Dark End Of The Street escrita por Minerva Lestrange


Capítulo 12
Propensão




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Observou, de longe, Iris abraçar Caitlin para se despedir e, simplesmente, sair sem olhar para os lados com a desculpa de que precisava dispensar a babá naquela noite e acordar cedo no dia seguinte. Ou seja, ignorando-o completamente. Não encontrara uma oportunidade boa o suficiente para conversarem e, tanto quanto, as palavras certas. Não queria feri-la e, por isso, vinha procrastinando por dias desde a conversa com Joe. Arrancar o band-aid rápido seria preferível, mas não mais fácil.

Com um suspiro resignado, voltou a tomar um gole do drinque em sua mão e notou Cisco se acomodar ao seu lado junto ao balcão do bar, lotado em plena quinta-feira. Estavam no “restaurante chique que Caitlin gostava”, onde havia um lounge em que as pessoas esperavam até suas mesas ficarem prontas ou, simplesmente, aproveitavam os serviços do happy-hour caríssimo, mas com boa música em um ambiente legal.

— Você está parecendo um stalker.

— Bem, eu fui convidado. – Revirou os olhos para o latino, de maneira contrariada.

— Provavelmente, Caitlin o mataria se não viesse. Tudo em silêncio, obviamente, porque... Não estão se falando. – Ele grunhiu, pensando sobre a possibilidade. – Ela ficaria muito pior.

Cisco passou a encarar o próprio drinque, inesperadamente mais cabisbaixo do que de costume, principalmente, levando em consideração que ele e Ralph estiveram animados o dia todo para a despedida de Caitlin. Não por ela estar indo embora, afinal não era como houvesse a impossibilidade de ir até Princeton para vê-la, pois bastava abrir um portal. Ninguém estava realmente preocupado com distância, naquele momento.

— O que está acontecendo?

— Enquanto disputavam essa queda de braços esquisita, Caitlin esteve pirando nas últimas semanas. – O outro o olhou tranquilamente. – Não estou surpreso que não tenha notado, você tem seus próprios problemas para resolver.

Barry processou a informação muito lentamente, tentando associar isso à forma como Caitlin agira nos dias anteriores, enquanto se preparava para a viagem, assim como após repreendê-lo e ignorá-lo por sua ação impulsiva com a traficante de crianças – a qual descobriram fazer parte de uma quadrilha, posteriormente. A seu ver, o comportamento dela parecia apenas mais ranzinza que o normal porque estava, ainda, muito brava com ele em específico.

— E... Por que ela esteve pirando? – Ajeitou-se na cadeira para encarar Caitlin, sentada próxima à banda, rindo alto de algo que Cecile estava lhe contando. – Ela aparentou estar feliz com a viagem, com o fato de estar indo dar aulas em Princeton.

— E ela está! Oh meu deus, Caitlin me falou sobre essas aulas por horas antes de ser convidada! Parece ser... A coisa dela. – Cisco voltou-se a ele, seriamente dessa vez. – A questão é: ela está indo embora.

— Aonde quer chegar, Cisco? Caitlin ficará fora apenas durante o verão.

Franziu o cenho sem entender, realmente incomodado, tanto por não entender a linha de raciocínio quanto por, somente então, notar o quanto a deixara de lado naqueles últimos dias. A médica o atormentara por dias com seus olhares julgadores sempre que abria a boca, sempre que alguém comentava sobre seu estado deplorável, sempre que falavam que estava distraído. Então, decidira lhe conceder espaço, já que falar com ela se mostrava impossível.

— Já parou para pensar que não faremos isso para sempre? – O engenheiro se levantou, colocando a banqueta no lugar, calmamente. – Porque acha que Caitlin recorreu à mãe dela, dentre todas as pessoas? Carla já pavimentou seu caminho na ciência, é de confiança, enquanto Cait ainda estava buscando o dela quando a explosão do acelerador de partículas aconteceu.

— Você acha que ela...

— Se Cait receber um convite, ela vai escolher Princeton. Sim, é uma possibilidade.

Cisco voltou para o lugar de onde saíra, próximo a Ralph e Joe em outra roda e Barry voltou-se para o drinque tomando tudo de uma vez e conseguindo algum efeito, até que este esvaísse de seu corpo tão rapidamente quanto chegara devido ao metabolismo acelerado. A barwoman o encarara de maneira incisiva notando a forma como acabara com o drinque, antes de começar a tranquilamente preparar outro.

