Nobres Guardiões escrita por Last Mafagafo


Capítulo 3
Doutor




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— Isso! - comemorou Crowley, recebendo uma rápida reprimenda de Aziraphale, enquanto os dois observavam Donna do Bentley de Crowley, estacionado do outro lado da rua. 

A ruiva estava conversando com um tal Doutor, muito charmoso na opinião de Aziraphale, mas terrivelmente odioso na opinião do Crowley. Mais cedo, quando ela desapareceu do casamento, os dois tentaram trazê-la de volta, mas Gabriel convocou os dois e passou um enorme sermão sobre o Plano Inefável de Deus, que tomou praticamente o dia inteiro. Crowley preferia ter assistido a uma Ted Talk por duas horas seguidas, seria uma tortura muito menos cruel do que o discurso do chato do Gabriel. Aliás, Ted Talks foram uma de suas ideias brilhantes. Levantar os espíritos dos fracassados com promessas falsas e casos de sucesso vazios, só para torná-los duas vezes mais frustrados depois, era uma das suas melhores maldições à humanidade até então. 

Quando finalmente Aziraphale e Crowley conseguiram se livrar dos chatos de cima, Donna havia encontrado um novo amigo, e juntos eles drenaram o Tâmisa. Crowley não tinha ideia quais eram os tais planos de Deus, mas que ele tinha um senso de humor estranho, ele tinha. 

Com o Tâmisa drenado e o noivo de Donna morto (Crowley nunca gostou daquele homem de qualquer jeito, ele era um daqueles humanos muito fáceis de tentar), Donna foi levada de volta para casa por um Senhor do Tempo. Justo um Senhor do Tempo. De todas as espécies e raças do universo, ele tinha que ser um Senhor do Tempo! Mas foi o que Donna encontrou durante a ausência dos dois. Pior era aquela Tardis em formato de cabine telefônica. Aziraphale disse que era charmoso e clássico, mas Crowley odiava aquilo. Ainda mais aquele azul brilhante! Então, quando ele e Aziraphale estacionaram do outro lado da rua para descobrir o que Donna pretendia fazer, Crowley se deu ao direito de comemorar quando ela recusou aquele convite descabido de viajar com o tal Senhor do Tempo. Aziraphale, por outro lado, pareceu decepcionar-se.

— Ela deveria ir com ele! Eles ficam muito bem juntos! - disse Aziraphale, sorrindo timidamente.

— O que? Você deve estar de brincadeira, Anjo. Olha esses dois! Eles não tem nada a ver! E você também deveria se opor a isso. Ele é um Senhor do Tempo!

— E qual é o problema?

— Ele é um Senhor do Tempo e ela é uma humana. Você sabe que essas coisas nunca acabam bem.

— Bem, eu lamento discordar, Crowley, meu caro. Veja o nosso exemplo? Você é um demônio, um anjo caído, e eu sou um servo do Senhor. Qualquer um que nos visse juntos poderia dizer o mesmo, não acha? - perguntou Aziraphale, com aquele sorrisinho de quando ele sabia que estava certo.

— Não mais, Anjo! É por isso que estamos ambos demitidos há pelo menos uns dez anos - disse Crowley.

— Olha para eles, Crowley. Eles precisam um do outro. Oh! Ele fez nevar para ela! Isso não é romântico?

— Grande coisa…  Olha lá, ele está indo! Finalmente! - sorriu Crowley - Viu? Eu sabia que Donna Noble iria fazer a coisa certa!

— É uma pena… Ainda acho que ela vai se arrepender de não ter ido - respondeu Aziraphale, colocando o cinto de segurança que Crowley havia instalado para ele no banco do passageiro - Vamos para casa? 

— Você tem vinho? Acho que seria um bom dia para um vinho.

— Podemos arranjar um no caminho - disse Aziraphale, sorrindo, enquanto Crowley dirigia seu Bentley em direção a uma pequena livraria no Soho.

 

***

 

— Eu sabia que aquele Senhor do Tempo era um problema - resmungou Crowley, enquanto ele tentava fisgar as chaves do Peugeot azul de dentro da lixeira.

— Mas você viu como ela estava feliz? Fazia muito tempo que Donna não sorria daquele jeito - disse Aziraphale, com um sorriso orgulhoso.

— Eu não sei, Anjo. Ele mal chegou e ela já está agindo de modo completamente irresponsável. A-ha! - disse Crowley, finalmente pegando as chaves.

— Pensei que você iria gostar. Não é o tipo de comportamento que você costuma incentivar nas pessoas? - perguntou Aziraphale.

