01. Sakura

Acordar cedo em uma segunda-feira não é uma tarefa fácil, imagine só acordar cedo na primeira segunda-feira de aula do ano? Para Sakura, era o próprio inferno.

Ainda assim, a garota levantou-se cheia de preguiça e foi direto passar o seu café. Não podia nem dar bom-dia a alguém sem antes tomar a sua sagrada primeira xícara de café do dia, um costume que certamente fazia com que ela parecesse alguns anos mais velha do que realmente era. Estava apenas no último ano do ensino médio – finalmente, o último! –, e apesar de ainda ser bem nova, já morava sozinha.

Quer dizer…

— Testuda, você viu a minha saia reserva? A outra acabou de rasgar! Estou em pânico! - diz a amiga doida, que também é colega de apartamento de Sakura, Yamanaka Ino.

Os pais de Sakura não concordariam em deixá-la frequentar o Instituto Konoha Arts, o melhor instituto de ensino médio com foco em arte do Japão, se ela precisasse morar sozinha para isso. Mas, os Yamanaka, que são um pouco mais liberais, os convenceram a deixá-la morar com Ino, o que certamente acarretaria em mais responsabilidade para Sakura. Morar com Ino era como cuidar de uma irmã mais nova e irresponsável.

— A sua saia reserva tá na secadora, Ino. - responde Sakura bebendo o primeiro gole do café recém-passado. A xícara que ela segura tem a bandeira do Japão, acompanhada da escrita “Tokyo 2011”.

Ino sai apressada da cozinha, mas volta rapidamente para agradecer, depois corre até a área de lavanderia do enorme apartamento e busca a saia reserva na secadora. Sakura observa tudo com um revirar de olhos. O que a amiga tinha de bonita, tinha de atrapalhada… Por isso, ela sempre tomava a frente em coisas como tarefas de casa.

Após o café, Sakura sobe para seu quarto e veste o uniforme colegial composto de uma saia azul-marinho e camisa social com gravata. As meias são opcionais, mas devem ser brancas, e naquele dia com o calor que faz, ela resolve calçar apenas os sapatos pretos. Não detestava o uniforme; se detestasse, poderia optar pela calça social, de qualquer maneira… Além do mais, nem era um uniforme curto. Era até que bem-comportado, quase alcançava os joelhos. Ino disse que no ano anterior – Sakura ainda não estudava no Instituto Konoha Arts nessa época – algumas meninas fizeram bainha em suas saias longas para que ficassem mais curtas. É claro que isso acarretou em detenção, ora, como elas não pensaram no óbvio?

Mas enfim. Sakura estava agora um pouco mais contente. Era o último ano do ensino médio, afinal de contas, e é claro que ela não pensava apenas em tirar notas excelentes. Ela queria se divertir, fazer daquele o seu ano mais divertido, talvez quebrar algumas regras, quem sabe? Às vezes, não faz mal. Desde que você não seja pego, essa é a única regra sobre quebrar uma regra.

Sakura desce as escadas direto para a sala. Aquele era um apartamento duplex enorme, emprestado pelo Sr. Yamanaka para que as garotas morassem perto da instituição. A decoração, em sua opinião, era bastante brega, mas, apesar disso, o lugar era bem aconchegante. E ela se sentia melhor ainda em não estar tão perto de seus pais – tipo assim, os amava, mas eles tinham que sufocá-la tanto?

Quando Ino aparece, o queixo de Sakura cai. A garota só poderia ter perdido a noção, e veja só, justo em seu último ano de escola…

— Tá doida que você vai com essa saia, Porquinha? - Sakura mede com os olhos a saia da amiga. Está curtíssima, terminando no meio das coxas. Ela parece ter saído de um anime ecchi próprio para garotos adolescentes nojentos.

— Não tenho escolha, Saky… - a garota suspira enquanto está prendendo seus enormes cabelos loiros em um rabo-de-cavalo, bem no topo da cabeça. — A saia encolheu na secadora, a outra rasgou, não comprei uma calça social porque, bem, não achei que fosse precisar, tendo em vista que acho minhas pernas adoráveis.

