A Outra Lydia Kinsley escrita por Bea Mello


Capítulo 16
Sebastian Kent




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“Nina!” cochichei, olhando ao redor para me certificar de que ninguém a estava vendo bater desesperadamente na porta do meu quarto.

“Você tá aí!”

Ela me abraçou forte, apertando os objetos em meus braços contra o meu peito.

“Calma, eu tô bem!” Forcei o sotaque californiano novamente. Eu não havia percebido que estava falando com a minha própria voz até agora. “Eu estava com Scott.”

Ela se afastou para me olhar, suas mãos firmes nos meus ombros. 

“Ah.” Ponderou por um momento, e então repetiu com uma cara de nojo. “Ah.”

Eu balancei a cabeça, reprimindo o sorriso. 

“Não é o que você está pensando,” expliquei. “Eu passei mal ontem à noite e eu não te encontrei em lugar algum para pegar meu cartão de acesso. Então passei a noite no quarto dele.”

Ela piscou, confusa.

“Achei que você não gostasse dele.”

Por isso eu não esperava. Scott não tinha nada além de amigável e prestativo comigo desde a premiação. Se bem que, por outro lado, ele havia notado algo de errado em Lydia desde o início.

“Bom, ele só viu que eu precisava de ajuda... e... me ajudou. Nada mais.”

“Mas… vocês dormiram juntos?”

Olhei em volta mais uma vez, mas o corredor continuava completamente vazio. Usei o cartão de acesso para abrir a porta da minha suíte e Nina e eu entramos. O quarto estava exatamente da maneira que eu havia deixado: completamente revirado. 

“Não dormimos juntos,” respondi, apesar de não ter certeza. Não havíamos dormido juntos, mas acredito que tenhamos dividido a cama. Eu não saberia dizer. “Ele dormiu no sofá,” menti.

Eu preferia evitar ter que explicar demais. Procurei roupas confortáveis na mala aberta sobre a minha cama e comecei a me trocar. 

“É, mas… por quê?”

“Nina, eu tava bêbada, quase caí da escada. Ele me ajudou, só isso.” Terminei de me vestir e me virei, jogando meu vestido sobre a mala com mais força do que pretendia. “Se você sabe que eu não gosto dele, por que deu o cartão do meu quarto?”

“Ele te contou?” perguntou engolindo em seco.

“Não precisou, o cartão estava com você ontem, e hoje apareceu nas mãos dele.”

Percebi seus olhos enchendo de lágrimas, e logo me arrependi de ter tocado no assunto. Eu nem estava brava, apesar de não conseguir controlar a irritação em minha voz — talvez devido ao fato de que eu não queria estar ali naquele momento —, só queria entender o porquê de ela ter feito isso se Lydia não gostava de Scott.

“Eu não lembro de muita coisa de ontem. Você sabe como é quando eu bebo.”

Eu suspirei — precisava acalmá-la. Não saberia como lidar com Nina em prantos.

“Tá tudo bem, Nina. Eu estou bem.”

“Me perdoa, Liddy, eu não devia ter te deixado sozinha.”

“Nina, está tudo bem,” repeti, mantendo-me calma com mais facilidade do que eu esperava. “Nada aconteceu. Só fiquei curiosa.”

Dei uma rápida olhada no espelho e decidi que minha roupa estava decente o suficiente para uma viagem de avião de volta a Los Angeles — um shorts floral leve e camiseta branca. Fitei Nina por um segundo, tentando decifrar o que fazer em seguida, mas antes que pudesse pensar em algo, ela veio em minha direção. 

“Me perdoa,” repetiu ao me abraçar. “Eu fui muito idiota.”

“Não foi, não.”

Ela segurou meu rosto entre as mãos, nossa diferença de altura mais nítida agora que seu rosto estava tão próximo ao meu. Eu não me lembrava de ser tão baixa — ou então era o fato de Nina ter um corpo de modelo em todos os sentidos.

“Você está mesmo bem?”

“Estou ótima,” assegurei, apesar da dor de cabeça permanecer. 

“Tem certeza? Ele não te fez mal, fez?”

“Claro que não,” respondi confiante — eu saberia se tivesse. Forcei um sorriso, desejando com todas as forças estar sozinha naquele momento e não ter que explicar nada a ninguém. “Só quero ir para casa logo.”