— É mas… É diferente, Anjo… 

— Não seja ridículo, meu caro! Se eu não te conhecesse melhor, diria que está agindo como um pai superprotetor…

— O que? Anjo, isso não faz o menor sentido! Primeiro que demônios não são… pais - ele disse com desprezo - Nós não somos nem padrinhos. Esse tipo de coisa de cuidar e proteger é para o lado de vocês, não nosso. Demônios se importam muito pouco com os humanos para isso. E segundo, Donna Noble é sua responsabilidade, e não minha! Se eu digo isso é porque quero te ajudar… 

Crowley colocou as chaves na mão do Aziraphale e saiu.

— Para onde você vai?

— Eu te espero no Bentley - ele disse, andando com o gingado de sempre, tentando reforçar sua imagem “legal”. Aziraphale só sorriu. Ele adorava os momentos em que Crowley mostrava seu lado bonzinho. 

— Só Donna pode ter uma ideia tão estúpida como essa! Jogar minhas chaves… - murmurou uma mulher loira, se aproximando da lixeira. Ela parecia extremamente irritada.

— Sylvia Noble? - perguntou o anjo, com um olhar gentil.

— Sim? - Sylvia perguntou rudemente, olhando o sujeito dos pés a cabeça. Ela estava muito impaciente e irritada para ser gentil naquele momento.

— Acho que isso é para você. Uma moça ruiva as deixou aqui - explicou Aziraphale.

— Ah! Muito obrigada! - agradeceu Sylvia, feliz que suas chaves estivessem seguras. Ela já estava planejando o que fazer se as chaves tivessem desaparecido - Me desculpe por isso. Minha filha é uma cabeça oca às vezes. O senhor tem filhos?

— Não, senhora.

— Um homem sábio! Nunca tenha filhos, eles são só uma dor de cabeça, mesmo depois que crescem - ela aconselhou acenando, e se despedindo.

— É… Eu posso imaginar - sorriu Aziraphale, enquanto olhava para o céu infinito.

 

***

 

— Olha toda essa fumaça, Crowley! Pior que o Nevoeiro de 52 - reclamou Aziraphale, enquanto os dois saíam de mais um almoço no Ritz - O que vocês estão planejando dessa vez?

— Não olha para mim, isso não é coisa nossa - disse Crowley, olhando para cima - Se bem que com toda essa fumaça saindo dos carros, você acha que eles acreditariam que fui eu quem incentivei?

— Você não quer levar os créditos pelo aquecimento global, não é mesmo? Quer dizer, até para um demônio isso é um pouco…

— É, você tem razão. Além do mais, isso tem a cara da Poluição - disse Crowley, colocando as mãos nos bolsos.

Enquanto anjo e demônio caminhavam pela rua, o céu foi tomado pelo fogo, e de repente a fumaça desapareceu e o céu voltou a ficar azul. Os dois olharam para cima assustados.

— O que foi isso? - perguntou o anjo.

— Eu não tenho ideia - disse Crowley - Não foram vocês?

— Fogo é coisa do seu lado… 

— Você tinha uma espada de fogo - lembrou Crowley, com um sorriso presunçoso.

— Aquilo era diferente! Você sabe que a espada…

— É, eu sei. Só queria te deixar nervoso - disse Crowley, sorrindo.

Aziraphale fez biquinho e cruzou os braços contrariado. Crowley sorriu, ele adorava ver seu anjo nervosinho. Era tão pouco angelical…

— Você acha que foi ela? - perguntou Aziraphale, depois de um longo tempo de reflexão silenciosa.

— Quem?

— Donna. Nossa Donna. Isso me parece algo que ela e o Doutor fariam - disse o anjo.

— Talvez? Quer descobrir? - perguntou Crowley, como se estivesse completamente indiferente ao assunto. Mas no fundo o anjo sabia que seu parceiro sentia saudades da ruiva, assim como ele sentia.

— Oh, sim! O céu está azul agora, acho que é um bom momento para irmos a Chiswick. 

 

***

 

— Anjo, estou com um mal pressentimento! - disse Crowley, ignorando a placa de “estamos fechados” na porta da loja de Aziraphale e entrando na loja mesmo assim.

— Você também sentiu? Oh, céus! Eu pensei que era besteira minha, mas agora que você diz… Você acha que alguma coisa aconteceu com ela? - disse o anjo, largando seu chocolate sobre a mesa e quase sujando sua mais recente aquisição, uma Bíblia do século XIX com a passagem “O amor é paciente, o amor é bondoso. Inveja, e se vangloria” em Coríntios. Aziraphale a chamava Bíblia dos Invejosos. 