— Você não tem uma reserva da reserva? - Sakura ainda está perplexa, e a Yamanaka balança a cabeça em negativa. — Bom, não há muito o que a gente possa fazer, as minhas saias não cabem em você e… Caramba! Estamos atrasadas!

Imediatamente, as duas garotas esquecem a discussão sobre saias e afins e saem correndo pela porta, com tempo apenas para chaveá-la. Elas correm pelas ruas de Konoha descontroladamente, assustadas com horário, bem no primeiro dia de aula. Era o karma, só podia! Sakura às vezes tinha a impressão de que havia jogado pedras na cruz em alguma vida anterior, porque sempre passava pelo tipo de situação estressante e absurda envolvendo atrasos.

Finalmente, após minutos de corrida, elas chegam ofegantes a escola e com tempo o suficiente para ir até a sala de aula. As pessoas que ainda estão pelos corredores do instituto olham para a roupa de Ino, mas a garota nem está muito preocupada com isso. Sakura, por outro lado, nem percebe o que está acontecendo ao seu redor quando coloca os olhos na fachada do instituto… É enorme. Lindo.

Uma construção muito antiga, com uma arquitetura artística incrível, semelhante a uma enorme casa de cultura lotada de salas e andares. Também pudera… Ela quase se matou de tanto estudar para entrar naquela escola, e honestamente, quando as provas acabaram, ela achava que realmente morreria se visse uma pergunta sobre movimento artístico na sua frente novamente. Mas após as curtas férias de verão, a garota estava renovada para várias e várias aulas envolvendo qualquer tipo de arte ou não.

— Certo, o que você tem agora, Saky? - indaga Ino pegando o horário na mochila.

— Ahn… - Sakura vasculha a mochila em busca do seu horário, mas não encontra nada. — Eu acho que esqueci meu horário em casa!

— Que droga… Você provavelmente vai precisar ir até a secretaria e pedir outro.

Depois de um suspiro de má sorte, Sakura decide que aquilo não é o bastante para arruinar seu dia. Ela se põe a andar pelos corredores rapidamente, porque ainda tem dez minutos, e se usá-los bem pode chegar na aula a tempo.

— Sem correr pelos corredores, garotinha. - avisa um garoto alto de cabelo comprido. Ele tem grandes olheiras, como alguém que passa tempo demais acordado a noite, mas é bonito e não parece velho também. Deve ser um estudante repetente, ou algo do tipo.

— Garotinha? - Sakura ergue uma sobrancelha, revoltada com o apelido. Quem ele pensava que era para se dirigir a ela como uma garotinha? — Eu tenho um nome, e é Sakura Haruno. Dispenso apelidos idiotas como “garotinha”.

— Bonito o nome. - diz o garoto com um sorriso de canto. — Sinto muito pelo apelido, senhorita Haruno, acabo me dirigindo assim aos alunos que ainda não conheço, por força do hábito sabe. - quando ele diz isso, o queixo da garota cai.

— S-sinto muito. Não sabia que você era professor aqui… Parece tão novo. - ela argumenta, sentindo as bochechas esquentarem. Nem ousa encará-lo.

— Tá tudo bem. - ele ri, e a risada dele é tão gostosa que Sakura cora mais ainda. — De qualquer maneira, é o meu primeiro dia como professor também. Mas enfim, estou atrasado para a primeira aula! E você também. Pode ter problemas se ficar correndo pelos corredores.

— Ah… É o que eu temia. Mas eu tenho uma memória de peixinho às vezes, sabe? Esqueci meu horário em casa e justo no primeiro dia, e agora preciso de um novo.

— Acho que tenho um minutinho para te ajudar. - o homem se vira e entra por uma porta, cujo há uma plaqueta escrito “Arquivo”. Um minuto e meio depois, ele retorna e entrega um papel para Sakura. — É provável que demorassem mais na secretaria, mas nessa sala aqui, há de tudo que você pode imaginar. Passei o verão lidando com ela, então estou bem-acostumado… Esse é o seu horário. Agora, se apresse!