Nina assentiu, limpando discretamente a lágrima que escorreu por sua bochecha. Eu tratei de fazer logo as malas. Talvez assim ela notasse que eu estava desesperada para ir para casa.

Estávamos no meio da arrumação quando notei o celular de Lydia vibrando sobre o travesseiro. Eu não lembrava de tê-lo deixado ali. Espiei Nina pelo canto do olho, me certificando de que ela estava ocupada com outra coisa, e peguei o celular, hesitando ao ler o nome desconhecido na tela. Sebastian Kent. 

Nunca havia ouvido esse nome antes. Se atendesse, não saberia o que dizer.

Me convenci de que, se fosse por um assunto importante, ele ligaria novamente, e eu poderia dizer que estava prestes a pegar um voo e que ele teria que ligar mais tarde, quando Sarah estivesse por perto para me orientar. Então, decidi ignorar, e continuei fazendo as malas, me perguntando o porquê de meu celular estar visível sobre o travesseiro se eu o havia guardado na gaveta da cabeceira antes de sair.

#

Nina me levou até o aeroporto e voltou para a casa dos pais. Por mais que gostasse da companhia dela, não posso negar que fiquei aliviada por não precisar passar mais quatro horas e meia com ela num carro. Senti que ela estava realmente arrependida quando me abraçou pela terceira vez naquele dia, ao nos despedirmos do lado de fora do aeroporto, sem contar que tentou insistir em me acompanhar até o embarque. Garanti que não seria necessário — poderíamos nos falar mais tarde, e sugeri que ela fosse para casa passar tempo com seus pais e seu irmão.

Algo que eu deveria fazer, com certeza. Eu invejava o fato de que isso era tão fácil para algumas pessoas. Nem todo mundo se remoía por dentro sem motivo só de pensar em uma reunião em família.

Eram cerca de duas da tarde quando cheguei à casa de Rose em Toluca Lake. Eu já estava planejando relaxar na banheira por algumas horas e depois dormir até o dia seguinte, mas logo que deixei minhas malas no quarto ouvi um movimento no hall de entrada.

“Margot?” chamou Sarah.

Foram ótimas vinte e quatro horas sem as interferências dela.

Relutante, saí do quarto, e a encontrei subindo as escadas para a sala de estar, seu conjuntinho business casual branco em destaque contra o painel vermelho desbotado das paredes.

“Está sozinha?” perguntou ela.

Eu assenti. Sarah continuou subindo as escadas, e entendi que deveria segui-la. Por que eu tinha uma sensação estranha dentro de mim? 

Ela parou na sala de estar, olhando pela janela por um momento como se houvesse algo muito importante acontecendo lá fora. Quando finalmente virou-se para mim, aguardou alguns segundos antes de falar, como se ainda estivesse procurando por um assunto.

“Margot,” começou séria, “sua mãe me ligou hoje. Disse que não consegui falar com você a manhã toda.”

Franzi a testa. Estive ocupada durante a manhã, mas tinha certeza de que minha mãe não havia deixado nenhuma ligação ou mensagem, nem no meu celular, nem no de Lydia. Mas por que ela queria falar comigo? Eu não havia recebido uma mensagem sequer na última semana inteira.

“O que ela quer?” Nem tentei explicar que não havia recebido nada dela — minha curiosidade era maior.

Sarah arquejou.

“Vou direto ao ponto, Rose não vai voltar na data planejada.”

“O quê?” senti meu coração pular uma batida. “Por quê?”

“Ela… Bem, acho que ela mesma pode te falar. Talvez fosse uma boa ideia você ir visitar as duas essa semana.”

A voz de Sarah era firme, mas não do jeito que eu estava acostumada. Havia um tom de preocupação escondido no seu porte extremamente profissional. Para ela vacilar em me contar alguma coisa, devia ser mais grave do que eu imaginava. Sarah nunca hesitava em falar a verdade, por mais dolorosa que fosse. 

Deixei o silêncio pairar no ar por um momento, minha cabeça criando os mais terríveis cenários. 

Quando falei novamente, minha voz era cautelosa:

“Ela está bem?”

“Sim!” Sarah assegurou. “Ela vai ficar bem. A equipe do Burk & Hall é muito profissional, não tenho dúvidas de que ela está em boas mãos.”