Apertou as mãos sobre os olhos e seguiu apertando os cabelos, notando pela primeira vez no dia o quão cansado estava novamente. Ainda não conseguia dormir, o que não era segredo, apesar de ninguém entender porque não fizera nada a respeito após tanto tempo. Além disso, a informação nova o pegara desprevenido, batendo contra ele como um trem.

Não tinha a mínima ideia de que Caitlin poderia, realmente, considerar deixar o time para seguir um caminho próprio e sozinha. Sentia que deveria ter, no entanto. Tê-la deixado se afastar por não querer ouvir um novo sermão parecia, no mínimo, displicente agora, como se não importasse que ela ficaria fora por semanas. Afinal, acima de tudo, tinha confiança de que ela sempre estaria ali, se precisasse, apesar dos silêncios esmagadores.

Suspirou, aceitando o novo drinque e levantando-se para tentar interagir com o resto do grupo, sem parecer que tinha pendências com Caitlin ou com seu próprio casamento ou com sua mente, devido ao sono instável. Tudo correu bastante bem pelo resto da noite e mesmo Carla apareceu para tecer comentários sarcásticos sobre tudo e todos, para o divertimento de Cecile. Para a sua surpresa, as duas se deram bem imediatamente bem, mas logo a última levantou-se para ir embora, assim como Joe.

— Precisamos pagar a babá, ela já deve estar louca nos esperando.

— Te vejo amanhã, filho. – Cecile apertou seu ombro em despedida enquanto Joe se despedia de Caitlin. – Estamos te esperando de volta, boa sorte com Princeton.

— Obrigada, Joe! – A doutora se levantou para abraçá-lo, mas se voltou aos presentes na mesa assim que o casal saiu, dando um sorriso de desculpas e pegando a bolsa. – Também preciso ir. Pretendo sair o mais cedo possível amanhã.

— Eu te acompanharia, se houvesse me convidado como hóspede. – Comentou Carla, despretensiosamente. – Mas, como não o fez, acho que vou tomar mais um drinque.   

— Você parece sentir tanto por isso.

— Oh, Caity, é a sua despedida, deveria ficar para fechar o bar! – Comentou Ralph de maneira um pouco enrolada, mas a mulher apenas sorriu sem se abalar enquanto se abaixava para abraçá-lo.

— Acho que você e Cisco estão a caminho de fazer isso por mim. – Ela abraçou Cisco também, mais apertado dessa vez, pois o engenheiro não parecia a fim de soltá-la. – Podemos vir novamente para comemorar minha volta, no fim do verão.

— Okay.

Então, levantou-se no momento em que Caitlin se voltou a ele, mais séria e hesitante já ensaiando uma despedida qualquer.

— Eu te acompanho. – A observou se surpreender, mas não discutiu. Logo, após zerarem suas contas no bar, saíram para a noite da cidade alimentando o mesmo silêncio de todos os outros dias. – Podemos ir andando?

— Minha casa não é muito perto daqui, você sabe. 

— Posso te levar, se cansar. – Então, ela escondeu as mãos nos bolsos do casaco fino, apertado por um cinto, e estreitou os olhos para ele.

— Meus saltos são enormes... – Olhou para baixo, observando os sapatos pretos envernizados e, realmente, mais altos que o comum.

— Achei que não sentisse essas coisas.

— Bom. Se parece que não sinto, o objetivo foi alcançado. – Meneou a cabeça, sorrindo levemente, mas voltando a atenção a calçada movimentada àquela hora da noite, assim como ela. Era estranho que houvessem tantas coisas não ditas entre eles. Até então, tanto ele quanto Caitlin não seguravam as coisas um do outro, ainda que estas os machucassem. – Pensei que não fosse aparecer hoje.

— Eu não deixaria de vir. – Sentiu o olhar desconfiado. – Falo sério!  

Pensando sobre a questão, mais cedo, notara que realmente não deixaria de ir à despedida de Caitlin, por mais estranhos e rompidos que estivessem. Sabia que se sentiria culpado por deixá-la ir sem dizer nada, pois soaria como se não se importasse, o que não era verdade; e além disso, seria prolongar e tornar ainda mais sério algo que não deveria ter tomado tais proporções. Estava acostumado às divergências, não àquilo.

— Está bem.

Ela sorriu, começando a suavizar as expressões antes tensas e não pode deixar de refleti-la, sorrindo também. Gostava de vê-la sorrir, desde o início quando o fazia apenas raramente, assim como preferia não ser alvo dos olhares julgadores e de sua carranca mal humorada.