Sakura não tem tempo para agradecer, porque o professor dá as costas e sobe uma escadaria. Ela fica abestalhada por alguns segundos, depois volta o foco para o horário. Tem história da arte no primeiro período, o que parece um pouco chato, mas ela vai dar tudo de si para aproveitar a aula de qualquer maneira. Ela vai para o corredor indicado da sala de aula B, e está tão concentrada no minimapa que está desenhado no canto da folha de horários que não percebe nada em seu caminho. Acaba por esbarrar em alguém, e cai de bunda no chão.

— S-sinto muito! - diz uma voz fina o suficiente para ser de alguma garota da sua idade. — E-eu… Tô perdida. - admite a voz, e Sakura encara a garota caída a sua frente com quem deu um encontrão. Ela é familiar.

Sakura se ergue do chão e dá a mão para a garota, que aceita, e assim a ajuda a levantar. A garota tem um rubor nas bochechas quase escondidas pelo enorme cabelo azul-escuro, a franja lhe caindo na testa.

— Tudo bem, acontece. - Sakura sorri de forma meiga. — Para onde está indo?

— Sala de aula B. História da arte, e-eu acho. - responde a garota, poucos centímetros mais alta do que Sakura.

— Eu também! Bom, então vamos juntas.

Ambas, enfim, chegam a sala de aula e por um minuto não estão atrasadas. Elas adentram o local bem iluminado e escolhem um lugar na frente da sala, Sakura ficando entre a garota em quem esbarrou e outro garoto fofo de sobrancelhas grossas.

A aula vem e se vai de forma rápida, e ao fim a garota está surpresa por ter gostado tanto. Ela decide que história da arte é mais divertido do que ela imaginava, talvez porque o professor era bem gatinho, mas não vem ao caso.

Mais alguns períodos se passam, e quando é hora do intervalo, as duas finalmente podem esticar as pernas e caminhar.

— Nem perguntei seu nome! Qual é? - indaga Sakura, andando ao lado da garota que deduz que será sua amiga.

— Hyuuga Hinata. - a garota sorri timidamente. — E o seu?

— Haruno Sakura. Pode ser só Sakura. Você disse Hyuuga? Eu acho que já ouvi falar nesse nome… - Sakura franze o cenho imaginando hoje já ouviu o nome antes.

— Claro que já! - a garota segura o braço dela de repente e a encara. — Sakura! Sou eu, não lembra?

Sakura estreita os olhos encarando a garota de pertinho. Sim! Hyuuga Hinata, a menina que foi sua melhor amiga por um verão inteirinho quando tinham onze anos de idade, em um acampamento de férias de verão que ficava em Nagoya.

— Cristo! - Sakura exclama com choque. — Fomos melhores amigas por um verão inteiro! Lembra quando pregamos aquela peça na monitora do acampamento? Ela nunca descobriu que fomos nós…

— Sim! A coitada ficou com a calça cheia de formigas… - Hinata caiu na gargalhada, finalmente perdendo a timidez por completo. — Você mudou um pouco, o cabelo curtinho e rosa e tal.

— E você então! Era tão diferente. - Sakura tinha a memória de uma garota baixinha e gordinha, de cabelo muito curto. Hinata já era muito tímida naquela época, mas também era bastante chorona. Sofreu bastante bullying no acampamento até Sakura aparecer em sua vida e salvá-la, ameaçando socar a cara dos garotos que a incomodassem.

— Definitivamente, mudamos para melhor. - sorri Hinata, e Sakura concorda. — Não sabia que era de Konoha também.

— Ah, não sou! Eu sou de Tokyo, na verdade, mas consegui passar na prova para essa escola no ano passado, e vim morar com a minha amiga Ino.

— A Yamanaka? - indaga Hinata, que parece já conhecê-la, e Sakura assente. — Ela é muito bonita!

Nesse momento, as duas não percebem, mas estão conversando bem em frente o banheiro feminino. Sakura sente um puxão em seu braço e percebe que está sendo puxada para dentro do banheiro, e Hinata, que está segurando seu braço ainda, é levada junto. As duas ficam assustadas até ver que se trata de Ino.