— Com os planetas no céu e todas essas dimensões colidindo, sim eu acho que tem grandes chances. Além de todos estes Daleks na rua. Tive que destruir pelo menos uns três vindo para cá. Coisinhas odiosas...

— Crowley, precisamos fazer alguma coisa. Esse pode ser o fim do mundo outra vez!

— Não é possível! Desde o Adam não trouxeram mais nenhum bebê aqui para cima.

— Bem, poderia ser o filho dele.

— Ele só tem um ano, não tem como se tornar o anti-cristo com um ano de idade! - ponderou Crowley.

— Certo… E se eu invocar o Metatron?

— Ele ainda responde às suas orações? - perguntou, Crowley, surpreso.

— Eu sou um anjo de fé - explicou Aziraphale - É apenas normal que ele responda ao meu chamado, mesmo que eu não frequente, bom, você sabe…

— Ei, Anjo…

— O que?

— Parece que as coisas voltaram ao normal - disse Crowley.

— O que?!?

Os dois saíram da livraria para ver que o céu não tinha mais planetas e tudo estava tranquilo novamente. Os Daleks haviam desaparecido e as pessoas estavam voltando para suas casas, assustadas, desesperadas.

— Será que acabou? - perguntou Aziraphale.

— Parece que sim… - concluiu o demônio - Mas eu ainda sinto que algo não está certo. E você?

— Também… Acho melhor irmos para Chiswick.

— Sim, vamos para Chiswick.

 

***

 

Crowley e Aziraphale demoraram algum tempo para se tornarem visíveis novamente. Eles estavam no quarto de Donna e haviam esperado Wilf e o Doutor saírem. Eles podiam sentir, dentro da cabeça de Donna havia uma mente de Senhor do Tempo que não cabia. Nenhum deles esperava por algo assim. Aziraphale abaixou-se para observá-la de perto. Ela dormia calmamente. Ele afagou o rosto da ruiva, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha dela. Seu coração estava partido.

— Eu vou acabar com aquele tal de Doutor - disse Crowley, irritado - Eu disse a você, Anjo. Aquele sujeito não faria bem para ela.

— Ela está bem, Crowley… Ela só não lembra dele, ou das coisas maravilhosas que ela fez. Foi ela que nos salvou… Salvou a todos nós de um novo apocalipse. Nossa garotinha brilhante - sorriu Aziraphale, segurando uma lágrima - A mulher mais importante do universo...

— Então esse era o tal do Plano Inefável de Deus? Torná-la a mulher mais importante do universo, para que ela jamais pudesse se lembrar do que fez? Isso é justo? - ele perguntou, irritado - Espera aqui, eu vou mostrar para esse tal Doutor com quem ele se meteu…

— Não, Crowley! Você não entende. O Doutor a salvou - disse Aziraphale - Donna não deveria ter sobrevivido. Ela deveria estar morta agora.

— Mas isso não está certo! Ela nos salvou!

— Exatamente… Você sabe o que acontece com aqueles que são enviados como salvadores deste mundo…

— Não é justo! ESSE é o Plano Inefável?

Aziraphale assentiu.

— Ao menos ela ainda está viva - disse Aziraphale, se levantando - E acho que ela vai acordar em breve. É melhor sairmos daqui.

Os dois desapareceram do quarto. Já do lado de fora, eles viram a Tardis estacionada do outro lado da rua, perto do Bentley de Crowley. Ela parecia triste, então Aziraphale se aproximou.

— Eles estão sofrendo muito. A Tardis e o Doutor… 

A porta da casa de Donna se abriu e o Doutor saiu, sendo seguido por Wilf. Os dois pareciam tristes.

— Você acha que ele vai ficar bem? - perguntou Aziraphale, sussurrando, enquanto anjo e demônio mantinham-se invisíveis.

— Acho que não - disse Crowley.

— Oh, céus! Pobre homem! Deve estar se sentindo tão sozinho!

— Não há nada que possamos fazer - disse Crowley, com má vontade.

O Doutor entrou na Tardis e desapareceu. Wilf ficou por alguns segundos na porta, derramando algumas lágrimas.

— Wilfred é um homem bom - sorriu Aziraphale.

— O avô? Sim, um dos poucos que não consegui tentar. Nunca matou um homem na guerra. 

Aziraphale sorriu.

— É melhor irmos agora - disse o anjo, e o demônio concordou.


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