altamente batizado, colorido e especialmente doce. No momento que colocou na boca, se arrependeu.

— Caramba, James, isso é a própria diabetes à um gole de distância!

— Não gostou? — Ele a olhou confuso, examinando a bebida — Achei que as garotas gostassem de algo mais adocicado...

— Tente outra vez, espertinho. — Ela o cutucou de leve, e contornando a bancada para ficar ao seu lado, Lily-bêbada teve uma ideia para deixar as coisas mais legais.

— Aposto que consigo tomar isso antes de você sem vomitar.

Ele levantou uma sobrancelha.

Ah, é? — Analisou ela por meio segundo. — Pois muito bem. Vou separar em dois copos e te ensinar a nunca apostar nada comigo de novo.

— Não se sinta tão pressionado, prometo te ajudar a chegar no vaso sanitário.

Ele lhe deu um sorriso de canto, mas os olhos faiscavam.

— Pode deixar. Eu seguro seu cabelo quando for a hora também.

Mas não foi preciso, ninguém vomitou, afinal. Na metade do desafio, os dois cuspiram na pia, sem condições de continuar. Escorregaram molemente até sentarem no chão, com James por reflexo limpando o canto da boca de Lily.

Eles estavam terrivelmente alcoolizados, de cabeça baixa, segurando-se um nos ombros do outro.

Em algum momento Lily começou a tocar o rosto dele com suas mãos, esfregando com certa violência.

— Uh, Lily? O que exatamente você está fazendo? Se isso for seu jeito de-

— Quieto. Estou tirando essa porcaria de talco da sua cara, está me dando nos nervos.

Na vontade de tirar aquela maquiagem e poder encarar o rosto bem desenhado, com uma barba rala e tão bom sob seu toque, ela estava quase em cima dele. James colocou uma das mãos no quadril dela, e quem visse de fora acharia essa posição, metade sentados e metade jogados, estranha.

O coração do rapaz batia forte contra o peito.

— Acho que tem um jeito melhor. — sussurrou rouco, abaixando as mãos dela com os olhos cravados.

Sem se mover, sem respirar, Lily apenas ficou lá, estática, assistindo aqueles milissegundos antes do garoto avançar de encontro aos lábios dela, faminto.

Com a boca na dele e os dedos cavando em seu cabelo, ela sentia-se estremecer. Seus lábios eram tão suaves e convidativos, Lily queria mais, queria tanto empurrar por mais e devorá-lo inteiro.  

Agora não poderia dizer que sentia qualquer inveja dos casais por quem passara antes. Um pequeno sorriso se formou enquanto recuperavam o fôlego, e os olhos de James nunca desviaram da sua boca, olhando de forma hipnótica.

 Lily engasgou surpresa com o beijo — ele voltou para mais. Isso era tudo que ela precisava para começar a se mover, o empurrando para trás até que ele estivesse recostado por completo no armário, as mãos agarrando sua cintura e viajando em torno de suas costas, causando arrepios em todos os lugares. Ela respirou fundo, buscando algum juízo, enquanto ele se preocupava somente com sua clavícula, capturou a sensação de sua pele sendo dele, tornando impossível não soltar um gemido baixo. James, com habilidade, a levantou e posicionou em seu colo, tentando cobrir toda parte que podia de seus corpos um ao outro. As mãos agora passeando nas coxas dela enquanto ela, por sua vez, alcançava com as mãos tudo o que conseguia, desde que levantou a camisa de James.

Lily, entre uma mordisca e outra nos beijos, desviou uma das mãos dele que chegava perto demais do fecho onde guardava sua adega. Alheia quando James parou de súbito, parecendo sair de um transe, não interpretando bem o sinal. E foi então que a magia começou a se dissipar.

Lentamente foram separando-se, com ela soltando um muxoxo baixo, sem entender muito. Ao final, após buscar o ar de volta aos pulmões, nada disseram. Levantaram ainda tontos, ela ajeitando o vestido e ele coçando a cabeça, sem se olharem realmente.

Embora quisesse aproveitar a festa, James, agora colocando a cabeça no devido lugar, gostaria de ter tido a oportunidade de conversar com Emmeline antes, apesar da situação já estremecida. Ele não era esse tipo de cara, afinal. E muito menos o tipo que avança desse jeito em uma garota, forçando alguma coisa.

James quis culpar os hormônios, mas a verdade é que desde o outro dia, embaixo de toda aquela marra, ele queria coloca-la em sua cama. Isso era mais forte que ele.

Lily o observou ver algo por cima do seu ombro, e virou-se na hora que ele gritou:

— Ei, Benjy, Otto, passem pra cá o capacete duplo, eu e a ruiva vamos experimentar!

Ele parou dois gêmeos siameses espaciais — uma mistura curiosa.  E Lily deu graças aos Céus por James saber contornar a situação constrangedora que se instalou melhor que ela.

Assim que vestiram aquela coisa horrorosa feita de alumínio, ficando colados um no outro, Lily aprendeu que não podia confiar em James, mesmo que a proximidade tenha lhe causando arrepios novamente.

Mas tudo que importava é que estavam no seu normal.

— Olha, isso vai pra conta como uma das coisas mais nojentas que já coloquei a mão, — reclamou ela assim que se afastaram da dupla, indo em direção onde Lily lembrava ter visto Marlene pela última vez.

— Não queira ir no quarto de Sirius então, tem exatamente esse cheiro...

Sorrindo, eles pararam perto de uma das caixas de som, e James a deixou em companhia de Remus, que recém chegara. Saiu para longe, isso a abalou um pouco.

Passou algum tempo na companhia dele, que prontamente a apresentou para Dorcas, uma garota de sorriso fácil.

Terminando uma cerveja, ela definitivamente soube precisava ir ao banheiro agora. Eles indicaram o caminho, prestativos, com Lily recusando a oferta de Dorcas para levá-la.

— É sério, eu ‘tô bem, não precisa não. Volto em um segundo.

Subiu as escadas e encontrou três garotas esperando no lado de fora. Recostou-se na parede do corredor, se sentindo zonza.

Pareceu uma eternidade quando finalmente foi sua vez.

Assim que fechou a porta, encontrou um banheiro normal. Bagunçado, mas não tão sujo como pensou. Jogou água corrente no rosto algumas vezes, esfregando os olhos e a cada nova lavada, ela parecia voltar ao seu normal.

E foi aí que Lily percebeu. O cheiro. Era por isso que raramente bebia desse jeito, acabava perdendo coisas importantes, como essa: era algo férrico e fermentado, com um toque de sais ao fundo.

Ela observou seu reflexo arregalar os olhos em completo horror. Tapou a boca com uma das mãos sufocando o grito, girando nos calcanhares, observando melhor. Mas de fato vinha dali. A pouca ventilação ajudou para que Lily soubesse do que se tratava.

Só havia duas possibilidades:

Alguém em processo de transformação, doente, esteve aqui recentemente.

Ou, um vampiro adulto acabara de sugar sangue humano, deixando rastros.

Cambaleou para fora sem norte. Verificou pateticamente a adaga várias vezes e marchou em direção a multidão lá embaixo.

 

Continua...


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Notas finais do capítulo

Fiquei tão feliz com a boa recepção desde o início! E são capítulos looongos, né UHASUISHSAU Temos mais 3 pela frente.

Me conte o que está achando, o que precisa melhorar (?) beijooo ♥



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