— Muito emocionante o reencontro de vocês e tal, mas caramba! - diz Ino, parecendo em pânico, e olha para suas pernas. — Quase fui pega pelos monitores duas vezes! Eles devem estar atrás de mim, ouvi algum falando a respeito de uma loira de saia curtíssima.

— Não sei como não foi retirada das aulas, isso sim! - diz Sakura, que até então não teve nenhuma aula com a colega de casa.

— Não vem ao caso, mas vocês precisam me salvar!

— Você veste quanto? - indaga Hinata, que está usando a saia no tamanho correto, mas, ao mesmo tempo, usa um suéter enorme e largo por cima da camisa social. Não parecia vestir o mesmo tamanho que Ino, na verdade, ela parecia vestir algum tamanho maior.

— 38, mas acho que a gente não tem as mesmas medidas… - Ino diz, tentando não parecer indelicada.

— Tenho uma saia 38 no meu armário, no vestiário do ginásio. Toma, amarra isso aqui na cintura e a gente corre até lá, aí você troca. - Hinata tira o próprio suéter e o entrega a Ino, que amarra na cintura com muita gratidão. As duas garotas observam que Hinata, por baixo da roupa enorme, parece bem mais magra agora, embora ainda mais “cheinha” do que elas.

— Você está salvando a minha vida! - Ino abraça Hinata como se fossem íntimas, embora nunca houvessem se falado antes. — Obrigada, de verdade.

As três garotas correm pelos corredores tentando despistar os monitores, até que enfim, chegam ao ginásio – que é do outro lado do campus. Por sorte, o ginásio está vazio, e o vestiário também. Hinata abre seu armário e tira de lá algumas saias em cabides. Há uma saia de tamanho 38, mas também há uma 36 e uma 34. As garotas estranham, mas não falam nada, e Hinata passa a saia de tamanho 38 para Ino.

A troca de roupa ocorre normalmente, então elas finalmente respiram aliviadas ao andar pelos corredores despreocupadamente. Elas estão rindo da situação quando o sinal toca, anunciando o final do intervalo, e pintando uma expressão amarrada em Ino que já não aguenta mais ter aulas no primeiro dia.

— O que vocês tem agora? - indaga Ino, com suspiros de lamentação escapando de sua boca.

— Aula de música. É o primeiro dia, acho que vão definir os instrumentos que sabemos tocar apenas, mas de qualquer maneira, não posso me atrasar. - avisa Hinata, passando a pasta pelo ombro e já se virando para ir embora.

— Eu também! - exclamam Ino e Sakura juntas.

— Finalmente uma aula juntas, testuda. - Ino bate no ombro de Sakura de forma amigável.

Elas se dirigem para o último andar, onde ocorre a aula de música do terceiro ano. É um auditório pequeno e com uma acústica incrível, onde vários instrumentos estão distribuídos, e quando adentram o local, já tem um garoto tocando violão, embora não tenha um professor em sala de aula. Várias garotas o observam parecendo encantadas, embora ele pareça não reparar em nenhuma delas.

— É o Uchiha Sasuke. - diz Ino, percebendo que Sakura o encarava com curiosidade. — Mas nem perca o seu tempo… Exigente demais para qualquer um.

— Acho que ele é gay. - Hinata comenta baixinho, e as garotas não descartam a opção de que isso seja verdade.

Apesar de achá-lo um tanto exibido, Sakura não consegue parar de olhá-lo. Os dedos grandes e pálidos dedilham as cordas do violão como se as conhecessem há anos, ele definitivamente tem um talento para ser exibido.

Mas o professor entra em sala, e todos sentam-se em seus devidos lugares. Sakura começa a tirar o caderninho em que anota algumas partituras normalmente quando percebe que quem entra, é o professor com quem esbarrou mais cedo. Ele está olhando diretamente para ela, e além de tudo, é extremamente parecido com o tal de Uchiha Sasuke.

…Continua.