— Cisco disse que esteve preocupada nos últimos dias.

Começou muito lentamente, tentando não tocar em qualquer ponto muito espinhoso, mas a ouviu bufar, provavelmente incomodada com a intromissão do amigo, antes de procurar as palavras corretas.

— Ah, é... Bem... Mudanças são estressantes, ainda que temporárias. - Lembrou-se de o latino mencionar que Caitlin aceitaria um convite de Princeton e tentou encontrar algo no perfil um pouco perturbado, mas ela estava mais concentrada no chão à frente deles parecendo distraída. – Cisco tem me mandado relaxar por toda a última semana.

— Por isso chamou Carla?

— Oh, ela não me faria relaxar nem se dependesse disso para sobreviver. Sabe como nós somos. – A doutora completou olhando-o rapidamente, como se isso explicasse tudo.

— Então...?

— Você realmente quer conversar! – Ela soou impressionada, encarando-o com o cenho franzido.

— Bem, você esteve me ignorando por vários dias, certo? – Caitlin revirou os olhos que resultou em uma careta engraçada, então a cutucou com o cotovelo. – Sinto muito por deixá-la me ignorar.

— Não, eu... Deixei outras coisas intervirem no meu julgamento, naquele dia em que se machucou. – Sua tentativa de amenizar o clima não deu muito certo, pois a mulher parecia pensativa enquanto olhava o movimento da cidade ao redor. – Quando aceitei o convite para as aulas pensei que fosse ser tudo divertido e interessante, mas... Agora, parece que as coisas estão mudando rápido demais.

— Quer dizer em relação...?

— Nós todos, o time. Por um tempo, eu me sentia muito certa de que minha vida estava estabelecida aqui e... Até me recusei a ir embora quando Ronnie propôs. – Ela o encarou por um momento e soltou um riso fraco. –  Mas... Acabei de completar 30 anos e julguei que precisava de mais. Algo novo, que me instigasse a descobrir outras coisas sobre mim, que desse a possibilidade de me provar novamente, como quando estávamos trabalhando no acelerador de partículas, porque... Sinto falta daqueles dias. Sem multiverso e sem viagem no tempo.  

Barry tentou processar a fala e onde Caitlin poderia querer chegar, mas tudo que sentiu foi a angústia crescer comparada a dela, afinal ela não parecia ter muita certeza naquele momento, andando meio cambaleante pela calçada plana do bairro elegante, que costumava frequentar. Sentiu-se culpado por colocá-la, e a Cisco também, naquele trabalho, pois eles poderiam gostar e se empenhar, mas não havia sido uma escolha realmente.

— Então, as aulas em Princeton. – A viu anuir e curvou a cabeça para tentar ver seus olhos. – Porquê não parece tão certa? Você estava feliz no bar e... Aparentou estar empolgada por toda a semana.

— Eu estou! Essa talvez seja a pior parte, porque... é algo que quero fazer, algo que sinto que pode mudar minha percepção sobre algumas coisas, mesmo as não científicas, apenas... – Ela bufou, inconformada e irritada. – Pensei que fosse mais fácil deixá-los dessa vez, mas... Na verdade, é como quando Ronnie fez a proposta de nos mudarmos e eu recusei construir uma vida nova em um lugar diferente, porque havia... Vocês.

— Cait...

— Eu sempre escolho vocês.

A ouviu constatar em um dar de ombros incomodado e, por isso, precisou pará-la, segurando seu cotovelo. Sabia que não era a intenção jogar aquilo sobre suas costas e que Caitlin só estava desabafando o que vinha ocorrendo naquelas últimas semanas em que vinham se ignorando. Ela não queria abrir mão de cuidá-los, apesar de essa não ser sua função no time, ao mesmo tempo em que almejava outras coisas, o que por si só o deixava muito culpado, uma vez que parecia estar segurando-a.

— Ei, nós vamos estar aqui quando voltar. No fim do verão ou no momento em que decidir, sempre estaremos aqui. – Cait detestava demonstrar emoções em público e, por isso, não o surpreendeu vê-la desviar os olhos marejados para o chão enquanto torcia as mãos. – Sua mãe vai garantir que estejamos todos vivos até lá. Foi para isso que a chamou, não é?

Ela apenas confirmou, mordendo os lábios e, enquanto a analisava, não pode evitar a sensação de que vinha deixando passar algo, como se estivesse em suas mãos e, então, não estivesse mais, rápido assim. Contudo, assim como aparecera, a sensação se desvanecera em sua maior preocupação no momento: vê-la bem, pois era nítido que não estava.