Nos últimos anos, sempre que minha irmã era mencionada, eu pensava em Lydia Kinsley. Mas, por algum motivo que eu não sabia explicar, as palavras de Sarah me levaram para uma memória muito mais distante desta vez — uma em que Rose era minha melhor amiga, e a ideia de ela não estar bem me causava náusea. 

Engoli em seco. Isso não devia acontecer desde os meus cinco ou seis anos de idade. Não havia motivo para acontecer agora, aos vinte e um.

“Você e eu, por outro lado, temos problemas maiores.”

“Maiores que saúde da minha irmã?” acusei, meus olhos formando as lágrimas apesar dos meus esforços para contê-las.

“Como eu disse, ela está em boas mãos na clínica,” sua voz era mais solene agora. “Precisamos falar de negócios.”

“Mas Rose…”

“Vou comprar uma passagem para você poder visitá-la, tudo bem? Mas antes: negócios.”

Cerrei os punhos, meu coração acelerado. Eu preferiria que Sarah me desse a pior notícia do mundo de uma vez só do que deixasse meu cérebro brincar com as possibilidades por um segundo que fosse.

“Não… eu vou ligar para Rose e ouvir seja lá qual a má notícia ela tem para me dar,” protestei enquanto caminhava até o telefone na cozinha. “Eu tô cansada. Tô de ressaca. Me dá um dia para descansar, tá bom?”

“Margot!”

Sua voz ressoou através do ambiente como um trovão. Minha mão parou sobre o telefone, a outra apoiada na bancada preta da cozinha. Por um segundo, Sarah não respondeu. Pensei em tudo que eu havia dito — eu sabia que estava prestes a levar um sermão, mas não achei que a tivesse provocado mais do que de costume.

“Margot, amor, você devia saber à essa altura que não tem o luxo de dizer não…”

“É o que estou fazendo nesse exato momento,” desafiei, mesmo sabendo que minha cara devia ser de uma criança perdida.

“Você finge muito bem que se importa com sua irmã,” cuspiu ela. “Talvez pudesse guardar essa energia toda pra quando alguém confrontar você sobre sua identidade e não abrir a boca na primeira pergunta que te fizerem.”

Senti meus dedos apertarem o telefone com tanta força que tive medo de quebrá-lo. E eu queria ter uma boa resposta pronta, mas não pensei em nada. Apenas me mantive imóvel, a respiração pesada e o queixo erguido enquanto meu rosto pegava fogo, enquanto eu me segurava para não partir para cima dela.

Eu já havia passado o bastante por isso em casa para saber que não era a melhor solução.

“Sorte sua que eu confio no Scott pra guardar seu segredo.”

“Confia? Ele disse que você o ameaçou.”

“Fiz o que precisei fazer.” Sarah suspirou, sua postura mudando completamente de um segundo para outro, como se estivesse cansada de ser durona. “Não há nada que você ou eu possamos fazer por Rose nesse exato momento.”

Ela se aproximou com cautela. Sua postura não era ameaçadora, mas talvez o fato de ela, pela primeira vez, não estar sendo tão fria comigo, me pegou desprevenida. Eu congelei quando ela tirou uma mecha do meu cabelo da camiseta e repousou uma mão sobre meu ombro.

“Rose está bem e está segura, e você vai visitá-la esta semana. Prometo.”

“Me dê um bom motivo para obedecer a você, Sarah.”

Percebi o canto de seu lábio se esticar em um meio sorriso.

“Porque eu recebi uma ligação de Sebastian Kent hoje.”

“Não sei quem é esse homem,” retruquei, mesmo morrendo de curiosidade. Eu precisava me manter firme.

“Ele é produtor. Rose fez uma audição para um filme que ele está produzindo há alguns meses e não conseguiu o papel. Eles começaram as gravações com outra atriz, mas por causa de algumas… polêmicas, ela foi demitida. Sebastian quer Lydia Kinsley no lugar.”

Não ousei dizer uma palavra, me corroendo por dentro por mudar de foco tão rapidamente. Eu precisava falar com minha irmã — já havia alguns dias desde a última vez que conversamos. Mas Sarah estava certa: não havia nada que eu pudesse fazer por ela a não ser o que eu já havia me comprometido a fazer, e se fosse algo urgente Sarah diria.

Sarah continuou:

“Ele ofereceu um contrato de cinco milhões de dólares.”


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