As Quatro Fases da Lua escrita por Siaht


Capítulo 4
IV. lua minguante




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IV

{lua minguante}

— miss you love (silverchair) — 

BLACK

Estava muito escuro e muito frio, embora fosse uma tarde de verão. Canções de amor saíam do velho rádio trouxa, soando como um réquiem melancólico e desafinado. James Potter gargalhava e Lily Evans praticamente dançava pela sala. O rapaz se obrigou a colocar um sorriso no rosto, mesmo que isso fizesse seu coração chover.

Sirius Black queria estar feliz pelos amigos. Aqueles eram tempos sombrios e o anúncio de um casamento, ainda que um tão abrupto, deveria fornecer alguma luz a todos. Entretanto, a imagem de Remus Lupin, sentado do outro lado do cômodo com uma xícara de chá nas mãos, era suficiente para causar um eclipse.  

Eles haviam terminado. De forma definitiva daquela vez. Após dois anos de idas e vindas, portas batidas, objetos jogados, promessas sussurradas e gritos de mal dizer, a linha fina que os unia havia finalmente arrebentado. De forma irreparável. Remus finalmente se cansara de toda aquela instabilidade, de toda falta de definição, de todas as brigas. Se cansara de todo o caos que o Black impunha ao mundo. Sirius finalmente havia deixado seu sangue ruim vencer e arruinara aquele relacionamento. Tentara muito não fazer aquilo, mas não fora possível. A corrupção estava impregnada em seu DNA. Suas melhores intenções ainda o levariam ao inferno.

O rapaz não sabia, porque estava surpreso com aquele desfecho. Era óbvio que aquele namoro – se um dia chegara a tanto – não iria durar. Coisas boas só existem para quebrar. E todo amor está destinado a se tornar ruína. Mesmo assim, Sirius sentia suas emoções espirando em se estômago, formando um vórtice que ameaçava sugar tudo o que ainda restava nele. O fazendo querer gritar, querer chorar, querer implorar a Remus que lhe desse uma última chance, querer cuspir na cara do garoto da mesma forma que ele cuspira em seu afeto.

Não fez nada disso. Apenas se sentou em silêncio, naquela sala luminosa demais, e forçou um sorriso, ignorando o amigo – ou seja lá o que Lupin fosse – da melhor forma que conseguiu. Só se permitiu olhar para ele, quando já estava prestes a partir. Um último olhar, jurou para si mesmo, antes de esquecer tudo o que acontecera entre os dois. Para sua surpresa, o rapaz o olhou de volta. Durou apenas um instante. Remus olhou para ele por um milésimo de segundo e Sirius sentiu seu mundo inteiro incendiar. E então o Lupin desviou os olhos, condenando o Black a habitar as cinzas de tudo o que foram e de tudo o que jamais seriam.

O mundo era sangue e fogo. A adolescência havia acabado. O tempo da ingenuidade chegara ao fim. O futuro de Sirius era tão sombrio quanto seu nome. A sua frente havia apenas guerra, solidão e as memórias – tão amargas quanto café em uma xícara lascada – de um amor perdido e nunca superado.

LUPIN

A pior parte era que Remus Lupin sempre soubera que as coisas terminariam daquele jeito. Então, se ele estava largado no chão, com nada além de uma garrafa de whisky de fogo e uma coração partido, a culpa era total e inteiramente dele. Não havia tempo para lamentos. O mundo estava acabando. Uma guerra era travada. Pessoas tinham suas vidas ameaçadas diariamente. E o coração de Remus estava partido.

O jovem lobisomem sabia que não deveria se encontrar em um estado tão lastimável, quando fora ele quem terminara a relação. No entanto, os motivos que o levaram a tomar tal decisão – e a permanecer firme nela daquela vez – faziam seu peito sangrar. Ele continuava amando Sirius, afinal. Não achava que um dia conseguiria deixar de amá-lo. Isso, contudo, não queria dizer que eles eram bons um para o outro.

Remus estava farto das brigas, da inconstância, da indefinição. Das palavras horríveis que ele e o Black atiravam como facas quando estavam irritados. Estava cansado daquele sentimento desesperado que parecia consumi-lo. Do desejo, da loucura, da paixão. O Lupin sabia que caminhava sobre uma linha tênue e instável quando o assunto era o autocontrole e sabia, mais do que qualquer um, que não podia se dar ao luxo de perder o controle, ou acabaria machucando alguém de forma irreparável. Estar com Sirius o tornava tudo o que ele não queria ser. Tudo o que não podia ser.

Por um momento – um segundo em uma vida inteira –, ele cedera àquilo e se deixara naufragar no oceano escuro de pura tormenta que era Sirius Black. Se deixara ser um oceano de tormenta. Não iria negar que gostara da sensação. Até que começara a se afogar naquele oceano. Até que dor, medo e asfixia eram tudo o que parecia existir. E Remus percebeu que precisava respirar. E Remus percebeu que o amor não deveria se parecer tanto com o desespero.

Porque Sirius Black sempre o faria se sentir como se fosse noite de lua cheia. Sempre o faria sentir aquele misto de liberdade, prazer e júbilo inigualáveis. Mas também sempre o faria sentir a dor de ser quebrado. A agonia de ser torcido e retorcido um milhão de vezes. O desespero que perder o controle. E, quando todo o êxtase cessava, as cicatrizes e a culpa ainda permaneciam. Então, sim, Sirius Black sempre o faria se sentir como se fosse uma noite quente de lua chia. Mas Remus Lupin passara a vida inteira ansiando pelas noites frias e sem luar.


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Notas finais do capítulo

FIM.


Quando recebi o convite para participar para o Pride tinha a certeza de que queria escrever histórias doces e com finais felizes. Já que representações lgbtt+ costumam estar tão cercadas de estereótipos negativos e tragédias. As outras seis histórias que inscrevi para esse projeto (sim, um tanto exagerada. Culpem meu sol em sagitário) seguem essa ideia, mas eu não consegui encaixar Wolfstar (que era um ship sobre o qual eu realmente queria escrever) em algo assim. Não consigo imaginar Sirius e Remus do universo canônico – e é sobre esse universo que gosto de escrever – tendo o mais estável dos relacionamentos ou um final feliz. Infelizmente a geração dos Marotos não foi feita para finais felizes. Peço desculpar pela pequena dose de melancolia e amargura. Espero que tenha ficado claro que Sirus Black e Remus Lupin não poderiam dar certo por serem Sirius Black e Remus Lupin, por suas personalidades e bagagens de vida, e não por sua sexualidade. E espero que um Remus que escolhe fazer o que é melhor para si mesmo, saindo de um relacionamento que era ruim para ambos, sirva de alguma luz no meio de tudo isso. Às vezes o amor não é suficiente e os relacionamentos não dão certos. Acho que essa é uma história sobre isso.
Enfim, espero que tenham gostado da história, porque eu - que gosto de um pouco de tristeza - gostei muito de escrevê-la. Prometo apenas finais felizes a partir de agora. ♥
Beijinhos,
Thaís