— Pode me levar para casa?

— Claro.

Em silêncio, entraram em um beco para que as pessoas não achassem estranho a mulher em seu colo sem qualquer motivo aparente e Caitlin detestava ser pega de surpresa pelas corridas abruptas. Então, um instante depois, encontravam-se na rua escura demais perante o prédio chique que ela vinha esvaziando nos últimos dias. Com cuidado, a colocou no chão enquanto a sentia apertar seus ombros firmemente para se equilibrar e mantinha os olhos fechados.

— Está tudo bem?

— Sim, eu só me esqueci que havia bebido um pouco. – Ela respirou fundo algumas vezes e ajeitou o cabelo, sempre bagunçado por sua velocidade de uma forma que a deixava adorável. Então, abriu os olhos, encarando-o por alguns momentos de forma pensativa, como se fosse difícil sorrir novamente. – Você vai ficar bem?

Parecia até irônico que fosse Caitlin a perguntar depois de tudo que havia lhe dito, o que o fez sorrir por um momento antes de puxá-la, abraçando-a enquanto a sentia automaticamente rodear sua cintura com os braços. Estava ciente de que ela perguntava em específico sobre seus problemas com sonhos inconvenientes e insônias, mas isso não era minimamente importante nesse momento.

— Sim. Vou correr até você se precisar, Dra. Snow. – A sentiu rir descansando a bochecha em seu ombro. – Assim fica melhor?

— Um pouco. – Ouviu o tom um tanto contrariado, mas logo mudou para aquele mais suave com o qual estava acostumado. – Estou feliz que tenha aparecido essa noite, Barry.

— Eu também.

Murmurou pensando em fazer uma piada qualquer sobre ela não o ferir muito gravemente assim que colocou os pés no bar naquela noite, mas seus pensamentos logo se voltaram aos cabelos dela, muito próximos e que emanavam aquele perfume presente, embora irreal, o qual o remetia imediatamente à mulher dos sonhos. Porque Caitlin era a única mulher que conhecia a usar aquele perfume? Porque só conseguia sentir aquele cheiro nela ou quando estava perto dela e precisava sempre disfarçar para não demonstrar estar alheio, pensando em outra coisa qualquer que imaginara?

Suspirou de olhos fechados, apenas se deixando sentir o perfume dessa vez, sem tentar se sentir muito criminoso por se tratar de Cait ali, completamente à vontade contra o corpo dele. Era um tipo de conforto familiar, abraçá-la e imediatamente sentir o aroma, que irremediavelmente o levava a divagar. Entretanto, cedo demais, ela se afastou de forma lenta e mais séria, claramente tentando colocar a cabeça no lugar.

— Você pode ir me visitar, se quiser.

— Apenas me mande o endereço.

Ela sorriu fracamente, ajeitando a alça da bolsa e mordendo os lábios de maneira incerta. Fazia algum tempo que não a via insegura daquela forma, pois Caitlin era sempre repleta de certezas e confiança, e, talvez, mais tempo ainda que não a via mordiscar a própria boca daquela forma, algo que imediatamente lhe chamou a atenção.

Desde que a conhecera, achava ser impossível olhá-la e não se sentir minimamente intimidado. Além de linda, sua inteligência sempre o fascinara e, às vezes, deixava a todos do laboratório no chão. Obviamente, sempre esteve mais do que apaixonado por Iris, mas demoraram alguns meses de convivência para Caitlin se tornar sua amiga, realmente, além da mulher super elegante, mal humorada e bonita, que era sua médica.

Por isso, percebeu há muito ter deixado de se perguntar como seria beijá-la. Imaginando sobre, nesse instante, enquanto via os dentes soltarem os lábios vermelhos e bem desenhados, concebeu quão errada era a direção para a qual seus pensamentos iam. No entanto, seus olhos pareciam presos ali e teve certeza de que, por tanto tempo, que mesmo ela notara o deslize. 

— Okay, então... – Voltou a encarar os olhos castanhos, percebendo o ligeiro franzir de cenho em estranhamento. – Nos vemos.

Caitlin sorriu, passando por ele para subir os degraus da calçada até a entrada do prédio. Dessa vez, não se virou para encará-la sumir pela porta, uma vez que o perfume parecia ter sido deixado para trás e ainda estava assustado sobre o quanto a vontade de beijá-la era latente como nunca havia sido.


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